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Pagamento por serviços ambientais: conceito

PAGAMENTO POR SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS Introdução

2.4. Análise axiológica do conceito de serviços ecossistêmicos

2.5.2. Pagamento por serviços ambientais: conceito

Em uma das mais aceitas definições, Sven Wunder106 conceitua Pagamento por Serviços Ambientais como uma transação voluntária através da qual um serviço ecológico específico é “adquirido” por um (ou mais) adquirentes de um (ou mais) provedor do serviço ambiental, se, e somente se, o provedor do serviço assegurar sua provisão.

Uma breve análise do conceito de Wunder pode nos indicar cinco requisitos básicos para instituição de uma programa de pagamento por esses serviços. São eles: (i) um serviço ecológico específico; (ii) um adquirente; (iii) um provedor; (iv) a obrigatoriedade de provisão do serviço; e (v) transação voluntária.

Para esse conceito, é imprescindível a definição e delimitação do serviço

ambiental que será objeto de transação financeira. Primeiro, porque sua verificação será

condição para o efetivo pagamento. É o que exige o quarto requisito (condicionalidade). Segundo, porque é uma exigência do mercado, onde se comercializa direito de propriedade de bens e serviços individualizados. Entretanto, essa necessidade de eleição de um serviço ambiental representa um grande desafio para sua operacionalização, vez que, quanto menos tangível, mais difícil torna-se a atribuição de unidades mensuráveis a um determinado serviço. Ademais, a ideia de serviços ecossistêmicos, por si só, é contrária à individualização. Como visto anteriormente, as funções ecossistêmicas são interdependentes e interagem entre si, formando um equilíbrio dinâmico e perfeito.

Nos programas de PSA sempre deve haver dois sujeitos envolvidos. Um, que será provedor dos serviços ambientais e outro, que será o adquirente. O provedor é aquele que detém domínio sobre o serviço, pois deverá garantir de alguma forma que o serviço seja prestado, sob pena de não realização do pagamento. Portanto, pode ser pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado. Basta que seja capaz de garantir a provisão de determinado serviço ambiental. O comprador também pode ser qualquer pessoa física ou jurídica que tenha disposição a pagar por determinado serviço ambiental. Entre esse rol inclui-se Organizações Não-Governamentais – ONGs e até Agências Públicas, que, na realidade, são os que mais demonstram disposição a pegar por esses serviços107. Dependendo de quem financia ou quem paga pode haver dois esquemas de PSE, público ou privado, que serão analisados mais adiante.

                                                                                                                         

106 WUNDER, Sven. Payments for environmental services: some nuts and bolts. Jacarta: Center for

International Forestry Research, 2005. p 3.

107  VATN, A., An institutional analysis of payments for environmental services. Ecological Economics 69

Outra característica dos programas de PSA, segundo Wunder, é a obrigatoriedade

de provisão de um determinado serviço ambiental para merecer efetivamente o pagamento

do preço. Também chamada de condicionalidade, representa uma garantia de que o programa resultará em benefícios ambientais, uma vez que, como o próprio nome sugere, condiciona o pagamento ao efetivo provisionamento do serviço eleito.

Essa característica recebe criticas contundentes de Farley e Costanza108 que alegam ser caro exigir o cumprimento de determinado comportamento, resultando em um aumento substancial dos custos de transação, em especial os custos de verificação e fiscalização. Ademais, para os autores, os pagamentos condicionados podem desestimular as motivações para atitudes sustentáveis. Por isso, merecem bastante atenção dos agentes públicos na elaboração e implementação desses programas.

Se é verdade que esse tipo de instrumento só faz sentido se gerar algum benefício para o meio ambiente, ou seja, se for capaz de gerar um melhoramento, que não seria possível sem a implementação do programa, podemos dizer que a condicionalidade nos remete a outro problema relacionados a efetivação de PSAs, qual seja, a questão da adicionalidade.

Como o próprio nome sugere, a adicionalidade é uma característica desses programas que exige um incremento em determinado fator ou valor eleitos como prioritários ou fundamentais desses programas. Em outras palavras, só pode ser considerado adicional aquilo que, na ausência do programa, não seria alcançado, podendo ser tanto o comportamento de provedores e compradores como a provisão dos serviços em si.

A adicionalidade, portanto, pressupõe uma comparação de uma determinada situação em um determinado espaço de tempo e lugar com outra, que exige-se, melhor ou adicional. Surge assim a necessidade de definição desse espaço, desse tempo e, principalmente, das linhas de base. A definição da linha de base é fundamental para o sucesso dos resultados pretendidos com a implementação dos programas de PSA, pois representa os parâmetros de verificação e fiscalização. Sendo assim, torna-se um elemento bastante delicado no desenho de políticas públicas de implementação desses programas, devendo ser definido por meio de procedimentos participativos e critérios objetivos, sob pena de mascarar atividades degradantes e indesejadas. Esse é mais um ponto onde a                                                                                                                          

108   FARLEY, J., COSTANZA, R. Payments for ecosystem services: from local to global. Ecological

participação do direito se mostra fundamental, mas que será melhor aprofundado mais adiante.

Por fim, o conceito proposto por Wunder exige a transação voluntária. O autor defende que para ser considerado um verdadeiro programa de pagamento por serviços ambientais, as transações entre os sujeitos (provedor e comprador) devem ser voluntárias. Não pode haver obrigatoriedade de participação do programa por nenhum dos lados. Essa voluntariedade, segundo o autor, é a característica que distingue esses programas de qualquer outro instrumento de comando e controle.

Essa exigência do conceito de Wunder é bastante criticada na literatura econômica, sobretudo, pelos economistas ecológicos, pois deixaria de fora a maioria dos programas de PSA implementados e bem avaliados em todo mundo109, por exemplo, atividades que preservassem área de reserva legal ou proteção permanente. Como esse instrumento seria implementado na floresta amazônica, onde a legislação exige que o proprietário de terra reserve 80% (oitenta por cento) de área preservada? O custo de oportunidade desse mecanismo o tornaria praticamente inviável.

Como visto anteriormente, a ideia de implementação de instrumentos econômicos na preservação ambiental surge exatamente a partir da constatação da insuficiência dos mecanismos de comando e controle. Ou seja, as determinações legais não foram eficazes no combate ao ímpeto do poder econômico sobre o meio ambiente. Assim, nos parece contraditório pensar em mecanismos alternativos aos de comando e controle, que não favoreçam aqueles que cumprem a determinação legal.

A exigência de voluntarismo ou, mais especificamente, a impossibilidade de incluir entre os provedores desses serviços aqueles que cumprem o dever legal de preservação representa uma clara consequência da forma como se entende o papel do direito nesses programas. Na realidade, trata-se de uma visão distorcida do direito, pois acreditam que seu papel limita-se a definir limites e estipular punições ou sanções. É pensar o direito com atuação a posteriore, ou seja, depois da ofensa ao bem tutelado. Entretanto, entendemos que o direito, enquanto resultado da dinâmica vida em sociedade, também pode sancionar positivamente quem segue a determinação legal, desde que gere benefícios, ainda que indiretos, para terceiros, como será melhor analisado adiante.

Com esse conceito é fácil de compreendermos a ideia por traz desse instrumento, mas, na prática, algumas dificuldades demonstraram a necessidade de adequação desses                                                                                                                          

109  VATN, A., An institutional analysis of payments for environmental services. Ecological Economics 69

programas, em especial, à evolução teórica do conceito de serviços ambientais para serviços ecossistêmicos analisada anteriormente. Mais do que isso, há que se repensar não apenas a evolução do conceito de pagamento por serviços ambientais, mas também a do próprio direito, para melhor adaptação às novas necessidades da sociedade110.