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5. A INTELIGÊNCIA DO RELACIONAMENTO ENTRE A ICT E A INDÚSTRIA

5.3 Outros fatores que afetam o relacionamento ICT-indústria e a inovação

As diretrizes apresentadas constituem um protocolo de interação entre ICT e indústria, fundamental e necessário para se criar um ambiente que proporcione segurança ao parceiro privado e assim, possibilite a efetivação de parcerias de sucesso com a indústria. Entretanto, o sucesso da inovação depende também de uma série de outros fatores, comentados a seguir e que não são objeto desta pesquisa.

O primeiro, diz respeito ao encorajamento à inovação pelo governo, onde vale destacar:

• Encorajar parcerias é aspecto chave de qualquer estratégia nacional que vise fomentar a inovação. Portanto, é de suma importância que o governo formule políticas e leis que direcionem investimentos ao fomento de parcerias entre ICTs e empresas no setor sucroenergético brasileiro. A disponibilização de incentivos fiscais às empresas,

bem como de fundos não reembolsáveis, para as etapas de alto risco do P&D, conduzido em parceria entre ICT e indústria, são essenciais para fomentar as alianças no setor. A divisão de risco com o governo facilitará o aporte da contrapartida do capital privado nas fases de alto risco.

• Conforme explicado anteriormente, a propriedade intelectual é um importante fator encorajador da inovação. A habilidade de instituições ou de países inovarem depende da existência de um sistema de PI e de um ambiente legal adequados, que possibilitem a proteção do conhecimento, sua gestão, transferência, enforcement e proteção à corrupção. Estes fatores fomentam investimentos externos (capital privado) e têm fortes implicações para o desenvolvimento econômico de qualquer país (NOFSINGER, 2011 e WEATHERALL e WEBSTER, 2014, com complementações pela autora). Neste sentido, as seguintes ações do governo são necessárias:

o Implementar um sistema judicial adequado, capaz de julgar as causas de PI, bem como um sistema legal que permita a construção de contratos que possam ser

enforced. Esses fatores são essenciais para encorajar as parcerias. Os parceiros

estarão confiantes sabendo que seus acordos de parceria serão cumpridos por força de lei e, seus direitos de PI, serão garantidos.

o O governo deve criar políticas claras e solicitar que as suas ICTs também a criem, estabelecendo sobre a promoção da gestão da PI (proteção, organização e transferência). Isso dará confiança ao parceiro industrial.

o O governo deve criar programas de treinamento nas áreas fundamentais ao processo de transferência de tecnologia: judicial, política, negócios, jurídica e de empreendedorismo. Em particular, as ICTs requerem profissionais experientes em: i) gestão da PI, transferência de tecnologia, valoração de negócios, partilha da IP e de benefícios, criação e participação em empresas, políticas (de PI, transferência de tecnologia e empreendedorismo), além da intermediação/negociação com os investidores do mercado de capitais (bancos, investidores de capital de risco, etc.), de agências de fomento e da indústria; ii) questões legais (referentes à PI e a contratos de transferência de tecnologia). O financiamento governamental no Brasil se concentra apenas na pesquisa

científica, sem prestar atenção à formação desses profissionais. O investimento do governo nesses programas de treinamento é crucial para facilitar a relação entre as ICT e indústria. Araújo e Teixeira (2014) analisam 71 acordos de parceria e concluem que, aqueles associados a parceiros que proporcionam aos seus colaboradores treinamento apropriado, produzem melhor desempenho em termos da transferência de tecnologia. Afirmam ainda que, altos níveis de escolaridade, por si só, não são suficientes e que é necessária a educação complementar em questões de transferência de tecnologia.

• Conforme mostrado neste Capítulo, além da PI, a confidencialidade também é uma questão delicada no relacionamento com a indústria, a qual nunca admitiria que suas informações vazassem para seus concorrentes. Qualquer empresa estará mais confiante em estabelecer parcerias com ICTs que possam demonstrar capacidade de manter confidenciais, todas as informações trocadas e/ou obtidas nos projetos conjuntos com a indústria. Assim, é importante a definição de políticas públicas que incentivem as ICTs a desenvolverem procedimentos de confidencialidade e a treinarem suas equipes internas neste assunto.

• Os formuladores de políticas devem encorajar e financiar a criação de redes nacionais de profissionais de transferência de tecnologia para a criação e troca de melhores práticas em gestão de propriedade intelectual e transferência de tecnologia. Trata-se de uma forma produtiva de se gerar conhecimento, treinar profissionais no campo e disseminar informações entre as ICTs no país.

O governo deve incentivar o empreendedorismo e a criação de novas empresas (spin-

outs/start-ups), já que, em algumas situações, estas são a melhor rota da tecnologia

para o mercado.

• A promoção e financiamento de incubadoras de empresas pelo governo é outra estratégia importante, uma vez que apoia a criação de novas empresas.

O segundo fator é sobre os ganhos do governo com inovação.

Todas as partes devem ganhar com o processo de inovação, inclusive o governo, como financiador e encarregado de boa parte dos riscos.

Em IPEA (2004) é relatado que diferentes países, especialmente os mais ricos, investem somas crescentes para desenvolver o potencial inovador de suas empresas porque, os processos inovadores, expressos em novos produtos, processos e patentes, têm relação direta com o desenvolvimento econômico, geração de emprego e renda e aumento da competitividade, fator essencial para o progresso das empresas e das economias nacionais. Pesquisas feitas pelo Ipea mostram que as empresas que lançam produtos inovadores conseguem preços até 30% maiores do que os de concorrentes; pagam salários cerca de 50% maiores a seus funcionários, em relação às empresas não inovadoras e têm 16% mais chances de se tornarem exportadoras. Assim, empresas inovadoras ainda recolhem mais impostos. Além disso, quando a empresa ganha com a inovação decorrente da parceria com a ICT, partilha benefícios (tais como royalties) com esta última, sendo este um ganho para o estado, haja vista que este é seu financiador. Similarmente, bancos do governo, como o BNDES, participam do negócio das empresas investidas por eles por meio do equity que recebem.

Tudo o que foi relatado acima mostra que estes ganhos existem, mas, talvez o governo não tenha a percepção do valor da inovação, incluindo os aspectos econômico e estratégico e assim, não tenha uma estratégia definida para alcançá-la.

Mensurar os ganhos do governo com a inovação não é objetivo deste trabalho, embora existam claramente, mas, é objeto importante para estudos futuros, haja vista que, uma percepção enganosa (por exemplo, de que importar tecnologia resulta em maiores ganhos do que inovar), seria catastrófica para a evolução da inovação no país.

Além disso, há fortes indícios de que o governo brasileiro poderia ganhar ainda mais com a inovação, o que certamente o encorajaria a investir mais e em mais fases de alto risco (por exemplo, pesquisa básica, prova de conceito, bancada, piloto e planta demonstração). Por exemplo, o FUNTEC, instrumento do BNDES mencionado em Capítulos anteriores e que tem foco em fases de alto risco, não prevê nenhum retorno ao banco caso o projeto financiado alcance o sucesso e chegue ao mercado. Desta forma, a busca de maiores ganhos com inovação para o governo é um assunto a ser explorado e que deve ser alvo de estudos futuros.

A estabilidade institucional da ICT (por exemplo, orçamentária e gerencial) é fundamental para proporcionar segurança e tranquilidade ao parceiro industrial e do mercado de capitais. O parceiro deve ter a confiança de que as diretrizes definidas para a parceria serão cumpridas pela instituição, independente dos atores presentes na cadeia gerencial. Além disso, a estabilidade orçamentária da ICT é necessária para garantir ao parceiro que esta esteja sólida e capaz de honrar contratos.

Os ganhos financeiros decorrentes dos projetos com a indústria devem ser reinvestidos na ICT, fator importante para contribuir com sua estabilidade orçamentária, além de representar um forte incentivo à sua comunidade.

Além dos fatores listados anteriormente, também afetam o relacionamento ICT- indústria e a inovação: a estabilidade econômica do país, fator importante para que sejam feitos investimentos em P&D aqui no Brasil; estabilidade da política de C&T; a própria vontade da indústria em fazer aportes financeiros em P&D e em trabalhar conjuntamente com a ICT (o setor sucroenergético, em particular, tem normalmente buscado tecnologias mais maduras e investido pouco em P&D) e, por último, o sucesso do projeto de P&D propriamente dito e o sucesso mercadológico dos produtos resultantes.