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O “desvio esquerdista” do PCP

No documento Luta Armada em Portugal (1970-1974) (páginas 193-200)

ARA “braço armado” do PCP

1. O “desvio esquerdista” do PCP

Em Janeiro de 1964 foi fundada a FAP, mas a circular de expulsão de Francisco Martins Rodrigues do PCP apenas seria discutida internamente no Verão desse ano. Durante cinco meses, o Comité Central reteve a circular, provavelmente temendo o grau de discordância dos seus militantes. Todavia, segundo João Madeira, essa discordância terá sido pouco expressiva, pois o que pesou na discussão não foram as questões políticas mas sim o trabalho cisionista e o abandono de instalações com material do partido498. Porém, havia dentro do Partido Comunista, sectores mais combativos, que defendiam uma radicalização da luta contra o regime e que reclamavam uma clarificação política em relação às posições defendidas por Martins Rodrigues. Os dirigentes do PCP designavam esta atitude de “aventureirismo”, considerando que não estavam ainda preparadas as condições necessárias para passar às acções armadas, e procurando, tanto quanto possível, impedir dissensões “à esquerda” no PCP.

Em entrevista à Rádio Portugal Livre, em Março de 1964, Sérgio Vilarigues, um dos membros do Secretariado no exterior, é claro sobre esta matéria:

“Quando alguns elementos, tomando os desejos pela realidade, dizem, muito senhores de si, com toda a sinceridade, que o partido deve armar as massas, o facto representa uma grande confiança no nosso partido, mas representa também muita ingenuidade [..] não se devem desencadear certos tipos de acções às cegas. É preciso preparar antes as condições de organização, os meios, as refregas, etc., e depois estudar cuidadosamente, com espírito de responsabilidade, o momento próprio, a conveniência e oportunidade desta ou daquela acção, sempre em função da luta de massas e em estreita ligação com ela” 499

No entanto, temendo perder o controlo dos sectores mais radicais, o PCP não descartava a possibilidade de “acções especiais” desde que estas estivessem enquadradas por amplas movimentações sociais ou políticas e implicassem “organizar e incentivar acções ofensivas de defesa e auto-defesa, que visem desorganizar o aparelho repressivo fascista e defender as massas da repressão policial” 500.

De facto, continuaria a haver dentro do PCP quem defendesse as acções armadas e

498MADEIRA, João, O efeito Martins Rodrigues e o desvio esquerdista de Maio de 1964 no PCP, comunicação

apresentada no “Colóquio Os Comunistas em Portugal 1921-2008”, PO/BMRR, Novembro de 2008

499A luta pelo derrubamento da ditadura fascista e a organização, Entrevista concedida por Sérgio Vilarigues à “Rádio

Portugal Livre”, em 25 de Março de 1964, cicl., p. 1. (documento gentilmente cedido por João Madeira)

reclamasse da direcção medidas concretas nesse sentido. Era preciso dar resposta a esta pressão, pelo que admitir o recurso às acções armadas era também uma forma de neutralizar estes sectores e de esvaziar o crescimento da FAP.

Todavia, Sérgio Vilarigues fazia, também, questão de explicar que ainda não estavam criadas as condições para avançar com as acções armadas e, que primeiro, seria preciso atrair os soldados, que eram os que tinham as armas, e colocá-los ao lado do movimento de massas:

“Como o partido comunista português já aparentou, os arsenais da classe operária, da massa trabalhadora, do nosso povo, são os arsenais do Estado e os quarteís. Aqui, muitas das armas encontram-se nas maõs dos filhos do povo fardados. Atrair os soldados e os cabos para a causa da revolução e organizá-los solidamente, é já dispor da possibilidade real de obter armas, quando a situação o exigir. Mais do que isso, é dispor de combatentes prontos a empregar as armas, quando a situação o aconselhar”501.

O PCP procurava demarcar-se da via “aventureirista” e num artigo do Militante, de Março de 1964, é referido que a linha “revolucionária” era a que estava subjacente às acções do 1º de Maio de 1962, enquanto a linha “aventureirista” era a que tinha prevalecido no golpe de Beja502.

Seriam um tipo de acções semelhantes às que tinham sido planeadas para o 1º de Maio de 1962 que o partido procurava, no interior, organizar para o 1º de Maio de 1964. Numa reunião da Direcção da Organização Regional de Lisboa, levada a cabo para esse efeito, foi defendido que o partido deveria concentrar os seus esforços na preparação das manifestações desse dia, procurando formar grupos que as conduzissem no terreno, apoiando qualquer acção espontânea das massas503. O que o partido pretendia era conter qualquer tipo de acções violentas espontâneas das massas e procurava preparar com tempo as iniciativas e organizar grupos que conduzissem as manifestações. Na reunião da Organização Regional de Lisboa, Rogério de Carvalho, membro do Comité Central, com funções de controlo político sobre a DORL, explicita as orientações da Direcção do partido para o 1º de Maio: preparar as manifestações que deviam ser acompanhadas de “acções especiais contra as forças repressivas e outras acções que criassem a agitação entre a população”504.

O PCP deu indicações para que fossem preparadas acções especiais que dificultassem a marcha dos carros da polícia, que forçassem a dispersão das forças repressivas e que causassem danos à máquina militar. Seriam aprovadas acções como a destruição de postos de chamada da polícia, utilização de cocktails Molotov contra carros da PSP, lançamento de granadas para o interior de esquadras e espalhar pedaços de pneu com pregos para provocar engarrafamentos de trânsito.

501 A luta pelo derrubamento da ditadura fascista e a organização, Entrevista concedida por Sérgio Vilarigues à “Rádio

Portugal Livre”, em 25 de Março de 1964, cicl., p. 2. (documento gentilmente cedido por João Madeira)

502 “Linha revolucionária e linha aventureirista”, O Militante, III série, 126, Março de 1964

503 IAN/TT, PIDE-DGS, Processo sem número, Documentos apreendidos a indivíduos do PCP, UI 9104, Discussão

efectuada pela Direcção Regional de Lisboa com vista à realização do dia 1º de Maio de 1964, dact., s.d., p. 1 [495]

504 IAN/TT, PIDE-DGS, Processo sem número, Documentos apreendidos a indivíduos do PCP, UI 9104, Discussão

Previa-se, também, na véspera do 1º de Maio, cortar os postes de alta tensão que alimentavam Lisboa, assim como os cabos telefónicos usados pelas forças policiais, bem como realizar comícios- relâmpago à entrada de grandes fábricas, apoiados em grupos de estudantes armados, que utilizariam carros roubados com matrículas falsas505. Por sugestão dos organismos de estudantes, chegou a ventilar-se o rapto de Paulo Cunha, Reitor da Universidade de Lisboa e de um inspector da PIDE. Foi também montado um aparelho de agitação com cerca de 50 grupos de rua, de dois a três elementos cada um, para distribuir comunicados à população, fazer pinturas na parede e colar cartazes. Num relatório sobre a situação no sector estudantil referia-se que: “Era grande o entusiasmo no sector antes do 1º de Maio. A organização trabalhava com afã, toda a gente falava, muitas ideias corriam sobre o 1º de Maio. Vivia-se o 1º de Maio como uma jornada superior a todas as outras pois desta vez dava-se um passo em frente: as acções especiais, que para muitos corresponderam a tentativas ou ensaios armados contra as forças repressivas”506.

A falta de conhecimentos e de experiência fizeram com que estas acções não resultassem. Depois de seguirem o reitor durante alguns dias, foi decidido não o raptar; as granadas não puderam ser utilizadas, porque não havia ninguém que as soubesse manipular; as acções com cocktails

Molotov foram desmarcadas por falta de elementos que os soubessem ou estivessem dispostos a

usar; o corte dos postes de alta tensão não se fez porque não se conseguiu arranjar o explosivo necessário e os comícios-relâmpago não se realizaram507.

O Avante! refere a participação de milhares de pessoas na manifestação do 1º de Maio, em Lisboa, que se dirigiram, de vários pontos da cidade, para os Restauradores, apedrejando o Palácio Foz, onde se encontrava instalado o SNI508. Aqui ocorreram dos mais graves confrontos com a polícia, tendo-se registado um morto e vários feridos.

Noutras regiões do país, como na margem Sul e no Alentejo, foram também preparadas acções com estas características. No Alentejo, por exemplo, nas vésperas do 1º de Maio, havia planos para obter cargas de dinamite nas Minas do Lousal, sabotar a ponte de Águas de Moura e cortar os fios telefónicos; bem como destruir aspontes de Alcácer do Sal, para impedir o acesso a Grândola, onde, com o objectivo de isolar a vila, deveriam ser também rebentados os pontões sobre as ribeiras e barrancos à sua volta; a linha de caminho-de-ferro entre esta última localidade e Águas de Moura deveria ser cortada e as estradas obstruídas. Ao mesmo tempo, deviam ser cortados os

505 IAN/TT, PIDE-DGS, Processo sem número, Documentos apreendidos a indivíduos do PCP, UI 9104, Discussão

efectuada pela Direcção Regional de Lisboa com vista à realização do dia 1º de Maio de 1964, dact., s.d., p. 1 [496]

506 IAN/TT, PIDE-DGS, Processo sem número, Documentos apreendidos a indivíduos do PCP, NT 9104 - Moreira

[Nuno Álvares Pereira], O trabalho do sector no 1º de Maio de 64, Julho de 1964, dact., p. 1 [1105]

507MADEIRA, João, O efeito Martins Rodrigues e o desvio esquerdista de Maio de 1964 no PCP, comunicação

apresentada no “Colóquio Os Comunistas em Portugal 1921-2008”, PO/BMRR, Novembro de 2008

508 Cf. “Um 1º de Maio de Lutas e manifestações contra a ditadura fascista” e “A manifestação de Lisboa – a fuzilaria da

fios telefónicos entre Grândola e Santiago do Cacém509. Todavia, nas vésperas do 1º de Maio, foi presa toda a troika que dirigia a organização regional e os efeitos práticos das acções acabaram por ser bastante reduzidos.

Ainda durante este mês, o PCP iria iniciar o processo de crítica ao “desvio esquerdista” ocorridos em alguns locais aquando da preparação do 1º de Maio, que se expressaram “nalguns documentos publicados, manifestos e tarjetas, em que se confundem duas coisas completamente diferentes: a organização de acções especiais – que segundo foi definido pelo Comité Central, devem ser estudadas e organizadas em apoio estímulo às acções de massas, mas inteiramente separados delas – e a organização das próprias acções de massas que mesmo quando assumem aspectos violentos tem, na fase actual da revolução, um carácter pacífico” 510.

O Avante! conclui ter-se tratado de um erro que radicou numa “deficiente discussão e controle de execução na aplicação da linha do Partido por parte da Comissão Executiva do Comité Central” 511, composta na altura, por Joaquim Gomes, Alexandre Castanheira e Jaime Serra. Álvaro Cunhal e o Secretariado no exterior não hesitaram em criticar a Comissão Executiva que, dentro do país, era responsável por aquelas acções em torno do 1º de Maio. O Secretariado do PCP não demorava, portanto, a corrigir essa orientação, e, reconhecendo a importância das acções de massas realizadas, constatava nas páginas do Avante! a existência de uma tendência que descreve como “esquerdista”. Contudo, sublinhava que essa deficiência tinha origem numa grande confusão acerca das acções especiais e do papel que estas desempenhariam de apoio às acções de massas. Todo o processo de preparação do 1º de Maio tinha acabado por enlear uma coisa na outra, quando a orientação correcta, segundo o Secretariado, implicaria sempre a separação deste tipo de acções 512,

Todavia, uma maior sistematização do problema sairia meses depois num artigo publicado em O Militante, centrando-se em três aspectos fundamentais: primeiro, considerava que comemorar o 1º de Maio era muito mais do que as manifestações e outras acções no próprio dia, mas incluiria as manifestações políticas, económicas e sociais que ocorreriam nos meses e semanas anteriores; segundo, destacava a manifestação de Lisboa no 1º de Maio, considerando que se tratara de um grande êxito; e, finalmente, em terceiro lugar abordava, a questão da violência, partindo da constatação que fora na reunião do Comité Central de Dezembro de 1962 que pela primeira vez levantara a possibilidade de conjugar acções de massas com acções de autodefesa, orientação que veio sendo posteriormente confirmada nas reuniões seguintes, quer na de Agosto de 1963, quer da de Abril de 1964, mas acrescentava, esclarecendo a orientação em relação a este tipo de acções:

509MADEIRA, João, O efeito Martins Rodrigues e o desvio esquerdista de Maio de 1964 no PCP, comunicação

apresentada no “Colóquio Os Comunistas em Portugal 1921-2008”, PO/BMRR, Novembro de 2008

510 “Um erro de orientação”, in Avante!, VI série, 342, número especial de Maio de 1964, p. 2

511 “Um erro de orientação”, in Avante!, VI série, 342, número especial de Maio de 1964, p. 2

“a eventual organização de acções de tipo especial é tarefa a levar a cabo por organismos especiais que embora actuando em conjugação com as acções e manifestações de massas e com o objectivo de as estimular, devem desenvolver a sua acção de modo inteiramente independente da acção das próprias massas. Isto é, a actuação dos organismos ou grupos para acções especiais não poderá nunca confundir-se, mesmo aos olhos das forças repressivas, com a acção e manifestações de massas” 513.

Assim, o que se passara no 1º de Maio era avaliado como resultante de uma discussão superficial e insuficiente dos organismos do partido, que teria gerado uma confusão entre acções especiais e movimento de massas. Nessa linha, os acontecimentos do 1º de Maio demonstraram que “na fase actual da Revolução, as manifestações de massas continuarão a caracterizar-se como manifestações essencialmente pacíficas, tirando daí toda a sua força face ao regime salazarista”514

Para o PCP, o essencial eram as acções de massas, pacíficas, com vista ao “levantamento de massas”. As “acções especiais” não estavam na ordem do dia, ainda que não fossem esquecidas.

A linha de demarcação do PCP com as novas correntes da oposição que iam surgindo passava pela questão da violência e da luta armada. O partido optava por não enveredar no imediato por esta forma de luta, mas não eliminava a possibilidade de poder enveredar por esta via. Daí a preocupação de sublinhar que o PCP não deixaria de estar atento à evolução do regime, da oposição e da situação política e social do país, recorrendo a estes meios de acção quando considerasse adequado. O recurso às “acções especiais” era admitido, como está patente no Rumo à Vitória, de Abril de 1964. Porém, o objectivo fundamental da “Revolução Democrática e Nacional”, alcançava-se com um crescendo da acção de massas, com efeitos na desagregação do regime e dos seus aparelhos repressivos.

O PCP entendia que o derrube da ditadura se faria através de um “levantamento nacional de massas”, mas era necessário que estivessem criadas as condições necessárias para esse efeito, isto é, “ por um lado existir uma situação revolucionária (condições objectivas)” e “por outro lado estarem as classes revolucionárias preparadas para conduzir a acção decisiva e derrubar o poder existente (condições subjectivas)”515.

Para o partido, ainda não estavam criadas as condições necessárias para o levantamento nacional, pois, apesar do agudizar do descontentamento popular contra o regime e da rápida radicalização das formas de luta, ainda não se viveria uma situação revolucionária e as massas ainda não estariam preparadas para despoletar este tipo de acção. Assim, a tarefa do partido era “não só impulsionar a luta popular que, por si, agrava a crise do regime, como preparar-se para poder

513 “Algumas experiências do 1º de Maio de 1964”, in O Militante, III série, 127, Julho de 1964, p. 1

514 “Algumas experiências do 1º de Maio de 1964”, in O Militante, III série, 127, Julho de 1964, p. 1

515CUNHAL, Álvaro, 1974, Rumo à Vitória. As Tarefas do Partido na Revolução Democrática e Nacional, Lisboa,

conduzir o país à luta decisiva e final na situação revolucionária que se aproxima. […] Guiados pelo marxismo-leninismo, definindo a nossa orientação apoiados nos factos, trabalhamos para apressar a criação de uma situação revolucionária e para criar as condições políticas e de organização de forma a estarmos à altura das exigências da situação”516.

De acordo com o PCP, a insurreição popular era o culminar do amplo movimento de massas com sucessivas greves e manifestações. Durante esse processo, os confrontos com as forças repressivas agudizar-se-iam e as massas adquiririam a necessária experiência política no confronto violento com as forças policiais. Os quadros aí formados, enquadrados pelo partido, deviam

“orientar as massas na procura das armas necessárias, passar audaciosamente a formas violentas de

acção popular e, na base de uma forte organização ligada às massas populares e com fundas raízes nas forças armadas, decidir o momento do assalto final à fortaleza fascista, o momento de desencadear a insurreição”517, ou seja, passar à luta armada.

Mas, para o PCP, a insurreição anti-fascista implicaria o apoio, pelo menos, de parte das Forças Armadas, o mais importante dos sustentáculos do regime, num quadro de desagregação por efeito da radicalização política e social. Por esse motivo, o PCP sempre procurou criar células clandestinas dentro dos vários ramos das Forças Armadas que fizessem um trabalho de agitação, propaganda, mobilização e organização dos militares que estavam descontentes com o governo e com a guerra colonial, embora a sua extensão fosse limitada. De acordo com o PCP, para se desencadear a insurreição era necessário “ter as massas populares em movimento e altamente radicalizadas numa luta diária e insistente, ter um exército político organizado, ligado às massas e controlando e dirigindo a sua acção, ter uma parte das forças armadas já ganha para a revolução no período anterior em que a luta política se agudizou”518.

Assim, admitia-se o recurso às “acções especiais” mas sempre como aprofundamento e intensificação do movimento político e social. Desta forma, Cunhal procurava neutralizar as críticas dos sectores operários e estudantis mais combativos e radicalizados e conter o crescimento do apoio à FAP, mantendo a orientação do partido quanto à política de unidade e ao conceito de “levantamento popular”.

Álvaro Cunhal identificava o “radicalismo pequeno-burguês” como o principal desvio ideológico que poderia afectar o partido:

“Hoje, o radicalismo pequeno-burguês, o revolucionarismo verbal, só insiste numa coisa: na

516CUNHAL, Álvaro, 1974, Rumo à Vitória. As Tarefas do Partido na Revolução Democrática e Nacional, Lisboa,

Edições A Opinião!, pag. 168

517CUNHAL, Álvaro, 1974, Rumo à Vitória. As Tarefas do Partido na Revolução Democrática e Nacional, Lisboa,

Edições A Opinião!, pag. 169-170

518CUNHAL, Álvaro, 1974, Rumo à Vitória. As Tarefas do Partido na Revolução Democrática e Nacional, Lisboa,

acção directa imediata, na acção violenta imediata, na luta armada imediata. Há pessoas que assim falam e ficam doentes quando ouvem falar da luta de massas e de organização. (…) Esta tendência anarquista é sobretudo prejudicial pela orientação que pretende imprimir à luta democrática. Causa enormes prejuízos, na medida em que influi as forças democráticas a afastarem-se das suas tarefas essenciais, instantes, imediatas, sem realizar as quais nunca poderão vir a lançar uma insurreição vitoriosa: as lutas de massas e a organização.”519

O Rumo à Vitória foi discutido nos diferentes escalões partidários, aconselhando-se a discussão colectiva e o envio à Comissão Executiva das respectivas conclusões. No sector estudantil de Lisboa, ganharia importância o debate em relação às questões da luta armada, dado o grau de penetração das ideias de Francisco Martins Rodrigues neste sector.

Ainda que a maioria dos estudantes das células do PCP na Universidade de Lisboa explicitassem a sua discordância com as ideias da FAP, a verdade é que se notava que oscilavam entre a concordância com as teses do Rumo à Vitória e críticas, mais ou menos directas, à política do partido, que convergiam, pelo menos em parte, com as teses de Francisco Martins Rodrigues, mas das quais tinham necessidade de se demarcar. Exemplo disso, é a posição de Fernando Rosas, da Faculdade de Direito, que criticava a FAP por “não confiar nas massas ao acusar o partido de trair os interesses do proletariado”, mas reconheceu que estavam criadas as condições para passar a estádios superior de luta, ou seja, à luta armada ou às acções de autodefesa face ao aparelho repressivo520. Por seu lado, João Aires Teixeira, estudante de Ciências, concordava com os sete pontos programáticos apresentados no Rumo à Vitória, mas afirmava que nele não se apresentavam

No documento Luta Armada em Portugal (1970-1974) (páginas 193-200)