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1 UMA VISÃO CONSTITUCIONAL ACERCA DOS INSTITUTOS DA

3.4 SISTEMAS DE RESPONSABILIDADE PROCESSUAL

3.4.2 RESPONSABILIDADE PROCESSUAL OBJETIVA

A responsabilidade processual objetiva, apontada alhures como a regra em sede de responsabilidade processual, é imputada ao litigante que, mediante a prática de um ato

237 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A responsabilidade das partes por Dano Processual no Direito

processual lícito, causa danos ao outro litigante. Todavia, tal imputação deve decorrer de uma norma processual determinando o dever de reparar por danos de tal natureza. A finalidade da responsabilidade processual objetiva é simplesmente a reparação do dano, ficando afastado eventual caráter punitivo. E é bem simples chegar a tal assertiva. A prática de atos processuais é, obviamente, uma atividade lícita e, por isso, não haveria razão de se impedi-la. Seria, inclusive, uma afronta à Constituição. Contudo, também não se pode de ter em mente que certos atos podem gerar danos a outrem (e, especificamente no processo, à outra parte). E tais danos, quando ausente sustentação legal, devem ser reparados.

Na tentativa de contrabalancear o potencial lesivo que a prática de certos atos processuais tem, e com o foco na reparabilidade de danos, entra em cena a questão do risco processual. Na responsabilidade civil, é o risco o fundamento para a sua imputação. Na responsabilidade processual também. No particular, trata-se do risco processual. Francesco Carnelutti trata o risco processual como “um sistema de estímulos e contra-estímulos aptos para solicitar e retificar sua ação [da parte]”238. Sob essa perspectiva, a figura do risco processual serve como elemento incentivador de uma atuação mais cautelosa das partes, tendo em vista que certos atos processuais, por causa do mencionado potencial lesivo, quando praticados implicarão na responsabilização independente de existência de culpa quando causarem danos. Ainda sobre o risco processual, Fernando Luso Soares bem delineia que, ao contrário do risco relacionado à responsabilidade civil que decorre da pressão geral exercida sobre a massa dos potenciais agentes responsabilizáveis, na responsabilidade processual objetiva cada processo é uma fonte individual de riscos239.

A partir da ideia de ampla reparabilidade inerente à responsabilidade processual objetiva, é possível destacar dois grupos de hipóteses previstas no ordenamento que dão ensejo a essa modalidade de responsabilidade: a responsabilidade pelas despesas do processo e a responsabilidades por atos executivos não definitivos.

Acerca da imputação de responsabilidade pelas despesas no processo, uma primeira observação merece ser feita. A despeito de a ordem processual a considerá-la como implicitamente requerida, somente tem lugar em razão justamente da previsão dessa modalidade de condenação, ou seja, de que o vencido arcará com as despesas antecipadas

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CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil, vol 2. 2. ed. - São Paulo: Lemos & Cruz, 2004, p. 115.

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pelo vencedor.

Por sua vez, como recorrente na responsabilidade objetiva (processual ou civil), o risco é sua força motriz. Trata-se do risco decorrente da utilização do processo. É inegável ser o processo uma fonte apta a causar danos. Nessa esteira, a culpa não cumpriria o papel de instaurador da recomposição de forma satisfatória. Entra em cena, então, a causalidade como instauradora da responsabilidade pelo reembolso das despesas adiantadas240; responsabilidade objetiva, portanto.

Também é preciso destacar a Tentativa de evitar a utilização do processo como tão somente fonte de danos à outra parte. O litigante, sabedor de não ter razão em sua pretensão (ou resistência), se veria desestimulado a manter tal comportamento, pois teria ciência de que, ao final, será condenado em reparar os danos concernentes às despesas processuais. Neil Andrews destaca essa finalidade:

Esta regra tem também o óbvio mérito de agir como desincentivo às demandas e defesas: qualquer litigante está ciente do risco de ficar sujeito à responsabilidade de pagar valores elevados de custos (os seus e os de seu oponente) caso tenha o infortúnio de perder a causa241.

Destacada a responsabilidade objetiva pelo pagamento das despesas, um ponto que merece atenção é a condenação no pagamento de honorários advocatícios. As despesas e os honorários comumente são denominados de “ônus de sucumbência”. Contudo, apenas a condenação referente às despesas é que guarda relação com a responsabilidade processual, inexistindo, pois, essa relação entre a responsabilidade processual e a condenação em honorários advocatícios. Dois fundamentos sustentam essa afirmação. O primeiro tem guarida na ausência do preenchimento do primeiro pressuposto da responsabilidade processual elencado: a qualidade de parte. O beneficiário da verba referente aos honorários advocatícios é o advogado, e não seu cliente. Não sendo parte, não há que se falar em responsabilidade processual. O segundo diz respeito à finalidade dessa condenação. A despeito de muita controvérsia, a condenação em honorários não atende à finalidade de ressarcir a parte de um gasto que teve, pois, além de não ser o destinatário, ainda que o fosse, inexistiria necessária correspondência entre os valores gastos e o valor da condenação, uma vez estar o magistrado adstrito não aos termos da contratação, mas sim à previsão legal, o que acarretaria em uma

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ABDO, Helena Najjar . O (equivocadamente) denominado "ônus da sucumbência" no processo civil. Revista de Processo, v. 140, p. 37-53, 2006, p. 42.

241 ANDREWS, Neil. Fundamentos dos custos legais: responsabilidade do vencido, acesso à justiça e disciplina

“reparação” incompleta242.

O segundo grupo de hipóteses dá ensejo à responsabilidade processual objetiva diz respeito à responsabilidade por atos executivos não definitivos. O ordenamento jurídico processual pátrio outorga aos litigantes algumas possibilidades de executar um provimento jurisdicional não definitivo. Em geral, tal possibilidade é conferida com amparo na efetividade da jurisdição. São hipóteses em que o legislado entendeu que permitir o pronto gozo (ou ao menos o início dos atos executivos) conferirá maior proteção ao potencial beneficiário. Exemplos são a possibilidade de se proceder ao cumprimento provisório de sentença, a efetivação das tutelas de urgência e a constituição de hipoteca judiciária.

Contudo, esse benefício não vem desacompanhado de consequências. Tendo em vista aptidão a causar danos à parte que suportará tais atos, é imputada a responsabilidade objetiva em caso de danos decorrentes dessas medidas. Trata-se de um contrabalanceamento dos riscos inerentes a essa atividade processual. Assim, se de um lado o beneficiário dessas medidas terá um direito seu resguardado, caso essas medidas causem danos, deverá arcar com o ressarcimento independentemente de culpa. Tal temática será aprofundada no último capítulo do presente trabalho.

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MARQUES, Bruno Pereira. . A incompatibilidade sistêmica da compensação de honorários em caso de sucumbência recíproca. In: MAZZEI, R. R.; LIMA, M. P.. (Org.). Honorários de advogado: aspectos materiais e processuais. 1ed.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, v. 1, p. 104.

4 ASPECTOS ESTRUTURANTES DA TUTELA DE URGÊNCIA

Para se perpetrar uma análise acurada acerca da responsabilidade pela efetivação de tutelas de

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