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O Japão Moderno

1.10. Questões Raciais da Expansão Imperial Japonesa na Ásia Oriental

As idéias inspiradas nos movimentos do início dos anos trinta foram apreendidas pela nova burocracia estatal e se reconstruiu em uma missão racial para se expandir. Com a ideologia do New Deal 11 no contexto do novo Estado de bem-estar americano, a missão racial do Japão legitimou a nova escala de envolvimento público em cidades e vilas locais. Embora no caso japonês a justificativa ideológica para o crescimento estatal tenha apelado mais abertamente à raça, as iniciativas americanas em educação e saúde pública foram levadas adiante com preocupações eugênicas e faziam as mesmas conexões entre a reforma social e o melhoramento racial (YOUNG 1998:362).

A missão racial do Japão foi comunicada através de um grande volume de propaganda e literatura (ANDERSON 1983) de recrutamento produzido pelos comitês locais,

burocracias municipais, Conselho de Emigração Manchuriana e Ministério da Agricultura e Floresta. A idéia de colonização disseminada através de diversos canais da máquina migratória introduziu uma nova visão de Império, tomando emprestado do passado.

11 O New Deal é o nome dado a uma série de programas implementados entre 1933 a 1937 nos Estados Unidos, sob o governo Franklin D. Roosevelt, com o objetivo de aliviar, retomar e reformar a economia americana durante a Grande Depressão. A Grande Depressão de 1929 foi uma crise econômica mundial, iniciado em 1929 e que atravessou os anos 1930. Ela atingiu diferentes países em diferentes momentos. Os mais afetados eram os mais industrializados, como os Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, França, Canadá, Austrália e Japão. O New Deal estimulou uma utopia no pensamento social e político americano em uma ampla gama de questões.

Benedict ANDERSON (1983:96) explora os processos que criaram as “Comunidades Imaginadas”: a territorialização da fé religiosa, o declínio da antiga monarquia, a interação entre o capitalismo e o impresso, o desenvolvimento das línguas vernaculares do Estado e as mudanças nas concepções do tempo. Dentro de sua argumentação, na expansão imperialista japonesa foi tudo conscientemente propagandeado através de escolas e impressos. Isso foi extremamente valioso para criar uma impressão geral de que a oligarquia conservadora foi um representante autêntico da nação da qual os japoneses vieram a se imaginar como membros.

Aproximando-se de um discurso colonial existente, a missão para expandir racialmente se tornou um imperativo em uma missão colonial já multifacetada que envolvia Taiwan, Coréia, Ilhas do Pacífico e China.

Para o Japão, como outras potências coloniais, o discurso colonial era em parte um discurso sobre o ‘Eu’ e o ‘Outro’, expresso cada vez mais na linguagem da raça. Desde o primeiro passo para o Império nos anos 1870 até o expansionismo militar dos anos 1930 e 40, a incorporação das doutrinas raciais no discurso japonês sobre o colonialismo se deu em três fases:

(1) A primeira ocorreu no final do século XIX, quando as idéias confucionistas do lugar próprio nas hierarquias sociais e as crenças xintoístas na ancestralidade divina do povo japonês foram revestidas pela ciência racial ocidental. Junto com a Craniometria e o Darwinismo Social, importou-se a noção de tipos raciais e a confusão européia entre definições nacionais, etnolinguísticas e fenotípicas de raça.

(2) A segunda fase da incorporação das doutrinas raciais no discurso japonês sobre o colonialismo, assim como os debates sobre os méritos relativos de assimilação ou associação racial, começou em 1895, com a aquisição de um império colonial que estimulou a formação de um discurso oficial e acadêmico sobre o domínio colonial. Esses debates sobre se era possível e apropriado japonizar os súditos coloniais, puseram em movimento o processo de definir e articular a natureza da diferença entre os japoneses e outros asiáticos no contexto colonial – onde a separação social e a autoridade política absoluta condicionaram as percepções dessa diferença. Frequentemente foi observado que nos contextos coloniais europeus as diferenças entre as políticas, associação e assimilação eram mais retóricas do que reais. O mesmo era válido para o Japão, com uma distinção interessante que sugeria que a retórica era o que mais importava. Enquanto a teoria colonial européia tendia a gravitar ao longo do tempo à posição associacionista, desencorajando a difusão das instituições ocidentais, o discurso colonial japonês ia na direção oposta, para a ‘assimilação’, como Mark PEATTIE (1984:97) apontou.

(3) Nos meados dos anos 1930, o entusiasmo pela adoção da idéia da ‘assimilação racial’ marcou a terceira fase no discurso sobre a ‘raça’ e ‘colonialismo’. A política colonial oficial se tornou racial de modo mais aberto. Isso se justificou pela mistura de

construções mito-histórica, confucionista e pseudo-científica de raça que vieram se desenvolvendo havia meio século. Isso aparece na política kōminka 皇 民 化 [imperialização] adotada em Taiwan e Coréia, onde se tentou forçar a assimilação racial através da difusão da língua japonesa, nomes japoneses e santuários xintoístas, como vimos no caso da Coréia. A racialização da política colonial também era evidente no planejamento administrativo da Esfera de Co-Prosperidade. Finalmente, também se pôde ver uma missão em voga para colonizar a Manchúria que articulou uma política oficial de expansionismo racial, pela primeira vez na história do colonialismo japonês (YOUNG 1998:365).

Antes de prosseguirmos com o contexto asiático oriental, vale apresentar alguns aspectos teóricos que envolvem as noções de ‘raça’, ‘etnicidade’ e ‘nacionalismo’, para mostrar como suas conceituações eram escorregadias (e continuam sendo – será a sua própria natureza?), mas que foram muito importantes para justificar a dominação colonial japonesa na Ásia, em termos ideológicos e políticos. Uma vez que eram as idéias vigentes que circulavam na época – o que nos remete à idéia de ‘Histórias Conectadas’ abordada por SUBRAHMANYAM (1997) – que nortearam as ambições imperialistas na corrida

internacional das grandes potências.