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Aplicações da psicologia das atitudes à publicidade

DO CONCEITO DE MARCA

6.4 Estádio 2: Marketing (primitivo)

6.5.3 Aplicações da psicologia das atitudes à publicidade

A investigação levada a cabo nas décadas de 60 e 70, a par das enormes

dificuldades em relacionar aspectos determinantes do consumo como a personalidade das marcas com a sexualidade básica, irá levar a uma busca de respostas em áreas mais sociológicas do que psicológicas (Eguizábal, 1998) – ‘expulsando’ os freudianos do terreno, a sociologia estabelece relações com a publicidade. Alguma confusão que rodeava o motivacionismo, amplificada pela publicação do livro The Hidden Persuaders a que nos referimos antes, favorecia também a desconfiança em relação a estas técnicas.

A tendência ‘socializante’ diluía a diferença entre as necessidades, entendidas como escolhas que o destino biológico nos obriga a fazer, e os desejos expressos nas escolhas que fazemos fruto da nossa liberdade, porquanto uma vez satisfeitas as necessidades, remanesce o desejo de estimulação positiva susceptível de elevar o estado emocional do homem, nem que seja temporariamente, acima do nível de equilíbrio. A ciência social vem também chamar a atenção para a necessidade de integrar novas variáveis no processo publicitário. Até então partia-se do pressuposto que uma vez estabelecido o contacto com a publicidade não haveria outros factores intervenientes entre indivíduo e mensagem. Porém, alguns investigadores, como Pierre Martineau42, acreditam que os fenómenos sociológicos são o pano de fundo sobre o qual a publicidade actua. Segundo o próprio Martineau ([1957] 1971), os indivíduos raramente actuam de forma isolada, sem levar em consideração a perspectiva de amigos, colegas de trabalho e grupos de referência. Neste contexto a classe social, e os seus standards, actuam como variáveis intervenientes entre a comunicação de massas e a audiência.

Esta influência, a par do aparecimento dos computadores nos anos 60, acarreta mudanças profundas no sector publicitário. Por um lado, o centro de gravidade da investigação publicitária desloca-se das agências (muitas delas partidárias da análise motivacional e das investigações qualitativas) para os anunciantes (cujos Directores de Investigação procedem em geral de meios mais propensos para a ciência económica e a estatística). As agências, não prescindindo do estudo das emoções do consumidor (incluindo os sentimentos que estes têm mais dificuldade em expor) mantêm a tradição de pesquisa qualitativa, recorrendo a técnicas projectivas e a outras metodologias de inspiração psicoanalítica (Goodyear, 1999). Porém, em contraste com as agências, anunciantes e empresas de estudos de mercado irão basear a sua investigação na utilização do computador e na redução dos problemas de marketing a fórmulas matemáticas. Neste quadro, a investigação motivacional cede lugar à ‘investigação operacional’, no pressuposto de que o efeito da publicidade pode ser reduzido a

fórmulas matemáticas mediante a adaptação das questões mais complexas à modalidade ‘sim-não’ acessível às calculadoras electrónicas e os anunciantes, sempre receosos relativamente à forma como as agências investem o seu dinheiro, começam a

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desenvolver esquemas de controlo da eficiência da publicidade43. Em face deste cenário, alguns dos grandes publicitários da época, como Ogilvy e Bernbach manifestam sinais de ‘rebelião’ contra o excesso de dados e de controlo. A vaga de críticas aumenta quando no final dos 60, e sobretudo já nos 70, se começam a fazer sentir as primeiras consequências dos movimentos contracultura, em resultado do aparecimento de categorias não tipificadas de consumidores e da dissolução de algumas estruturas sociais que punham em causa a validade de taxionomias e investigações at então livres de suspeição (Eguizábal, 1998). As variáveis sócio-demográficas são ca vez menos discriminantes e as recompensas emocionais atraem mais que os benefícios materiais. Em face deste cenário, o universo publicitário prepara nova ofensiva: as abordagens psi

é da

cológicas.

As abordagens psicológicas constituem a matéria-prima do branding clássico, sendo neste estádio que surgem os sistemas psicográficos (de atitudes ou tipos personalísticos) desenvolvidos com o propósito de melhorar o targeting dos

destinatários das mensagens. Estes, não obstante, são ainda percepcionados como tendo valores fixos e hábitos de compra estáveis (Goodyear, 2001, 1999). Um dos enfoques psicográficos mais utilizados pela publicidade foi o VALS (Values and Life Styles)44. No essencial, este estudo, composto por uma combinação de dados demográficos e de tendências atitudinais, resultantes da confluência de várias perspectivas (as teorias da psicologia do desenvolvimento, dados obtidos a partir da investigação de mercados), realçava o papel dos valores, recém-(re)descobertos pela psicologia, como factor explicativo dos comportamentos de consumo.

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A Procter & Gamble, por exemplo, uma das empresas que mais investe nesta área, desenvolveu um conjunto de testes levado a cabo na Burke Research e zelosamente guardado pela companhia e as suas agências.

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Não obstante a relevância do VALS muitos outros sistemas irão aparecer nesta fase (Estilos de Vida, Geodemográficos, Fases da Vida) 45 com o objectivo de ajudar ao targeting dos alvos publicitários, evitando desta forma o desperdício de ‘munições’ (Eguizábal, 1998).

6.5.4 Os últimos anos do estádio 3

A crise do petróleo nos anos 70, e o final de uma época de prosperidade e de ilusões, são o sinal de que depois de uma época de ‘vacas gordas’ em publicidade, que tinha durado quase 25 anos, se avizinhavam tempos difíceis. As mulheres, que até então tinham constituído a audiência preferencial da publicidade, voltavam às fábricas e aos escritórios, ficando fora do alcance dos publicitários durante a maior parte do dia. Nos EUA o fracasso da guerra do Vietnam deixa na população americana um gosto amargo e uma sensação de inutilidade perante a morte de muitos jovens, e o caso Watergate gera a desconfiança em relação ao meio político. Neste contexto, a publicidade, epítome do sonho americano, torna-se um alvo fácil da ira de uma geração profundamente desiludida. Os publicitários, que haviam mostrado o paraíso, fruto da explosão demográfica e da bonança económica do pós-guerra, deparam-se agora com um meio hostil que rechaça o materialismo e busca a realização pessoal. Para chegar a estes herdeiros da contracultura a publicidade reinventa-se, tornando-se soft, recorrendo a conceitos como ‘simplicidade’ ou ‘integridade’, permitindo-lhes enfim manter o seu estilo de vida ‘marginal’. Porém, em alguns anos, os jovens rebeldes dos anos 60 irão converter-se em profissionais adultos de grande poder aquisitivo (yuppies). Estes nascidos em pleno baby boom são numerosos, foram criados longe dos fantasmas da crise e da guerra e estão acostumados a gastar (Eguizábal, 1998). Entravávamos nos anos 80.

45 Leo Shapiro, por exemplo, baseia a sua abordagem nos costumes alimentares dos indivíduos, segundo

o número de refeições tomadas dentro ou fora de casa, ou em casa sem a presença da família, etc.. Já o ACCORN (A Classification of Residential Neighbourhoods) constitui um sistema geodemográfico. O sistema alemão Fases da Vida considera, por outro lado, ser a idade o factor determinante (Eguizábal, 1998).