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6.3.1 Instituto Geográfico e Cadastral

Como vimos anteriormente, o Instituto Geográfico e Cadastral era, desde 1980, responsável pela elaboração, até ao final da década, do levantamento cadastral de todo o território português. A organização interna do Instituto não foi, no entanto, alterada de modo a atender a esta difícil tarefa, tendo-se insistido na realização do cadastro rural.

Em 1987, a tutela do IGC passa do Ministério das Finanças para o Ministério do Planeamento e Administração do Território, um sinal que Henriques (2002) interpreta como a constatação de que o IGC não será capaz de efectuar em tempo útil as tarefas que lhe tinham sido incumbidas e, portanto, deixava de ter interesse para o ministério que tutelava a recolha de impostos.

A entrada na União Europeia veio proporcionar um interesse temporário pelo cadastro rural, uma vez que a aplicação das políticas agrícolas comunitárias vieram impor a realização de cadastros de determinadas espécies agrícolas. Neste aspecto, alguns projectos de aproveitamento hídrico vieram também obrigar ao emparcelamento de propriedades e naturalmente, à realização prévia de cadastros exaustivos.

Numa primeira abertura à possibilidade da entrada de empresas privadas na produção cartográfica, o IGC elabora então um projecto de vários milhões de contos, no sentido de produzir uma cobertura cartográfica total do território (com excepção das áreas urbanas) em escala 1:2000, e de cadastro predial de apenas uma parte mais ligada às referidas zonas de emparcelamento. As somas envolvidas e a constatação por parte da administração de que o interesse de cartografia rural a uma tal escala era pequeno levou ao abandono do projecto. O impasse que se seguiu levou à criação, em 1990, de uma comissão de reestruturação do IGC, que acabou por apresentar um conjunto de medidas para viabilizar a produção do cadastro (Henriques, 2002).

Ao nível do IGC, o impasse mantinha-se, ao ser impossível conceder pelo governo o estatuto de instituto público, julgado na altura fundamental para a reestruturação do organismo. Foi publicada então uma nova lei orgânica, passando o IGC a designar-se Instituto Português de Cartografia e Cadastro (IPCC), mas do ponto de vista organizativo retrocedeu-se novamente aos princípios do

antigo IGC, nomeadamente, colocando o antigo Conselho Coordenador de Cartografia (que tinha sido substituído temporariamente por outro organismo idêntico, mas na dependência do Governo) de novo em funcionamento e na dependência directa do próprio IPCC. Esta nova lei orgânica confere ao IPCC o poder de homologar toda a cartografia a usar pelos organismos da administração pública e municipal, ao mesmo tempo que mantém a sua actividade de produtor, colocando-o assim em directo conflito de interesses com as empresas do sector (Henriques, 2002). Este facto viria a inquinar de modo definitivo a relação entre indústria de produção cartográfica e o organismo que tutelava pelo lado da administração essa produção que, ainda por cima, estaria mal preparado tecnicamente e sem qualquer tipo de experiência para poder intervir na homologação, quer de cartografia temática, quer de cartografia a escalas grandes.

6.3.2 Instituto Geográfico do Exército

Os Serviços Cartográficos do Exército, entretanto denominados Instituto Geográfico do Exército (IGeoE), aproveitaram as lacunas da restante administração (Castro, 2004) e continuaram as suas séries cartográficas, tendo com um apoio financeiro muito significativo do CNIG (que para aí canalizou verbas comunitárias) passado a disponibilizar a cartografia 1:25000 em formato digital (Henriques, 2002). A decisão do IGeoE de avançar para uma cadeia de produção digital cartográfica foi uma pedra fundamental e permitiu à Intergraph penetrar no mercado da cartografia digital em Portugal. As grandes empresas da altura começaram também a avançar para soluções deste tipo, como a Socarto, a Novageo, a Estereofoto, e a Geometral (Julião, 2004).

Enquanto a cartografia de escalas médias e pequenas era assim assegurada, com qualidade, pelo IGeoE, a desactualização da antiga cartografia dos Serviços de Urbanização (agora designada DGOT-DU) tomava contornos dramáticos pela ausência de iniciativa municipal na sua actualização e modernização. Tal facto levou ao descalabro total verificado na execução da primeira geração de Planos Directores Municipais, no princípio da década de 90, que primaram, na sua quase totalidade, pela inexistência de um base cartográfica adequada. A base cartográfica usada para a realização destes planos foi muitas vezes a carta 1:25000 do IGeoE. Esta era manifestamente inadequada na maioria dos casos, sendo redesenhada por processos manuais, com sucessivas emendas e rasuras, tornando o resultado publicado muitas vezes impossível de usar ou com erros grosseiros.

6.3.3 Instituto Hidrográfico

No Instituto Hidrográfico (IH) as tecnologias de cartografia digital aparecem em 1993, e cerca de dois anos depois foi possível ter recursos humanos formados e a primeira carta de papel produzida com recurso a tecnologia digital (cartografia assistida por computador). O sistema escolhido na altura foi o da Universal Systems, o CARIS, por ser o mais adequado à cartografia náutica, que tem pressupostos diferentes da cartografia terrestre (Pacheco, 2005).

Desde 1983, a NATO tinha decidido avançar com o standard DIGEST, uma norma para a transferência de dados geográficos com recurso a formatos raster e vectorial (Pinheiro, 2002). Este terá tido alguma influência pelo facto de ter obrigado a avançar para o ambiente digital. Os standards da NATO, visando aplicações militares, têm por detrás o conceito de que se deve incluir na cartografia

toda a informação disponível, enquanto que os standards da Organização Hidrográfica Internacional se baseiam apenas na inclusão da informação relevante para a segurança da navegação marítima. Para além da cartografia náutica produzida com estes dois standards, está também prevista a produção, no âmbito militar, de Aditional Military Layers que contêm informação táctica devendo funcionar sobreposta à informação de navegação (Pacheco, 2005).

Em 1995 é publicada no IH a primeira carta digital, impressa em papel, mas baseada em processos de produção digitais (Sanches et al, no prelo). Surge também um novo produto, a carta de navegação electrónica. Na sequência do acidente do navio petroleiro Exxon Valdez, no Alasca em 1989, a comunidade internacional e as organizações marítimas e hidrográficas desenvolveram esforços para se criar um novo sistema de navegação electrónica baseado também em cartas electrónicas, com a finalidade de diminuir os riscos associados ao erro humano. Isso faz com que nasça o sistema de navegação ECDIS (Electronic Chart Display and Information System) (Pinheiro, 2002) que tem de ser alimentado por cartas de navegação electrónicas. Tal facto obriga a que a produção de cartografia seja orientada não só para o produto em papel, mas também para o formato digital, que tem normas e características especificas (Pacheco, 2005).

Esse processo é iniciado no IH em 1997, na sequência da realização de mestrado por parte de um oficial da Marinha na Universidade de New Brunswich sendo ele o produtor da primeira carta de navegação electrónica nacional. Foi posteriormente implementado esse processo de produção para todas as zonas sob soberania, jurisdição e interesse nacional, estando-se numa fase de completamento dos fólios, que deverão atingir já os 60 a 70% (Pacheco, 2005).

Em 2000 na sequência do mestrado de Bessa Pacheco faz-se o desenvolvimento de um protótipo SIG no IH, de um modo mais concreto, para exploração de informação técnica e ambiental. O processo arranca com a decisão em 1997 de criar um centro de dados técnico científicos, para integrar informação ambiental com a informação cartográfica e para centralizar o armazenamento, e ter capacidade de gerar novos produtos, integrando informação das diferentes áreas cientificas (Pacheco, 2005).

O centro de dados e o ensejo de iniciar o projecto SIGAMAR (Sistema de Informação Geográfico sobre o Ambiente Marinho) fazem com que, desde 1997 até 1999, se tenha feito formação em bases de dados (Oracle), e se tenha desenvolvido aplicações de exploração com objectos CARIS (Chumbinho, 2001). Entre 2001 e 2003, houve então um forte investimento em pacotes de SIG comerciais para implementação e consequente exploração de um SIG de tipo departamental- empresarial. O sistema implementado funciona sobre uma base de dados Oracle, com componente espacial, e tem pacotes de serviços, de acesso à base de dados e de páginas Web. Existem ainda pacotes de funções de exploração espacial avançada para os utilizadores que precisam de funcionalidades específicas (Pacheco, 2005).

Quando aconteceu o acidente do navio mercante Prestige, em 2001 ao largo da Galiza, o IH estava a cerca de 80% da funcionalidade pretendida e o SIG serviu como uma ferramenta muito útil para integrar toda a informação e auxiliar a decisão e a divulgação pública. Se houvesse alguma dúvida nessa altura sobre os benefícios da implementação do referido sistema de informação, ficou desde logo dissipada.