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O CURRÍCULO DO CURSO É PROFISSIONALIZANTE OU FORMATIVO?

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CAPÍTULO III ANÁLISES DAS ENTREVISTAS

3.4 ANÁLISE CONJUNTA DOS PROFESSORES

3.4.6 O CURRÍCULO DO CURSO É PROFISSIONALIZANTE OU FORMATIVO?

Esta questão visa suscitar a reflexão dos entrevistados sobre a estrutura do currículo do curso de pedagogia: ele estaria mais voltado à profissionalização ou à formação dos estudantes?

Foram realizadas três perguntas aos professores sobre este tema, relacionando o currículo do curso com profissionalização e formação.

Os professores Dois, Quatro, Cinco, Sete e Nove afirmam que o curso no qual atuam é mais voltado à profissionalização, embora nem todos considerem que isto seja bom.

A professora Dois diz:

Então acho que nós pensamos mais na parte da sala de aula mesmo, mais no profissional. No que ele vai fazer no que vai ser dele lá.

Para o professor Quatro, o currículo do curso está diminuindo os “fundamentos”, que para ele são a base do curso, tornando então o curso mais técnico. Ele afirma:

Os fundamentos que para mim são a base na formação de uma possibilidade de formação humanista estão desaparecendo dos cursos. E as novas diretrizes curriculares do curso de pedagogia o tornaram no Normal Superior. Agora, mais do que nunca virou um curso utilitarista.

Ainda segundo este professor, a profissionalização é uma demanda dos próprios alunos, como ele diz:

Eu diria que atualmente é: o curso na visão dos alunos ele deve ser profissionalizante. Os alunos querem um curso profissionalizante, com a menor duração possível. A instituição me parece que até no atual currículo, ela caminhava como que em uma corda bamba. Então nem lá, nem cá. Ela tentava dar um pouco dessa formação básica dos fundamentos, sem deixar de lado a formação mais prática, mais técnica.

O professor Cinco também entende que o curso no qual atua está mais voltado para a prática docente cotidiana. Ele argumenta: “Profissionalizante seria prepará- las para a sala de aula? Eu acho que é mais profissionalizante”.

Esta também é a opinião da professora Sete, conforme ela fala:

Ele é mais profissionalizante. Ele não é um curso que dá uma base teórica, é um curso que tem aquelas disciplinas, por exemplo, psicopedagogia, essas coisas mais da moda, que acabam formando para o mercado e infelizmente para o mercado de escola particular.

A professora Nove considera a profissionalização uma boa característica do curso:

Eu acredito que sim. Hoje melhor que em anos atrás. Na minha época, por exemplo, se você tivesse que sair da sala de aula para dar aula, você saía bem cru. E hoje as universidades estão preocupadas com essa formação, de se ter uma idéia mais real do dia-a-dia.

Os professores Um e Oito entendem que, com as mudanças ocorridas nos cursos, eles passaram a ser mais de formação.

A professora Um refere-se às novas diretrizes publicadas pelo MEC, que são muito abrangentes e amplas, dando muita autonomia às universidades, o que deixa os cursos diferentes entre si. Referindo-se ao curso em que atua, ela coloca:

Eu só sei dizer que nesse momento eu estou muito empenhada, junto com a minha coordenação, com a minha equipe, em construir um currículo para esse novo curso que está nascendo muito direcionado à questão da formação do professor pesquisador, do professor reflexivo, autônomo, capaz de solucionar os problemas cotidianos da sala de aula. Nós entendemos e eu entendo que essa autonomia, essa reflexidade, essa pesquisa diária, ela só se faz centrada no conhecimento. Entender bem qual é o conceito de professor pesquisador reflexivo e autônomo e valorizar a teoria, curso de formação de professor não é curso de bordadinho.

Tendo como ponto de partida as mudanças no currículo, o professor Oito afirma:

Eu acredito que agora ele está muito mais de formação. Eu acreditava anteriormente, que ele era mais voltado para a questão da profissionalização, do profissional. Nós tínhamos muitas disciplinas em que o foco era muito de prática. Precisávamos formar essa pessoa para atender mercado, agora não, nós mudamos radicalmente. Ao mesmo tempo em que nós estamos levando todos os nossos alunos a pensar e refletir sobre o papel dele como educador. Entendemos até que a profissionalização é uma conseqüência.

As professoras Seis e Dez acreditam que o curso em que atuam é misto, ou seja, buscam a profissionalização, mas também a formação do aluno.

A Professora Seis afirma: “Eu acho que é mais... Acho que está misto, ou talvez sessenta por cento na formação, mas está muito direcionado também para que os alunos consigam se posicionar no mercado de trabalho”.

Segundo a professora Dez, é até um desejo dos alunos que os professores tragam receitas, mas ela não vê distância entre o profissional e o humano, por isso considera que o curso no qual atua contempla tanto a formação quanto a profissionalização. Ela afirma:

Eu vejo muito uma preocupação e desejo até dos alunos, expectativa dos alunos, que a gente traga modelos de ação, receitas, exemplos. E essa discussão que fundamenta a prática tem sido preterida. Ele é profissional, profissionalizante por que forma o profissional para atuar na sociedade, forma pessoas para se relacionar no mundo do trabalho com outras pessoas. Quando eu falo que o currículo está prejudicado por que tem insistido muito na formação técnica, me parece então que tem formado mais profissionais técnicos do que formado profissionais reflexivos, se é que podemos fazer essa diferenciação. Para mim o profissional não pode deixar de ser humano, então eu não enxergo essa diferença que você coloca.

Para a professora Três, o currículo não dá espaço suficiente para formação, e também não dá conta de formar adequadamente o profissional. Ela coloca:

E teve reunião de planejamento. O que eu senti: você tem a conversa naquele momento entre os pares, entre as áreas. No papel até se fala de uma concepção, de uma formação, por que eu peguei uma cópia do projeto e li. Mas eu não sinto isso efetivamente acontecendo.

Referindo-se à profissionalização, ela aponta:

Aí também depende do ponto de vista. O que é ser um profissional? É aquele que só sabe a teoria, que cumpriu ali os créditos, que tirou as notas suficientes, que teve as avaliações dos professores dizendo o que os autores falaram? Ou é aquele aluno que realmente apresenta questões para serem problematizadas na sala de aula? Que refletem a realidade de onde ele vai trabalhar?

Concluindo, esta professora diz que o currículo atual não dá conta de formar os alunos para a realidade, conforme ela afirma:

Em meu ponto de vista, com meu um ano de experiência, eu acho que o currículo não está dando conta de formar o que realmente é necessário para a realidade que nós temos vivido. Nós não temos dado a base necessária para isso.

3.4.7 Universidade e formação humana

Uma das orientações da LDB referente às funções do ensino superior consiste em formar o sujeito integral para a sociedade, o cidadão. Partindo desse pressuposto, o objetivo desta questão é perceber se na perspectiva dos professores entrevistados, as instituições universitárias se preocupam com essa formação ou não.

Neste sentido, os professores Dois, Três, Cinco, Seis, Oito e Nove entendem que as universidades não se preocupam com a formação humana, e cada um deles aponta para uma real preocupação da universidade.

Para a professora Dois a preocupação das universidades é com o lucro, como ela afirma:

Eu acho que nós que estamos na sala de aula temos essa preocupação com o humano. Eles estão preocupados com o lucro, com o burocrático, com o administrativo. Estão preocupados com o quanto está entrando.

A professora Três também entende que as universidades não dão conta da formação dos alunos, e estão preocupadas em otimizar tempo e gasto. Ela relata:

Sinceramente? Não dá conta. Como é que eu formo um aluno na minha disciplina nesses aspectos em seis não, em quatro meses. Ele vai embora e vem outra turma e quando eu começo a me entrosar com essa turma, conhecer, já estou indo embora. No regime semestral? Que é otimização de tempo, de gasto?

Segundo o professor Cinco, existem dentro da universidade grupos que se preocupam com a formação humana, mas as universidades em si não têm essa preocupação, como ele relata:

Eu acho que alguns grupos dentro de algumas universidades têm essa preocupação. Alguns grupos têm, de forma geral, as universidades não. Mas talvez alguns grupos que até tenham influência, de grupos que além de estarem na universidade participam também de movimentos sociais, movimentos políticos, que têm essa preocupação, principalmente com ONGs, com movimentos sociais.

A professora Seis acredita que existe muita competição entre as pessoas, o que acaba diminuindo a humanização. Ela responde ao ser indagada se, na opinião dela, as universidades se preocupam com formação:

Eu acho que não, mas não tenho conhecimento técnico disso. Acho que, de uma forma geral, as pessoas não se preocupam com humanização. Muito embora, a gente até está na era da gestão de pessoas, mas o que a gente acaba vendo na prática é uma competitividade muito grande, as pessoas querendo uma ganhar das outras a qualquer preço, e a humanização vai para o espaço, mas eu acho que o caminho seria essa humanização, entender o outro, e respeitar as diferenças.

Na concepção do professor Oito, a preocupação das universidades é atender uma demanda de mercado, como ele aponta:

A preocupação hoje com a universidade é visando exatamente atender uma demanda de mercado. Você coloca cento e cinqüenta, duzentos alunos em sala de aula, como nós vemos em algumas universidades, você acredita que vai existir preocupação do professor com uma abordagem humanista? Coisíssima nenhuma, com certeza absoluta não.

Para a professora Nove, as universidades não se preocupam com formação, mas incorporam os projetos de iniciativa individual dos professores. Ela diz:

Não, acho que não. Acho que as universidades ainda não se voltaram para isso. Eles até incorporam esses projetos de iniciativas individuais dos professores, mas não por iniciativa das universidades. Eles não estão preocupados com isso, pelo menos no momento, acho que não.

As opiniões dos professores Quatro e Sete convergem no sentido de que existe nas universidades alguma preocupação com a formação humana, ainda que pequena e que ela não aconteça efetivamente.

O professor Quatro relata:

Eu diria que pode haver a preocupação, mas não há a prática. Há o discurso. O discurso está presente. Quando você vem, por exemplo, para a Universidade Quatro, que é uma Universidade Confessional, a gente percebe a clara intenção dos gestores em fazer essa formação, mas a configuração dos cursos empurra em uma direção contrária. E por isso eu digo, acaba ficando muito em função da iniciativa própria, individual de cada professor.

A professora Sete aponta para a divisão das universidades em públicas e privadas, e considera que o sistema privado não tem comprometimento real com aluno. Ao ser questionada sobre a preocupação das universidades com a formação humana, ela responde:

Muito pouco. Considerando essa divisão entre sistema público e privado, já é complicado, por que em geral, o sistema privado não tem um real comprometimento com o aluno, mesmo no ensino fundamental e médio. O comprometimento dele é com o sistema econômico que rege, é o mais barato, é o mais fácil, o mais simples. Você não vai remunerar bem os seus professores, ter professores super formados. Você vai pagar um preço ali e quem aceitar entra. Isso é muito complicado. Nas universidades públicas, pelo que eu conheço delas, eu acho que ainda tem um comprometimento maior com o aluno... Já começa chamando de clientela, e para mim educação não é uma mercadoria, eles não são meus clientes. Quando nós estabelecemos uma relação de cliente, o aluno, as coisas não ficam muito humanizadas. Até por que o cliente não tem razão na universidade. As reivindicações dos alunos são justas, mas o que acontece é que não são atendidas.

As professoras Um e Dez percebem nas universidades a preocupação com a formação humana. Para a professora Um embora as faculdades particulares não percam o caráter de empresa, na faculdade em que ela atua existe a preocupação em “mudar a vida dos sujeitos”. A professora Um coloca:

Essa é uma questão complicada, por que as faculdades particulares, elas não perdem o caráter de empresa. Querendo ou não é uma empresa. Eu vou falar da faculdade Um, por que eu trabalho aqui e existe um lema, uma missão, a faculdade Um quer oferecer o melhor ensino pelo melhor custo-benefício. E o que é o melhor ensino? O melhor ensino como ele é entendido pelo nosso novo diretor é uma questão de mudar a vida desse sujeito que aqui chega... Agora, se todas as faculdades pensam assim, realmente eu não posso dizer, eu não sei. O que eu sei dizer é aqui também a questão empresa aparece, por que é uma faculdade particular que visa lucro ensinando ou não.

Para a professora Dez, a formação humana acontece por que os professores estão comprometidos com a educação e com a produção do conhecimento. Mas, trabalhando no que ela chama de “condições adversas”, os professores têm que priorizar certas atitudes em detrimento da formação para atender a uma demanda de mercado. Ela afirma ao responder se as universidades se preocupam com a formação humana:

Eu acho que sim. Até porque nós temos profissionais atuando nestas universidades que têm formações diferenciadas. Eu vou dizer especialmente na área da educação. Os profissionais formadores que atuam em geral nos cursos que formam licenciados são profissionais que têm formação teórica densa, comprometidos com a educação, com o ideal da educação, com a prática de produção de conhecimento. São profissionais sérios, que tiveram uma formação diferenciada. São formadores que tiveram a chance de ter um outro tipo de formação, mas que se deparam com todos os determinantes do mercado de trabalho, com o desejo das instituições de cada vez ter mais alunos, com as condições adversas de formação e de trabalho. Enfim, eu acho que existe sim um desejo de se formar profissionais na perspectiva humana, não profissionais técnicos, só técnicos. Mas as condições adversas de formação, de trabalho e do mercado acabam por vezes fazendo com que a gente priorize o caráter técnico.

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