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LIVRO II – PARTE ESPECIAL – DECADÊNCIA TRIBUTÁRIA E SUA

2 DECADÊNCIA E O VEÍCULO INTRODUTOR APROPRIADO

2.4 Decadência tributária e Lei Complementar

Em que pese tratar-se de tema objeto de grandes debates na comunidade jurídica, inclusive com reflexos de inegável importância, como a edição da Súmula Vinculante nº 8 pelo Supremo Tribunal Federal – assunto que abordaremos amplamente no decorrer deste trabalho –, adiantamos nosso posicionamento para expor, desde já, que entendemos que após a promulgação da Constituição Federal de 1988, por força do disposto em seu artigo 146, III, b, as normas acerca de decadência tributária devem ser introduzidas no direito positivo, tendo a lei complementar como seu exclusivo veículo introdutor.

Vejamos novamente o que enuncia o artigo 146 da CF:

Art. 146. Cabe à lei complementar:

I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; […].106

Nesse sentido também a lição de Paulo de Barros Carvalho, para quem

106 BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 13 mar. 2013 (grifos nossos).

[…] decadência e prescrição tributárias, por exemplo, são matérias que o constituinte considerou especiais e merecedoras de maior vigilância, demandando disciplina mais rigorosa, a serem introduzidas no ordenamento mediante veículo normativo de posição intercalar em decorrência de seu procedimento legislativo mais complexo.107

Se o texto constitucional adstringiu o tratamento da decadência à edição de norma geral de direito tributário e, portanto, à necessidade de lei complementar, o que fez foi colocar todas as matérias que tocam ou abordam esse tema sob a reserva da norma geral.

Corroborando tal assertiva, dignas de transcrição são as palavras de Rafhael Fratari:

Não faria sentido exigir lei complementar (norma geral) para normatizar o crédito tributário, mas permitir que as causas de sua extinção da suspensão de exigibilidade fossem alteradas e manejadas por lei ordinária. Assim, a norma geral não é necessária apenas para a definição dos institutos descritos no art. 146, III, mas para a conformação de todo o seu regime jurídico, entendido como o plexo de normas que os regulam. Portanto, esses temas não estão ao talante do legislador ordinário, eis que foram previstos no Código Tributário Nacional e, portanto, só podem ser manejados por meio de normas gerais, o que implica dizer que necessitam de lei complementar.108

No mesmo sentido é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal:

Ementa: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA TRIBUTÁRIAS. MATÉRIAS RESERVADAS A LEI COMPLEMENTAR. DISCIPLINA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. NATUREZA TRIBUTÁRIA DAS CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURIDADE SOCIAL. INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 45 E 46 DA LEI 8.212 /91 E DO PARÁGRAFO UNICODO ART. 5º DO DECRETO-LEI 1.569 /77. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. I. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA TRIBUTÁRIAS. RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. As normas relativas à prescrição e à decadência tributárias têm natureza de normas gerais de direito tributário, cuja disciplina é reservada a lei complementar, tanto sob a

107 Marketing de incentivo e seus aspectos tributários. Revista de Direito Tributário. São Paulo:

Malheiros, n. 96, 2007.

Constituição pretérita (art. 18, § 1º, da CF de 1967/69) quanto sob a Constituição atual (art. 146, b, III, da CF de 1988). Interpretação que preserva a força normativa da Constituição, que prevê disciplina homogênea, em âmbito nacional, da prescrição, decadência, obrigação e crédito tributários. Permitir regulação distinta sobre esses temas, pelos diversos entes da federação, implicaria prejuízo à vedação de tratamento desigual entre contribuintes em situação equivalente e à segurança jurídica. II. DISCIPLINA PREVISTA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. O Código Tributário Nacional (Lei 5.172 /1966), promulgado como lei ordinária e recebido como lei complementar pelas Constituições de 1967/69 e 1988, disciplina a prescrição e a decadência tributárias.

[…].109

Importante mencionar, ainda, os abrangentes estudos realizados por Renata Elaine Silva110, que dão conta que, anteriormente à Constituição de 1988, vários instrumentos normativos que delimitavam regras de decadência foram criados e publicados por meio de decretos-lei e também por lei ordinária.

Apenas o Código Tributário Nacional (Lei 5.172/66), contudo, foi recepcionado pela Constituição de 1988 como norma geral em matéria de legislação tributária sobre decadência.

No ponto, precisa é a lição de Paulo de Barros Carvalho:

Não excede recordar que a Lei n. 5.172/66 – Código Tributário Nacional – foi aprovada com lei ordinária da União, visto que naquele tempo a lei complementar não apresentava o caráter ontológico-formal que só foi estabelecido com o advento da Constituição de 1967. Todavia, com as mutações ocorridas no ordenamento anterior, a citada lei adquiriu eficácia de lei complementar, pelo motivo de ferir matéria reservada, exclusivamente, a esse tipo de ato legislativo. E, com tal índole, foi recepcionada pela Constituição de 1988.111

109 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº

556.664/RS. Relator: Ministro

Gilmar Mendes. Julgamento: 12 jun. 2008. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação: DJU 14 nov. 2008.

110 Em Curso de decadência e de prescrição no direito tributário: regras do direito e segurança

jurídica (São Paulo: Noeses, 2013).

Outras leis ordinárias que abordavam o tema decadência, anteriores à nova constituição não receberam o mesmo status que o Código Tributário Nacional e não podem dispor da matéria de forma incompatível com o que dispõe o CTN. Eventual lei ordinária poderia servir apenas para esclarecer as disposições do CTN, sem alterar, modificar ou revogar seu conteúdo e alcance.

Concluímos, assim, que os enunciados legislativos que tragam em seu conteúdo regras de decadência, seja disciplinando direitos, deveres ou prazos, devem ser introduzidos em nosso ordenamento jurídico, tendo a lei complementar como veículo introdutor exclusivo.