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1 UMA VISÃO CONSTITUCIONAL ACERCA DOS INSTITUTOS DA

5.3 A RESPONSABILIDADE OBJETIVA PREVISTA NO ARTIGO 302, I, DO NOVO CPC

5.3.2. UM DIÁLOGO ENTRE A RESPONSABILIDADE PROCESSUAL OBJETIVA E A

Não obstante a natureza processual da responsabilidade objetiva pelos danos decorrentes da efetivação de tutelas de urgência, bem como sua fundamentação na teoria do risco processual, uma comunicação com a responsabilidade civil objetiva prevista no Código Civil (e, em

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DINAMARCO, Cândido Rangel. O regime jurídico das medidas urgentes. In Nova era do processo civil. 2.ed. Sâo Paulo: Malheiros, 2007. p. 97.

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Essa relevância jurídica é entendida sob dois pontos: de um lado, como o preenchimento do requisito técnico para sua concessão; de outro lado, a qualidade que a norma processual lhe confere de afastar a responsabilidade pelo dano causado em virtude de sua licitude conjugada com a falta de amparo jurídico da pretensão da parte adversa.

especial com a cláusula geral de responsabilidade civil objetiva prevista no parágrafo único do artigo 927) permite uma melhor consolidação da natureza da responsabilidade. Cumpre destacar que não se trata de negar a autonomia da responsabilidade processual, mas sim trazer uma abordagem que permita interpretar ambas as previsões como integrantes de um mesmo sistema, o sistema normativo brasileiro. Importante, sob essa perspectiva, que se procure manter uma lógica entre os dois sistemas de responsabilidade, embora se busque fundamentações distintas. Destaque-se ainda que a responsabilidade processual objetiva e a responsabilidade civil objetiva têm como ponto de contato o fato de que uma situação geradora de risco fora erigida a fundamento para a busca da plena reparação dos danos que por ventura tenham sido ocasionados.

Partindo desse ponto em comum, é possível buscar também no Código Civil a justificação para uma responsabilidade objetiva pelos danos causados pela efetivação de tutelas de urgência. A partir da codificação de 2002, o ordenamento jurídico pátrio passou a ser dotado de uma cláusula geral de responsabilidade civil objetiva, prevista no parágrafo único do artigo 927, dispondo que “haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. Enquanto na primeira parte reconhece o modelo tradicional de imputação de responsabilidade objetiva (por meio de disposições casuísticas), a segunda parte imputa a responsabilidade pelo risco que a atividade que o autor desenvolva normalmente implique para direitos de outrem. As questões que se põem, portanto, são: o que seria atividade, o que seria normalmente desenvolvida e como aferir se essa atividade implica risco. Já nos propusemos a respondê-las no tópico correspondente, de modo que passaremos a delinear tais respostas sob a perspectiva do processo.

Atividade, entendida como atos coordenados para se atingir um fim363, mostra-se aplicável ao processo. O termo atividade voltado para a efetivação de tutelas de urgência, desta forma, se mostra plenamente compatível. Nesse caso não é a mera efetivação que deve ser entendida como a geradora do risco, mas sim toda a sequência coordenada de atos. Faz-se necessária a postulação, a respectiva demonstração do preenchimento dos requisitos autorizadores da concessão de tutela de urgência, a prolação da decisão concedendo a tutela de urgência para aí então se proceder à efetivação. Uma série de atos coordenados e com o objetivo de afastar o

363 SALLES, Raquel Bellini de Oliveira. A cláusula geral da responsabilidade civil objetiva. Rio de Janeiro:

perigo de dano ou o risco de inutilidade do processo. Atividade nos termos legais, portanto. O desenvolvimento normal da atividade, por sua vez, aparece como oposição ao desenvolvimento anormal da atividade. Extrai-se se tratar de uma atividade lícita364. Indubitável ser a atuação no processo pleiteando a concessão de tutelas de urgência um ato lícito. A atuação processual de forma ilícita também tem aptidão a ensejar a responsabilidade, mas essa é independente da responsabilidade objetiva.

Por fim, o risco inerente à concessão de tutela de urgência se mostra existente na medida em que, além de promover uma distribuição dos riscos decorrentes da espera por uma decisão final, a tutela de urgência é proferida com base tão somente em um juízo com base em uma cognição sumária, e muitas vezes sem mesmo ouvir o réu.

Desta forma, é possível concluir que a efetivação de tutelas de urgência se enquadra na hipótese prevista na cláusula geral de responsabilidade civil prevista na legislação civil pátria. Ainda acerca da responsabilidade processual objetiva prevista no inciso I do artigo 302 do NCPC, e novamente fazendo um diálogo com o direito civil, é imprescindível o resgate da ideia de erosão de filtros da responsabilidade civil. A existência desses filtros seria impedir uma avalanche de demandas, bem como impedir o surgimento de inúmeras demandas infundadas365. Contudo, no caso das tutelas de urgência, não há razão de ser desses filtros. A origem do dano, sendo de natureza processual, já se mostra mais restrita, ou seja, não se corre o risco de “aventuras processuais”, uma vez que antes deverá haver outra demanda. Ademais, não ha que se falar na persistência daquelas razões para os filtros da responsabilidade, uma vez que, por se tratar de situações mais restritas, a própria origem dos danos serve como elemento a impedir a proliferação de demandas reparatórias, além do fato de que, em verdade, não surgiriam novas demandas, mas seria apenas um “prolongamento”366 da demanda originaria.

O direito civil moderno, contudo, já vem dando mostras de derrubar (ou ao menos reduzir) essas barreiras, a denominada erosão dos filtros da responsabilidade civil, de modo a

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TARTUCE, Flávio. A cláusula geral de responsabilidade objetiva nos dez anos do Código Civil de 2002. RTDC: revista trimestral de direito civil, Rio de Janeiro, v.13, n.50 , p. 93-134, abr. 2012, p. 105.

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SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p.11.

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Afirma-se se tratar de um prolongamento da demanda já existente na medida em que, como será analisado, a liquidação da indenização (rectius, a apuração da existência e da extensão do dano), se dará, sempre que possível, nos autos em que a medida for concedida.

privilegiar a reparação do dano e abrandando exigências de culpa e até de nexo de causalidade367. Desse ponto de vista, afastar a natureza objetiva da responsabilidade processual pelos danos decorrentes da efetivação de tutelas de urgência corresponderia a caminhar em sentido contrário do que o direito civil pátrio, afastando a modalidade mais moderna de responsabilidade368. Mostrar-se-ia um contrassenso, mormente se termos em conta que no direito pátrio a responsabilidade processual objetiva como regra é mais antiga que a cláusula geral de responsabilidade objetiva no direito civil.

5.3.3 EQUIPARAÇÃO DA RESPONSABILIDADE PELA EFETIVAÇÃO DE TUTELAS

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