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A psicologia no estádio 4: Cognitivismo (Processamento da Informação)

DO CONCEITO DE MARCA

6.6 Estádio 4: Customer-driven marketing

6.6.2 A psicologia no estádio 4: Cognitivismo (Processamento da Informação)

A investigação em psicologia persuasiva irá evoluir nesta etapa em resultado da constatação que a investigação precedente tratava de forma demasiado simplista as relações entre receptores e mensagens, chegando frequentemente a resultados diferentes (León, 1992). Tendo por objectivo melhorar os modelos atitudinais disponíveis, e desenvolver novos constructos susceptíveis de explicar as conexões cognição-atitude e atitude-comportamento, uma das linhas de investigação desenvolvida propõe-se dar continuidade à corrente ‘tradicional’ em psicologia e psicometria das atitudes e da mudança de atitudes que caracteriza o decénio anterior (Carrera Villar, 2000). Esta tendência, prototipicamente desenvolvida por Fishbein, tem por base a noção de que as atitudes são demasiado gerais, nem sempre se reflectindo em comportamentos. Ao

conceito de atitude, Fishbein virá acrescentar o conceito de intenção, o qual considera virtualmente equivalente ao comportamento. Esta abordagem, formalizada no modelo de Fishbein e Ajzen (1975), vem postular que o comportamento (e.g. a compra de uma marca) pode ser predito em função da atitude do indivíduo em relação à acção

comportamental e às normas sociais, susceptíveis de influenciar a probabilidade de concretização do comportamento.

Uma segunda corrente de investigação característica desta época, designada por Carrera Villar (2000) como “cibernética-estatística”, propõe-se formular o

comportamento do consumidor em termos de resolução de problemas do ponto de vista do processamento da informação, entendida ‘informação’ como quaisquer estímulos susceptíveis de ajudar o indivíduo a construir significados e a guiar as suas acções. É no final dos anos 70 que este paradigma irá chegar de forma sistemática à investigação do consumidor, com os trabalhos de Bettman (1970), autor que desde a primeira página irá marcar o programa de investigação neste âmbito (León, 1992), e a quem se reconhece o esforço de unificação desta corrente de investigação com as outras coexistentes à época. O sucesso da empreitada irá levar nos anos 80 à confluência das diferentes linhas de investigação num único modelo de processamento de informação do consumidor (Consumer Information Processing ou CIP) (Carrera Villar, 2000). Genericamente caracterizada pela unificação das tendências metodológico-conceptuais, pela atomização dos objectivos das investigações e pelo protagonismo da “teoria atitudinal de resposta cognitiva” (Carrera Villar, 2000), a lógica CIP incide, segundo León (1992), sobre os seguintes conceitos: atenção, intensidade de processamento, memorização e recordação, avaliação e utilização da informação com vista às decisões de consumo. Em seguida apresentam-se de forma necessariamente sumária os principais contributos desta abordagem na perspectiva de León (1992).

(i) Motivação para o consumo de produtos e motivação processual da publicidade Um primeiro efeito da bibliografia CIP é o de permitir distinguir a motivação associada ao consumo de produtos da motivação associada ao consumo da informação sobre o produto. Podendo as motivações associadas ao consumo de produtos assumir dois tipos – utilitário-funcionais e de expressão social (simbólicas) – o facto de serem representadas na mensagem publicitária não implica o consumo do anúncio. A principal

motivação para o consumo dos meios consiste no entretenimento, tendo as finalidades funcionais (e.g. adquirir informação) um carácter marginal (não só em televisão como, nos dias de hoje, também em imprensa).

(ii) Mediadores do processamento da informação

Os modelos CIP actuais integram os dois níveis motivacionais referidos no ponto anterior com vista à predição da probabilidade de processamento da informação publicitária (MacInnis e Jaworski, 1989; Petty e Cacioppo, 1996, 1986). Porém, em conjunto com estes dois níveis motivacionais incluem igualmente um repertório de outras variáveis mediadoras do processamento como a oportunidade de processar e a capacidade do indivíduo, susceptíveis de explicar limitações ou mesmo impedimentos ao nível do processamento.

(iii) Nível de processamento

O conceito de nível de processamento merece atenção especial em virtude de se referir a um fenómeno real que se traduz no processamento parcial a que é submetida a esmagadora maioria dos anúncios que são vistos em condições naturais, em contraste com o processamento intenso que ocorre quando voluntariamente procuramos obter informação sobre os produtos. Obviamente que no caso de processamento parcial os níveis de memorização e de detalhe da memorização são fracos. Esta noção levou Greenwald e Leavitt (1984) a postular quatro níveis de intensidade de processamento ou percepção da publicidade, desde o mais elementar ou de menor efeito semântico até ao mais complexo ou de maior elaboração cognitiva.

(iv) Memorização

A memorização constitui porventura uma das linhas de investigação CIP mais estudadas. No entanto, embora o mundo profissional se tenha debruçado sobre a relação entre recordação da publicidade e comportamento de consumo (Haley e Baldinger, 2000; Jones, 1995), na perspectiva cognitivista o habitual consiste em analisar, como Keller (1987), as relações entre elementos da cadeia processual à margem do

comportamento (seja devido a um enfoque ultra cognitivista, seja devido à falta de dados de consumo relacionados com dados de processamento da publicidade). A partir da lógica CIP muitos conceitos ingénuos sobre a memorização irão ser reformulados:

(a) a memória não constitui um depósito passivo da informação recebida do exterior, mas um espaço construtivo que armazena uma mistura entre a envolvente externa e a interna; (b) o efeito emocional de uma mensagem é guardado de forma mais profunda e duradoura do que os seus detalhes informativos; (c) é necessário distinguir entre

memória de curto e de longo prazo, donde as respostas cognitivas no momento da exposição publicitária poderem não influenciar o comportamento (situação em que não passariam à memória de longo prazo); (d) a construção de imagens de marca depende mais de princípios associativos do que de elaborações cognitivas autónomas dos

indivíduos. Petty e Cacioppo (1996) identificaram a existência de duas vias persuasivas – central e periférica – a primeira dependente da informação estrita sobre atributos, e a segunda das formas retóricas, sendo possível que a segunda seja muito mais

determinante do que os autores preconizavam.

De uma forma geral, os desenvolvimentos da teoria CIP irão apontar para a existência de uma ampla diversidade de estratégias de processamento (e atitudes resultantes) cuja discussão está fora do âmbito deste trabalho. Relevante neste contexto é o facto de estas teorias serem unânimes no que se refere à definição do consumidor como um ente cuja capacidade de processamento é limitada. Este facto, em conjunto com a enorme quantidade de informação e decisões com que é obrigado a lidar no seu dia a dia, leva-o a recorrer a estratégias simplificadoras de processamento, denominadas estratégias heurísticas. Aplicada à percepção da publicidade, este tipo de estratégia traduz-se na atenção a um elemento informativo simples, entre o conjunto de estímulos disponíveis, com base no qual o consumidor irá desenvolver toda a estrutura afectiva em relação ao produto. Exemplos destes elementos na publicidade são os atributos da fonte (experiência, credibilidade e atractividade), susceptíveis de influenciar o processamento periférico de Petty e Cacioppo (1996, 1986) (designação que os autores preferem a processamento heurístico) ou a novidade do conteúdo e/ou estilo expressivo, relevante na relação com a recordação (Burnkrant e Unnava, 1987) e com o consumo (Lodish et al., 1995).

Ainda no âmbito da mecânica heurística têm entretanto vindo a desenvolver-se algumas linhas de investigação, em particular no campo de tradições que se julgavam há muito abandonadas: Gorn (1982) e Stuart et al. (1987) recuperam o conceito de

condicionamento clássico estudando a ‘música’ como estímulo condicionante; León (1989), entre outros, o conceito de familiaridade, o qual por sua vez vem reforçar o papel da repetição; e Mitchell e Olson (1981) o de atitude relativamente ao anúncio (ou agrado, na terminologia profissional), percebida como mais um factor mediador da atitude em relação ao produto. Em boa verdade, a mecânica a que a psicologia

académica chama processamento heurístico tem sido usada pelos criativos publicitários desde sempre, estando na génese da principal fórmula expressiva usada pela

publicidade: a hipérbole. Não sendo interpretável literalmente, o ‘exagero’ publicitário tem por objectivo transmitir uma confiança ilimitada em produtos e serviços mediante frases e imagens simples e eufóricas dispensando o recurso a argumentos detalhados sobre atributos e qualidades (León, 1992).

É ainda nesta etapa que começa a aparecer investigação dedicada às emoções numa perspectiva global e processual. Formalmente (se bem se lembram) a emoção havia sido integrada na publicidade por intermédio do modelo da hierarquia dos efeitos de Lavidge e Steiner (1961). Porém, nesta primeira fase, o estudo das emoções estava confinado à análise das mensagens que recorriam a emoções específicas como o medo (Ray e

Wilkie, 1970) ou o humor (Sternthal e Craig, 1973). De facto, até aos anos 80, a emoção enquanto mediador persuasivo recebeu muito pouca atenção. No entanto, os estados e alterações emocionais irão gradualmente começar a assumir um papel específico no âmbito do processamento da informação, dando origem ao estudo sistemático das emoções, em particular no campo da psicologia cognitiva aplicada ao consumo e à publicidade. Há que reconhecer, não obstante, que nesta primeira fase, embora o papel da emoção fosse diferenciado era ainda considerado como sendo suplementar ao

processamento da informação (Holbrook e Hirschman, 1982). Neste contexto a emoção tende a aparecer como anexa ao processamento da informação, convertendo-se para alguns em sinónimo de ‘agrado’ relativamente ao anúncio (Shimp, 1981). Na realidade, a escola mais influente à época via a emoção como uma forma de facilitar o

processamento da informação (Ray e Batra, 1983) a diferentes níveis – atenção,

processamento, avaliação (mais favorável) e memorização – ideia que veio com o tempo a converter-se numa espécie de ‘lei’ do funcionamento da emoção que irá chegar até aos nossos dias.

Pese embora o estudo das emoções se inicie ainda nos anos 80, será somente nos anos seguintes (até ao presente) que se irá instalar como corrente de investigação com Journal of Advertising Research a dedicar ao tema honras de edição especial em duas ocasiões distintas (Junho de 2004 e Março de 2006). No entanto, estes trabalhos

integram já o derradeiro (e actual) estádio do marketing, o estádio 5, o próximo da nossa lista.