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O apóstolo Paulo era suficientemente seguro para convidar as pessoas a exami- narem sua vida e caráter como evidência da verdade de sua mensagem (ICo 11.1). Talvez esse seja um padrão de escrutínio mais elevado do que muitos de nós aceita-

riam. Quanto mais conscientes estamos dos nossos pecados, menos competentes nos sentimos em levantar e pregar. Contudo, a privacidade não pode ser prometi- da àquele que afirma falar em nome de Deus. Os ouvintes têm o direito de per- guntar se nós praticaremos o que pregamos.

Em vez de desprezar essa prestação de contas, devemos recebê-la de bom grado e até mesmo apoiá-la. Precisamos estar dispostos a estabelecer relaciona- mentos fortes com pessoas corajosas o suficiente para nos fazerem perguntas duras que nos protejam desses impulsos destrutivos. É aconselhável que limitemos in- tencionalmente a nossa liberdade evitando até mesmo a aparência do mal. Nada compromete a credibilidade de uma mensagem mais do que uma vida que nega as palavras que o pregador fala. O caráter conta.

Podemos ver um exemplo disso no ministério de Billy Graham e sua equipe. Em 1948, Graham e os seus companheiros de equipe, Cliff Barrows, George Beverly Shea e Grady Wilson se encontraram em Modesto, Califórnia, para determinar os parâmetros éticos para o ministério de pregação. O código resultante, alcunhado de "O Manifesto de Modesto", descrevia quatro compromissos fundamentais. Eles de- terminaram deliberadamente que evitariam até mesmo a aparência de abuso finan- ceiro. Eles prestariam contas de todo o dinheiro, e essa prestação de contas seria completamente exposta ao público. Eles determinaram que seriam absolutamente honestos em sua divulgação de estatísticas. Eles escolheram exercitar o cuidado para evitar a possibilidade de qualquer impressão de impropriedade sexual, nunca apare- cendo sozinhos com uma mulher que não fosse sua esposa. Eles concordaram em cooperar com qualquer igreja local que concordasse com sua visão do evangelho, de modo a evitar qualquer sentimento de competição entre as igrejas.

Muitos devem ter pensado que eles haviam tomado precauções além do que era necessário. No entanto, décadas mais tarde, o ministério de Graham permanece como um padrão de retidão ética. A credibilidade da pregação de Graham tem aumentado de modo imensurável por meio desse compromisso com um caráter deliberadamente escolhido e cuidadosamente mantido por todos esses anos.

Cometeremos erros, às vezes até erros espetaculares. Todavia, se fizermos a sujeira, devemos limpá-la e depender intensamente da graça de Deus.

Veracidade

Ouço pregadores compartilhar histórias de sua experiência pessoal e, depois, ouço outros pregadores compartilhar a mesma história como se ela tivesse aconte- cido com eles. Pude apenas supor que um deles estava mentindo. Os ouvintes precisam saber que eles podem confiar nas palavras do pregador. Qualquer coisa que possa fazer nossos ouvintes duvidar da nossa credibilidade é um problema ético. Há três áreas de preocupação.

Exegese

A veracidade começa com a boa exegese. A Palavra de Deus foi concedida em linguagem humana, e a linguagem inevitavelmente requer interpretação. Isso não

é tornar a pregação completamente subjetiva; é dizer, entretanto, que há um tanto de compreensão humana envolvida no uso das Escrituras por parte do pregador. Abusamos dessa compreensão, entretanto, se conscientemente usamos nossa posição para manipular o significado para propósitos pessoais: agradar ou impressionar ouvintes, "melhorar" o sermão ou reunir um grande grupo de adeptos. Somos responsáveis por apresentar a verdade clara como a encontramos no texto.

As pessoas não se devem ver obrigadas a aceitar nossas palavras com ceticismo. Alguns pregadores são conhecidos por embelezar as histórias ou usar números "evangelásticos" quando falam de estatísticas, mas nossos pontos nunca são forta- lecidos quando distorcemos a verdade a nosso favor, mesmo quando o fazemos porque pensamos que isso serve ao evangelho.

Isso não significa que precisamos ser escravos dos detalhes das histórias que estamos contando. No nosso uso da Bíblia, por exemplo, podemos imaginar um olhar intrigado na face do jovem rico ou uma lágrima no olho do filho pródigo. O texto não nos dá os detalhes, mas não estamos violando a intenção do texto quan- do os fornecemos.

Plágio

O plágio é uma preocupação particular para o pregador comprometido com a veracidade. Enquanto muitos sugerem que o púlpito permite liberdade de ex- pressão no uso das idéias de outras pessoas, a apropriação não autorizada de pro- priedade intelectual, sem dar crédito a quem de direito, é roubo. O plágio ocorre sempre que passamos adiante as palavras ou a idéia de alguém como se fossem nossas.

Em minha leitura, eu freqüentemente me empolgo em relação ao modo que o escritor usou para fazer expressar sua idéia. Eu gostaria de ter sido esperto o sufi- ciente para expressar a questão exatamente daquela maneira. A tentação é usar as palavras do autor em um sermão como se elas fossem minhas. Se, entretanto, faço isso, não estou sendo verdadeiro. Um problema maior encontra-se na prática de plagiar sermões inteiros de livros ou da internet e reivindicá-los como se fossem os nossos.

Os pregadores, de fato, devem se apoiar nos outros. É uma boa prática, por exemplo, beneficiar-se de conceitos, comentários e até mesmo construções de ser- mões oferecidos por outros. Em alguns desses casos, as idéias estão essencialmente no domínio público e não precisam mais ser citadas. Em outros casos, em que as idéias são exclusivas de uma fonte particular ou o uso é mais amplo, precisamos identificar de quem é que nos beneficiamos. Isso não é difícil. Isso pode ser feito oralmente ("Eu gosto da maneira que Rick Warren coloca isso"), no telão que usamos no culto ou no boletim impresso.

Outra área de preocupação é o uso do conteúdo de filmes sem a permissão apropriada. Um trecho de um filme usado de forma criteriosa pode acrescentar

muito a um sermão, mas assim como aprendemos a fazer com as músicas, precisa- mos obter uma licença geral permitindo o uso limitado.

Manipulação

Certa vez, tive um ouvinte que levantou, acenou seu punho para mim e gri- tou: "Isso não é verdade". Eu provavelmente tinha feito por merecer. Havia desa- fiado seu ponto de vista, e ele não tinha uma maneira apropriada de responder. Eu estava em pé no púlpito e tinha todo o poder. A ética na pregação exige que falemos e atuemos respeitosamente para com nossos ouvintes. O púlpito é um lugar de poder, ainda que somente pelo fato de o sermão tradicional oferecer pou- ca oportunidade para o diálogo ou a interação. Quaisquer meias-verdades ou in- verdades podem ser devastadoras para pessoas sem condições de defender-se.

Normalmente temos os melhores motivos. Pregamos de forma que as pessoas encontrem fé em Cristo e que os seguidores de Jesus sirvam para trazer o Reino de Deus à terra. Raro é o pregador, entretanto, que não sente as forças sutis da ten- tação de manipular nem que seja apenas um pouco. Os fatos podem ser amplia- dos, as histórias, exageradas, e a retórica pode ser tão inflamada que o ouvinte encontre motivação não apenas no poder da mensagem ou no chamado do Espíri- to de Deus, mas na emoção produzida do momento. Seminários não ensinam isso, mas ainda assim aprendemos isso bem.

Precisamos ser cuidadosos em motivar mais as pessoas, é verdade, mas não po- demos manipulá-las. Manipulamos quando coagimos ouvintes a convicções e ações que eles não aceitariam normalmente. A manipulação ocorre quando secretamente influenciamos uma mudança involuntária no pensamento e na vida do ouvinte.

A motivação é diferente. Pregadores que motivam conduzem pessoas a um redi- recionamento pensado. Isso não significa que o ouvinte entende plenamente toda a profundidade e todas as implicações, mas que o pregador conduz o ouvinte a um ponto de descoberta intelectual ou congruência emocional. O ouvinte é cativado pelo momento, não hipnotizado pela propaganda. Existe uma linha sutil entre a manipulação e a motivação e nós precisamos aprender a ficar no lado certo disso.

Precisamos ser cuidadosos em não usar o púlpito como uma forma de intimidar as pessoas à submissão. Embora possamos nos sentir desrespeitados e difamados, o púlpito não é o lugar de nos vingarmos ou de "colocarmos as coisas em pratos lim- pos". Pregadores, peritos no uso de palavras, podem prejudicar e difamar, e ainda assim soar espirituais e corretos. Pode ser que um pastor esteja em uma batalha com o conselho da igreja sobre uma questão relacionada à estratégia, mas o sermão de domingo não é o melhor lugar para tentar vencer essa batalha. Não é uma luta justa, visto que o conselho não tem oportunidade semelhante para expressar seus pontos de vista.

Durante dois anos, enquanto estudava no Texas, pertenci a uma igreja espe- cial. Eu nunca vi um pastor ser tão profundamente respeitado pelas pessoas a quem foi chamado a servir como o pastor daquela igreja. O homem nem parecia

um pastor. Certamente não era um homem muito espalhafatoso. As pessoas o amavam porque confiavam nele. Enquanto ele lhes apresentava a sabedoria que encontrava na Palavra de Deus, as pessoas não precisavam questionar se ele viveria ou não de maneira coerente. Ele vivia aberta e honestamente perante o seu povo, e eles o seguiam como a poucos pastores que eu conheci.

Aspiro a esse tipo de ministério, pois servimos a um Deus santo a quem amamos e que pedirá contas de nós. A Bíblia diz: "Sejam santos, porque eu sou santo" (lPe 1.16).

Capítulo 20

L E I T U R A O B R I G A T Ó R I A