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DO CONCEITO DE MARCA

6.9 Timeline da publicidade

6.1 Introdução

Como dizíamos no final do capítulo anterior, se entendida como dimensão

constituinte do sistema marca, a publicidade, no seu processo evolutivo, não pode deixar de reflectir a evolução da própria marca (Grassl, 1999). De facto, segundo Goodyear (1996), a publicidade segue o mesmo padrão evolutivo da marca, caracterizado pela inflexão da ênfase no fabricante para a ênfase no consumidor ou, dito de outras formas, do produto para a marca, dos atributos-produto para os benefícios-consumidor, do racional para o emocional, do real e particular para o abstracto e geral, ou da noção de consumidor passivo e “vítima” para a noção de consumidor “activo” e participante. Na realidade, para a autora (Goodyear, 1999), (i) o tipo de abordagem publicitária, e portanto o papel da publicidade no contexto das actividades das organizações, constitui mesmo um dos indicadores susceptíveis de discriminar entre estádios evolutivos do marketing, a par de outros indicadores como (ii) o papel das marcas, (iii) o equilíbrio de poder entre fornecedores de bens e serviços e consumidores, (iv) o método de definição dos alvos (targeting) e (v) o tipo de investigação (research).

Segundo Goodyear (2001, 1999, 1996, 1991) são cinco os estádios de literacia publicitária, correspondentes a outros tantos estádios de evolução do marketing e da marca1. Definidos numa perspectiva sincrónica pela autora, estes estádios correspondem a cinco níveis de desenvolvimento que coexistem no mundo ‘actual’. Tendo o último trabalho da autora sido publicado já há seis anos (Goodyear, 2001), o uso da expressão

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‘actual’ poder ser considerado abusivo; não obstante, o nosso interesse pelos estádios de Goodyear não decorre da sua sincronicidade com o momento actual, mas do que estes encerram de diacrónico. De facto, segundo Goodyear (2001) o marketing (a marca e a publicidade) evolve ao longo do tempo de uma forma consistente e previsível

(perspectiva longitudinal), resultando as diferenças entre os cinco estádios de

desenvolvimento que coexistem no mundo actual (perspectiva transversal) do ‘degrau’ em que cada país se encontra na ‘escada evolucionista’. Alguns países e sectores de actividade vão ‘à frente’, ou são mais sofisticados, do que outros. Porém, com o tempo, os menos sofisticados, em resultado do seu próprio desenvolvimento, irão acabar por adoptar as convenções dos que lideram a marcha evolucionista.

Na perspectiva de Goodyear (1999), o nível de sofisticação do marketing depende primordialmente de dois factores: (i) a intensidade da concorrência entre produtos e (ii) o nível de conhecimento dos consumidores acerca dos mesmos. As diferenças culturais podem também introduzir variantes ao processo evolutivo; contudo, estas variantes são sensíveis sobretudo ao nível das questões de estilo. O processo evolutivo, em si, é imparável – tem um passado, um agora e um futuro – se bem que em relação a este não possamos senão especular (a morte da marca e/ou publicidade, prematuramente

anunciada já em diversas ocasiões, é exemplo deste exercício). Nas secções seguintes iremos debruçar-nos sobre a parte do processo que já conhecemos, desde o passado até ao agora, correspondente aos cinco estádios de literacia do marketing e,

necessariamente, da publicidade, identificados por Goodyear (2001, 1999, 1996, 1991); a saber: (i) Estádio 1: Venda de artigos sem marca (commodities selling). (ii) Estádio 2: Marketing (primitivo). (iii) Estádio 3: Branding (clássico). (iv) Estádio 4: Customer- driven marketing. (v) Estádio 5: Marketing pós-moderno. A apresentação segue uma lógica, relativamente comum a todos os estádios, que tem por objectivo o

enquadramento de cada estádio em face (i) do nível de desenvolvimento da abordagem publicitária e do equilíbrio de poder entre produtores e consumidores que irá conduzir à emergência da sociedade de consumo, (ii) das relações entre psicologia e publicidade, pois não obstante a investigação académica sobre publicidade e a actividade profissional parecerem frequentemente distantes, na realidade os publicitários são influenciados pela academia por intermédio dos estudos de mercado e dos curricula escolares e (iii) das

técnicas aplicadas ao estudo da publicidade e do consumo pelo sector profissional, em particular no que se refere ao tipo de investigação levada a cabo por empresas de estudo de mercado, anunciantes e agências (research, na terminologia profissional) e ao

método de definição de alvos (targeting).

Antes, porém, apresentamos já de seguida um breve resumo das origens da publicidade.

6.2 As origens da publicidade

A história da publicidade está ligada à história das cidades. Onde há uma cidade existe comércio, e onde há comércio existe a necessidade de chamar a atenção, ainda que seja de um modo tão rudimentar quanto uma fogueira que se acende na praia para ‘anunciar’ a chegada de um navio mercante. A existência de publicidade, incluindo as suas manifestações mais primitivas, indicia portanto um determinado nível de

civilização, urbana e comercial. Porém, os povos artífices e comerciantes da antiguidade recorriam já a formas arcaicas de publicidade, em que predominava a expressão oral. Nesta perspectiva pode afirmar-se que a origem da publicidade é tão antiga quanto a da marca1. Contudo, não obstante a importância destes anúncios primordiais, os mesmos não constituem publicidade em sentido estrito, pelo menos na concepção actual (Eguizábal, 1998).

A origem da publicidade, como a conhecemos hoje, está marcada por uma invenção de especial relevância ocorrida em 1447 e atribuída a Gutenberg – a impressão com tipos móveis – autêntica pedra angular de uma nova era nas comunicações humanas e institucionais (Eguizábal, 1998). Apenas trinta anos mais tarde (1477) surge o primeiro anúncio de imprensa em língua inglesa. Por esta altura, no entanto, o uso de painéis publicitários afixados aos edifícios públicos era já relativamente comum. A meados do século XVII os jornais britânicos exibem uma variedade de anúncios a produtos como livros e jornais, tabelas de portes de envio dos comerciantes ou patentes medicinais (Collins e Skover, 1993). Nas (então) colónias americanas o primeiro anúncio de

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imprensa surge em 1704, no Newsletter de Boston, o primeiro semanário americano com êxito. Depois deste, os lançamentos de títulos (jornais e revistas) nesta zona do globo irão suceder-se a bom ritmo2. A partir do final do século XVII, e durante o XVIII, as mensagens publicitárias mais frequentes diziam respeito a sabonetes, penas de ave, livros, vinhos, cosmética e patentes medicinais (Eguizábal, 1998). Casos de publicidade mentirosa e charlatanismo viriam entretanto a criar problemas ao normal

desenvolvimento da actividade publicitária, a qual só muito lentamente se irá libertar da má reputação dos primeiros tempos.

A partir do final do século XVIII, com a expansão da marca, estão criadas as condições para o desenvolvimento da publicidade. Num primeiro momento, as marcas aparecem frequentemente ligadas a produtos obtidos a partir da mistura de outros produtos (molhos, licores, elixires e pseudo-fármacos). Do ponto de vista dos

produtores havia, portanto, que fabricar em grandes quantidades, para evitar ficar com o dinheiro ‘preso’ a stocks de ingredientes, surgindo as marcas neste contexto com o propósito de identificar os produtos finais, e a publicidade com o de impulsionar o seu escoamento. Porém, a maior parte dos bens era ainda vendida como mercadorias sem identificação (Eguizábal, 1998).

6.3 Estádio 1: Venda de mercadorias (commodities selling)