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DA FORMAÇÃO POR COMPETÊNCIA À PRÁTICA DOCENTE REFLEXIVA

3.6 Os paradigmas de formação na perspectiva de Zeichner

Fundamentando-se nos pressupostos de Jonh Dewey, para discutir a formação do professor reflexivo crítico, Kenneth Zeichner, professor e pesquisador da Universidade de Wisconsin, Madison (EUA), considera que nenhuma formação pode ser neutra e reitera a sua posição ao afirmar ―[...] eu tenho trabalhado para ajudar professores a examinar os aspectos morais e éticos de sua prática e a tomar decisões no ensino com uma clareza de suas consequências sociais‖. Zeichner (1995b, p.11 apud Geraldi et al., 1998, p. 243).

Para o referido teórico, todas as decisões tomadas por um professor no âmbito da profissão, no que diz respeito à seleção dos conteúdos, à definição de estratégias metodológicas, à organização do tempo e espaços escolares e na avaliação, são definições ético-políticas. (ZEICHNER, 1993; LISTON; ZECHNER, 1993).

O seu pensamento retrata um esforço de contextualização social e de problematização política e ideológica da prática, pois, para ele,

[...] a maior parte do discurso sobre o ensino reflexivo dá pouca ênfase à reflexão como prática social, no qual grupos de educadores apoiam e sustentam o crescimento de cada um dos seus membros. A definição de desenvolvimento do professor como uma atividade a ser exercida unicamente pelos professores individuais limita muito seu potencial de crescimento. (ZEICHNER, 2003, p.45).

O engajamento do profissional ao modelo de formação (crítico-reflexivo) envolve a compreensão de que todas as ações educativas têm consequências pessoais, acadêmicas e políticas. Isso quer dizer que o ato de ensinar nunca pode ser neutro. Zeichner (2003) rejeita o modelo de transmissão de conhecimento dominante nos programas de formação de professores e nas salas de aula, por colocar o professor em uma posição passiva, como mero executor de tarefas pré-determinadas em pacotes formulados por especialistas.

A formação profissional consciente e crítica permite, segundo o autor, um ensino onde a prática é tomada como objeto de investigação, a fim de que seja desenvolvida a competência profissional, por meio das estratégias de ensino e das tomadas de decisões pelo professor. O ensino como prática reflexiva requer um ambiente de investigação (reflexão-na-ação) e experimentação (reflexão-sobre-a-ação). Para o teórico, a formação profissional do professor reflexivo, apesar de este ser contemplado teoricamente na maioria dos projetos pedagógicos dos cursos de formação, não tem passado de um slogan para tais programas.

O segundo grupo de paradigmas é o proposto por Zeichner, em seus primeiros estudos, com base na classificação de Van Manen (1977), que estudou o conceito de prática no campo do currículo. Primeiramente, é necessário destacar o que o referido teórico compreende por paradigma. Segundo Zeichner (1983, apud Santos, 2007), um paradigma pode ser considerado como uma ―[...] matriz de crenças e concepções sobre a natureza e o propósito da educação escolar e da prática docente e, consequentemente, sobre as maneiras como deve ser educado o professor, modelando formas específicas de práticas na formação desse profissional‖ (p.240).

Partindo desta concepção, ele classifica a prática na formação a partir de quatro paradigmas. No entanto, é necessário destacar que, na perspectiva do teórico, eles não ocorrem de forma isolada ou pura, mas se apresentam no contexto da implementação, muitas vezes, de maneira híbrida. O primeiro paradigma é denominado por ele de ―orientação behaviorista‖. Nele, a formação tende a reduzir-se a um conjunto de técnicas que o professor deve adquirir e aplicar no processo de ensino-aprendizagem dos alunos. O sucesso do professor é medido pelo domínio destas técnicas. Está subjacente a este paradigma a ideia da educação como uma ciência aplicada. O professor é visto como um simples executor de leis e princípios do ensino eficaz, que foram concebidos e experimentados por especialistas. Numa

perspectiva ideológica, esta formação, ao centrar-se nas técnicas de ensino e naturalizar a sua natureza, acaba por sancionar o contexto educacional e social vigente. Segundo Santos (2007), para o teórico, neste paradigma, o foco central da formação docente é ―[...] o desenvolvimento de habilidades consideradas básicas para o desempenho dessa função‖ (p. 240).

O segundo paradigma é denominado de ―educação personalística de professor‖. Esta concepção está fundada numa epistemologia fenomenológica, na psicologia perceptiva e desenvolvimentista, mas também em princípios humanistas. Os programas de formação são feitos à medida das necessidades e preocupações dos professores, centrando-se na formação do "eu" dos sujeitos. As respostas para cada caso são naturalmente recolhidas junto dos profissionais mais competentes e maduros, julgadas naturalmente mais eficazes. Neste paradigma, ao contrário do anterior, os conhecimentos e as competências dos futuros professores não estão definidas a priori. A preocupação passa a ser com a reorganização de suas percepções e convicções, tendo em vista a sua conformidade a um dado modelo de maturidade psicológica, tomado como referência. Esta formação acaba sancionando igualmente o contexto social e educativo vigente, ao ignorá-lo no processo formativo, não apresentando mudanças no sistema social. (idem).

O terceiro paradigma é o de ―educação artesanal do professor‖, nele o ensino é visto como uma arte, e os professores como artífices. A formação é encarada como um processo de aprendizagem construído por tentativas e erro, que pode ser facilitada com a ajuda e a sabedoria dos seus praticantes mais experientes, que explicitam os conhecimentos que compõem uma boa prática. Pode ser considerado aquilo que se convencionou denominar de clássico modelo de mestre-aprendiz. Nessa perspectiva, os futuros professores são vistos como meros receptores passivos, não possuindo um papel importante na determinação dos conteúdos e orientação dos programas de formação.

O quarto paradigma é o da ―educação do professor orientada pelo questionamento‖. Este paradigma baseia-se no pressuposto de que não há receitas antecipadas válidas para qualquer situação. Cada professor e contexto educativo são únicos. A formação, ao contrário de fornecer receitas, deve prepará-los para desenvolverem capacidades de analisar os efeitos do que fazem junto dos alunos, escolas e sociedade. O pressuposto desta teoria é que quanto maior for a consciência de um professor sobre as origens e consequências das suas ações e das realidades que as constrangem, maior é a probabilidade de ele poder controlar e modificar tanto suas ações quanto os constrangimentos. A tarefa fundamental da formação é, neste caso, a de desenvolver as capacidades dos futuros professores para a ação reflexiva, a capacidade de

olhar criticamente a sua prática e o contexto social e educativo vigente. Santos (2007) assegura que, na perspectiva de Zeichner, este projeto de formação caminha na direção da ―[...] construção de uma sociedade mais justa e menos desigual‖. Neste campo, estariam as propostas de formação que emergiram, sobretudo a partir de 1980 (p.241).

3.7 As diferentes tradições no campo da formação de professores na perspectiva de

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