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LIVRO II – PARTE ESPECIAL – DECADÊNCIA TRIBUTÁRIA E SUA

3 CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO E DECADÊNCIA

3.2 Modalidades de lançamento tributário

3.2.3 Lançamento por homologação ou autolançamento

O lançamento por homologação é sem dúvida o mais polêmico, tendo previsão legal no artigo 150 do CTN:

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. § 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.

§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.

§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.

§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a

Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.

Trata-se da espécie mais corriqueira na prática do direito tributário e também da que compreende o maior volume de arrecadação.

Mas qual seria a razão a justificar o fato de essa ser a modalidade mais utilizada pelo Fisco? A resposta parece ser mais simples do que imaginamos. Nela é o contribuinte que faz a maior parte do trabalho, mostrando-se a mais rápida e eficaz, já que a grande maioria da receita tributária ingressa nos cofres públicos independentemente de qualquer providência estatal prévia.

Melhor explicando, no caso do lançamento por homologação tratamos de tributos que têm o recolhimento exigido do devedor, independentemente de prévia manifestação do Fisco, ou seja, não é preciso que o sujeito ativo efetue o ato final de lançamento para tornar exigível a prestação tributária.

Isso significa que o contribuinte tem o encargo de valorar os fatos à vista da norma aplicável, determinar a matéria tributável (base de cálculo), identificar-se como sujeito passivo, calcular o montante do tributo e efetuar o recolhimento, sem que a autoridade precise tomar qualquer providência, ao menos até esse momento.

É o que se verifica, exemplificativamente, no caso do Imposto de Renda da Pessoa Física. No momento de apresentar a Declaração de Ajuste Anual, a pessoa física presta as informações, faz o cálculo e ainda recolhe o tributo, se o caso. Por óbvio que, nos dias de hoje, para efetuar todo esse trâmite o contribuinte conta com a ajuda de programas de computadores específicos, mas ainda assim não se pode negar que é o contribuinte quem realiza todos os atos acima descritos.

E qual seria o papel do fisco nessa espécie de lançamento? Tomando conhecimento dessa atividade de constituição do crédito exercida pelo devedor, o Fisco a homologa. São bastante e elucidativas, a esse respeito, as lições de Renata Elaine Silva, que passamos a transcrever:

O particular, desse modo, precisa constituir o crédito, calcular o montante do tributo devido e antecipar o valor do crédito tributário, sem o ato de conferência da autoridade administrativa, a qual apenas ficará responsável em homologar o valor que foi transferido aos cofres públicos a título de tributo. A autoridade administrativa, então, não constitui, mas sim homologa o crédito constituído pelo contribuinte. Quando concorda, extingue homologando; quando não concorda não homologa, lança de ofício subsidiariamente ao ato do particular que não foi realizado a contento, nos termos da revisão de lançamento

suplementar, art. 149, V, VI e VII do CTN.127

De acordo com a autora, somente a homologação vai atribuir à constituição do crédito realizada pelo sujeito passivo a nomenclatura de “lançamento por homologação”. Mesmo antes da homologação, todavia, já existe uma norma individual e concreta do contribuinte, uma vez que ele verifica a ocorrência do fato e sua implicação lógica ocorrida no consequente, que é a relação jurídica estabelecida entre fisco e contribuinte.

A homologação pode ser expressa, nos termos do artigo 150, caput, ou tácita, como dispõe o artigo 150, § 4º do CTN. Será expressa na hipótese de a autoridade registrar, de maneira expressa, a sua concordância. Ou seja, a Autoridade edita um ato em que formalmente afirma sua concordância com a atividade do sujeito passivo, homologando-a. Será tácita se a autoridade administrativa quedar-se inerte e deixar transcorrer in albis o prazo previsto em lei para a homologação expressa.

127 Curso de decadência e de prescrição no direito tributário: regras do direito e segurança jurídica.

Assim, uma vez escoado o prazo para a homologação expressa, dá-se a homologação tácita, e o ciclo está completo.

O prazo para a homologação expressa é de 5 anos contados da data do fato gerador, segundo previsão inserta no artigo 150, § 4º, do Código Tributário Nacional. Nesse caso, expirado o prazo sem que a Fazenda Pública tenha se pronunciado, considera-se homologado o lançamento.

Analisemos agora uma questão prática: O que ocorreria caso o contribuinte, na hipótese de tributo sujeito ao lançamento por homologação, somente fosse até a metade do caminho? Ou seja, o que ocorre se o contribuinte se identifica como sujeito passivo, calcula o montante do tributo devido, portanto constitui o crédito tributário, mas deixa de efetuar o recolhimento? Segundo o CTN, nesse caso teria lugar o lançamento de ofício. Ou seja, respeitando a sistemática prevista pelo nosso Código Tributário Nacional, o tributo declarado, mas não pago, se sujeita ao lançamento de ofício pela Autoridade Administrativa, conforme previsão do artigo 149, inciso V, do CTN. O mesmo se dá no caso de recolhimento a menor.

Sabe-se, entretanto, que essa solução não é a adotada na prática tributária. Entende-se que apresentada a DCTF ou GFIP, na esfera federal, os valores reconhecidos como devidos pelo contribuinte não precisam ser objeto de um lançamento de ofício, mas serão diretamente inscritos em dívida ativa com suporte na própria declaração do contribuinte, que se entende como linguagem constitutiva do crédito. Apesar de muito controversa teoricamente, do ponto de vista do CTN, essa é a

prática já há muito adotada em âmbito federal e também em alguns estados e acabou por gerar inovações legislativas que a “positivaram”128.

Também o Poder Judiciário já reconhece de maneira pacífica essa possibilidade, tanto que, no mesmo sentido, foi publicada em maio de 2010 a Súmula 436 do Superior Tribunal de Justiça, cujo teor se transcreve: “Súmula 436: A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco”.

Dessa forma, poderá haver um débito tributário inscrito em dívida ativa e cobrado mediante ação de execução fiscal, sem que tenha havido lançamento

128

Exemplificativamente, em âmbito Federal, o Decreto-lei nº 2.124, de 13 de junho de 1984, em seu artigo 5º, que assim dispõe:

“Art. 5º O Ministro da Fazenda poderá eliminar ou instituir obrigações acessórias relativas a tributos federais administrados pela Secretaria da Receita Federal.

§ 1º O documento que formalizar o cumprimento de obrigação acessória, comunicando a existência de crédito tributário, constituirá confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência do referido crédito.

§ 2º Não pago no prazo estabelecido pela legislação o crédito, corrigido monetariamente e acrescido da multa de vinte por cento e dos juros de mora devidos, poderá ser imediatamente inscrito em dívida ativa, para efeito de cobrança executiva, observado o disposto no § 2º do artigo 7º do Decreto-lei nº 2.065, de 26 de outubro de 1983.” (BRASIL. Presidência da República.

Decreto-Lei nº 2.124, de 13 de junho de 1984. Altera a legislação do imposto de renda, e dá outras

providências. Brasília, 13 jun. 1984. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1965-1988/Del2124.htm>. Acesso em: 13 maio 2013).

Também em âmbito Federal, no mesmo sentido, dispõe o Decreto nº 3.000/99, Regulamento do Imposto de Renda, em seu art. 933:

Art. 933. O Ministro de Estado da Fazenda poderá eliminar ou instituir obrigações acessórias relativas ao imposto (Decreto-Lei nº 2.124, de 13 de junho de 1984, art. 5º).

§ 1º O documento que formalizar o cumprimento de obrigação acessória, comunicando a existência de crédito tributário, constituirá confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência do referido crédito (Decreto-Lei nº 2.124, de 1984, art. 5º, § 1º).

§ 2º Não pago no prazo estabelecido por este Decreto, o crédito, atualizado monetariamente, na forma da legislação pertinente (art. 874), e acrescido de multa de mora (art. 950) e de juros de mora (arts. 953 a 955), poderá ser imediatamente inscrito em Dívida Ativa da União, para efeito de cobrança executiva (Decreto-Lei nº 2.124, de 1984, art. 5º, § 2º).

[…].” (BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999. Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Brasília, 26 mar. 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3000.htm>. Acesso em: 13 mar. 2013).

tributário. Trata-se justamente do caso de constituição do crédito tributário pelo contribuinte.

Renata Elaine Silva129 destaca com propriedade o que entende ser a diferença entre o lançamento por homologação e a constituição do crédito pelo contribuinte: quando o contribuinte constitui o crédito e não antecipa o valor constituído a título de tributo, não haverá ato administrativo de homologação para imprimir a essa modalidade de constituição a nomenclatura de lançamento por homologação. Não há objeto para ser homologado e o débito será automaticamente inscrito em dívida ativa. Apenas com a constituição do crédito pelo particular e o pagamento é que poderá haver a homologação, quando então se poderá falar em lançamento por homologação.

Parece importante lembrar que, nessa modalidade de constituição do crédito, não haverá a notificação ao sujeito passivo, que imprime publicidade ao ato, pois sendo o próprio contribuinte que constitui o crédito, considera-se que ele está ciente do que declarou.

Resta averiguar, ainda a esse respeito, qual procedimento realizado pelo contribuinte pode ser considerado suficiente para qualificar-se como constituição do crédito tributário. Por óbvio deve ser uma documentação que possibilite a verificação da ocorrência do fato jurídico tributário e da correspondente obrigação tributária. Renata Elaine Silva bem observa que cada atividade comercial, industrial e de prestação de serviço pode demandar documentação específica que seja capaz de reproduzir o fato e a relação jurídica, mas é enfática ao concluir que “[…] a simples

129 Curso de decadência e de prescrição no direito tributário: regras do direito e segurança jurídica.

guia de pagamento, tais como o Documento de Arrecadação da Receita Federal – DARF e a Guia de Arrecadação Estadual – GARE, não são suficientes para reproduzir a ocorrência do fato e da correspondente relação jurídica”130.

A autora enumera diversos documentos efetivamente capazes de relatar a atividade de constituição do crédito do contribuinte, eis que informam todo o fato praticado pelo contribuinte e sua correspondente relação jurídica. A lista, ainda que meramente exemplificativa, merece transcrição:

(i) Declaração de Débitos e Créditos Tributários – DCTF;

(ii) Constituição de Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica – DIPJ;

(iii) Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte – DIRF;

(iv) Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais PIS/COFINS – DACON;

(v) Relação Anual de Informações Sociais – RAIS;

(vi) Declaração Mensal dos Débitos/Créditos de ICMS e Declaração Anual de Informações Econômico-Fiscais de ICMS.131

Pois bem. Já devidamente mencionadas as modalidades de lançamento previstas pelo CTN, é o momento de tratarmos, ainda que rapidamente, acerca do lançamento por arbitramento. Não seria uma quarta modalidade prevista pelo Código?

Na verdade, o lançamento por arbitramento não é uma modalidade de lançamento diversa, mas, sim, uma espécie de lançamento de ofício, cuja previsão está no artigo 148 do CTN:

Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado,

130 Curso de decadência e de prescrição no direito tributário: regras do direito e segurança jurídica.

São Paulo: Noeses, 2013, p. 248.

131 SILVA, Renata Elaine. Curso de decadência e de prescrição no direito tributário: regras do direito

ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.

O lançamento de ofício pode-se dar por arbitramento a partir do momento em que o contribuinte deveria prestar informações para a Administração Pública, mas deixa de fazê-lo, ou mesmo prestando, se essas informações não merecerem fé ou não forem verdadeiras.

3.2.4 Críticas à classificação tripartite e a proposta de classificação do