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1 UMA VISÃO CONSTITUCIONAL ACERCA DOS INSTITUTOS DA

3.3 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE PROCESSUAL

3.3.4 NEXO DE CAUSALIDADE

A mera existência de dano e a prática de um ato processual não implicam em necessária imputação de responsabilidade. É imprescindível que entre o ato processual e o dano sofrido pela outra parte haja um liame que permita concluir que esse ocorreu em razão daquele. Necessário, portanto, o nexo de causalidade entre o ato processual e o dano. O nexo de causalidade, em se tratando de responsabilidade processual não se diferencia do nexo de causalidade em sede de responsabilidade. Em ambos se perquire se entre a conduta humana e o dano alegado há uma relação de causa e efeito, se o dano fora causado pelo ato descrito. É o pressuposto que permite a interconexão entre os demais pressupostos e consolidando, assim, a imputação do dano e descortinando a relação de responsabilidade.

Por outro lado, em se tratando de responsabilidade processual, a identificação dessa relação de causalidade se mostra menos tormentosa do que quando diante da responsabilidade civil. A responsabilidade processual é diz respeito a universo de atos mais reduzidos, já que o próprio processo é uma limitação dos fatos ocorridos. A necessidade de judicialização por meio de normas processuais acaba por afastar um sem-número de situações que, quando observadas sob o prisma da responsabilidade processual, poderiam ensejar uma amplitude de causas de eventual dano. Assim, a responsabilidade processual, devido a esse corte do campo dos fatos que limita a amplitude da busca pela causa do dano, não padece dos mesmos problemas em relação ao nexo causal existentes na responsabilidade civil.

Contudo, as soluções apresentadas em sede de responsabilidade civil se mostram plenamente válidas também para a responsabilidade processual, permitindo, inclusive, um melhor aprimoramento da busca pela reparabilidade dos danos causados pelos atos processuais a fim de evitar a utilização do processo como instrumento causador de dano.

Um exemplo bem definido do nexo de causalidade na responsabilidade processual é encontrado quando examinada a condenação no pagamento das custas processuais pelo vencido ao vencedor. É largamente aceito que tal condenação decorre do princípio da sucumbência, ou seja, a recomposição dos danos concernentes às despesas adiantadas deve ser efetuada pela parte sucumbente como decorrência direta de sua derrota no processo. Quando há resolução de mérito, a questão das despesas se resolve de forma mais simples: ao vencido é imputada responsabilidade pelo pagamento. A sucumbência nada mais faz nessa hipótese do que indicar qual das partes deu causa ao processo.

Pode-se, pois, destacar que não é a sucumbência propriamente dita a razão da imputabilidade da condenação no pagamento das despesas ao vencido. A sucumbência acaba por funcionar como um elemento que destaca o nexo de causalidade entre a resistência daquele que fora vencido e os custos do processo. Nesse sentido, Helena Najjar Abdo destaca que “na verdade, a sucumbência é, como dito, um indicador do verdadeiro princípio que deve prevalecer em matéria de atribuição da responsabilidade pelo custo do processo: o da causalidade”230. Seguindo mesma linha, Frederico do Valle Abreu, concluindo pela explicitação do princípio da causalidade como suporte jurídico à responsabilidade pelas despesas do processo assevera que “responde pelo custo do processo aquele que haja dado causa a ele, seja atribuindo-se

230 ABDO, Helena Najjar . O (equivocadamente) denominado "ônus da sucumbência" no processo civil. Revista

razão sem ter (pretensão auto-atribuída), seja obrigando quem tem razão a vir a juízo para obter provimento satisfatório e permitido”231

Percebe-se que a imputação da responsabilidade pelo pagamento das despesas se dá como reflexo da confirmação do nexo causal entre nas situações em que não há propriamente uma condenação do vencido, e em especial naquelas situações em que há perda superveniente do objeto. A imputação da responsabilidade pelo pagamento das despesas processuais recai sobre aquele que deu causa ao processo. Exemplo claro também se observa no enunciado da súmula 303 do Superior Tribunal de Justiça232, reconhecendo que tais despesas, em sede de embargos de terceiro, devem ficar a cargo de quem deu causa ao processo. Outras situações em que a causalidade é o elemento que induz à imputação de responsabilidade são previstas no Novo Código de Processo Civil, tais como na divisão proporcional das despesas e honorários entre os vencidos (artigo 87 e seu parágrafo primeiro)233; a imputação, no caso de desistência, renúncia ou reconhecimento do pedido, da responsabilidade à parte que desistiu, renunciou ou reconheceu (artigo 90) 234 ; e a imputação responsabilidade pelas despesas dos atos adiados ou de com necessidade de repetição àquele que der causa, sem justo motivo, ao adiamento ou à repetição (artigo 93235).

Tem-se, em verdade, um critério único para a imputação da responsabilidade pelas despesas processuais: é responsável aquele que der causa às despesas, com base no princípio da causalidade, ainda que em certas situações essa causalidade esteja indicada pela sucumbência. Por sua vez, o principio da causalidade nada mais é do que o transporte do nexo de causalidade reconhecido do direito civil para a responsabilidade processual. Nexo de causalidade, portanto, agindo como pressuposto da responsabilidade processual.

Nas hipóteses indenizatórias concernentes à responsabilidade processual também se percebe a atuação do nexo de causalidade como elemento a consolidar a relação de imputação do dano

231

ABREU, Frederico do Valle . O custo financeiro do processo. Revista dos Tribunais, v. 818, n.dez, p. 65, 2003, p. 67.

232

STJ – Súmula 303: Em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios.

233

Art. 87. Concorrendo diversos autores ou diversos réus, os vencidos respondem proporcionalmente pelas despesas e pelos honorários.

§ 1º A sentença deverá distribuir entre os litisconsortes, de forma expressa, a responsabilidade proporcional pelo pagamento das verbas previstas no caput.

234

Art. 90. Proferida sentença com fundamento em desistência, em renúncia ou em reconhecimento do pedido, as despesas e os honorários serão pagos pela parte que desistiu, renunciou ou reconheceu.

235

Art. 93. As despesas de atos adiados ou cuja repetição for necessária ficarão a cargo da parte, do auxiliar da justiça, do órgão do Ministério Público ou da Defensoria Pública ou do juiz que, sem justo motivo, houver dado causa ao adiamento ou à repetição.

ao agente. À semelhança do que ocorre na responsabilidade civil, a prática de um ato que acarrete em dano, impõe que se estabeleça uma relação de causalidade para que se concretize a imputação da responsabilidade processual prevista na norma dessa processual.

3.3.5 O ELEMENTO VOLITIVO

A investigação acerca do elemento volitivo em se tratando de responsabilidade processual é a exceção, haja vista a maior veiculação de hipóteses de responsabilidade objetiva. Todavia, o elemento volitivo na responsabilidade processual cumpre importante papel perante a relação processual.

Se na responsabilidade civil subjetiva a culpa cumpre o papel de valorar a conduta humana no sentido de aferir a observância de diligência no seu atuar e, com base nessa valoração do comportamento imputar a responsabilidade, na responsabilidade processual os deveres a serem observados são mais estritos e, por isso mesmo, normativamente previstos. A volitividade, no caso da responsabilidade processual, está ligada com mais força à violação a deveres de probidade e lealdade exigido das partes no processo, exsurgindo dessa violação o dever de reparar o dano.

Seguindo a especificidade o elemento volitivo em se tratando da responsabilidade processual, importante destaque deve ser feito ao fato de não se cogitar no dever de indenizar por culpa; faz-se necessária a presença de dolo do agente. Eventual imprudência, imperícia ou negligência não importam para fins de responsabilidade, afinal, tais características se mostram incompatíveis com a má-fé que é imputada ao litigante. Extrai-se o dolo da noção de dolo eventual do direito penal. Ainda que não se possa falar que a parte reputada como litigante de má-fé tenha agido assim a fim da causar um dano à outra parte (em geral, age assim visando um benefício a si próprio, sendo o dano à outra parte apenas um efeito colateral), seu comportamento processual indica a ausência de preocupação em não causar danos. Como bem indicam Eugênio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli, “o limite entre [o dolo eventual

e] a culpa é dado pela aceitação ou rejeição da possibilidade de produção do resultado”236. A infração aos deveres de lealdade e probidade, mormente se termos em conta que os atos são tipificados, impõe seja reconhecido que a litigância de má-fé corresponde ao dolo eventual no sentido de que, ciente da potencialidade lesiva e da antijuridicidade expressamente descrita na norma processual, o autor ainda sim age em confronto com as previsões que estipulam o que é litigância de má-fé, ignorando, portanto, potencial dano que possa causar.

Assim, percebe-se que a responsabilidade processual aparece nos dois ápices: ou reponde por dolo, ou independente do animus, deixando o meio termo (que seria a culpa) sem o abrigo. Dada a inversão da sistemática para fins de responsabilidade, ou seja, devido ao fato de em sede de responsabilidade processual a regra ser a responsabilidade objetiva, deixar de conferir relevância jurídica à culpa stricto sensu não apresenta quaisquer dificuldades. Em sendo objetiva a responsabilidade como regra, as razões para se impor a responsabilidade por culpa se esvaem em benefício da reparação do dano. E, quando a responsabilidade exsurge acompanhada de um indicativo de reprovabilidade do próprio ato gerador do dano (e não apenas reprovando o dano), o dolo se faz necessário face ao seu caráter punitivo.

No ordenamento processual pátrio se mostra ainda mais ligado à ideia de culpa normativa. A legislação expõe os atos que, quando praticados, levam à conclusão de que a parte estava de má-fé. Nessa linha, a investigação de cunho psicológico tem sua importância consideravelmente limitada. Ainda que as disposições acerca da configuração da litigância de má-fé apresentem certo grau de subjetividade (e, por isso, se insiram em análises do aspecto anímico do sujeito), essa possui um grau de concretude mais acentuado que na culpa stricto sensu exigida da responsabilidade civil subjetiva. Para ser considerado litigante de má-fé basta a prática de atos vedados e assim reputados. Sua prática pressupõe a violação aos deveres de probidade e lealdade, não sendo relevante se o estado anímico da parte assim se caracterizava – à exceção dos elementos anímicos previstos na própria norma.

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