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Os PDM atingiram os seus limiares em termos de vigência, e é necessário garantir que a nova geração de PDM seja já produzida com base num referencial comum e coerente, para impedir que os mesmos erros de há quase 20 anos atrás se voltem a repetir (Julião, 2004). Na prática, sabemos por constatação dos concursos lançados que, se houve uma melhoria na obtenção de cartografia em formato digital por parte das autarquias nestes últimos dez anos, esta segunda geração de PDM não será ainda, para a maior parte delas, o ponto de arranque para a estruturação da informação geográfica de que dispõem ou necessitam.

Na primeira geração de PDM, o IGP (na altura IPCC) era responsável, por despacho ministerial, pela carta administrava de Portugal. Mas o facto é que ela não existia e só recentemente o actual IGP apontou para a necessidade de haver uma coerência na divisão administrativa que, até há bem pouco tempo, apresentava sobreposições e lacunas frequentes. Esse trabalho acabou por ser feito (com a colaboração de várias entidades), foi publicado e está disponível em formato digital (http://www.igeo.pt/caop.htm). A carta administrativa tem vindo a ser melhorada e existe já na sua terceira versão (Figura 25), sendo as alterações normais no processo que decorre dos trabalhos que o IGP continua a desenvolver (Julião, 2004). O IGP, o IGeoE, o INE, a DGAL foram as entidades que se agruparam para promover a coordenação neste projecto.

Existe hoje em dia mais informação geográfica, mas continua a haver a ideia de que basta sobrepor a informação e os problemas de ordem geográfica ficam resolvidos. Esta noção, muito comum em decisores menos ligados às áreas técnicas das organizações, não é exclusivo dos SIG (nem das autarquias), mas sim de todas as tecnologias da informação. Por outro lado, a capacidade de sobrepor e comparar informação de proveniências diferentes de forma fácil e rigorosa expõe, muitas vezes a fragilidade de uma das camadas sobrepostas (ou de ambas). Essa pode ser uma das

explicações para a resistência à aplicação destas tecnologias nos municípios: a facilidade com que se pode fiscalizar a actuação dos serviços e detectar desvios que podem ser mais ou menos intencionais.

O problema das autarquias, não é um apenas um problema de SIG, mas sim do próprio modo de funcionamento das autarquias. Há uma solução organizativa que passa pela aplicação de ferramentas deste tipo, mas a mudança principal advém da democratização progressiva das ferramentas e do facto de grande parte do conhecimento estar do lado dos utilizadores da informação e não dos departamentos de informática ou dos núcleos de informação geográfica.

Figura 25 - Extracto da CAOP - Distrito de Castelo Branco (Fonte: Instituto Geográfico Português, 2005)

No fundo, a abordagem do problema autárquico tem mais a ver com a implementação de sistemas de informação do que da especificidade das bases de dados geográficas. Os departamentos resistem aos sistemas porque eles supõem um controlo efectivo sobre a sua produtividade e sobre a correcção das decisões tomadas. O exercício de tráfico de influências fica consideravelmente limitado se um sistema de informação correctamente estruturado permitir um controlo fácil sobre a tramitação dos requerimentos, dos licenciamentos, quer por parte dos decisores técnicos e políticos, quer por parte do cidadão. Este último passa geralmente a ter informação em tempo real sobre o estado dos processos administrativos que lhe dizem respeito.

com o licenciamento de operações de urbanismo e de construção. Ora também neste aspecto um sistema de informação, especialmente se tiver uma componente geográfica, permite um maior rigor na tomada de decisões e uma maior facilidade em acompanhar e fiscalizar a actuação dos departamentos técnicos. Esta maior capacidade de fiscalização (ainda que não esteja acessível ao cidadão comum) das deliberações dos serviços origina desde logo atitudes reactivas em muitos municípios, que só são ultrapassados com forte incentivo e pressão dos executivos municipais.

Isto leva-nos ao terceiro e último aspecto a ter em conta na implementação de sistemas de informação em autarquias: o papel dos decisores políticos. Tradicionalmente em Portugal, os autarcas são cidadãos sem formação técnica ou académica de nível superior, que baseiam a sua actuação em processos burocráticos que herdaram dos seus antecessores. Chegaram ao poder por motivos que não interessa aqui analisar, mas que provavelmente não tiveram a ver com a sua capacidade técnica ou com conhecimentos de gestão. Pertencem quase sempre a uma geração que, durante a sua escolaridade, não teve ainda contacto com computadores e menos ainda com os novos sistemas de comunicação. São portanto muitas vezes um campo hostil à introdução de novas tecnologias e, mesmo quando as toleram, não as assumem como um aspecto essencial da sua governação. Ora sabemos que a introdução de novas tecnologias, em especial os SIG, necessitam de alguns cuidados na metodologia de implementação no seio de uma organização. Se não existe um apoio pró-activo ao nível dos decisores políticos, capaz de contrariar as resistências clássicas dos níveis inferiores de decisão, então sabemos estarem votados ao fracasso estes projectos.

Se conjugarmos estes três aspectos que enumerámos nas autarquias, como grandes obstáculos à entrada das tecnologias de informação (em especial da informação geográfica) nas autarquias, percebemos de imediato que se trata de um problema geracional que, como tal, irá levar uma ou duas gerações a resolver. Naturalmente, nem todos os municípios partilham estes problemas e esta visão negativa, como o comprovam inúmeros casos de sucesso ao longo do território. Mas só a próxima geração de técnicos e de autarcas estará em condições de, dispondo também de uma geração de consultores SIG mais informados e mais ponderados, efectuar um trabalho uniforme e definitivo no que toca á assimilação dos sistemas de informação de forma total e em todo o país.