• Nenhum resultado encontrado

O Japão Moderno

2.1. O Movimento Populacional dos Japoneses na Ásia Oriental

Nos anos seguintes à Guerra Russo-Japonesa (1904-1905), o número de residentes japoneses fora do país começou a crescer nas áreas em que se estabeleceram colônias nipônicas através da expansão imperialista como na Coréia, Karafuto (Sacalina do Sul), Taiwan e Sul da Manchúria. Durante a década de 1930, o maior aumento foi na Manchúria, com o número total de imigrantes japoneses residentes aí passando o número da Coréia em 1935. Além disso, pode-se notar que o número de imigrantes japoneses residentes na China continental aumentou progressivamente a partir de um nível razoavelmente baixo desde os meados dos anos 1930, especialmente depois de estourar a hostilidade entre a China e o Japão em 1937.

A política emigratória japonesa para a Manchúria estava voltada para atender às necessidades militares, de reforço da defesa nacional. Mais especificamente, era preciso: [1] defender a Linha Ferroviária do Sul da Manchúria – conhecida como 「 満 鉄 」

[ Mantetsu ] – e as áreas de ataques-surpresa pelas forças antijaponesas;

[2] defender o Japão contra a União Soviética, através do estabelecimento de imigrantes no Norte da Manchúria, especialmente próximo à fronteira;

[3] assegurar que a ‘raça Yamato’ formasse a raça principal entre as ‘cinco raças em coexistência harmoniosa’ entre as três regiões da China, Coréia e Japão e

Embora os números envolvidos nunca tenham sido grandes em termos comparativos, a emigração japonesa crescia com a arrancada do país para um estágio mundial enquanto única potência imperialista não-branca. As rivalidades imperiais se sobrepuseram às questões raciais e a identificação dos imigrantes com o império foi, no mínimo, parcialmente responsável pela anexação dos Estados Unidos do Havaí em 1897 e as subseqüentes limitações da imigração japonesa nas Américas e no Pacífico. Essas restrições incluíram as políticas de branqueamento da Austrália e Nova Zelândia de 1901 e 1903, o Gentlemen’s Agreements com os Estados Unidos e Canadá de 1907 e 1908, iniciativas para frear a imigração ao Peru e ao Brasil e o que seria sempre lembrado como insulto maior – a exclusão dos japoneses na lei da imigração americana de 1924.

Uma vez que os japoneses consideraram o tratamento de seus nacionais como um reflexo do prestígio internacional, os diplomatas trabalharam muito para que os japoneses fossem tratados como “brancos honorários”. Da perspectiva deles, possuir um império permitia-lhes ser poupados da discriminação racial experimentada pelos povos colonizados da Ásia e da África. O fracasso dos esforços diplomáticos na questão migratória alimentou um ressentimento e rivalidade em relação às potências ocidentais. Esse assunto irritou muito as relações externas japonesas durante o período pré-guerra. Interpretado como um sinal de exclusão do Japão do clube imperialista, a ‘migração’ é associada novamente ao ‘império’.

Segundo Louise YOUNG (1998), essa onda de emigração reforçou o padrão

cultural da colonização de Hokkaidō inscrito no movimento emigratório. O paternalismo do movimento, tão aparente na sua fase inicial, continuou a configurar as instituições e ideologia da emigração. Isso foi um movimento de promotores, não de migrantes; isso foi uma emigração preconizada de cima pela elite e não por baixo pelos agricultores famintos por terra. Além disso, assim como a colonização de Hokkaidō, que foi vista como uma forma de enriquecer a nação e expandir o território japonês, a emigração para as Américas e o Pacífico foi associada às idéias de potência mundial e ao orgulho nacional. A mensagem do movimento emigratório focou o problema populacional do Japão e a utilidade das comunidades japonesas no exterior para acumular riqueza e poder nacional. Em outras palavras, o movimento lidou com a ideologia de nacionalismo em voga e não de oportunidade individual.

Tanto o sucesso da colonização de Hokkaidō quanto os sonhos não realizados de uma diáspora japonesa nas Américas e no Pacífico configuraram as aspirações para uma outra onda de emigração quando a nova fronteira de povoamento se abriu na expansão colonial do império japonês. Em 1909, o Ministro das Relações Exteriores KOMURA

Jutarō 小村 寿太郎 revelou ante a Dieta Imperial um plano de enviar um milhão de emigrantes japoneses para Manchúria dentro de vinte anos. Muitos anos depois, o historiador TAKEGOSHI Yosaburō 竹越與三郎 reportou exuberantemente que se antes de

1895 o Japão era um colonizador mas não tinha colônias, “agora a Coréia tem lugar para dez milhões de imigrantes e Formosa (Taiwan) dois milhões” (PEATTIE 1984:89). Esse

plano foi impossível de ser implementado em Taiwan, onde as companhias de açúcar japonesas organizaram a mão-de-obra local para um sistema lucrativo de produção e tinham pouco interesse em desviar as terras ao uso dos japoneses colonizadores. Mas na Coréia e no Território Arrendado de Kwantung no Sul da Manchúria, estimativas otimistas de terras e o desejo de aumentar a produção de arroz e outros bens com os quais os agricultores japoneses estavam familiarizados, levaram os políticos a adotar planos de colonização (YOUNG 1998:315-6).

A história do arrendamento na Península de Kwantung e na Zona ferroviária do Sul da Manchúria pelos administradores japoneses tinha um objetivo semelhante ao do projeto coreano: muitos dos arrendamentos eram povoamentos de grupos de pequena escala supervisionados pelo Mantetsu 満 鉄 ou pelo governo geral do Território Arrendado de Kwantung. Apesar desses esforços, menos que mil agricultores se mudaram para a Manchúria antes de 1931 e centenas destes retornaram para casa. Esse fracasso significou que, embora quase um milhão dentre o 1,5 milhão de japoneses no exterior em 1930 vivessem no império, apenas uma pequena parte era de agricultores.

Sobre o curso do movimento emigratório que se desenvolveu no Japão no final do século XIX e início do XX, a noção Meiji de colonização adquiriu um conjunto de significados sobrepostos. Suas associações eram, sobretudo, imperiais. Os japoneses consideravam o crescimento de suas comunidades no exterior como uma forma de “Expansionismo Pacífico” tomando emprestado o termo de IRIYE Akira (1972: 35-47).

Para eles, o tratamento dos japoneses nas sociedades de colonização européia era uma questão de prestígio nacional e refletia a posição do Japão no mundo. No império colonial,

eles viam o crescimento de uma população estável de colonos japoneses como um instrumento para a administração imperial. A emigração se tornou parte de um projeto de construção do império. Deve-se enfatizar, no entanto, que as prioridades burocráticas do Ministério das Relações Exteriores do Japão (doravante MREJ) não necessariamente refletiam a visão de outras partes do governo nem da opinião pública. Basicamente, o MREJ acreditava que era uma prioridade urgente encontrar uma solução satisfatória ao tratamento discriminatório em relação aos imigrantes japoneses nos territórios anglo- saxões, como os Estados Unidos, Canadá e Austrália. Pois isso, simbolizava a posição inferior dos japoneses em relação a grandes potências ocidentais. Assim, a imigração refletia a insegurança do Japão de ser uma nação não-branca dentre as grandes potências (sendo que os outros eram brancos ocidentais: Inglaterra, Alemanha, França, Estados Unidos e Itália) (SHIMIZU 1998:87).

Durante décadas o movimento populacional desenvolveu um aparato institucional elaborado, com um exército de promotores e publicações extensivas. Embora antes de 1931 o movimento emigratório defendesse a colonização agrícola, ele manteve apenas um tênue laço ideológico e institucional ao agrarianismo japonês: sua missão era construir o império, não salvar a agricultura japonesa. Isso mudaria depois da criação do Manchukuo27 満州国 em 1932, quando os movimentos agrários e emigratórios juntaram suas forças na campanha de colonização manchuriana e as duas missões se fundiram (YOUNG 1998:318).

As políticas propostas pelos defensores da colonização objetivavam, primeiramente, dar uma ajuda estatal na colonização auto-suficiente e assim proteger-se da competição no mercado com os agricultores chineses. Em segundo lugar, eles sugeriram que o Estado treinasse os colonos com técnicas e métodos agrícolas “superiores” aos dos chineses, fornecesse garantias de terra para assegurar as economias de escala e financiasse a compra de novos equipamentos agrícolas mecanizados. Para acompanhar essas metas, os promotores da colonização manchuriana vieram com várias propostas para o estabelecimento como: a seleção apropriada de terras e colheitas, posses

27 Manchukuo 満州国 é outro termo para designar o Estado Fantoche criado pelos japoneses. O nome atual é Manchúria Manshū 満州 .

e ajudas financeiras e técnicas, dentre outras. Mais uma vez, os promotores emigratórios imaginaram que o paternalismo poderia superar vários obstáculos (YOUNG 1998:320).

A comunidade japonesa expatriada foi então composta por uma elite colonial temporária: burocratas governamentais, assim como técnicos e administradores envolvidos no comércio, ferrovia e manufatura. Mas apesar dos resultados decepcionantes do início dos experimentos migratórios na Manchúria e na Coréia, esses movimentos populacionais foram importantes modelos sobre os quais os planos de colonização pós-1931 se basearam.