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REALIZAÇÃO DE METAS

3.2 Teorias organizacionais e seu foco em grupo

3.2.1 Teoria da estruturação

As práticas sociais ordenadas no tempo e no espaço são o domínio básico da teoria da estruturação (GIDDENS, 1989). Nela, a ação humana se define a partir de um processo contínuo de construção social no decorrer do tempo e em espaços distintos, formando um conjunto de práticas complexas e diversas, dependentes do

modo como os atores organizacionais assimilam suas funções e apreendem o contexto que os cerca.

No contexto da teoria da estruturação, as ações são resultantes de práticas sociais que devem ser compreendidas a partir do contexto histórico-social em dada realidade (ALVESSON; WILLMOTT, 1996), vinculando-se a ação à estrutura por meio de um processo dinâmico de construção e reconstrução da vida social (JUNQUILHO, 2003). Este configura-se como o conceito central desta teoria: a dualidade da estrutura.

Por ser dual, a estrutura tanto limita quanto viabiliza a própria ação, o que permite que os atores modifiquem seu comportamento e provoquem processos contínuos de mudança social. Neste sentido, um sistema colaborativo, objeto desta tese, carrega uma estrutura própria, construída, que viabilizará e limitará as ações dos usuários por um caminho pré-estabelecido, materializado pelas funcionalidades e tarefas especificadas naquele sistema.

Por outro lado, a ação humana é modelada pela estrutura, mas também a modela. É modelada a partir do momento em que a estrutura trará scripts pré- estabelecidos no intento de definir como determinada ação, ou tarefa, será realizada, modelando-a. Ao mesmo tempo, o ator social, ao agir mediado pela estrutura, apropria-se dela e promove alterações na forma prevista de ação. Desse modo, o ator social, ou usuário, durante a atuação mediada pelo SC, tem sua forma de agir modelada pela estrutura daquele, mas, também, é capaz de promover nova modelagem a partir de novos usos e apropriações das funcionalidades providas pelo sistema.

Para Giddens (1989), a estrutura é virtual; é uma propriedade abstrata dos sistemas sociais e não apresenta propriedades materiais. Assim, não pode existir sem os atores humanos que nela desempenham papéis e interpretam essa estrutura, mas permitem que suas abstrações condicionem suas ações (ORLIKOWSKI; ROBEY, 1991).

As tecnologias colaborativas se incorporam a este esquema, ao contemplarem as concepções mencionadas, provendo uma estrutura para a ação, mas estando suscetíveis a modificações e adequações provenientes da ação, o que caracteriza a relação dual. Adicionalmente, o contexto de ação é caracterizado pela virtualidade do ambiente e pela relativização do tempo, agora percebidos pelos atores mediante as funcionalidades do sistema.

Os atores, no desempenho de suas ações, não só controlam e regulam continuamente o fluxo de suas atividades e esperam o mesmo comportamento dos outros, como também monitoram frequentemente aspectos sociais e físicos dos contextos nos quais se movem (GIDDENS, 1989). Por isso, esses atores são vistos como seres cognoscitivos e reflexivos.

A figura 18 empresta visão gráfica à dualidade da estrutura, ilustrando as relações em duplo sentido entre a estrutura e as ações humanas, estas executadas por atores sociais.

Figura 18 - Dualidade da estrutura.

Fonte: adaptado de Giddens (1989).

Giddens (1989), o luminar desta teoria, acrescenta que a dualidade da estrutura é composta por três dimensões sendo a primeira o significado, que utiliza a linguagem e a comunicação para produzir sentido; a segunda a legitimação, que busca gerar ordem pelo uso de normas sociais e poder; e em complemento, a dominação, que acontece por intermédio de sanções sociais e controle dos recursos.

As modalidades de estruturação interfaceiam o campo de ação humana com o campo da estrutura social (institucional) e são traduzidas em esquemas interpretativos, recursos e normas. Tais modalidades determinam como as propriedades institucionais dos sistemas sociais mediam a ação humana e como a ação humana constitui a ação social (GIDDENS, 1989; ORLIKOWSKI; ROBEY, 1991). A interface entre os campos institucional e da ação humana é então referida como estrutura.

As estruturas de significado das instituições sociais, declaram Bobsin e Hoppen (2011), são representadas pelos esquemas interpretativos utilizados pelos atores para compreenderem as falas e ações dos outros.

Esses esquemas interpretativos podem ser operacionalizados a partir de uma ordem cognitiva compartilhada, em que os atores incorporam significados.

A recursividade da estrutura dual se expressa, também, quando normas e regras operacionais são reafirmadas ou desafiadas, à medida que os atores se apropriam e legitimam as tecnologias utilizadas. Assim, as interações ocorrerão por meio de sanções normativas, expressas a partir de normas culturais, formando as estruturas de legitimação (ORLIKOWSKI, 2000), as quais são sustentadas pela socialização da cultura e das práticas.

A figura 19 sintetiza as dimensões mencionadas e explicita os demais relacionamentos.

Figura 19 - Dimensões da dualidade da estrutura.

Fonte: adaptado de Giddens (1989) e Orlikowski e Robey (1991).

Nessa trilha, as estruturas de dominação se alteram por meio das interações, destacando-se o poder mediado pelos recursos como capacidade transformativa gerando certa assimetria entre autoridade e recursos (BOBSIN; HOPPEN, 2011).

A teoria da estruturação sempre atraiu pesquisadores na área de sistemas de informação devido a seu aspecto processual e também pelo estudo da dinâmica e da ambiguidade entre agência e estrutura organizacional, já que a tecnologia traz a característica de estruturar as ações e também de alterar processos nas organizações (POOLE; DeSANCTIS, 2004; JONES; KARSTEN, 2008).

Assim, diante da proposta de se estudar sistemas colaborativos, a teoria da estruturação confere uma lente na qual seus conceitos nucleares - estrutura, ações humanas, ser humano como um ser cognoscível e reflexivo – compõem um painel para a articulação das dimensões da dualidade da estrutura no contexto de geração de ideias em grupo por meio da tecnologia.

Somando-se a esta perspectiva inicial, o modelo estruturacional da tecnologia (ORLIKOWSKI, 1992) contextualiza e relaciona a estrutura e suas propriedades à tecnologia. Nesta perspectiva, a estruturação é entendida como um processo dinâmico

numa relação dual e recursiva entre a tecnologia e as ações humanas, regulada por propriedades institucionais. Nos estudos que envolvem TI, a estruturação é vista como provedora da estrutura que viabiliza, limita e modela as ações humanas, ao mesmo tempo em que é modelada quando é operacionalizada pelo homem.

Em adição, acredita-se ser bastante produtivo convocar para esta base teórica os estudos de DeSanctis e Poole (1994), dentre outros autores, sobre a teoria da estruturação adaptativa que contempla a articulação direta da teoria da estruturação com a tecnologia, descortinando perspectivas para a leitura do contexto deste estudo.