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LIVRO II – PARTE ESPECIAL – DECADÊNCIA TRIBUTÁRIA E SUA

1.6 NATUREZA JURÍDICA

1.6.1 Norma de Estrutura ou Norma de Conduta

Autores de grande renome, como Lourival Vilanova, Norberto Bobbio e Paulo de Barros Carvalho, trabalham, na doutrina da teoria geral do direito, com a distinção das regras jurídicas em dois grandes grupos: normas de comportamento, também denominadas normas de conduta, e normas de estrutura, também conhecidas por normas de organização.

Normas de comportamento seriam aquelas diretamente voltadas para disciplinar a conduta das pessoas. Modalizam os comportamentos como obrigatórios, permitidos e proibidos.

Já as normas de estrutura, por sua vez, seriam aquelas que regulam a produção, modificação e extinção de outras normas. São, exemplificativamente, as normas que disciplinam o órgão competente, a matéria e o procedimento próprio para a criação de novos enunciados jurídicos.

Nas palavras de José Artur Lima Gonçalves:

As normas jurídicas, quanto à função que desempenham dentro do sistema de normas, classificam-se em normas de estrutura e normas de conduta. As normas de estrutura são aquelas que dizem respeito à atribuição de competências, ao método de produção de outras normas e à forma de organização e relacionamento das normas jurídicas entre si, ao passo que as de conduta são as que contêm prescrições dirigidas ao comportamento humano.84

Sobre essa distinção, Aurora Tomazini de Carvalho pontua que, na verdade, toda e qualquer norma jurídica tem como objeto disciplinar condutas entre sujeitos, o que tornaria redundante a expressão regras de conduta. Explica a autora que, no

84 GONÇALVES, José Artur Lima. Imunidade do Livro Eletrônico. In: MACHADO, Hugo de Brito.

entanto, em uma análise mais detalhada, encontramos regras que aparecem como condição sintática para a criação de outras normas: “Embora tais regras também tenham como objeto a disciplinação de relações intersubjetivas, a conduta por elas prescrita é específica, trata-se do comportamento de produzir novas unidades jurídicas.”85. Este seria, então, o critério diferenciador que deve informar a classificação das normas de comportamento e de estrutura.

No mesmo sentido é a lição de José Souto Maior Borges:

[…] a norma de conduta lato sensu é um gênero que inclui as normas de conduta stricto sensu (as que regulam diretamente a conduta humana) e normas de estrutura (as que regulam indiretamente a conduta humana). Pretender que a norma de estrutura tem função diversa é incorrer em equívoco capital.86

Considerando que o direito positivo regula a sua própria criação, uma interessante comparação foi elaborada por Paulo de Barros Carvalho:

[…] as regras de estrutura representam, para o sistema do direito positivo, o mesmo papel que as regras da gramática cumprem num idioma historicamente dado. Prescrevem estas últimas a forma de combinação dos vocábulos e das expressões para produzirmos orações, isto é, construções com sentido. À sua semelhança, as regras de estrutura determinam os órgãos do sistema e os expedientes formais necessários para que se editem normas jurídicas válidas no ordenamento, bem como o modo pelo qual serão elas alteradas e desconstituídas.87

Para fixar a diferenciação, Paulo de Barros Carvalho apresentou os seguintes exemplos, todos relacionados ao direito tributário:

[…] são normas de conduta, entre outras, as regras-matrizes de incidência dos tributos e todas aquelas atinentes ao cumprimento dos deveres instrumentais ou formais, também chamados de ‘obrigações acessórias’. E são tipicamente regras de estrutura aquelas que

85 Curso de Teoria Geral do Direito. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2010, p. 350.

86 BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed., 2. tir. São Paulo:

Malheiros, 2007, p. 380.

outorgam competências, isenções, procedimentos administrativos e judiciais, as que prescrevem pressupostos etc.88

Feita a distinção, cabe indagar se as regras de decadência seriam normas de estrutura ou de comportamento.

Nossa opinião é no sentido de que as regras de decadência seriam normas de estrutura. Para demonstrar de que modo chegamos a tal conclusão, optamos por analisar, exemplificativamente e de maneira individualizada, o enunciado do artigo 173, caput, do Código Tributário Nacional.

A redação do artigo 173, caput, do CTN89 sugere, numa primeira leitura, tratar-se de norma proibitiva. Ficaria o Fisco impedido de realizar o lançamento tributário relativo a eventos ocorridos há certo tempo.

Poderíamos pensar que essa hipótese retrataria uma norma de conduta, qualificada com o modal proibido: Após certo lapso de tempo, a Fazenda Pública está proibida de constituir o crédito tributário.

A questão que se coloca, todavia, é a seguinte: o Auditor Fiscal é justamente o agente competente, escolhido pelo sistema do direito positivo para efetuar o lançamento tributário e construir a norma jurídica individual e concreta.

A regra do artigo 173 do CTN, portanto, dispõe exatamente sobre a conduta de produzir uma outra norma jurídica, ainda que individual e concreta. Trata-se, portanto, de norma de estrutura.

88 Fundamentos jurídicos da incidência tributária. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 62-63.

89 “Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco)

Bem se amolda a essa conclusão a lição de Aurora Tomazini de Carvalho, para quem: “[…] são de estrutura as regras que instituem condições, fixam limites e prescrevem a conduta que servirá de meio para a construção de outras regras”90.

No mesmo sentido é o ensinamento de Renata Elaine Silva, que, em extenso estudo sobre a decadência e prescrição no direito tributário, entende as regras de decadência como normas de estrutura, justamente porque delimitam o comportamento daqueles que foram eleitos para construir normas91.