• Nenhum resultado encontrado

Se compararmos o estado da arte em Portugal, em 1986, com o resto dos países europeus notaremos algumas discrepâncias. Estas diferenças não são tanto ao nível das novidades tecnológicas, uma vez que a tecnologia nos outros países se encontrava também em estado de desenvolvimento, mas sim na forma mais estruturada como era encarada a investigação e a aplicação destas inovações no quotidiano desses países. O Reino Unido e a Suécia desde princípio da década de 50 que vinham a desenvolver investigação nesta área, sempre com objectivos práticos de aplicação destas tecnologias, o que, em Portugal, só veio a ocorrer em 1970. Tivemos pois aqui uma diferença de praticamente duas décadas no interesse pela georeferenciação de fenómenos com recurso a computadores.

Como vimos anteriormente, em 1954 já se faziam mapas meteorológicos em computador (na Suécia), em 1963 tinha sido produzido o Atlas of Great Britain and Northern Ireland, em 1964 a Suécia tinha decidido implementar um cadastro dos seus terrenos, e por aí adiante. Desde 1967 que, no Reino Unido, uma entidade governamental (a Experimental Cartography Unit) se dedicava exclusivamente ao estudo de novas tecnologias nestes campos, ao mesmo tempo que o National Swedish Council lançava um programa de investigação em georeferenciação. Ao longo da década de

70, nestes dois países, entraram em funcionamento vários sistemas, quer de produção cartográfica digital, quer de bases de dados georeferenciados.

A comparação com a situação portuguesa nas década de 60 é pois desnecessária e imprudente. Portugal não tinha ainda despertado sequer para a informação geográfica georeferenciada. Só na década seguinte surgiram os primeiros projectos nesta área, como atrás referimos. Estes sistemas e projectos pioneiros tiveram em comum o facto de serem projectos quase experimentais, isolados, muito desligados da prática quotidiana da administração pública que continuou a usar as técnicas cartográficas manuais como método de trabalho. Os primeiros anos da década, com o início do Banco de Dados de Sines e com o arranque do sistema do CEP/DCP, fariam prever um outro desenrolar dos acontecimentos, sobretudo se atendermos que este último estava associado ao mais alto nível de planeamento e, por isso mesmo, poderia ter tido uma função dinamizadora e divulgadora da tecnologia. Tal não aconteceu, provavelmente em parte pelas alterações que a mudança de regime em Abril de 1974 veio introduzir no sistema de planeamento económico português. Assim, mesmo tendo havido contactos com as experiências inglesas e tendo sido possível manter em funcionamento estes sistemas ao longo do período pós-revolução, a realidade portuguesa dos anos 70 ficou muito aquém das implementações concretas verificadas no Reino Unido e na Suécia, na mesma época (em 1973 o Ordnance Survey inicia a conversão de mapas para formato digital, muito antes de os Estados Unidos o terem conseguido, enquanto na Suécia, a base de dados cadastral entra em pleno funcionamento em 1975).

No resto da Europa, a situação parecia não ser muito diferente da portuguesa, embora exista uma grande lacuna de informação publicada sobre os desenvolvimentos noutros países. Sabemos, no entanto, que na mesma altura em que se introduz Portugal, com muitas resistências, o ensino de SIG na Universidade Nova de Lisboa (FCSH), a Holanda era já o líder europeu em investigação e formação universitária em sistemas de informação geográfica.

Em 1986, quando o Governo decide preparar o caminho para o lançamento de um Sistema Nacional de Informação Geográfica, algo que ainda não existia nos outros países europeus, o atraso português nesta tecnologia é particularmente evidente. Os projectos e sistemas em funcionamento, com todo o interesse e valor individual de cada um, eram muito pouco em comparação com a onda de revolução que percorria já as administrações de alguns países europeus, nesta área da Geografia. Este facto reforça a importância de uma tal decisão, construída com poucas ou nenhumas raízes em experiências prévias, evidenciando uma forte vontade do Governo da altura em vencer etapas e lançar Portugal para o grupo de países europeus mais avançados. Partimos quase do nada, com pouca experiência anterior, com um fraco apoio das estruturas de ensino, directamente para o desenvolvimento de conceitos e aplicações inovadoras a nível global. Talvez este salto temporal no amadurecimento da tecnologia explique, em parte, as razões do ainda persistente atraso português nas questões mais básicas, como a inexistência e indisponibilidade de dados geográficos de qualidade.

4.7 Resumo cronológico

1960 Reforço das funções de investigação do Estado e das Universidades

1969 A empresa IBM mostra-se interessada no projecto de Loures

1969 Iniciado o “Inquérito 70” (que era um “Atlas” do concelho de Loures), primeiro exemplo

conhecido de um sistema de informação geográfica português

1969 Jorge Gaspar e Hagerstrand publicam um artigo sobre da situação evolutiva da Geografia

1971 Iniciado o banco de dados do GAS, de apoio à gestão do complexo de Sines

1971 Primeiros SIG aparecem em várias empresas e organismos da administração

1971 Publicado o Decreto-Lei nº 560/71, que previa a elaboração de planos de nível municipal

1972 Empresa Geral de Fomento inicia entre 1972 e 1974 a utilização de software matricial de SIG

1972 Génese do Atlas do Ambiente, ainda na versão em papel

1973 Aquisição do software SYMAP pelo GAS

1976 O CEP é substituído nas suas funções pelo Departamento Central de Planeamento

1976 Primeiro de três seminários em Portugal sobre detecção remota (outros em 1978 e 1980)

1976 Realizado em Lisboa um primeiro seminário sobre técnicas de detecção remota

1977 Criada na JNICT a Comissão para a Investigação Urbana e Regional (CIUR)

1978 DCP usa o SYMAP, concebido pelo Harvard Lab, assim como o SYGRAPH e SYMVU

1978 CEP conclui estudos sobre “Desequilíbrios Regionais” e “Migrações Pendulares e Unidades Geográficas de Emprego”

1980 Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e o Laboratório Nacional de Engenharia Civil colaboram no desenvolvimento de uma base de dados georeferenciados

1980 IGC fica responsável pela elaboração do levantamento cadastral de todo o território

1980 Publicada nova lei orgânica do IGC que previa a conclusão do cadastro até ao final da década

1980 Realizadas no LNEC as “Jornadas de Reflexão sobre estatísticas para a investigação urbana e regional” que introduzem o conceito de BGRI

1980 FCSH lecciona uma cadeira de informática que evoluiu para disciplina específica sobre SIG

1983 Começa formalmente na FCSH o ensino de SIG

1983 LNEC instala sistema de processamento de imagens, com visualização colorida

1985 Comunidade Europeia lança o projecto Corine – Land Cover

1985 Iniciado o Projecto Sistema Informação Geográfica do Município de Almada

1985 Realizada a conferência OTAC (Ordenamento do Território Assistido por Computador)

1985 UNL desenvolve investigação no domínio das estatísticas de pequenas áreas (Municenso)

5 O Centro Nacional de Informação Geográfica

SNIG e CNIG são duas siglas que se confundem, tal como se confundem as origens, objectivos e atribuições de ambos. O Sistema Nacional de Informação Geográfica (SNIG) foi concebido em 1986 e precedeu em quatro anos a criação do Centro Nacional de Informação Geográfica (CNIG), organismo criado em 1990, que viria a coordenar a actividade de informação geográfica em Portugal até 2002, anos em que foi dissolvido e integrado no novo Instituto Geográfico Português.

Este sistema e este organismo são relativamente indissociáveis. O CNIG surgiu como forma de dar corpo institucional a todas as iniciativas que rodeavam a pretendida implementação do Sistema mas, por sua vez, o SNIG era a alma e justificação de existência do próprio Centro. Embora este desfasamento de alguns anos tivesse existido, as suas evoluções sempre foram paralelas e tiveram a mesma origem.