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A supremacia das normas constitucionais e sua garantia jurisdicional: o controle de

2. A SUPREMACIA DAS NORMAS DO BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE

2.3 A supremacia das normas constitucionais e sua garantia jurisdicional: o controle de

supralegalidade e que outras normas podem conter ou ser merecedoras de valores constitucionais.

Não se trata de indagar o contexto sociológico de opções de determinadas matérias como dotadas de supremacia material, mas sim de compreender que a supremacia substancial da constituição não está restrita somente ao que está positivado, mas sim que há direitos e

regras fundamentais periféricos ou extravagantes139.

2.3 A supremacia das normas constitucionais e sua garantia jurisdicional: o controle de constitucionalidade

Da supremacia e supralegalidade constitucional, resulta que a constituição é “a mais

alta expressão da soberania”140 – a lex legum. Agora, neste sentido, também afirma que

constitucionalidade advém, basicamente, da supremacia e da supralegalidade pertencentes à constituição141.

Quando há o respeito à supremacia constitucional, como didaticamente expõe Lâmmego Bulos, deparamo-nos com a ideia de constitucionalidade, mas se atos ou normas públicas ou privadas contrariarem o caráter supremo da constituição estar-se-á diante da

137 FERNANDO COELHO, Luiz. Op. cit., p. 160. 138

Op. cit. p. 12.

139 A nomenclatura extravagantes é utilizada por Luis Fernando Sgarbossa na sua obra “Direitos e garantias

fundamentais extravagantes” para se referir a direitos sem assento constitucionais, conforme trazido por Ingo Sarlet. Op. cit. p.88

140 BONAVIDES, Paulo. Op. cit. p. 296. 141 Op. cit. p. 653.

inconstitucionalidade142. Em seguida, complementa o autor que essa distinção é em caráter amplo, pois há diferentes tipos de inconstitucionalidade, como apreciaremos logo a seguir. Registra ainda que a inconstitucionalidade é um juízo de valor, “porque conduz o intelecto

humano a considerar certas condutas – públicas ou privadas – contrárias à constituição”143.

Para Pontes de Miranda, as constituições antigas que não adotavam a garantia de decretação de inconstitucionalidade das leis “não eram propriamente ‘obrigatórias’ como constituições, salvo para os que não faziam as leis”. O eminente jurista destaca que a rigidez da constituição foi fruto de um processo histórico, que culminou na rigidez constitucional como sendo a limitação, inclusive do poder constituinte reformador, de alteração do seu texto144.

Como cristaliza Marmelstein, “aceitar que a Constituição é a norma suprema do ordenamento significa reconhecer a necessidade do controle de constitucionalidade das

leis”145. O controle de constitucionalidade, por conseguinte, é fruto da lógica do sistema em

assegurar a primazia da constituição perante as legislações e atos inferiores, ou seja, sistema que verifica a adequação ou compatibilidade de uma lei ou ato normativo com a Constituição.

O controle é necessário porque mesmo dotada de supremacia, a constituição não está livre de abusos e violações que podem ser cometidas pelo legislador ordinário, pelas

autoridades públicas em geral146 e até mesmo pelo poder constituinte reformador, na

promulgação de emendas constitucionais. Como pondera Pontes de Miranda147, “desde que se

pensou em Constituição, é natural que se haja pensado em defendê-la”.

Neste sentido, Michel Temer entende que “controlar a constitucionalidade de ato

normativo significa impedir a subsistência da eficácia de norma contrária à Constituição”148.

Significa dizer que o controle de constitucionalidade – como garantidor da própria Constituição -, protege a sua supremacia normativa, evitando que atos e demais normas desrespeitem os seus preceitos.

J J.H Meirelles aponta que o controle de constitucionalidade é justamente relacionado com a supremacia e a rigidez constitucional, pois está ligado à própria noção de constituição:

“(...) o controle de constitucionalidade das leis não constitui problema autônomo, mas corolário de diversas questões estritamente relacionadas com a própria noção de constituição, de rigidez constitucional, de supremacia da constituição, do princípio de constitucionalidade, e daí a importância jurídica e política que se reveste, e que o

142 Op. cit. p. 138. 143 Op. cit. p. 139. 144 Op. cit. p. 176-179. 145 Op. cit. p. 14.

146 BULOS, Uadi Lammêgo. Op. cit. p. 187.

147 MIRANDA, Pontes. Democracia, liberdade, igualdade: os três caminhos. Campinas: Bookseller, 2002, p.

87.

tornam merecedor de um desenvolvimento especial nos estudos de Direito Constitucional”149

O controle de constitucionalidade, então, é um dos focos de preocupação dos juristas sobre a legitimidade de intervenção judiciária nas normas constitucionais. Nas lições de Gustavo Just, o controle seria o mais ativo mecanismo de intervenção da autoridade judicial na vida política:

o controle de constitucionalidade é geralmente reconhecido como o mais importante e o mais ativo entre os mecanismos de intervenção da autoridade judicial, e particularmente da corte constitucional, na vida política; é, além disso, o momento em que ocorre o exercício mais importante, se não o mais frequente, da interpretação constitucional.150

Controlar a constitucionalidade das leis, portanto, implica dois pressupostos: que existem normas constitucionais e que tais normas estão hierarquicamente superiores às normas ordinárias existentes no ordenamento jurídico, tanto do ponto de vista formal (supralegalidade) como da ótica substantiva (supremacia material). Significa, ainda, como visto, que há um processo mais dificultoso para alteração da constituição, a chamada rigidez constitucional.

Para que não ocorra desvios do assunto proposto não se procederá a uma análise mais profunda sobre o controle de constitucionalidade, até porque o tema é riquíssimo e com muitas vertentes, não obstante traz-se os principais aspectos que permeiam o referido instituto.

Em uma ótica ontológica, ao se exercer o controle de constitucionalidade tem-se que existem alguns componentes essenciais, sem os quais não é possível haver o controle: o objeto, o sujeito cognoscente e a norma de referência.

A norma de referência é a constituição, ou melhor, as normas constitucionais que compõem o bloco de constitucionalidade e que são chamadas de parâmetro de controle. Podendo esse ser parâmetro, a depender do ordenamento jurídico, apenas o texto constitucional – conceito estrito -, ou então abarcar princípio e regras de valores constitucionais dentro de um sistema jurídico – conceito amplo, que será mais trabalhado no tópico subsequente.

As normas controladas são as emendas, leis e atos normativos que podem ser submetidos à apreciação, ao controle de validade. São normas cujo conteúdo e formas serão cotejadas com o parâmetro de controle – a constituição, ou melhor, o bloco de constitucionalidade.

149 Op. cit. p. 371-372. 150 JUST, Gustavo. Op. cit.

Por sua vez, o sujeito cognoscente traduz-se no sujeito (ou órgão) ao qual é conferida a competência para apreciar se determinada norma está de acordo com a lei das leis. Essa afirmativa traz certo grau de dificuldade, uma vez que, pela posição central que ocupa a constituição no ordenamento jurídico, dizer que determinado ato normativo não está de acordo com a mesma será uma interferência, mediante controle constitucional, sobre os demais Poderes.

Sobre qual órgão deve ser o “guardião da Constituição” convém lembrar-se, sucintamente, da discussão travada entre Carl Schmitt e Hans Kelsen. Sem maior aprofundamento ressalta-se que Schmitt entendia que o Presidente do Reich alemão deveria figurar como o guardião da Constituição em momentos de crise, por ser uma função política, ao passo que Kelsen defendia um sistema de garantia da Constituição por meio da atuação de um Tribunal Constitucional no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade. Kelsen

esclareceu em seu artigo intitulado “Quem deve ser o guardião da Constituição?”151, que

controvérsias de grande repercussão especial não escapavam do âmbito do Direito, devendo ser julgadas por um Tribunal Constitucional, composto por magistrados preparados, e priorizando a imparcialidade das decisões, até perante o governo.

De modo geral, atualmente os sistemas constitucionais adotam como legitimados para fiscalização do controle um órgão político ou jurídico. O órgão político não pertence ao

judiciário, que é o chamado controle político, e foi impulsionado pela Revolução Francesa152,

sendo que seus defensores sustentam que o equilíbrio entre os três poderes, no âmbito do controle constitucional, é melhor alcançado por um órgão distinto, com membros de mandato

determinado, como vimos no Conselho francês, com o intuito de se obter a imparcialidade153.

André Ramos Tavares lembra que o fato de o controle ser exercido por órgão político pode ser entendido de modo geral, pois qualquer órgão que tem autonomia em relação aos demais seria político:

(...) poder-se-ia afirmar, sob a influência de determinada teoria, que qualquer órgão da República é político, no sentido de que goza de autonomia em relação aos demais, e outrossim, por exercer alguma das funções considerada essenciais (teoria da separação orgânica dos poderes) dentro de um estado.154

O autor considera que “a partir dessa ideia ter-se-ia que todo o controle da constitucionalidade reverteria em controle político, porque exercido por um órgão

politicamente relevante”155. Porém, ele frisa que o termo “político” não pode ser entendido

151 KELSEN, Hans. Quem deve ser o guardião da Constituição? KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional. São

Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 237‐298.

152 AGRA, Walber de Moura. Op. cit. p. 661. 153 AGRA, Walber de Moura. Op. cit. p. 661

154 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 247. 155 Op. cit. p. 247.

como se houvesse liberdade para decidir a constitucionalidade conforme critérios políticos discricionários (conveniência e oportunidade), mas sim que “o controle continua sendo técnico, e só por isso pode ser controle de constitucionalidade”. Em outras palavras, não é o fundamento, o motivo do controle que é político, pois assim estar-se-ia desnaturando o instituto, mas o órgão que o realizaria é que seria político.

No tocante ao controle jurisdicional, generalizado atualmente, este é exercido por

órgãos do Poder Judiciário, sendo decorrente do sistema americano (judicial review)156. Jorge

Miranda, todavia, separa o controle jurisdicional em dois: o modelo judicialista difuso norte- americano e o modelo dos tribunais constitucionais, de procedência austríaca e inspirado,

como pincelado, na doutrina de Hans Kelsen157.

Há de se registrar ainda o controle misto158, que ocorre quando há a repartição de

análise da constitucionalidade entre um órgão político e um órgão jurídico, uma vez que certas matérias são fiscalizadas pelo judiciário e outras são controladas pelo legislativo e

executivo. Jorge Miranda159 e Uadi Lâmmego Bulos160 entendem que no Brasil o sistema

seria misto. Em posição distinta, José Afonso da Silva exemplifica o sistema misto com o sistema suíço, no qual as leis federais ficam sob o controle da Assembleia Nacional e as leis locais sob o controle jurisdicional, enquadrando o Brasil, como se infere de seus

ensinamentos, como sistema jurisdicional161.

No que tange à inconstitucionalidade do objeto (norma) posta em análise, esta pode ser feita pela forma ou pela matéria. O primeiro – controle formal - cinge-se ao formalismo jurídico, à verificação de que a norma foi elaborada respeitando os preceitos constitucionais de competência, iniciativa, quórum de aprovação, dentre outras regras. Não se faz juízo de valor sobre o conteúdo ou essência da norma impugnada.

Pelo controle material, contudo, a situação torna-se mais delicada, uma vez que o parâmetro passa a ser o conteúdo da norma, que envolve não apenas questões jurídicas, mas busca verificar se a norma está adequada “aos cânones da Constituição, ao seu espírito, à sua

filosofia, aos seus princípios políticos fundamentais”162.

156 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 49

157 MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Tomo II. Coimbra: Coimbra editora, 1999, p. 381-

383.

158 Não confundir com o controle de constitucionalidade misto, que é quando determinado sistema constitucional

utiliza-se tanto das regras do controle difuso como as do controle concentrado.

159 Op. cit. p. 386. 160 Op. cit. p. 192. 161 Op. cit. p. 49.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho163 resume o controle formal e o controle material como sendo requisitos de verificação de conformidade das normas nos seguintes termos:

Controle da constitucionalidade é, pois, a verificação da adequação de um ato jurídico (particularmente a lei) à Constituição. Envolve a verificação tantos dos requisitos formais – subjetivos, como a competência do órgão que a editou – objetivos, como a forma, os prazos, o rito, observados em sua edição – quanto dos requisitos substanciais – respeito aos direitos e às garantias consagrados na Constituição – de constitucionalidade do ato jurídico.

Quanto ao modo de exercício do controle de constitucionalidade, basicamente, pode se dar sobre duas formas: controle concreto – por via de exceção -, e controle abstrato – por via de ação. Há quem acrescente, ainda, a inconstitucionalidade declarada por iniciativa do juiz

dentro de um processo de partes (Richterklage)164, que, todavia, entende-se como incluído no

controle incidental.

O controle concreto de inconstitucionalidade ocorre quando no caso em exame, submetido ao judiciário, um dos fundamentos jurídicos para o pedido da parte está na objeção da inconstitucionalidade na lei que deseja afastar. A sentença, nesses termos, produzirá apenas efeitos entre as partes, ex nunc (não retroativa), afastando-se a aplicação da norma legal nos termos decididos. Não se produzirá a anulação da norma, mas o magistrado irá declarar tão- somente a sua inaplicabilidade ao caso em lide. Esse sistema é oriundo dos Estados Unidos, no famoso caso Marbury vs. Madison, no qual o juiz Marshall, nos fundamentos da sentença elaborou o raciocínio acerca da supremacia da lei constitucional sobre a lei ordinária: “Partiu assim Marshall para uma proposição evidente e incontestável: ou a Constituição controla todo o ato legislativo que a contrarie, ou o legislativo, por ato ordinário, poderá modificar a

constituição. Não há meio-termo entre tais alternativas”165. O Presidente da Suprema Corte

americana, segundo Ivo Dantas166, com essas palavras alicerçou “a teoria da superioridade da

constituição em seu aspecto jurídico: materialmente, nenhum preceito existe que seja superior à norma contida na Constituição; formalmente, nenhuma norma seria elaborada sem que preenchesse os requisitos fixados no documento maior”.

O controle abstrato é aquele genérico, realizado em tese, sem litígio concreto, razão que a doutrina entende que as ações que permitem o seu manejo constituem verdadeiro processo objetivo, uma vez que cuida da relação de validade de normas frente à constituição,

163 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2001,

p. 34.

164 Nesse sentido está José Afonso. Para mais: SILVA, José Afonso. Op. cit. p. 50. 165 BONAVIDES, Paulo. Op. cit. p.307.

166 DANTAS, Ivo. O valor da constituição: do controle de constitucionalidade como garantia da

sem interesses intersubjetivos em choque e com produção de efeitos ex tunc e valido para

todos (erga omnes)167.

Quanto à legitimidade atribuída aos órgãos para análise da questão constitucional, essa

pode ser difusa ou concentrada168. O controle difuso, típico do direito norte-americano, é

aquele no qual qualquer juiz ou tribunal pode conhecer de arguição de inconstitucionalidade de uma norma. Já o controle concentrado, proveniente do sistema europeu, é aquele atribuído a um único órgão. No caso brasileiro, que se compõe em um sistema híbrido, por permitir ambos os tipos, ao Supremo Tribunal Federal cabe em controle concentrado à análise das questões nas ações Direta de Inconstitucionalidade (ADI), Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF (novidade da CF/88), na ação direta interventiva e, incidentalmente, pelo mandado de segurança ou habeas corpus quando a autoridade coatora for de competência funcional do STF169.

De outra parte, Celso Bastos justifica que as constituições rígidas asseguram sua supremacia pelo controle de constitucionalidade que se dá em dois momentos, primeiramente pela identificação do ato ou comportamento inconstitucional, no segundo momento, quando

se nega eficácia jurídica aos mesmos170.

Nesta perspectiva, a produção de atos e normas legislativos deve obedecer aos ditames da magna carta sob pena de inconstitucionalidade por ação ou omissão, afinal “a constituição impõe-se normativamente não só quando se faz o que ela proíbe, mas também quando não se

faz o que ela impõe que seja feito”171.

A inconstitucionalidade por ação é mais recorrente e consiste no confronto vertical entre a norma controlada e a constituição. O seu fundamento está nos mencionados princípios da supremacia e supralegalidade da constituição, devendo a produção de atos e normas legislativos obedecer aos ditames da magna carta.

167 DIDIER JUNIOR, Fredie, SARNO BRAGA, Paula e OLIVEIRA, Rafael. Aspectos processuais da ADIN. In:

DIDIER JUNIOR, Fredie (org).Ações Constitucionais. Salvador: Juspodium, 2009, p. 416.

168 Vale ressaltar que controle difuso e incidental não se confundem, apesar de parte da doutrina entender,

equivocadamente, as expressões como sinônimas. O controle difuso refere-se aos sujeitos legitimados a apreciar a questão de constitucionalidade, ao passo que o controle incidental é o modo de exercício de controle, vinculado a uma lide específica.

169 O STF já aceitou, inclusive, controle concentrado preventivo, que ocorre quando parlamentar do Congresso

Nacional ingressa com mandado de segurança para fazer valer o devido processo legislativo. Precedentes do STF (http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigobd.asp?item=%20783): MS 20.257/DF, Min. Moreira Alves (leading case) (RTJ 99/1031); MS 20.452/DF, Min. Aldir Passarinho (RTJ 116/47); MS 21.642/DF, Min. Celso de Mello (RDA 191/200); MS 24.645/DF, Min. Celso de Mello, DJ de 15-9-2003; MS 24.593/DF, Min. Maurício Corrêa, DJ de 8-8-2003; MS 24.576/DF, Min. Ellen Gracie, DJ de 12-9-2003;

170 Op. cit. p. 323.

171 PEREIRA E SILVA, Reinaldo. A ação direta de inconstitucionalidade por omissão administrativa. Revista

Não se pode permitir que o ordenamento acolha normas que contrariem os ditames constitucionais, como bem destaca José Afonso da Silva:

Essa incompatibilidade não pode perdurar, porque contrasta com o princípio da coerência e harmonia das normas do ordenamento jurídico, entendido, por isso, como reunião de normas vinculadas entre si por uma fundamentação unitária172.

A inconstitucionalidade por omissão, por seu turno, é fruto de uma evolução ocorrida na doutrina e jurisprudência, sendo um fenômeno novo que, no caso do Brasil, já se encontra albergado no nosso texto constitucional. Este tipo de constitucionalidade consiste na “inércia

na elaboração de atos normativos necessários à realização dos comandos constitucionais”.173

É decorrente de um comportamento negativo no qual o Poder responsável deixa de tomar as

providências previstas na Lei Maior para o fiel cumprimento de suas normas174, isto é, a

própria constituição determina que determinada norma deva ser editada.

Para o STF a inconstitucionalidade por omissão representa descaso com a autoridade suprema da constituição:

Descumprimento de imposição constitucional legiferante e desvalorização funcional da constituição escrita - a inércia do poder público como elemento revelador do desrespeito estatal ao dever de legislar imposto pela constituição - omissões normativas inconstitucionais: uma prática governamental que só faz revelar o desprezo das instituições oficiais pela autoridade suprema da lei fundamental do estado - a colmatação jurisdicional de omissões inconstitucionais: um gesto de fidelidade, por parte do poder judiciário, à supremacia hierárquico-normativa da constituição da república.175

Também está baseada no princípio da supremacia, pois a inércia dos poderes em não regular a situação prevista na constituição afronta a sua força normativa, pois determinados mandamentos constitucionais só produzem efeito quando for regulamentado pelo legislador ordinário. Segundo Canotilho, “trata-se, pois, de uma pretensão que assenta não na existência de normas jurídicas inconstitucionais, mas na violação da lei constitucional pelo silêncio legislativo (violação por omissão)”.

Entre os aspectos polêmicos da inconstitucionalidade por omissão está a sua complicada relação com as constituições dirigentes, repletas de normas programáticas, como a

brasileira176. As normas programáticas estabelecem ações ou conjunto de ações que devem ser

tomadas pelo governo em longo prazo, prazos não determinados, uma vez que se tratam de compromissos a serem realizados. Esses programas dependem de providências legislativas

172 Op. cit. p. 47.

173 BARROSO, Luis Roberto. Op. cit. p. 223.

174 É como expõe BULOS, Uadi Lammêgo. Op. cit. p. 151.

175 Brasil, Supremo Tribunal Federal, MI 1331 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno,

julgado em 07/12/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-239 DIVULG 16-12-2011 PUBLIC 19-12-2011.

posteriores que não se sabe quando serão tomadas, o que produz a chamada síndrome de inefetividade da constituição177.

Em que pese o caráter riquíssimo que a discussão sobre a inconstitucionalidade contém, por ora basta ter em mente, com base no que foi exposto, que “a falta de um mecanismo de controle de constitucionalidade pode ser fatal para os direitos e garantias

fundamentais, que ficariam, de fato, à mercê da vontade do legislador”178. De fato, é o próprio

controle de constitucionalidade que permite a harmonização do ordenamento jurídico, protegendo-o na medida em que extirpa normas jurídicas inconstitucionais, cuja permanência representaria ofensa à supremacia da Constituição e também representaria a existência de normas de superior hierarquia com conteúdos divergentes, tumultuando o sistema.