• Nenhum resultado encontrado

O investimento de terceiros em processos judiciais e em arbitragens

CAPÍTULO 4 O INVESTIMENTO DE TERCEIROS NA ARBITRAGEM

4.5 O investimento de terceiros em processos judiciais e em arbitragens

4.5.1 Os casos de financiamento de arbitragem no ICSID

O ICSID276 é uma Câmara Arbitral criada para solucionar os conflitos entre Estados e particulares que investiram em Estados signatários da Convenção de Washington sobre Investimentos.

Embora não sejam propriamente arbitragens comerciais, tais procedimentos são relacionados com o comércio internacional, e a jurisprudência daí advinda tem sido muito utilizada por tribunais comerciais em

273 Caso Sygma Photo News, Inc. vs. Globe Intl, Inc. 626 F. Supp 1153 (SDNY, 1985); e Caso Bluebird Partners, LP vs. First Fidelity Bank, N.A. 94 NY 2d 726, 731. N.E.2d 581 [NY, 2000]. 274 Caso Fairchild Hiller Corporation v. McDonnell Douglas Corporation. Court of Appeals of the

State of New York. Decided April 21, 1971. 28 N.Y.2d 325 (1971].

275“The statute is violated only if the primary purpose of the purchase or taking by assignment

of the thing in action is to enable the attorney to commence asuit thereon. The statute does not embrace a case where some other purpose induced the purchase, and the intent to sue was merely incidental and contingent.”

128 situações em que não há posição consolidada em outras arbitragens comerciais.

A Arbitragem ICSID, dada a sua natureza pública, é amplamente divulgada, o que muitas vezes explica por que não tenhamos tantas decisões conhecidas sobre o tema em arbitragens comerciais internacionais e, por outro lado, temos uma verdadeira profusão de decisões ICSID.

Os custos para apresentar um caso no ICSID são consideráveis, girando em torno de USD 5 milhões.277 Por vezes, algumas empresas, após a frustração de seu investimento, terminam por ficar em situação bastante frágil em suas finanças. Assim, passam a necessitar de um financiador externo para levar adiante o procedimento em que vai se discutir o abuso do Estado réu sobre os investimentos que realizou.

O inverso também é verdadeiro. Muitas vezes, alguns Estados entram em situação financeira crítica e precisam de apoio externo para se defender no ICSID e mesmo para iniciar processos junto àquele órgão. A Argentina, país com mais litígios naquele órgão, se viu obrigada a defender-se naquele Tribunal em centenas de casos, logo após ter de enfrentar a pior situação financeira de sua história, culminada com o calote em seus títulos públicos ocorrido em 2001.278

O financiamento de terceiros nesses casos é, portanto, relativamente comum. E o ICSID se pronunciou em três casos recentes que chamaram atenção da comunidade arbitral e merecem nossa análise.

277 Estudo do Escritório Allen & Overy estima que

“The costs of an investment treaty arbitration fall into two broad categories. First, there are the fees and expenses of the arbitral tribunal itself, together with those of the institution or appointing authority, if any (tribunal costs). In addition, there are the fees and expenses of legal counsel as well as any expert or factual witnesses (party costs). [...]

The study revealed that the average party costs were quite similar, at US$4,437,000 for claimants and US$4,559,000 for respondentes”. Disponível em: <http://www.allenovery.com/SiteCollectionDocuments/Counting_the_costs_of_investment_treat y.pdf>. Acesso em: 7 set. 2014.

129 O leading case é o caso Ioannis Kardassopoulos/Fuchs v.

República da Geórgia.279 O Sr. Kardassopoulos e o Sr. Fuchs, da Tramex International Inc, fizeram pedido de arbitragem em 2005, alegando que seus direitos haviam sido violados no contexto Tratado Bilateral de Investimentos firmado entre Geórgia e Grécia.

Em 1992, a joint venture (GTI Ltd) entre a estatal georgiana (SakNavtobi) e a EUA Tramex fora criada para a exploração de óleo e gás na Geórgia, em Samgori-Batumi. Contudo, em 1995, o governo georgiano encontrou outro parceiro para essa empreitada, e substituiu a EUA Tramex pela Azerbaijan International Operating Company (AIOC) para explorar o território abrangido pelo acordo anterior. Para pagar as custas do ICSID e dos árbitros a Tramex (por meio dos Srs. Kardassopoulos/Fuchs) se valeu de um financiador externo. O ICSID deu razão aos Srs. Kardassopoulos/Fuchs,280 condenando a Geórgia a indenizá-los pelo investimento frustrado.

Contudo, a controvérsia entre as partes que nos interessa não é sobre o descumprimento do BIT, mas a relativa à alocação de custos do procedimento. A República da Geórgia alegou que o princípio de que o “perdedor paga as custas” não é geralmente aplicável em arbitragens de investimentos. Afirmou ainda que os custos de honorários apresentados pelos reclamantes eram excessivos e que, além disso, foram parcialmente cobertos por um terceiro. Assim, o direito dos reclamantes de recuperar essas despesas não seria razoável.

O Tribunal Arbitral decidiu que “nenhum princípio” na arbitragem internacional de investimentos exigiria que o financiamento por

279 Caso Ioannis Kardassopoulos/Fuchs v. República da Geórgia

– ICSID (ARB/05/18, ARB/07/15).

280

Parte do dispositivo da Sentença Arbitral: “(d) The Respondent has unlawfully expropriated Mr. Kardassopoulos’ investment and failed to pay him the compensation due on the taking of his investment, in breach of Article 13(1) of the ECT; (e) The Respondent has breached the fair and equitable treatment standard applicable to Mr. Fuchs’ investment under Article 2(2) of the Georgia/Israel BIT and failed to pay him the compensation due on the taking of his investment”. Disponível em: <http://www.italaw.com/sites/default/files/case-documents/ita0445.pdf>. Acesso em: 1.º ago. 2014.

130 terceiro fosse levado em consideração. Por fim, por analogia, o Tribunal Arbitral chegou à conclusão de que não haveria qualquer razão para tratar de maneira diferente o financiamento de terceiros, em comparação com outras formas de seguro para disputas.

Um segundo caso foi o RSM e RSM Corporação v Granada.281

Em 1996, RSM e Granada celebraram um acordo para exploração de petróleo naquele país. A licença deveria ter sido concedida no prazo de 90 dias após a data de vigência do acordo. A RSM solicitou uma licença em 2004, e Granada indeferiu o pedido.

Duas arbitragens surgiram consecutivamente. A última foi interrompida pela RSM, que foi condenada a pagar todos os custos. Um processo buscando a anulação da sentença arbitral foi apresentado pela RSM e depois suspenso, pois RSM se recusou a pagar antecipadamente as custas.

A RSM alegou que não deveria ser obrigada a pagar todos os custos, especialmente porque Granada havia sido financiada por um terceiro. Esse argumento foi indeferido pelo Comitê com os mesmos fundamentos do caso Kardassopoulos, de que a ocorrência de um financiamento não deve impactar a alocação de custos pelo Tribunal.

Por fim, o caso ATA Construção Hachemita, Companhia

Industrial e Comércio v. O Reino Hachemita da Jordânia (ARB08/2). Neste, o

requerente foi o Reino Hachemita da Jordânia, que fez um pedido condicional para a anulação parcial da sentença com base no artigo 52 (b), (d) e (e) da Convenção de Washington, até que o Tribunal Arbitral emitisse sua interpretação do laudo.

Contudo, como os pedidos principais foram indeferidos, o requerente terminou por desistir do pedido de anulação parcial. A Jordânia, então, solicitou à ATA Construção que pagasse todos os custos do pedido de

281 RSM Production Corp. v. Grenada (ICSID Case n. ARB/05/14). Sentença disponível em:

<http://www.italaw.com/sites/default/files/case-documents/ita0727.pdf>. Acesso em: 9 nov. 2014.

131 anulação. Em resposta, a ATA salientou que, como a Jordânia havia sido financiada durante o processo arbitral e de anulação, não seria razoável que os custos recaíssem exclusivamente sobre a ATA Construção.

O Comitê reiterou os precedentes jurisprudenciais e decidiu que ambas as partes deveriam igualmente suportar os custos, pois a ocorrência de financiamento de terceiros no procedimento não deve alterar a forma de o Tribunal ver as partes, especialmente para alocar os custos.

132