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Capítulo 2 História e Geografia do carnaval em Juiz de Fora

2.6. A Nova República

A Nova República inaugurada em 1985 com a chegada de José Sarney e redemocratizada, de fato, em 1989 com a vitória no voto popular de Fernando Collor de Mello é um marco da nova fase do Brasil. O quadro de conquistas de direitos civis e liberdades individuais tem aqui seu ponta pé. Acompanhado disso, uma dinâmica globalista de integrações regionais numa economia de escala mundial.

Em contrapartida, no início do século XXI, cresce a popularidade de ideias ligadas a autodeterminação da cidade pela população. Marcos desse ímpeto, são as manifestações de caráter urbano, como Occupy Wall Street nos Estados Unidos, os Indignados na Espanha e as manifestações de Junho de 2013 no Brasil (HARVEY, 2014: p. 211). Seguidos dos grandes protestos, uma série de outras reivindicações em escalas regionais se apropriam do conceito criado em meados do século passado por Henri Lefebvre do Direito à Cidade, reivindicando uma produção do espaço urbano de cunho popular, de forma a atender as necessidades da população e não apenas do mercado em suas múltiplas facetas. O ressurgimento do carnaval de rua através dos blocos, reivindicando mais que o direito à festa, o direito de ocupar a cidade surgem em diversas cidades, como Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, para citar apenas algumas metrópoles.

Em Juiz de Fora, não muito atrás, a partir da segunda década do século XXI, constatamos um aumento significativo desses blocos de rua, de caráter independente e autofinanciado. Entretanto, julgamos ser excessivamente precipitado, apesar das tendências em outras cidades brasileiras, classificar esta etapa como um novo movimento na história do carnaval da cidade.

2.6.1. Carlos Alberto Bejani e a queda da folia

Eleito em 1988, pelo pequeno Partido Jovem, o ex-radialista foi durante seu mandato de 1989-1993, figura importante na queda definitiva dos desfiles de Escolas de Samba na cidade. Em seu primeiro ano em 1989, altera o local dos desfiles para outro região da Avenida. “Continuou na avenida Rio Branco, mas num trecho menos aristocrático, entre a avenida Brasil e a rua Marechal Setembrino de Carvalho”, invertendo pela primeira vez a direção dos desfiles, o qual, desde 1966 ocorria no sentido sul-norte. A mudança gera protestos e boicotes por parte das agremiações do grupo especial que se recusam a desfilar. A própria FUNALFA, órgão

responsável pela promoção da cultura na cidade não registra a Escola campeã até os dias de hoje (MOREIRA, 2008: p. 74).

O Bloco do Beco, de Armando Aguiar, o Mamão, sai às ruas com o enredo “Bejani Mucho” em protesto à decisão da prefeitura. Outras figuras de relevo na história do carnaval na cidade, como Gilmara Delmonte e Baby Mancini, para não perder o dias de festa se direcionam para o Rio de Janeiro para os desfiles cariocas. Muitos foliões assíduos da Avenida juizforana se desanimam com o ocorrido (RIBAS, 1989: p. 22).

Defronte ao boicote do grupo especial em 1989, a FUNALFA em 1990 monta na rua Halfeld um stand para votação popular, plebiscito objetivando definir o local de preferência do público juizforano para realização dos desfiles na cidade. Com 7.378 votos, sendo deste montante, 5.700 favoráveis à realização do desfile na Avenida Rio Branco na região central, imediações da catedral metropolitana. O carnaval que teve eleita campeã a Feliz Lembrança, respira, mas não o suficiente para os anos posteriores. Em 1991, 1992 e 1993 não se realizam os desfiles das Escolas de Samba. Em 1993, a festa se descentraliza do centro, direcionando-a para centro regionais, como “Santa Luzia, Benfica, Bandeirante e Ladeira”. Contudo, alguns hotéis da cidade decidem fechar as portas e “o Terminal Rodoviário Miguel Mansur, em Juiz de Fora, o movimento foi intenso, com cerca de 35 mil embarques e 14 mil desembarques” (ALMADA, 2014: p. 91-94).

De volta às passarelas – entre a ponte do Manoel Honório e o Mergulhão – em 1994, segundo ano de gestão do prefeito Custódio Mattos, tentou-se superar a crise carnavalesca na cidade. “A prefeitura investiu em infra-estrutura e divulgação, buscando atrair o visitante e dotar a cidade de uma diversão saudável. Porém, vale ressaltar, que não foram disponibilizadas verbas às Escolas de Samba, cabendo a estas o dever de capitalizar seus próprios recursos” (CARVALHO; ROSA, 2012: s/p). A Real Grandeza sagra-se a campeã de 1994, assim como em 1995, sob as bases das mesmas políticas estabelecidas.

2.6.2. Nas margens do Rio Paraibuna

No terceiro ano de mandato de Custódio Mattos, ocorre o realocamento dos desfiles que se realizam durante os anos de 1996, 1997 e 1998 no novo palco: a Avenida Brasil, margem direita do Rio Paraibuna. As campeãs são a Unidos do Ladeira duas vezes (1996 e 1998) e o Partido alto em 1997. É neste ano que a prefeitura inova e estabelece uma premiação aos principais destaques do carnaval. Intitulada de “Pandeiro de Ouro”, premiou além das categorias analisadas no desfile, o “destaque”, “melhor intérprete” e “ala das baianas”. “A

premiação deu certo e foi apreciada pelos componentes das Escolas, tanto que é realizada até os dias atuais” (ALMADA, 2014: p. 95).

Já em 1999, novamente, mais um ano sem desfilar. “Em 1999, devido a dificuldades financeiras enfrentadas pela prefeitura, as Escolas não desfilaram e a Funalfa promoveu um Carnaval popular alternativo, com desfiles de blocos, bandas e bailes populares” (CARVALHO; ROSA, 2012: s/p).

Em 1999, a Funalfa investiu 45 mil reais no Carnaval da cidade, pois novamente, não aconteceu os desfiles das Escolas de Samba. O valor foi passado para blocos e bailes populares. O caderno "Boa Viagem" da Tribuna de Minas, lança um especial sobre as praias mais procuradas pelos juizforanos naquele ano, que são o litoral do Espírito Santo e Rio de Janeiro. As viagens para o Nordeste também aumentaram nesse período (ALMADA, 2014: p. 95).

Importante destacar que, o movimento de saída de parte da população da cidade no período do carnaval acontece desde o início da década de 1980, quando começou a constatar que “a chegada de turistas é menor e a população passa a preferir viagens para o litoral do que a permanência na cidade” (ALMADA, 2014: p. 89).

2.6.3. De volta à Avenida Rio Branco

Em 2000, o carnaval recebe “o apoio dado pela CDL – Câmara dos Dirigentes Lojistas, que realizou campanha para que os juizforanos ficassem na cidade durante a folia”.Resultando em um incremento nas vendas do setor ligado às vendas carnavalescas de 50% em relação à 1999 (CARVALHO; ROSA, 2012: s/p). Mais que isso, FUNALFA e prefeitura retornam com o carnaval para a Avenida Rio Branco. O esforço resultou em queda nos números de embarques comparados à 1999 (ALMADA, 2014: p. 96). A Real Grandeza sai campeã neste ano.

Durante o novo período de desfiles na Avenida Rio Branco, se sagraram campeãs as escolas Unidos do Ladeira (2001 e 2004), Turunas do Riachuelo (2002 e 2003) e, em 2005, uma confusa divisão do primeiro lugar entre Juventude Imperial, Real Grandeza e a Unidos do Ladeira. Para além houveram inovações no que se refere aos blocos da cidade. A Banda Daki adquire um pequeno trem para que os foliões que tivessem crianças pequenas pudesse aproveitar o bloco. As batalhas de confetes voltam a acontecer na Praça Antônio Carlos e a prefeitura passa a entregar a chave da cidade ao Rei Momo em evento realizado no Parque Halfeld, como rito de entrada no período de festa. E em 2004, trinta e dois anos após a sua

fundação, a Banda Daki “é tombada como Patrimônio Cultural de juiz de Fora” (ALMADA, 2014: p. 96-98).

2.6.4. Queda

De volta ao cargo de prefeito em 2005 Carlos Alberto Bejani, mantém no mesmo ano a Avenida Rio Branco como passarela dos desfiles. No entanto, em 2006, os desfiles retornam à Avenida Brasil, nos fundos do Museu Mariano Procópio, onde permaneceu até 2015. Deste momento em diante, o carnaval de Escolas de Samba que parecia, de alguma forma, se restabelecer, entra em acelerado declínio.

Enquanto a cidade assiste a um pequeno reinado da Unidos do Ladeira, campeã em 2008, 2009, 2010. 2012, 2013 e 2014, o número de pessoas que saem da cidade nesse período aumenta. A prefeitura cria alguns projetos tentando evitar o aumento da crise carnavalesca.

Novamente, em 2006, os números de juizforanos que vão viajar aumenta, tendo uma estimativa de 80 mil pessoas saindo da cidade no feriado. Para que o restante da população vejam o que será preparado pelas Escolas antes do Carnaval, e até mesmo sua atuação na avenida, a Prefeitura cria dois projetos: o "Juiz de Fora com Arte", onde a cada sexta-feira, iniciando em janeiro, cada agremiação da cidade se apresenta no Parque Halfeld, com intérprete, bateria, rainha de bateria, mestre-sala e porta- bandeira e alguns integrantes fantasiado; e o "Viver Juiz de Fora – Descobrindo essa cidade", onde um grupo de pessoas conhece a história do Carnaval no município, assistindo a telejornais de João Carriço que falam da folia de antigamente e, logo em seguida, saindo para um passeio pelos barracões de todas as Escolas de Samba de Juiz de Fora (ALMADA, 2014: p. 100-101).

Em 2011, durante a prefeitura de Custódio Mattos, a prefeitura lança o projeto “Corredor da Folia”. Inspirado em outro projeto de sucesso chamado “Corredor Cultural” que realiza atividades diversificadas de arte durante alguns dias, o projeto carnavalesco promove por diversos pontos da cidade eventos carnavalescos descentralizados, “como bares, casas de show, Praça Antônio Carlos, Praça da Estação, no Centro Cultural Bernardo Mascarenhas (CCBM) e outros”. As atividades variam de grupos e blocos locais à artistas renomados nacionalmente (ALMADA, 2014: p. 101).

2.6.4. Ressurgimento dos Blocos

Em setembro de 2015, após intensas negociações da Liga das Escolas de Samba de Juiz de Fora e a Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage (FUNALFA), é decidido que os desfiles de carnaval não aconteceriam no ano de 2016, simbólico, devido às comemorações dos 50 anos

desde o primeiro concurso. Essa decisão tomada em um momento de corte do repasse de verbas entre a união e as cidades, justificado pelo momento de crise política e econômica que assolava o país durante o mandato da então presidenta Dilma Rousseff. A política de contenção de gastos do prefeito Bruno Siqueira entendeu como solução o corte de mais de 50% da verba repassada no ano anterior51 a Blocos e Escolas de Samba da cidade, inviabilizando diversas apresentações. No ano seguinte, em 2017, os desfiles são retomados, mesmo com o protesto de algumas escolas de samba, como a Unidos do Ladeira e a Juventude Imperial que se recusaram a desfilar sob as condições impostas pela prefeitura, que mantém o repasse de verbas reduzido e transfere o local dos desfiles, que antes se realizavam na Avenida Brasil, principal via de ligação entre as zonas norte e noroeste ao centro da cidade, para o Parque de Exposições da cidade, situado no bairro Jóquei Clube. Soma-se a isso, alegada falta de estrutura e segurança às agremiações colocadas pelas desistentes52. Convém destacar aqui que o número de espectadores nos desfiles daquele ano seguiu a tendência de queda de público aos quais vinham sendo registrados desde a atitude de antecipação do carnaval na cidade.

Essa proposta de antecipação da festa na cidade foi colocada em prática em 2013 e teve inspiração em outros exemplos de cidades brasileiras. A justificativa era pautada no auto índice de viagens registradas para cidades menores do entorno nos chamados “carnavais de cidades pequenas” ou para o litoral em cidades costeiras próximas à zona da mata mineira por pessoas interessadas de aproveitar o recesso para o turismo ou descanso. No primeiro ano, a antecipação teve uma avaliação positiva das escolas de samba, o que não foi realidade nos anos seguintes, onde registrou diversas baixas de público (FUNALFA)53.

Em 2018, além da nova recusa aos desfiles por parte da Liga das Escolas de Samba de Juiz de Fora, soma-se a esse fator a proibição através da Associação de Moradores do Bairro São Mateus do desfile do bloco “Meu Concreto Tá Armado” (MORAIS, 2018: s/p).