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Seguimos aqui a ordem alfabética O leitor não há de surpreender-se ao encontrar novamente, nesta parte do

No documento MASSIN 1997 Historia Da Musica Ocidental (páginas 46-50)

E OS GÊNEROS MUSICAIS

1 Seguimos aqui a ordem alfabética O leitor não há de surpreender-se ao encontrar novamente, nesta parte do

livro, certas noções já estudadas no capítulo precedente; o contexto agora é diferente, e elas estão ligadas a outras formas.

2 Muitas vezes também chamado "baixo cifrado"; já a denominação "baixo geral" é a tradução literal de seu nome

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truturado totalmente sobre um basso ostinato de quatro notas, que se repete mais de duzentas vezes sem que isto o torne enfadonho. A chacona e a passacalha são geralmente escritas sobre um baixo obstinado, embora Bach não tenha recorrido a esse procedimento em sua Chaconne para violino solo.

Cânone

Recurso de escrita polifónica segundo o qual duas ou mais vozes vão "entrando" sucessivamente, retomando sempre o mesmo tema melódico e guardando até o fim o mesmo intervalo de tempo que as separa. O exemplo mais simples de cânone

é a canção infantil francesa, universalmente conhecida, Frère Jacques. O cânone é

a forma mais estrita de imitação. E a fuga é um desenvolvimento e uma ampliação do princípio do cânone.

Cantus firmus

Melodia, geralmente tomada da liturgia, expressa em valores longos, que serve de coluna vertebral para um desenvolvimento polifónico. Este procedimento de es- crita, muito freqüente durante a Idade Média, é característico do estilo de Johann Sebastian Bach, em cuja obra vamos encontrar os melhores e mais clássicos exem- plos: os Seis corais Schübler e o primeiro e o terceiro coros da Cantata n° 80.

Contraponto

Técnica de escrita musical que consiste na superposição de várias "vozes", as quais, conservando sua autonomia melódica, resultam num conjunto harmonioso. Diz- se, metaforicamente, que o contraponto é uma música "horizontal", enquanto a harmonia seria^ ao contrário, uma música "vertical". De maneira mais precisa, pode-se dizer que o contraponto estimula o ouvinte a pôr sua atenção no encami- nhamento simultâneo das diferentes linhas melódicas, ao passo que a harmonia, ao contrário, está presa à sucessão, no tempo, de "massas" sonoras constituídas pela soma das notas emitidas, no mesmo instante, por diferentes "vozes".

Na Tocata e fuga em mi maior de Johann Sebastian Bach, por exemplo, alter- nam-se, logo no início, três tipos de escrita claramente distintos: (a) longas passa- gens monódicas (a uma só voz), em que o organista faz brilhar, por toda a extensão do teclado e da pedaleira, uma profusão de fogos de artifício sonoros; (b) sucessões de acordes tocados fortemente (= escrita harmônica); (c) passagens polifónicas nas quais cada voz guarda sua independência (= contraponto). A fuga que vem depois da primeira parte é evidentemente, por definição, um exemplo de contraponto.

O contraponto é a principal técnica de escrita musical da Idade Média e do Renascimento, períodos que poderiam ser denominados de "era polifónica". A es- crita harmônica desenvolveu-se sobretudo a partir do século XVII, sem que, por isso, tenha feito desaparecer o contraponto. O estilo da imitação tem seu funda-

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mento no contraponto; o cânone, o ricercare e a. fuga são codificações particulares desse estilo.

Fuga

Composição de estilo contrapontístico (ver contraponto), que desenvolve ao má- ximo todas as possibilidades da escrita de imitação e que tem sua origem no câno-

ne. A fuga obedece a regras muito estritas, que fazem dela um gênero bastante

difícil. Mas nada seria tão falso quanto ver na fuga um gênero acadêmico. A extrema precisão e o grande rigor de suas regras, que fazem da fuga a "forma" por excelência, não são arbitrários e jamais constituíram empecilho à liberdade de invenção de um Johann Sebastian Bach. É na fuga que "forma" (em todos os sen- tidos da palavra) e "conteúdo" coincidem mais exatamente: quanto mais a "forma"

lato sensu identifica-se com uma estrutura (e, portanto, com uma "forma" musical

no sentido preciso da palavra), mais denso poderá tornar-se o conteúdo. É difícil descrever em detalhes a estrutura da fuga sem entrar em considerações técnicas. Simplificadamente, poderíamos dizer que a fuga compõe-se de diversas partes: 1. Exposição: o tema da fuga é exposto sucessivamente por todas a vozes (em geral, as fugas são a três ou quatro vozes, algumas vezes a cinco). Na primeira vez que aparece, o tema é exposto sozinho por uma das vozes: é o enunciado. Logo uma segunda voz o expõe novamente no tom da dominante: é a resposta; enquanto a primeira voz continua o seu caminho, agora trabalhando o contratema. A terceira voz, por sua vez, "entra" quando a segunda voz já expõe o contratema, ao passo que a primeira prossegue em sua trilha; em seguida, se for o caso, entrará uma quarta voz.

2. Desenvolvimento: depois da exposição, inicia-se um passeio pelos tons vizinhos

(modulações), durante o qual se pode ouvir uma ou diversas reexposições totais ou parciais, digressões sobre o tema ou o contratema e, entre as modulações, um desenvolvimento contrapontístico livre, chamado episódio. O desenvolvimento culmina quase sempre numa longa nota pedal (ou seja, nota sustentada por uma das partes, enquanto as outras fazem ouvir um encadeamento de acordes mais ou menos livres com relação a essa nota) da dominante.

3. Stretto: exposição em que as sucessivas "entradas" se vão precipitando cada vez mais, ficando mais próximas umas das outras, de tal modo que o tema e o contra- tema sempre venham entrelaçados.

4. Conclusão: é geralmente precedida de uma nota pedal da tônica.

O grande mestre da fuga foi Johann Sebastian Bach, autor de Die Kunst der

Fuge [A arte da fuga]. Exemplos da arte da fuga em sua obra são Das wohltem- perierte Klavier [O cravo bem temperado] e a Fuga sobre um tema de Legrenzi.

O terceiro movimento do Concerto de Brandenburgo n° 4 é um exemplo de fuga bastante livre, conciliada com o estilo concertante.

Harmonia

Em sentido estrito, é o conjunto de regras que regem a formação e o encadeamen- to dos acordes. Em sentido amplo, a harmonia opõe-se ao contraponto. Enquanto este último considera a superposição das "vozes" no sentido de seu desdobramen- to melódico no tempo, a harmonia, ao contrário, prende-se ao efeito produzido pela emissão simultânea dos diferentes sons das diversas "vozes". Na prática, har- monia e contraponto coexistem em qualquer composição. Mas, em certas épocas os compositores deram preferência à perspectiva temporal do desdobramento e, portanto, à beleza proveniente do encaminhamento paralelo de várias melodias (Idade Média, Renascimento, Johann Sebastian Bach), ao passo que, em outras, enfatizou-se o efeito produzido, de momento a momento, pela superposição dos sons emitidos simultaneamente.

Imitação

É um dos casos particulares do contraponto. A imitação consiste em reproduzir, numa das vozes, um desenho melódico anteriormente ouvido em outra voz. Um bom exemplo é o início da Cantata n° 80 de Johann Sebastian Bach, em que a entrada das diferentes vozes do coro se faz em imitação.

A imitação é, na verdade, um dos fundamentos da escrita polifónica. O cânone, o ricercare e a fuga são modalidades específicas de imitação.

Leitmotiv (motivo condutor)

Motivo melódico, rítmico ou harmônico que reaparece diversas vezes no decorrer de uma mesma obra, sempre ligado a uma mesma situação, a uma mesma idéia, a um mesmo sentimento ou a uma mesma personagem. O retorno do motivo tem o efeito de suscitar, no ouvinte, a evocação mental da situação, idéia, sentimento ou personagem a que o motivo foi previamente associado: é um pouco o fenôme- no da "associação de idéias".

Wagner valeu-se sistematicamente deste recurso, e foi por sua causa que a pa- lavra alemã Leitmotiv entrou no vocabulário musical. Mas, antes dele, Johann Se- bastian Bach — com os corais das Paixões — e sobretudo Mozart já o haviam espontaneamente utilizado. Pode-se dizer que o emprego do coral "Ein feste Burg" na Cantata n° 80 de Johann Sebastian Bach prende-se à idéia do Leitmotiv.

Melodia

Sucessão de diferentes sons ligados por relações que lhes permitem ser percebidos por um ouvinte como um conjunto coerente. É esta "lógica" na sucessão de sons,

inconscientemente reconhecida como tal pelo ouvinte, que consitui a melodia. Au

Clair de la lune [À luz da lua] é uma melodia, ao passo que os sons produzidos por

um gato andando sobre as teclas de um piano, mesmo que ele o faça com todo o cuidado, não constituirão uma melodia, a não ser que o acaso reunisse os sons produzidos segundo uma espécie de lógica acidental. A melodia é sentida esponta- neamente como uma linha sinuosa, o que quer dizer que todos os pontos que a constituem estão ligados entre si por uma "lógica" que se percebe inconscientemen- te. Esta linha tem uma direção geral percebida como horizontal (desdobramento no tempo). Nada impede imaginarmos — e criarmos—uma melodia em que a suces- são dos sons que estão organizados segundo suas alturas seja substituída por uma sucessão dos timbres (de instrumentos diferentes ou diferentemente associados) relativos a um mesmo som ou a um mesmo acorde ou agregado de sons; donde o termo Klangfarbenmelodie ("melodia de timbres"), criado por Schõnberg em 1911, uma inovação que viria a exercer grande influência sobre a composição musical.

Não confundir melodia, no sentido de forma da gramática musical, com melo-

dia enquanto gênero musical, tipo de composição para solo vocal e acompanha-

mento instrumental característico da música francesa (as mélodies de Duparc, Fauré, Debussy, etc.).

Modulação

A palavra muitas vezes é empregada erradamente, com o sentido de uma "modi- ficação na intensidade do som" (piano-forte). Mas, em música, modular significa nada mais que passar de uma tonalidade para outra. A modulação é um dos fun- damentos da composição.

Uma obra em que não existissem modulações seria de uma monotonia insu- portável, a menos que fosse o caso de uma monotonia proposital. Exemplo: o Bole-

ro, de Maurice Ravel. A obra inteira permanece na obsessiva tonalidade de dó

maior, sem modulação e sem mudança rítmica. A diversidade é obtida apenas pela orquestração, ou seja, o emprego dos timbres instrumentais. Mas, de repente, no final, intervém uma brusca modulação para mi maior, cujo efeito é tanto mais surpreendente por haver a música permanecido estacionária tanto tempo, até aquele momento, na mesma tonalidade.

Ornamento

Procedimento de escrita musical usado pelo compositor, ou eventualmente pelo intérprete em sua execução, que consiste em ornamentar, embelezar, variar uma nota ou linha musical, particularmente fazendo acompanhar certas notas de fugi- tivas passagens para notas que lhes são vizinhas.

O ornamento (abbellimento, em italiano) existe na música ocidental desde o canto gregoriano e desenvolveu-se entre os séculos XTV e XVI. Na época barroca,

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o ornamento era regra de execução obrigatória: os cravistas costumavam acres- centar grande quantidade de ornamentos ao texto escrito, e os cantores freqüente- mente improvisavam passagens inteiras, com grande virtuosismo. Os hábitos mu- sicais de hoje muitas vezes fazem esquecer o quanto, antigamente, era importante a iniciativa pessoal na execução das obras. A ornamentação improvisada sempre foi um dos procedimentos essenciais, através dos quais se manifestava a liberdade deixada ao intérprete (ver também baixo contínuo).

Muito numerosos no início, e diferentes em cada país, os ornamentos não po- deriam ser todos relacionados aqui. Rossini foi dos primeiros a escrever, nota por nota, os ornamentos que aparecem em suas óperas e a exigir que fosse cantado aquilo que estava escrito, codificando, dessa forma, o bel canto. Com isso, Rossini fez da coloratura —trecho de virtuosismo feito de trinados, escalas, arpejos, gran- des saltos, etc., que se articulavam sob a forjna de vocalises nas árias de bravura cantadas nas óperas, como as duas árias da Rainha da Noite em Die Zauberflõte [A flauta mágica], de Mozart, por exemplo — um verdadeiro condensado dos orna- mentos usuais.

A partir do século XIX, os ornamentos mais usados são a apojatura (do italiano

appoggiatura), o grupeto (do italiano gruppetto), o mordente (do italiano morden- te) e o trinado, trino ou ainda trilo (do italiano trillo).

A apojatura, nota dissonante com relação a determinado acorde, precede de um intervalo de segunda e prepara a nota esperada pela harmonia, fazendo com que esta nota, desse modo, ganhe relevo.

O coulé, termo francês que designa um ornamento da música antiga próximo da apojatura, permitia reunir dois sons separados por uma terça.

O grupeto (em francês doublé ou tour de gosier) é um ornamento rápido, em que a nota principal está rodeada por três ou quatro notas conjuntas superiores e inferiores.

Grupeto inferior ou invertido

l l = p - i i ¡ | p

Grupeto superior o u normal

O mordente (em francês mordant pu pincé) é um ornamento rápido em que a nota principal, depois de alternar-se com a nota que está imediatamente meio tom abaixo (ou acima), volta a ser tocada ou cantada.

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O trinado, trino ou trilo (também dito groppo ou gruppo; em francês trille) é a alternância rápida da nota principal com a nota imediatamente superior. O trina- do comporta certa liberdade de execução.

O trinado passou a ter grande importância a partir de Beethoven, quando dei- xou de ser ornamental para tornar-se prâticamente temático, impondo uma con- cepção totalmente nova do timbre, como nos finali das sonatas para piano opus

109 e opus 111, de Beethoven. (Na música antiga, a suspensão — em francês sus- pension — partia de princípio similar, mas produzia um efeito de surpresa ao atra-

sar, por meio de ligeira síncope, o início do ornamento.)

O trêmulo (do italiano tremolo), próximo do trinado, consiste em repetir a nota principal em um movimento rápido e regular.

Ao inverso do trêmulo, a aspiration ou accent, ornamento usado pelos cravistas franceses, consistia em acrescentar, no fim de uma nota sustentada, uma apojatura que lhe cortava o som, abreviando-a, mas de modo a conferir-lhe destaque.

Polifonia

Em sentido estrito, é a combinação de diversas "vozes" simultâneas que guardam certa autonomia melódica (ver contraponto e voz). Em sentido amplo, diz-se de qualquer música escrita para mais de uma voz ou mais de um instrumento.

Ricercare

Peça polifónica escrita em estilo de imitação. A fuga é uma forma codificada do

ricercare, que desapareceu no século XVII, cedendo o lugar àquela que foi sua her-

deira. A palavra italiana ricercare, entretanto, continuou sendo usada durante o século XVIII para designar uma fuga irregular.

Temperamento

Sistema de equalização dos semitons da escala cromática, destinado a remediar a diferença existente entre os valores acústicos puros (determinados matemática-

mente) e aqueles utilizáveis na prática musical (ver, na Parte IV deste livro, o que se diz sobre Das wohltemperierte Klavier [O cravo bem temperado], de Bach). O temperamento permite a prática da "modulação enarmônica" entre as notas representadas nos instrumentos de som fixo por meio de um único som interme- diário, como é caso de um dó sustenido ou de um ré bemol.

Voz

Na escrita musical, chama-se voz qualquer parte vocal ou instrumental que tenha autonomia melódica e se desenvolva no seio de um conjunto polifónico. Assim, tanto se pode falar de um coro a quatro vozes como de um quarteto instrumental escrito para quatro vozes.

No documento MASSIN 1997 Historia Da Musica Ocidental (páginas 46-50)