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178 9 Publicidade comparativa e concorrência parasitária

A concorrência parasitária não é objeto de tratamento legal específico no direito brasileiro, mas é tema de repercussão econômica e de interesse jurídico, afetando a muitos empresários que investem na sua atividade e acabam sendo atingidos por essa conduta, quase desconhecida do Poder Judiciário brasileiro.

É espécie do gênero parasitismo econômico, que pode ser conceituado como o comportamento de um terceiro viver à sombra de empresário diverso, aproveitando-se, direta ou indiretamente, dos esforços deste, que contribuíram para a formação do bom nome, da imagem dos produtos e da estrutura econômica que conferiram credibilidade e grande penetração no mercado.

A repressão ao parasitismo econômico funda-se na proteção exclusiva do empresário no mercado atual — tutelado pela repressão à concorrência desleal — e no mercado potencial, o que nem sempre é bem visto na doutrina. Denis Borges Barbosa a considera uma tese de defesa de um interesse econômico privado óbvio, de natureza feudal e antípoda à economia de mercado, por se prestar a defender um mercado potencial, de futuro.221 Todavia, o que se protege não é o mercado potencial do empresário, mas o seu estágio atual em razão da boa fama que conseguiu para si, seus produtos ou serviços. A tutela repressiva ao parasitismo econômico, por dizer respeito à proteção do empresário no mercado presente, constitui-se numa figura de concorrência desleal.

No parasitismo econômico pode existir ou não a situação de concorrência, sendo a primeira hipótese de concorrência parasitária e a última a de aproveitamento parasitário. A doutrina pátria costuma atribuir sentidos iguais às referidas hipóteses. Considera-se que a concorrência parasitária abrange o aproveitamento parasitário, o que pode acarretar problemas na apreciação de casos concretos. O maior deles reside no fato de que, se idênticas as figuras, não há como se aplicar a teoria da repressão à concorrência desleal em se tratando parasitismo sem relação de concorrência propriamente dita. Vale dizer, numa formulação conceitual unívoca, a figura do aproveitamento parasitário subordinar-se-ia a um regime não

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compatível com sua descrição fática. Lembrando-se que há concorrência entre os envolvidos na medida em que seus produtos ou serviços destinam-se a um mesmo público consumidor, isto é, uma mesma clientela. Nesse contexto é que se dá a concorrência parasitária.

O parasitismo econômico dispensa a existência de confusão entre concorrentes, produtos e serviços. Nesse sentido, Jean-Jacques Burst, o considera um aproveitamento do esforço intelectual ou econômico alheio, independente do risco de confusão. A imitação servil afasta os custos de concepção e apresentação do produto ou através da utilização da marca notória se poupam gastos publicitários. 222

No direito pátrio, podem ser detectadas situações de parasitismo econômico, mas que não são enfrentadas na jurisprudência de modo de claro e preciso, no mais das vezes porque as demandas não contemplam diretamente o tema. Vejamos a seguinte disputa processual, em que a discussão foi deixada de lado. A Sociedade Beneficiente Israelita Albert Eistein, titular da expressão marcária ―Albert Eistein‖, pretendeu a proibição de seu uso por instituição de ensino fundamental e médio da cidade de Araraquara. Em que pese ter sido reconhecido o direito ao nome empresarial e registro marcário da autora (na classe de serviços de educação), o tribunal confirmou a sentença de improcedência do pedido, sob o argumento central de que as empresas não estão em regime de concorrência, pois atingem públicos diferentes e, inclusive, de localidades distantes. Tais fatos conduzem à conclusão de ausência de risco de causar confusão para os consumidores. A decisão foi por maioria de votos, com voto vencido o Desembargador Ênio Santarelli Zuliani. Nesse voto, foi observado que a ré sequer tem no seu nome empresarial a expressão ―Albert Eistein‖ e muito menos conta com registro no INPI. 223 Como se verifica, a hipótese poderia ser analisada sob a ótica do parasitismo econômico, pois, ainda que se considerasse acertada a ideia de ausência de concorrência, a hipótese se enquadra em aproveitamento parasitário.

Por força da condição de concorrentes, a concorrência parasitária pode ser tratada sob o regime da repressão à concorrência desleal. A adoção de estratégias publicitárias idênticas de um anunciante em relação a outro concorrente é caso de concorrência parasitária. O anunciante que aguarda todos os lançamentos de campanha

222 Concurrence Déloyale et Parasitisme, passim.

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publicitária do concorrente para andar de carona em suas temáticas, ou copiando as combinações de recursos técnicos distintivos da publicidade alheia, deve ser reprimido. A repressão à concorrência parasitária não se apresenta medida de reserva de mercado, pois, tem justificativa na exigência de respeito às regras da boa-fé, da correção profissional, ao dever de não se enriquecer sem causa, ou, ainda, de não abusar do direito de fazer publicidade.

Com efeito, é identificável no comportamento a concorrência parasitária em que a publicidade funciona como objeto do parasitismo. Muitas vezes, em casos de publicidade na televisão, se percebe o caráter comparativo devido à quase simultaneidade da apresentação dos anúncios das empresas concorrentes. A fabricante de produtos de limpeza ―X‖ se socorre de um tema incomum, desenvolvido num ambiente exótico, e, minutos depois surge a fabricante concorrente ―Y‖, se valendo do mesmo tema, mas desenvolvido em lugar diverso. A associação entre as peças de publicidade será imediata pelo consumidor, restando perceptível que uma delas imita a outra na estratégia dos anúncios.

No mercado de distribuidores de bebidas há disputa judicial envolvendo a Companhia de Bebidas das Américas – Ambev e Cervejaria Kaiser do Brasil S/A, ainda pendente, mas útil referência para comprovar o quanto o tema pode ser desenvolvido na jurisprudência pátria.

A controvérsia reside no fato de a Ambev ser titular da marca ―Skol‖, atingida em sua imagem pela concorrente, que detém a marca ―Sol‖. A demandada Kaiser, segundo a fundamentação da autora, introduziu no mercado a cerveja da marca ―Sol‖ com o objetivo de parasitar a marca ―Skol‖, mediante a imitação de seu rótulo e embalagem, tanto que utiliza tais elementos no Brasil em total disparidade com o que é utilizado no exterior. Conclui a autora, enfim, que as campanhas publicitárias da Kaiser induzem a erro os consumidores dadas as semelhanças existentes entre os produtos, caracterizando-se como concorrência parasitária. Em sede liminar, a Ambev não logrou obter liminar para sustar as publicidades e determinar a cessação do comportamento da ré Kaiser. Anote-se, todavia, a existência de acórdão proferido em Agravo de Instrumento, no qual o voto vencido do Desembargador João Carlos Saletti autorizava a

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concessão de tutela antecipada em favor da autora, acolhendo a tese de concorrência desleal por meio de conduta parasitária.224

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