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Ordenamento do Território e Governança Territorial

NOTA INTRODUTÓRIA AO CAP

2. ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E POLÍTICAS PÚBLICAS DE BASE TERRITORIAL

2.4. Ordenamento do Território e Governança Territorial

O propósito final da governança territorial (GT) é o desenvolvimento do território (Dallabrida, 2015, 2011; Ferrão, 2013; Garcia, 2009; Stead, 2014). A GT e a coordenação intersectorial beneficiam a atividade do OT na sua natureza governativa, promovendo a coordenação intersectorial (horizontal) na articulação entre os vários sectores de políticas (e.g., transportes, educação e saúde) e coordenação entre níveis de governos (vertical) na articulação entre escalas (e.g., nacional, regional e local) (ESPON, 2006; Feio and Chorincas, 2009; Ferrão and Mourato, 2010; kazancigil, 2002; Rosenau and Czempiel, 1992).

Isto porque, o OT decorre segundo um processo de intervenção que exige uma noção de conjunto, uma visão holística, o que implica capacidade de harmonização horizontal e vertical na definição e concretização das suas PPBT (Amado, 2018a). A definição de PPBT tem que ser feita de forma articulada e integrada, segundo uma lógica de conjunto para que se garanta a articulação entre as várias PP e se considere não apenas a área de intervenção física da PP (incidência das medidas interventivas), mas também o seu envolvente, uma vez que o impacto das suas medidas extravasa o limite físico da área de intervenção da PP. Deste modo, pensar em PPBT como intervenções pontuais e isoladas é iludir a principal questão posta ao OT (Doxiadis, 1965), e que tende ao desenvolvimento do território de forma equilibrada e segundo uma lógica de rede (network) integrada e de conjunto. Neste sentido, as PPBT desempenham em simultâneo um papel local e um papel em rede (network). Ou seja, para além do seu papel enquanto instrumento de intervenção no seu território de implementação, as PPBT também desempenham um papel ativo no conjunto global das PP, funcionando mesmo que de forma não intencionada como uma rede global de PP intervenção.

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O conceito de GT pode ser aplicado para descrever a aplicação dos princípios de boa governança às PPBT, ou para referir o processo colaborativo de planeamento e gestão de dinâmicas territoriais (Farinós, 2008; Ferrão, 2010). Neste sentido, o conceito de GT remete para a caracterização da forma como as várias PPBT são articuladas e aplicadas (Garcia, 2009). A GT é assim encarada como um processo de tomada de decisão interativo e integrador da sociedade civil e que ambiciona um modelo de regulação coletiva e equilibrado no que diz respeito à definição e implementação de PPBT (Dallabrida, 2015; Fadigas, 2015; Rhodes, 1996; Stoker, 1998).

Deste modo, suporta-se numa ótica governativa assente na cooperação e coordenação intersectorial (Blanco and Comà, 2003; Ferrão and Mourato, 2010; Graña, 2005; Weale, 2011), onde o processo de tomada de decisão é exercido por um conjunto de atores interdependentes, focados em áreas sectoriais ou funcionais específicas nas quais são especializados, e que se articulam em rede com o intuito de programar e gerir os assuntos públicos relacionados com o OT segundo os princípios da boa governança (Dallabrida, 2006, 2007, 2011; Dallabrida and Becker, 2003a; Farinós, 2008; Héritier and Lehmkuhl, 2011; Sørensen and Torfing, 2005).

A GT representa um sinal de inovação politica e administrativa no OT, existindo uma maior convergência, quase sobreposição entre a GT e o OT. Isto porque, ao protagonizar uma mudança de paradigma de uma ótica para e dura de regulação do uso do solo, para uma ótica estratégica de desenvolvimento, o OT tem necessariamente de se suportar em processos e mecanismos de governança. A governança pode ser realizada de diferentes modos como, e.g., uma governança colaborativa caraterizada por relações horizontais (em rede) ou centralizada, pela adoção de um sistema vertical (hierárquico) (Healey, 1997). No caso da GT, esta corresponde a uma tentativa de estabelecer voluntariamente relações horizontais de cooperação e parceria na definição e implementação das PP (Ferrão, 2013) e distingue-se ainda pela gestão das dinâmicas territoriais e avaliação dos seus impactos (Stead, 2014).

Atualmente, a GT tem ganho expressão no OT com a evolução da definição de PP de OT a caminhar para um processo que se deseja cada vez mais suportado numa tomada de decisão relativamente horizontal e participada, que defende o interesse público na formulação de estratégias e os princípios da transparência na sua comunicação e apresentação (Healey, 2003). Nesta perspetiva, a GT surge em reação a um modelo tradicional de tomada de decisão em OT, que se apresentava como um modelo hierárquico, em que a tomada de decisão ocorre num meio restrito de atores e o seu resultado é apresentado como poder soberano e de última

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instância sobre os cidadãos e a sociedade civil (ESPON, 2006; Feio and Chorincas, 2009; Mayntz, 1998; Pereira, 2017).

Ganha assim destaque a ótica do planeamento colaborativo, suportada pela transição de uma fórmula de governação baseada no governo do território para uma outra forma de governação mais flexível, em rede, não hierárquica (Innes et al., 2010).

O modo de desenvolvimento territorial que se tem vindo a adotar, caracteriza-se pelo aumento progressivo da dicotomia entre o espaço rural e o espaço urbano, exigindo cada vez mais ao OT uma resposta rápida e integrada, que apenas é possível através de uma GT fluida e articulada (Aguiar, 2002; ESPON, 2006). Nesta ótica, o conhecimento transversal construído com a cooperação entre as várias entidades administrativas (Batista e Silva, 2017a; Ferrão, 2010), a população e em parceria com os agentes decisores e as entidades que regulam os territórios adjacentes à área de intervenção (Feio and Chorincas, 2009), contribui significativamente para a aplicação de recursos de forma equilibrada e segundo uma estratégia de desenvolvimento sustentável (Barrow, 1995; Kavaliauskas, 2008), suportada numa visão alargada e com capacidade de diminuir ou mesmo eliminar eventuais desigualdades pré-existentes (Condessa et al., 2015; Mohammad et al., 2012).

A GT incute no OT uma colaboração ampla e qualificada através da partilha de informação entre os vários atores e entidades. Numa perspetiva operativa e de utilidade, é fundamental para a GT, que os processos de OT assentem numa lógica colaborativa de partilhada de informação (Ferrão, 2010), onde a sociedade civil assume um maior protagonismo, impulsionado pela promoção da participação pública e por processos de OT mais integradores, respeitando, no entanto, o papel insubstituível do Estado (Dallabrida, 2015, p. 307).

Uma PP é inevitavelmente fruto de uma ação estatal, e nesse sentido o papel do Estado na definição de PP é insubstituível por qualquer grupo ou entidade civil. O papel do Estado inclui articular escalas, sectores e interesses, e não pode ser delegado a grupos ou entidades civis, uma vez que estes tendem a organizar-se por sectores, âmbitos, escalas ou interesses e por norma funcionam fechados em si mesmos, enquanto o Estado desempenha um papel de defesa do interesse público nos vários âmbitos, escalas e sectores.No entanto, é cada vez mais desejável que a definição de PP decorra segundo um processo aberto e integrador da sociedade civil, onde a colaboração e partilha de informações ocorre entre as partes intervenientes com o objetivo de criar um conhecimento mais vasto, coeso e profundo (Amado et al., 2017).

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A abertura dos processos de OT à sociedade que a GT promove, representa ação tão difícil e complexa, quanto útil e necessária. Por um lado, a abertura do processo de OT resulta numa maior participação da comunidade nos processos de OT e planeamento, o que contribui de forma inequívoca para a transparência e credibilidade dos processos de OT e, em simultâneo, facilita o entendimento e aceitação das PP por parte da população. Por outro lado, este panorama de inclusão torna-se um desafio enorme para a GT, quando aleado a toda uma extensão administrativa que se verifica difícil de coordenar devido à sua natureza dispersa e assente na multiplicação constante de atores e intervenientes no processo (Amado, 2018a).

Em paralelo, à medida que as PP se tornam mais abrangentes, introduzindo noções emergentes no seu processo de definição, e mais inclusivas, abrindo o seu processo aos vários grupos da sociedade, são exigidas maiores capacidades de resposta ao OT, e em especial maior celeridade na resposta aos problemas enfrentados. Neste sentido, a exigência de coordenação intersectorial torna-se ainda mais pertinente e premente com a aceleração da transformação da sociedade e da intervenção territorial, que vê os seus efeitos cada vez mais repentinos e incertos, e que procura no OT uma postura mais proactiva (Antunes, 2017). Torna-se assim fundamental que o processo de OT decorra assente em práticas colaborativas (Graña, 2005), que beneficiam da cooperação e partilha de informação e conhecimentos no seio do processo de decisão estratégico, para que se possa garantir uma maior eficiência, eficácia e transparência ao nível das intervenções territoriais.

O OT exige uma visão de futuro que tem que ser minimamente partilhada entre os vários intervenientes envolvidos (Farinós, 2008). Neste sentido, o GT apresenta- se como ferramenta de gestão dos assuntos públicos com impacto no território (Dallabrida, 2011, 2007, 2006) e promove intervenções territoriais articuladas, assentes numa visão para o futuro partilhada, desenvolvendo estratégias unificadas e unificadoras (Feio and Chorincas, 2009) e contribuindo para o reforço da coesão social e territorial de forma sustentável e equilibrada. O alcance de uma visão partilhada para o futuro, assente em parcerias e cooperação entre os vários níveis de atores envolvidos é fulcral para assegurar a integração e representação dos diferentes grupos e interesses, contribuindo ainda de forma ativa para o reforço da coesão social e territorial. (Dallabrida, 2015; Dallabrida and Becker, 2003b; ESPON, 2006; Farinós, 2008; Feio and Chorincas, 2009; Ferrão, 2013).

A GT encara dificuldades na sua integração no seio da atividade do OT. Em primeiro lugar, pela natureza complexa do suporte territorial a que está associada,

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envolvendo temáticas complexas e uma realidade territorial em constante transformação. Por outro lado, porque contrasta com a tradição administrativa assente numa cultura organizacional verticalizada e sectorial, caracterizada por uma desarticulação constante entre níveis e setores que prejudica a implementação de práticas de trabalho mais colaborativas e comunicativas. Trata-se de uma barreira cultural, uma questão de cultura e mentalidades, onde não existe uma cultura de colaboração e interação, funciona-se por tradição numa ótica de silos, de poderes, assente numa organização política e administrativa que se divide, por tradição, entre um governo central fortemente centralizado e uma tradição municipal muito forte que não comunicam entre si.

2.5. Influência europeia na reconfiguração da política de

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