• Nenhum resultado encontrado

Influência europeia na reconfiguração da política de Ordenamento do Território

NOTA INTRODUTÓRIA AO CAP

2. ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E POLÍTICAS PÚBLICAS DE BASE TERRITORIAL

2.5. Influência europeia na reconfiguração da política de Ordenamento do Território

Desde a sua formalização que a União Europeia (UE) tem tido uma influência indireta e doutrinária no rumo do OT ao nível dos Estados Membros (Oliveira and Breda Vázquez, 2010), acompanhando com prudência as matérias de desenvolvimento e realizando um trabalho afincado e significativo no que diz respeito a aprofundar uma Europa das Regiões como, e.g., na primeira Comunicação Europeia sobre política regional (1965) (Ferrão and Mourato, 2010; Oliveira, 2004; Porteiro et al., 2015).

O foco de atenção da UE nas matérias de desenvolvimento territorial justifica-se com a abrangência dos problemas do OT, cada vez mais considerados como problemas transversais, de cariz intersectorial e que não respeitam limites administrativos, estendendo-se aos territórios adjacentes à semelhança de uma crise económico- financeira e que, por isso, requerem a necessidade de criação de meios coordenados de gestão e acompanhamento do desenvolvimento territorial a uma escala alargada (CSD, 1999; Stead, 2014).

Através do reforço da sua política de coesão com a inclusão da dimensão territorial no programa Europa 2020 (Tratado de Lisboa - 2008), a UE tem desempenhado um papel importante e ativo nas matérias da GT e do desenvolvimento do território, nomeadamente promovendo o debate do papel que as áreas urbanas podem vir a assumir na consolidação de uma política económica, social e territorial mais forte, coesa e equilibrada no território europeu (Mateus, 2012).

64

No entanto, o OT continua a não se apresentar como uma das competências formais e diretas da UE (Ferrão, 2010), visto que de acordo com o princípio da subsidiariedade (Chateau, 2016) o OT permanece uma prerrogativa de cada Estado Membro soberano, regulado pelo seu próprio SGT.

Ainda assim, a coesão territorial tem vindo a tornar-se cada vez mais um foco de atenção a nível europeu, e são cada vez mais os documentos estratégicos produzidos, os contactos estabelecidos e as discussões promovidas sobre a temática (Aguiar, 2002; Barca, 2009; CE, 2008,). Os exemplos de iniciativas europeias em prol da consolidação de estratégias de coesão para o espaço urbano europeu são vários e convergem na ótica de redução das disparidades territoriais, demográficas e económicas existentes no território, alertando para a necessidade de as monitorizar e avaliar em prol de um desenvolvimento articulado e sustentável entre os vários Estados Membros (CEMAT, 2010).

Atualmente e por cautela ao princípio da subsidiariedade, são evitadas possíveis decisões formais que poderiam estar a ser tomadas por parte da UE e que dizem diretamente respeito ao modo como os vários Estados Membros devem estruturar a ocupação e organização dos seus territórios (Chateau, 2016). Trata-se de um assunto político de extrema sensibilidade, pelo facto de o território nacional e as suas fronteiras ainda se apresentarem como um dos últimos redutos de soberania dos diversos Estados Membros da UE. Em simultâneo, é um exercício complexo e exigente, uma vez que o território europeu é diversificado e se apresenta com características de ocupação muito heterogéneas, atualmente regulado por um conjunto de sistemas de planeamento e gestão que ainda não estão preparados para uma GT integrada e coordenada a nível europeu (CSD, 1999; Romão Ventura, 2015; Stead, 2013).

O princípio da subsidiariedade não se pode sobrepor à necessidade de adotar práticas de GT em prol da coesão territorial no contexto europeu. Neste sentido, o acompanhamento do desenvolvimento territorial num contexto alargado é considerado como um assunto premente e pertinente no seio da UE, legitimando o papel que esta tem assumido na reconfiguração da política de OT no espaço europeu e que tem convergido para a europeização da atividade do OT.

A europeização do OT é um processo de convergência que tem vindo a decorrer através da transmissão ou aquisição de características europeias ao nível da política de OT, por parte dos vários Estados Membros, suportada em práticas colaborativas e de partilha de informações e experiências (Stead, 2013; Faludi, 2012).

A europeização é um processo que respeita a diferença e procura preservar a variedade, não representando uma standarização do território Europeu na procura

65

de uma europa homogénea, mas sim uma europa mais comunicativa, coordenada e articulada. A nível concetual, a europeização é um processo cultural que se concretiza através de coordenação e articulação entre âmbitos, setores e níveis de política, e que pode ser diretamente associada aos processos de globalização e de procura por melhores PP (Antunes, 2004, Faludi, 2012, Nadin, 2007).

No caso do OT, a europeização constitui processo continuado de construção de uma herança cultural partilhada pelos Estados Membros e a sua diferença, constituindo um conjunto histórico, cultural, político e socioeconómico articulado e coordenado ao nível das PP de OT desenvolvidas nos vários Estados Membros (Newman and Thornley, 1996; Faludi, 2010).

A europeização do OT tem vindo progressivamente a adotar uma orientação que vai ao encontro da territorialização das PP de OT, numa ótica de promoção de políticas mais focadas nos resultados e nos seus impactos territoriais, aleadas a ações de acompanhamento e avaliação da sua implementação.

A transição para práticas de OT mais orientadas para os resultados e com forte enfase no acompanhamento da sua implementação é indispensável, uma vez que os projetos de desenvolvimento dos vários Estados Membros interagem ente sí e se podem complementar no sentido de alcançar objetivos de desenvolvimento comuns (Oliveira and Vasquez, 2010).

Em paralelo, o foco no acompanhamento promove a produção de informação relativa à execução da PP, que permite conhecer os impactos territoriais da sua implementação no território e alimentar a produção de relatórios de monitorização que se apresentam essenciais para a tomada de decisão. Nomeadamente, no atual panorama em que, nos vários Estados Membros, existem atores políticos colocados em lugares de responsabilidade pública para tratar o OT que muitas vezes não estão preparados para entender e prever dinâmicas territoriais e cujas equipas técnicas não têm disponível a informação base necessária à produção dos documentos de suporte e legitimação da tomada de decisão por parte do corpo político. Esta situação é propícia ao predomínio do atual panorama de desenvolvimento que, em termos operativos, é tendencialmente desarticulado entre sectores, escalas e âmbitos, e onde as práticas de monitorização e avaliação não encontram o seu devido espaço. Por exemplo, é comum a referência à monitorização e avaliação ainda como meros procedimentos inscritos em documentos de caracter normativo e que enfrentam dificuldades extremas na passagem a políticas concretizadas e assumidas como compromisso e cultura por parte das administrações públicas.

Atualmente, não existe uma cultura europeia de avaliação das PP. A avaliação ainda não é uma obrigatoriedade transversal a todas as PP desenvolvidas pelos

66

vários Estados Membros, o que representa um entrave à sua promoção enquanto cultura na UE. Uma cultura de avaliação europeia só é estabelecida se assumida e cultivada de forma harmonizada e articulada, e como compromisso por parte dos vários Estados Membros (Medeiros, 2017).

A dificuldade de integração destes procedimentos enquanto cultura no seio do OT está relacionada com a dificuldade de credibilização da avaliação enquanto atividade útil e vantajosa, e com a inexistência de um consenso em termos dos procedimentos a adotar para a sua execução. Neste aspeto, a inexistência de uma metodologia para a realização da avaliação não beneficia a sua afirmação enquanto cultura e prática corrente nos vários Estados Membros (Oliveira, 2011; Voogd, 1998). Isto porque, se verifica que em muitos casos é a falta de uma metodologia para a avaliação que leva à sua não realização ou à sua incorreta realização (Medeiros, 2017). Para além da situação limite, que corresponde à inexistência da prática da avaliação em alguns países, existe ainda a realização de ações de avaliação que não correspondem a avaliações efetivas, mas sim a estudos de caraterização generalistas como, e.g., casos de avaliações disfarçadas em estudos SIG ou em análises de mercado.

Neste panorama, cabe à UE o papel de promover a coordenação e cooperação nas matérias da avaliação no espaço europeu. A UE tem vindo a promover investigações no âmbito da temática da monitorização e avaliação do desenvolvimento territorial, com foco na procura de aferição dos parâmetros e fatores de monitorização e avaliação que permitem avaliar o impacto das PP, a objetividade da sua implementação, a realização dos objetivos definidos e sobretudo a articulação e comparação entre territórios. Esta promoção tem vindo a ser realizada sobretudo com a introdução de programas de cooperação que têm contribuído para estudar de forma transversal as diferentes culturas de planeamento e as convergências que se têm verificado por influência europeia. Exemplo disso, é a criação do European Spatial Planning Observatório Network (ESPON) e seu papel enquanto programa de cooperação territorial orientado para o acompanhamento e observação das dinâmicas territoriais e dos impactos territoriais das PP europeias.

O ESPON procura constituir uma base de discussão e partilha de informação entre os estados membros, em prol da cooperação e coordenação transeuropeia nas matérias referentes ao OT e desenvolvimento territorial (ESPON, 2006). A lógica do ESPON não é estabelecer uma perspetiva única e restrita do modo de desenvolvimento do território europeu e uniformizar os sistemas de planeamento e mecanismos de gestão e intervenção territorial dos Estados Membros, mas sim disponibilizar um espaço de partilha e aprendizagem. Isto é, cada estado-membro possui o seu SGT que estrutura o seu processo de OT, podendo todos beneficiar da

67

troca de experiências e articulação entre estratégias, assegurando o princípio da subsidiariedade e sem que seja ameaçado qualquer poder estatal nestas matérias. Entende-se assim, no ESPON, que o princípio coesão territorial beneficia da partilha de informação entre os organismos com competências de acompanhamento e promoção das matérias de OT nos vários Estados Membros, promovendo a identificação e análise das tendências de desenvolvimento territorial em contexto europeu (Rodrigues, 2005).

Neste sentido, o ESPON converge para a afirmação da cooperação entre Estados Membros, que através da cooperação inter-regional no quadro da UE têm tido a possibilidade de usufruir e proporcionar novas experiências de relacionamento internacional. A cooperação é imprescindível na articulação entre as diferentes ambições e sentidos coletivos das populações e das administrações dos vários Estados Membros que necessitam de regular, do ponto de vista social e político, o seu espaço territorial que estabelece relações de interdependência com as PP que regulam os territórios adjacentes (Romão Ventura, 2015).

O ESPON tem vindo a revelar-se uma base de suporte ao desenvolvimento de PPBT nos Estados Membros, assente numa perspetiva de coesão territorial europeia. O ESPON apoia o desenvolvimento de PP na medida em que disponibiliza um conjunto de evidências em relação ao desenvolvimento das estruturas territoriais nos vários países que integram o programa, possibilitando a identificação de tendências, perspetivas de desenvolvimento, avaliação de impactos resultantes da implementação das PPBT e permitindo a comparação entre territórios a várias escalas (Medeiros, 2017).

Através deste conjunto de evidências e informações de base territorial, e com o leque de conhecimento que é possível produzir com o seu cruzamento, o ESPON potencia a identificação das oportunidades de desenvolvimento assentes numa visão alargada do território e o reconhecimento das disparidades territoriais a fim de as amenizar numa perspetiva de coesão territorial e desenvolvimento equilibrado (Rao, 2000).

A lógica de observatório territorial que o ESPON assume não é exclusiva do âmbito internacional e o seu funcionamento beneficia da sua extensão para o âmbito nacional de cada estado-membro, numa perspetiva de rede integrada de observatórios territoriais. O ESPON funciona como uma estrutura administrativa que é alimentada de forma sistémica, por cada um dos Estados Membros que integram o programa, com um conjunto de evidências territoriais que permitem a elaboração de análises, comparações e cenários com o intuito de alcançar uma tomada de decisão sobre as estratégias desenvolvimento com base nas dinâmicas verificadas. Ou seja, são os vários Estados Membros, através das suas estruturas

68

administrativas, que têm a função de alimentar o ESPON, o que promove e facilita a criação de observatórios nas escalas inferiores, designadamente no âmbito nacional como, e.g. no caso português a perspetiva de criação do ONOTU (ver Cap. II – 7.1). Deste modo, o programa ESPON (2007-2013) tem vindo a atribuir uma maior enfase no desenvolvimento e coesão territorial (European Observation Network on Territorial Development and Cohesion) e reforçado a sua componente de rede (network), assumindo-se como uma estrutura autónoma que articula entidades de naturezas distinta e promove a cooperação institucional e a coesão territorial (IFDR, 2009). A título de exemplo, no novo ciclo da Rede Europeia de Observação Desenvolvimento Territorial e Coesão – ESPON 2020, o ESPON EGTC (European Grouping on Territorial Cooperation) lançou um convite à apresentação de propostas de análise (Targeted Analysis), no âmbito do respetivo programa de cooperação, onde as partes interessadas apresentam propostas de análise que atendam às exigências e necessidades específicas das suas PP, no entanto considerando sempre a perspetiva de obtenção de evidências territoriais num contexto territorial mais amplo (DGT, 2016, para. 1). Estas análises pretendem-se desenvolvidas em parceria entre as partes interessadas e peritos, aliando o conhecimento empírico das partes interessadas com as evidências territoriais europeias disponíveis no âmbito do tema da análise.

O ESPON EGT orienta as administrações dos Estados Membros nas matérias de acompanhamento do desenvolvimento territorial, OT e dinâmicas territoriais, através da definição de prioridades de desenvolvimento e investigação. Esta definição de prioridades por parte da UE, nomeadamente através do ESPON EGT, tem vindo a influenciar a reconfiguração da política de OT na UE dando prioridade, e.g., à investigação aplicada no contexto do desenvolvimento territorial, da competitividade e da coesão territorial (prioridade 1); ao desenvolvimento de indicadores e dados territoriais, ferramentas analíticas e apoio científico para o acompanhamento das dinâmicas territoriais (prioridade 3); e a construção de capacidade de diálogo entre redes (prioridade 4).

Articulando-se os princípios, métodos e técnicas de acompanhamento e observação, aumenta-se a utilidade das evidências territoriais produzidas para o universo das PP e garante-se um registo útil da sua evolução. Uma das grandes mais-valias do acompanhamento à escala europeia, através do ESPON EGT, consiste na capacidade de disponibilizar informação e estudos multi-escala, que permitem um entendimento das questões territoriais segundo uma visão alargada e assente na cooperação territorial.

69

A outra grande mais-valia reside na troca de experiências e conhecimento transversal do território e contribui fortemente para a transferência de conhecimento e para processos de aprendizagem e inovação, que são um dos fatores de convergência das práticas de OT com os princípios doutrinários veiculados pela EU, com o Esquema de desenvolvimento do Espaço Comunitário (EDEC) e as agendas territoriais e urbanas.

Neste sentido, o ESPON tem contribuído para europeização do OT, influenciando os países na redefinição da política de OT. Por esta via, a UE fomenta o desenvolvimento de PP cada vez mais orientadas para os resultados e com forte base territorial, reforçando a necessidade de espacialização de medidas interventivas, articulação na execução dos programas operacionais, e avaliação ao longo da sua implementação. Deste modo, a europeização do OT tem vindo a despertar os Estados Membros para a necessidade de avaliação das PP de OT, numa ótica de monitorização e avaliação dos seus impactos e das dinâmicas territoriais resultantes da sua implementação (ver Cap. II – 4.2).

Neste panorama, a monitorização e o estudo dos impactos e dinâmicas territoriais ganha relevância nas instituições governamentais e nos agentes privados, com a necessidade acompanhar de forma regular a transformação territorial, social, económica, cultural e tecnológica induzida pelas PP. Isto porque, por parte da governança permite criar uma variedade de mecanismos territoriais adaptados à realidade do momento e do sistema-real (Batista e Silva et al., 2009), e por outro lado, aos setores público e privado porque permite a exploração plena das atividades inovadoras e a possibilidade de estabelecer sinergias a nível internacional.

Deste modo, as ações de monitorização e avaliação têm vindo a configuram-se, na ótica europeia, como processos estruturados de recolha, tratamento e produção de informação capaz de informar o processo de desenvolvimento territorial e reduzir o nível de incerteza na tomada de decisão por parte dos decisores e das partes interessadas. Em paralelo, são ações que afirmam um papel de compromisso político por parte da UE e dos Estados Membros no sentido de corrigir os erros sucessivamente cometidos nas matérias das PP com incidência territorial, que na maioria das situações reiteram a necessidade de criação de meios públicos de avaliação e acompanhamento permanente dos processos de desenvolvimento territorial, para que as situações de desequilíbrio ou conflito deixem de exigir correção e resolução, passando a reger-se por um processo dinâmico, atento às transformações e segundo uma lógica de prevenção ativa.

Neste sentido, a influência da UE na reconfiguração da atual política de OT nos vários Estados Membros incentiva à territorialização das PP numa ótica de intervenções integradas de base territorial, que permitam observar integradamente o território, considerando as suas várias componentes e promovendo o diálogo entre

70

os vários Estados Membros no intuito de construir uma visão partilhada que sustente a definição de PP de OT de forma independente e individualizada por cada Estado Membro soberano.

71

3. METODOLOGIAS DE AVALIAÇÃO EM ORDENAMENTO DO

Outline

Documentos relacionados