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OCUPAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E DEMANDAS EDUCACIONAIS NO ESTADO DO ACRE

1.2 O Acre a partir da conquista da autonomia política

O Acre permaneceu como território até 1962, depois de enfrentar uma acirrada luta pela criação do Estado, liderado pelo nominado Movimento dos Autonomistas, que queriam

ter o direito de eleger seus governantes, no lugar de interventores. Para Nunes (1991), a década de 1960 se constitui em um marco fundamental dos reflexos dessas mudanças no Acre.

É necessário lembrar que os estudos realizados sobre a temática apontam a década de 60 como o marco de uma nova fase de ocupação do Acre, que deve ser entendida, em primeiro lugar, no bojo de um processo mais amplo relacionado à economia nacional. (p.52).

Contemplando os anseios acrianos, fortes movimentos reivindicatórios das elites política e econômica territorial que visavam perpetuar seus poderes na hegemonia política do futuro estado, e, à pressão de forças populares, em 1962 o Acre foi elevado à categoria de Estado, por força da Lei Federal nº. 4.070, assinada pelo então Presidente João Goulart.

Nas décadas de 1960 e 1970, o Governo Federal elaborou diversos planos para o desenvolvimento econômico da Amazônia, investiu na construção de rodovias (Belém/Brasília, Transamazônica e a Perimetral Norte), criou a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia - SUDAM e elaborou um conjunto de medidas e ações para fomentar o desenvolvimento socioeconômico da região, a partir da agricultura e pecuária. À época, o Estado já possuía o seguinte desenho territorial:

FIGURA 4 – Mapa administrativo do Estado do Acre – 1964

Fonte: IMAC, Atlas Geográfico Ambiental do Acre, 1991.

Vale ressaltar que, neste período, o Governo Federal abriu caminho para o investimento do capital internacional, que passou a ocupar a Amazônia com interesses específicos pelas riquezas extrativas, principalmente a madeira nobre e os recursos minerais.

Para Farias (2003), a partir da década de 1960, particularmente a partir de 1966 – a ideia de ocupar economicamente a Amazônia passou a ser enfatizada em todos os discursos e manifestações governamentais. (p.33).

Tratava-se de preencher o vazio demográfico, ou o vazio econômico. Era preciso colonizar, desenvolver, articular, vertebrar. Como se fora uma ilha solta no espaço geopolítico, ou econômico, os governantes se preocupavam em despertar a Amazônia e em desenvolver ali laços com o centro-sul (...) tudo deveria ser feito para que a região fosse, ao mesmo tempo, produtora e consumidora de mercadorias; preferencialmente, produtora de mercadorias que se realizassem no mercado externo, para produzir divisas necessárias à continuidade dos negócios dos governantes e das empresas predominantes na economia política da ditadura. (IANNI, 1981, p. 141).

No Estado do Acre, na esteira da política nacional, o governador Francisco Wanderley Dantas, no período de 1971 a 1975, promoveu uma ampla propaganda divulgando no rádio e em outros meios de comunicação de massa as vantagens de se investir no Acre. Além dos argumentos das terras férteis e a preço baixo, divulgavam-se ainda as possibilidades de empréstimos a médio e longo prazos, com facilidades fiscais e juros subsidiados através da SUDAM e do BASA - Banco da Superintendência da Amazônia.

Na divulgação propagandista, especialmente direcionada ao sul e ao sudeste, segundo Santana (1988, p.150), o governador afirmava ser o Acre a ―nova Canaã, isto é, um Nordeste sem seca e um Sul sem geadas‖. De acordo com Costa Sobrinho (2001):

A marcha em direção ao Acre foi arrasadora. A compra dos seringais, cuja extensão nunca havia sido definida, permitiu o uso e abuso pelos novos proprietários do conhecido método de esticamento da terra incorporando então aos seus domínios grandes áreas devolutas, com ou sem possuidor identificado. Para a ocupação dessas áreas foi lançada uma operação de destruição sem controle e indiscriminada da floresta, com o objetivo de instalar fazendas e implantar a pecuária extensiva de corte. No lugar de uma floresta exuberante, estava fadada a surgir uma paisagem de extensos campos com pastagens artificiais, cuja monotonia seria quebrada pelas patas do boi. O lema era criar boi, abater e exportar através do Oceano Pacífico. (p.13).

Em 1975, foi criado o Plano de Desenvolvimento da Amazônia, que privilegiava projetos agrominerais e agropecuários e incentivou também grandes proprietários nacionais e estrangeiros a ocupar a terra, sem levar em consideração que já ocupavam estas terras os índios e os posseiros. Estava aqui o embrião dos complexos problemas fundiários no Estado, gerados entre os que compravam grandes extensões de terra e os donos nativos da região.

No ano de 1976, de acordo com a FIG.5, o Estado passa por uma nova divisão político-administrativa, sendo criados mais cinco municípios: Plácido de Castro, Senador Guiomard, Assis Brasil, Manoel Urbano e Mâncio Lima.

FIGURA 5 - O desenho espacial do Acre a partir de 1976

Fonte: Acre (1991). Extraído de SILVA, 2010.

Ao longo da década de 1970, a população do Acre cresceu 40%, e a violência se instalou no interior da floresta em níveis nunca vistos antes. Os conflitos eram resultantes do choque de interesses: de um lado, os seringueiros e posseiros a defender a floresta e, de outro, os fazendeiros do sul e sudeste a contratar peões para derrubá-la e transformá-la em pastagens. Ressalta-se que, a despeito de essa política ter sido implantada na década de 1970, os conflitos vão se estender por quase duas décadas.

Contudo, os anos de 1980 foram marcados por ações permanentes de resistência dos trabalhadores acrianos, via sindicatos e outros movimentos sociais, defendendo os direitos humanos e os interesses dos povos da floresta.

Uma das principais formas de resistência foram os denominados empates, neste período muito frequentes:

Os empates são feitos através de mutirões de seringueiros. À medida que os seringueiros tomam conhecimento de que tem companheiros ameaçados pelo desmatamento, que uma área está sendo ameaçada pelo desmatamento dos fazendeiros, se reúnem várias comunidades, principalmente a comunidade afetada,

organizam-se no meio da mata mesmo, e criam-se as lideranças, grupos de resistência que vão se colocar diante das foices e das moto-serras de maneira pacífica mais organizada. (GRZBOWSKI, 1989, p.18)

Souza (2002, p.41) descreve que, no acontecer dos empates, as mulheres se colocavam à frente de seus companheiros, na tentativa de impedir violência policial, numa postura de quem também é responsável pela defesa de seu modo de vida.

Para além do exposto, não se pode simplificar a questão, pois, ao aumentar expressivamente o contingente populacional, aumentou-se também uma série de problemas, sobretudo a necessidade de criar infraestrutura de transporte, saúde e educação na zona rural, demandas que até o presente ainda não foram cumpridas.

Na década de 1980, uma nova reorganização político-administrativa já era discutida, mas, somente em 1991, veio a se concretizar conforme representado na FIG. 6. Segundo os condutores deste processo, a criação de novos municípios era justificada pela necessidade de integrar o Acre social, cultural e economicamente, possibilitando uma melhor distribuição de renda e riquezas no espaço acriano e proteção de seus limites e fronteiras.

FIGURA 6 - Mapa Político-administrativo atual do Estado do Acre

Fonte: Base cartográfica IMAC/SEMA/ZEE, 2000. Elaborado por Cláudio Roberto S. Cavalcante, 2005.

Havia a possibilidade de criação de treze municípios, no entanto, depois de submetidas a um plebiscito popular, realizado no dia 28 de junho de 1992, dez novos municípios obtiveram aprovação. Os referidos municípios foram implantados em 01 de janeiro de 1993, com posse de seus respectivos prefeitos e vereadores. O Estado passou a administrar

politicamente 22 municípios, os quais foram divididos e agrupados para um melhor gerenciamento econômico em cinco regionais: 1- Regional do Juruá, da qual fazem parte os municípios de Cruzeiro do Sul, Porto Walter, Marechal Thaumaturgo, Rodrigues Alves e Mâncio Lima; 2- Regional do Tarauacá-, pelos municípios de Tarauacá, Jordão e Feijó; 3- Regional do Purus, que abrange Santa Rosa, Manoel Urbano e Sena Madureira; 4- Regional do Baixo Acre, com os municípios de Porto Acre, Bujari, Senador Guiomard, Acrelândia, Plácido de Castro e Capixaba e 5- Regional do Alto Acre, composta por Xapuri, Brasileia, Epitaciolândia e Assis Brasil.

A década de 1990 representa uma fase rica na formulação e implementação de Políticas Públicas destinadas ao desenvolvimento de atividades produtivas, com a criação e institucionalização das reservas extrativistas, melhoramento estrutural dos projetos de assentamentos agroextrativistas, ampliação do conceito de cidadania, sendo incorporado e fortalecido neste contexto o conceito de Florestania, termo relativamente novo criado para descrever os diversos modos de se viver na Amazônia de forma emancipadora, numa relação sustentável entre homem e meio ambiente.

Assiste-se, a partir de então, no cenário acriano o denominado empoderamento não só das populações tradicionais no Acre, os ribeirinhos e povos da floresta, mas da sociedade como um todo, especialmente dos grupos minoritários e marginalizados socialmente, os mais pobres.

Embora a palavra empowerment exista na Língua Inglesa significando ―dar poder‖ a alguém para realizar uma tarefa, sem precisar da permissão de outras pessoas, esse não é o sentido aqui utilizado. O conceito e sentido adotado é o de Paulo Freire (1992), significando a capacidade de um sujeito de realizar, por si mesmo, mudanças de comportamento e ações que o levam a evoluir, ou seja, fortalecer-se por meio de conquistas, avanços e superação – empoderar-se, conquistar poder para.

O empoderamento das comunidades mais pobres e marginalizadas e, consequentemente, a melhoria das condições de vida dessas pessoas se constituíram em uma luta essencialmente política do ―Governo da Floresta‖, mantida até os dias atuais e nunca vista anteriormente no Estado do Acre.

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