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A UNIVERSIDADE NO PERÍODO POPULISTA

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CAPÍTULO II A CONSTRUÇÃO DE UM MODELO DE UNIVERSIDADE NO BRASIL

2.4 A UNIVERSIDADE NO PERÍODO POPULISTA

O populismo foi um fenômeno político complexo, que surgiu no Brasil após a revolução de 1930. Segundo Cunha este sistema:

Caracterizou-se por um estilo de governo e uma política de massas. Como estilo de governo estava marcado pela sensibilidade às pressões populares: como política de massas, buscava a mobilização controlada destas em proveito das classes dominantes. (1989. p. 48).

No início desse período também conhecido por República Populista, a organização do ensino superior pouco tinha de universitária, pois havia mais estudantes nas faculdades isoladas do que nas universidades, e sua organização continuava sendo regida pelo Estatuto das Universidades Brasileiras de 1931.

A República Populista trouxe de volta à burocracia do Estado, liberais como Anísio Teixeira, mas não desligando funcionários mais dedicados, como por exemplo, Gustavo Capanema. Essa dualidade limitou os liberais de organizar um novo sistema educacional, mas permitiu-os retomar seus projetos dos anos 30, fazendo incluir na constituição um dispositivo que prescrevia a elaboração da “Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional”.

Segundo Anísio Teixeira, a universidade brasileira, já nesse período, poderia ser vista sarcasticamente como uma série de congregações isoladas e independentes, unidas por uma reivindicação comum em torno do orçamento, que era feito e votado fora dessa universidade.

Os questionamentos, então, passavam em torno de questões de integração da universidade com eficácia, que pudesse lhe conferir uma unidade. Na década de 30, as Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL), deveriam se tornar o pólo aglutinador das universidades brasileiras. No entanto, na década de 60, os intelectuais responsáveis pela reforma universitária, não pensavam assim.

A LDB de 1961, propunha que a universidade fosse constituída, no mínimo de cinco estabelecimentos de ensino superior, sendo que um deles deveria ser a FFCL, sem, no entanto, ser obrigatória a sua formação em torno dela.

A rede nacional do ensino superior conta, já, com mais de 70 faculdades de filosofia, que vêm exercendo, salvo raras exceções, exclusivamente a função de formar professores de grau médio. Nessas circunstâncias, a exigência de que toda universidade mantenha uma dessas faculdades, torna-se desnecessária. Acresce que as funções de órgão integrador que se deseja atribuir a tais faculdades podem ser exercidas por outros órgãos tais como Institutos Centrais que já vem sendo estruturados em algumas universidades federais (LDB, Documenta, Rio de Janeiro: MEC, n. 12, p.86, mar. 1963 apud Celeste Filho, p.163).

Para Newton Sucupira, atuante membro do Conselho Federal de Educação (CFE), a missão dessas faculdades não seria somente a de formar professores de ensino médio, mas também de promover a pesquisa científica básica e exercer a função integradora da universidade. Mas, devido à tradição do nosso ensino superior, à base de faculdades profissionais, não se permitiu que ela pudesse realizar sua missão desde sua fundação, tornando-a uma faculdade como as outras, ou seja, profissionalizante.

Baseado na suposta constatação que a função exercida pelas FFCL era quase que exclusivamente formar professores de grau médio, foi vetada a obrigatoriedade da constituição destas como órgão integrador das universidades.

Um outro artigo da LDB dispunha sobre o objetivo do ensino superior, que seria a pesquisa e o desenvolvimento da ciência, entre outros. Para Maurício Rocha e Silva – Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência ( SBPC) e membro do CFE – este artigo era revolucionário, e inverteria a ordem dos valores das universidades, colocando a pesquisa, o desenvolvimento das ciências, das letras e das artes como base do ensino.

A hierarquia burocrática, que surgiu a partir da década de 50 com a entrada de capital estrangeiro no país, se tornou alvo da classe média.

Para que se atingissem tais alvos, a escolarização no nível superior se tornou requisito necessário, havendo então um aumento de demanda para esse nível de ensino e tornou-se principal força propulsora da expansão do ensino superior no Brasil no período 1946/1964. Aliado a esse fato, juntou-se a consolidação da sociedade urbano-industrial brasileira.

“a transferência das populações rurais para as zonas urbanas fez com que elas logo se percebessem da importância da posse dos conhecimentos de leitura, escrita e cálculo para as transações mais elementares na cidade”(1989.p. 73)..

Essa demanda pela escolarização em nível superior, passou a ocupar um importante lugar no mecanismo de dominação política próprio do populismo. Construir mais salas de aulas foi um dos meios do Estado demonstrar sua preocupação com as necessidades do povo e sua capacidade de realizá-las.

No período de 1945 a 1964, as críticas contra a universidade se acirraram, principalmente quanto ao seu arcaísmo. A ideologia desenvolvimentista necessitava de uma universidade moderna, que atendesse aos imperativos da segurança e do desenvolvimento.

Segundo Cunha:

“A formação econômica, acelerada e abundante de profissionais, principalmente de tecnologistas, era vista como requisito do rompimento dos laços de dependência que entravavam o desenvolvimento do país, como condição para a sua mais perfeita integração econômica, diplomática e militar no conflito entre o “mundo livre” liderado pelos Estados Unidos, e a “cortina de ferro”, pela União Soviética” (1989.p. 152).

O primeiro passo para a modernização do ensino superior no Brasil, se deu através do segmento militar através da criação Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

O ITA funcionava com inovações acadêmicas, como por exemplo, não havia cátedra vitalícia, sua organização era em departamentos, o currículo flexível. A existência dessa ilha de modernidade animou os reformadores do ensino, principalmente aqueles que viam na modernização do ensino superior, e na produção da pesquisa científica e tecnológica o caminho para o rompimento da dependência do Brasil. Para possibilitar essas pesquisas, foi criado o Conselho Nacional de Pesquisas.

No entanto, acordos internacionais, principalmente com os Estados Unidos, mantiveram o Brasil longe de qualquer tentativa de independência tecnológica, inclusive de pesquisas nucleares.

Com o intuito de adaptar o ensino superior à realidade do país, e mais especificamente o ensino das engenharias, foi criada no MEC uma comissão, a COSUPI. Seu presidente fez um diagnóstico da situação das faculdades de filosofia e das escolas de engenharia existentes na época.

O momento mais forte do movimento iniciado pelo ITA, foi a criação de uma universidade em Brasília. Em primeiro lugar, por que havia a necessidade de se manter junto à burocracia do governo uma reserva de especialistas qualificados, e em segundo lugar criar um paradigma moderno para o ensino superior brasileiro.

A Universidade de Brasília foi a mais audaciosa tentativa de se criar o verdadeiro espírito universitário no Brasil. Não partindo da aglutinação de nenhuma escola superior, possuía Institutos Centrais de Ciências, Letras e Artes, os quais forneceriam um curso introdutório de dois ou três anos para todos que ingressassem na universidade. Seriam também responsáveis pelos programas de estudo e formação de pesquisadores e pós-graduação.

Nasceu assim a mais moderna universidade do Brasil, tendo como finalidade primeira “formar cidadãos empenhados na busca de soluções democráticas para os problemas com que se defronta o povo brasileiro na luta por seu desenvolvimento econômico e social”.

Nesse período, cresceu a participação do Estado, principalmente da União nos estabelecimentos de ensino superior. Muitos deles, mantidos pelos governos estaduais, municipais e também particulares passaram a ser custeados e controlados pelo Ministério da Educação. Os professores catedráticos tornaram-se funcionários públicos federais, e os demais funcionários foram enquadrados como extranumerários.

Nos últimos dez anos da república populista, o ensino superior era predominantemente universitário, resultado das numerosas federalizações e aglutinações de escolas isoladas. Apresentou um grande crescimento no número de matrículas, que passou de 24.253 em 1945, para 142.386 em 1964.

Na república populista, o número de universidades passou de cinco para trinta e sete, e o número e estabelecimentos isolados subiu de 293 para 564. A taxa de aumento no número de vagas nas universidades e nas escolas isoladas cresceu 236,7%. O crescimento relativamente maior do número de universidades, se comparado ao de estabelecimentos isolados, se deve ao fato de que as

universidades não nasceram assim, mas se formaram a partir da integração de escolas isoladas.

No entanto, a combinação dos resultados do aumento de vagas oferecidas e da demanda pelo ensino superior, não foi equilibrada. Em 1964, o número de inscritos nos vestibulares era 2,5 vezes maior que o de 1946, enquanto que o número de vagas era 2,1 vezes maior.

Na república populista, surgiram as primeiras cidades universitárias, inspiradas nos campus das universidades norte-americanas. A reunião das faculdades em um campus, limitou-se a justapô-las, pois as concepções arquitetônicas desses campus, nem sempre buscavam sua integração.

Nem todas as correntes políticas eram favoráveis à modernização da universidade na república populista. Dentro do próprio movimento estudantil abrigou- se uma corrente de pensamento que se opunha a esse processo.

O projeto de reforma e democratização do ensino superior brasileiro, nasceu e se desenvolveu no meio dos estudantes. Pode-se afirmar que a UNE, nasceu dentro de um projeto de reforma elaborado pelos próprios estudantes no II Congresso Nacional de Estudantes de 1938 no Rio de Janeiro.

Desde sua fundação, não foi mais possível ao Estado, ignorar o potencial político dos estudantes universitários, devido ao seu grande potencial de mobilização em todos os momentos críticos da situação do país. O controle da representação estudantil passou então a ser então fundamental para o Estado.

Em 1960-1961, aproveitando-se da Campanha pela Escola Pública, o movimento estudantil se articulou e realizou em Salvador o Primeiro Seminário Latino-Americano da Reforma e Democratização do Ensino Superior. Nesse seminário foram realizados painéis com questões sobre a reforma, e também feitas manifestações sobre a LDB.

O texto final apresentado no seminário conhecido como Carta da Bahia, mostra que os participantes não tinham orientações claras e definidas quanto ao contexto social da universidade brasileira, mas convergiam nas propostas particulares, muitas já defendidas na modernização do ensino superior pelo Estado.

Segundo esse texto, o sistema educacional era restrito e altamente seletivo, desvinculado da realidade social. O ensino superior era visto como uma barreira ao

desenvolvimento, pois nem formavam os profissionais exigidos, nem as universidades estariam assumindo a liderança que lhes cabia.

Consideraram a cátedra vitalícia e os concursos para docentes como falhas estrutural da universidade, que resultavam em aulas excessivamente teóricas e acadêmicas, professores sem métodos pedagógicos ou com métodos ultrapassados, que não praticavam a pesquisa e nem forneciam aos alunos meios para fazê-las.

O texto, porém, apresentava algumas contradições, pois ao mesmo tempo em que proclamavam a universidade como patrimônio do povo, ela era entendida como a instituição que deveria formar os profissionais para as necessidades do meio e os núcleos dirigentes da nação. Para isso a universidade deveria voltar-se para os problemas brasileiros, para a criação de uma tecnologia nacional, com ênfase às ciências exatas, à agronomia e à administração.

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