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Regime geral da cessação do contrato de trabalho:

No documento Direito Do Trabalho II - Romano Martinez (páginas 52-55)

a. Segurança no emprego: no artigo 53.º CRP prescreve-se que são proibidos

os despedimentos sem justa causa. Com base nesta disposição, desde logo encontra-se banida a denúncia discricionária, ad nutum, do contrato de trabalho por parte do empregador; o contrato de trabalho, não obstante ser de execução continuada, só pode cessar por vontade da entidade patronal se existir um motivo atendível. Apesar de a previsão constitucional de segurança no emprego constituir uma particularidade do regime português, a consagração do princípio generalizou-se nos países da União Europeia, sendo um postulado da OIT. Mesmo noutros espaços jurídicos, com contornos algo distintos, é frequente a consagração do princípio de segurança no emprego.

b. Solução legislativa: o regime da cessação do contrato de trabalho consta

dos artigos 338.º e seguintes CT e corresponde a uma solução de compromisso entre o sistema tradicional da cessação do contrato de trabalho, assente nos princípios de Direito Civil com ligeiras correções e a regra de proteção da estabilidade do emprego. Atualmente, com o Código do Trabalho, na sequência do regime precedente, subsiste uma solução de compromisso. Estão proibidos os despedimentos sem justa causa (artigo 338.º CT), mas, por um lado, a justa causa pode ser subjetiva, por facto imputável ao trabalhador (artigo 351.º CT), ou objetiva (v.g. artigo 359.º CT) e, por outro lado, admite-se a inclusão de termo resolutivo em situações que extravasam o sentido tradicional desta cláusula acessória.

c. Uniformidade e imperatividade do regime da cessação: as soluções

constantes dos artigos 338.º e seguintes CT aplicam-se aos contratos de trabalho de regime comum, em que predomina uma relação laboral no seio empresarial, assim como aos contratos de trabalho com regime especial, sempre que das respetivas regras não constem preceitos particulares que derroguem as regras gerais ou não exista incompatibilidade do regime geral com as especificidades de tais contratos (artigo 9.º CT). Além do regime comum de cessação do contrato, subsistem regras especiais estabelecidas em determinados tipos negociais, como os artigos 10.º, n.º8 Portaria n.º 1497/2008, artigos 27.º e seguintes Decreto-Lei n.º 235/92 e os artigos 26.º e seguintes Lei n.º28/98. O regime comum de cessação do contrato propende para uma uniformidade, pois, por via de regra, não se estabelecem

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diferenças em função do tipo de trabalhador ou do género de empresa, equiparando-se situações distintas. Quanto ao trabalhador, não obstante a substancial diferença introduzida pelo Código, a nível indemnizatório, o legislador não diferencia de modo relevante as situações culposas das isentas de culpa, e identifica sob vários aspetos as diversas causas de cessação do contrato. De facto, quanto aos valores a pagar em casos de cessação de contrato, a indemnização por despedimento ilícito (artigo 389.º, n.º1, alínea a) CT) pode ser inferior à compensação devida em caso de despedimento coletivo (artigo 366.º CT), porque, neste, se atende à duração do contrato, o que pode não ocorrer na hipótese de despedimento ilícito; esta discrepância, é, porém, minimizada tendo em conta a previsão do artigo 391.º CT, onde se confere ao trabalhador ilicitamente despedido o direito de optar por uma indemnização que substitui a reintegração. Também das alterações introduzidas em 2012m nos artigos 344.º e 361.º CT decorre a ideia de uniformizar a compensação em caso de cessação do contrato com causas objetivas. Além da diferença no plano da indemnização, importa aludir a algumas distinções relativas ao tipo de trabalhador ou de empresa, que contrariam a propensa uniformidade. A natureza injuntiva da cessação do contrato de trabalho consta do artigo 339.º CT; situação que não é exclusiva do âmbito laboral, pois, no arrendamento urbano, o disposto sobre cessação do contrato também tem natureza imperativa (artigo 1080.º CC). A mencionada imperatividade admite, contudo, exceções. Não se permite que, por instrumento de regulamentação coletiva ou por contrato de trabalho, se estatua qualquer alteração ao regime da cessação do contrato, ainda que mais favorável ao trabalhador, mas há que atender a disposições legais que permitem a sua derrogação e à previsão constante dos n.º2 e 3 do artigo 339.º CT. De entre as normas que consubstanciam disposição legal (em contrário) importa atender aos diplomas sobre contratos de trabalho com regime especial, nomeadamente os já citados artigos 10.º, n.º8 Portaria n.º1497/2008 (contrato de aprendizagem), 27.º e seguintes Decreto-Lei n.º 235/92 (contrato de serviço doméstico) e artigos 26.º e seguintes Lei n.º 28/98 (contrato de praticante desportivo). Das exceções constantes dos n.º2 e 3 do artigo 339.º CT resulta que a derrogação do regime pode unicamente constar de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho. Tendo por base o disposto no n.º2 conclui-se que podem ser regulados por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho os critérios de definição de indemnizações, assim como os prazos de procedimento e de aviso prévio constantes do Capítulo da cessação do contrato. Daqui se infere que a convenção coletiva não poderá, por exemplo, restringir ou alargar a noção de justa causa de despedimento ou modificar os fundamentos do despedimento coletivo. Mas já será admissível que, em instrumento de regulamentação coletiva, sejam regulados os valores das indemnizações devidas em caso de cessação do contrato de trabalho (artigo 349.º, nº4 CT). Cabe ainda referir que no artigo 349.º, n.º3 CT se admite que as partes, ao revogarem o contrato de trabalho, acordem quanto a outros efeitos não previstos na lei. A imperatividade do regime tem de ver com o facto de, no âmbito laboral, ser problemática a garantia de uma vontade do trabalhador livre e esclarecida na

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quanto à vontade livre e esclarecida das partes para efeitos de formação de diferentes acordos que alterem o regime especial de cessação do contrato. De facto, o contrato de trabalho assenta numa estrutura de direção-subordinação e o trabalhador exerce a sua atividade em regime de subordinação jurídica (e, eventualmente, económica), designada heterodeterminação, enquanto ao empregador são conferidos os poderes de direção e disciplinar. A relação jurídica emergente do contrato de trabalho é tendencialmente desequilibrada, quer no plano jurídico quer no plano económico. No âmbito laboral, há alguns aspetos que podem indiciar uma posição de supremacia do empregador: a possibilidade de determinação ou de conformação da atividade por este exercida e, sobretudo, o exercício do poder disciplinar, que faculta ao empregador a aplicação de sanções disciplinares sem necessidade de recurso a intervenção judicial. No plano oposto, o trabalhador encontra- se numa posição passiva, em particular resultante da subordinação jurídica, de que resulta um dever de obediência em relação às ordens, regras ou orientações emanadas do respetivo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem. Por outro lado, frequentemente a relação laboral pressupõe a subordinação económica do trabalhador em dois sentidos:

i. Os rendimentos do trabalho constituem o seu principal meio de subsistência;

ii. O processo produtivo para o qual o trabalhador contribui não é dominado pelo próprio, mas sim pelo empregador, detentor dos meios de produção e do poder de gestão da empresa.

Por isso, não raras vezes se afirma que a relação jurídica de trabalho é desequilibrada, pois assenta num desnível jurídico e económico, por força do qual o trabalhador, enquanto contraente mais débil, se coloca contratualmente numa situação de inferioridade em relação ao empregador. Mas a imperatividade tem um âmbito mais alargado, pois também não confere aos instrumentos de regulamentação coletiva validade para intervirem nesta questão, salvas as exceções indicadas.

d. Consequências da cessação: a cessação do vínculo extingue as obrigações

das pares que respeitam ao cumprimento do contrato de trabalho, mas determina a constituição de certas prestações. Associado às questões formais resultantes da extinção, neste contrato, de modo mais premente do que em outros vínculos, atende-se frequentemente às consequências da extinção na pessoa do trabalhador, por vezes relacionado com a perda do meio de sustento. Importa referir que estas condicionantes foram tidas em conta na previsão limitada de situações de cessação do contrato de trabalho, não devendo ser ponderadas duas vezes; por isso, na apreciação dos pressupostos das situações de cessação, ainda que esses dados pessoais possam estar subjacentes, não são relevantes, sob pena de se introduzirem mais elementos subjetivos na aplicação do Direito do Trabalho. Importa ainda referir que, contrariamente ao que é preconizado por alguma doutrina, não há que distinguir a cessação do contrato de trabalho da extinção da relação laboral, porque o contrato é de execução continuada, não se podendo acantoná-lo ao mero ato de celebração. Como dispõe o artigo 341.º CT, tendo cessado o contrato de trabalho, o empregador é obrigado a entregar ao trabalhador um certificado de trabalho, do qual constarão as datas de admissão e de termo,

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bem como o cargo ou cargos desempenhados (n.º1, alínea a)), e outros documentos destinados a fins oficiais, nomeadamente para a segurança social, de modo a poder ser atribuído ao trabalhador subsídio de desemprego (n.º1, alínea b)). Cessando o contrato de trabalho, impende sobre o trabalhador o dever de devolver imediatamente ao empregador os instrumentos de trabalho e quaisquer outros objetos que sejam pertença deste (artigo 342.º CT). Consagra-se um princípio geral, que decorre das regras comuns, nomeadamente de Direito das Obrigações e de Direitos Reais. O incumprimento deste dever de devolução determina a aplicação das regras gerais de responsabilidade civil, concretamente dos artigos 483.º e seguintes e 798.º e seguintes CC, por um lado, e dos artigos 563.º e seguintes CC, por outro. Do disposto no artigo 342.º CT deduz-se que a falta do empregador (discutível ou mesmo por ele reconhecida) de pagamento de quaisquer quantias ao trabalhador, em princípio, não confere a este direito de retenção sobre os instrumentos de trabalho ou outros objetos que sejam pertença daquele. De facto, tendo em conta a previsão geral do artigo 754.º CC, para haver direito de retenção será necessário que o crédito do trabalhador resulte de despesas feitas por causa desses objetos do empregador ou de danos por eles causados. Por sua de regra, os montantes que o empregador tem a pagar ao trabalhador aquando da cessação do contrato não se relacionam com essas duas hipóteses. Acresce que entre as situações especiais de direito de retenção (artigo 755.º CC) não se inclui o trabalhador no elenco de credores privilegiados. Por último, da cessação do contrato resulta a obrigação de acerto de contas, pelo que se podem constituir prestações específicas próprias da extinção. Nesse acerto de contas, além de se atender a prestações vincendas, tem particular relevância aludir às obrigações que se vencem em virtude da cessação do vínculo. Neste sentido importar referir o disposto no artigo 245.º CT relativo aos efeitos da cessação do contrato de trabalho no direito a férias e correspondente subsídio: o trabalhador tem direito a receber uma quantia proporcional ao tempo de serviço prestado no ano em que cessa o contrato e, não tendo ainda gozado as férias vencidas no dia 1 de janeiro desse ano, tem direito a receber também a quantia referente a essas férias e ao correspondente subsídio. Do mesmo modo, como prescreve a alínea b) do n.º2 do artigo 263.º CT, cessando o contrato, o trabalhador tem direito a receber o proporcional do subsídio de Natal correspondente ao tempo de serviço prestado nesse ano. Qualquer das situações anteriormente indiciadas corresponde a deveres de execução pós-contratual, que decorrem da cessação do vínculo; vencendo-se, por isso, com a extinção do contrato, pelo que tais obrigações serão cumpridas após a dissolução do contrato de trabalho. No fundo, como ocorre em outros contratos, estar-se-á no âmbito do que se pode designar por consequências da liquidação; a relação contratual extingue- se e tem de se proceder à respetiva liquidação.

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