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Os problemas do valor mínimo para a alienação do bem hipotecado e do

Consiste o valor mínimo para expropriação do bem de um dos mais tormentosos pontos da execução extrajudicial hipotecária.

Desvinculou-o o legislador do valor do imóvel a ser alienado e adotou como critério o valor do saldo devedor. Além disso, permitiu que o credor persiga a satisfação de eventual crédito remanescente se o produto da alienação não fo r suficiente para satisfazê-lo (art. 32, § 2º, do Decreto-lei 70/66): ao menos como pretendida, a execução extrajudicial hipotecária admite o chamado “deficiency

judgment”385

.

Tais aspectos tem rendido importantes discussões.

383

A propósito, a largueza que se tem admitido para a defesa do réu na hipótese contradiz a estreiteza dos limites impostos pelo procedimento delineado no Código de Processo Civil de 1.939 para a ação de imissão na posse (restrita, consoante o parágrafo único do art. 383 daquele Código, à nulidade manifesta do título em que se funda o direito de propriedade invocado pelo autor), o que motivou V. L. DENARDI a afirmar que a de ação de imissão de posse não se trataria, mas sim de ação reivindicatória (Execuções judicial e extrajudicial no Sistema Financeiro da Habitação: Lei 5.741/1971 e Dec.-lei 70/1966, 2010, pp. 95-101).

384 Art 38, Decreto-lei 70/66. Referido dispositivo previa que tal taxa viesse a ser cobrada em ação executiva, procedimento especial previsto no Código de Processo Civil de 1939 (art. 299) pelo qual, não paga a quantia reclamada no prazo de 24 horas contadas da citação, realizava-se a penhora, após o que o devedor poderia contestar, prosseguindo-se consoante rito ordinário. Sob a égide do atual Código de Processo Civil, carecendo o adquirente, na situação em exame, de título executivo extrajudicial que documente obrigação líquida, certa e exigível, a pretensão de condenação do réu ao pagamento de taxa mensal de ocupação há de ser deduzida em processo de conhecimento de procedimento comum (art. 272 e ss.), nele se formando o título executivo judicial que viabilizará oportuno cumprimento de sentença (art. 475-I e ss.).

Em primeiro lugar, há quem desconsidere o critério adotado pelo Decreto-lei 70/66 e imponha avaliação como providência prévia à alienação.

Sobre a questão, observa-se que, em 2009, ao julgar Embargos de Divergência que versavam sobre a execução judicial de hipoteca vinculada ao Sistema Financeiro da Habitação, a Corte Especial do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA firmou o entendimento de

que386

revela-se necessária a prévia avaliação do bem a ser submetido a posterior leilão da Lei nº 5.741/71, de modo a proteger o patrimônio do executado, evitando, desse modo, sua arrematação por preço vil, ou eventuais injustiças no ato da adjudicação, afastando a possibilidade de enriquecimento sem causa do exeqüente com o consectário prejuízo do executado.

Tal regra, segundo se depreende de precedente trazido no voto condutor do referido acórdão387, também teria aplicação na execução extrajudicial:

tanto quanto na execução judicial prevista na Lei n. 5.741, de 1º.12.71, na execução hipotecária extrajudicial instituída pelo Decreto-Lei n. 70, de 21.11.66, a prévia avaliação do imóvel a ser alienado constitui uma exigência para garantia do mutuário e de terceiros eventualmente interessados.

A questão, no entanto, longe está de estar resolvida.

No final do ano de 2010, significativo julgado do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

passou em revista o entendimento retro referido. Segundo expresso no voto condutor, tal entendimento “baseou-se em doutrina relacionada a execuções processadas em juízo” e que exigir-se a avaliação do imóvel nas execuções extrajudiciais, “muito embora louvável

a cautela”, seria criar “uma exigência que não é da lei”, e que, por isso “nem haveria como se disciplinar essa avaliação, porque, como o processo é feito extrajudicialmente, não se teria como proceder a uma perícia judicial e não se sabe o que poderia substituí- la”; além de ter desconsiderado que, no regime do Decreto-Lei 70/66, “o valor da

386 STJ, Corte Especial, EREsp 325591/RJ, Rel Min. Francisco Falcão, j. 17.06.2009. 387 STJ, 4ª Turma REsp 480475/RS, Rel. Min. Barros Monteiro, j.03.05.2005.

execução é o do saldo devedor"; concluindo-se, portanto, pelo descabimento da avaliação

do imóvel a ser expropriado em execução extrajudicial388.

Pensamos ser esta a posição mais consentânea com as características do mecanismo em exame, que não comporta mesmo avaliação do imóvel a ser expropriado.

No entanto, já em meados de 2012, tornou o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA a

afirmar que seria389

necessária a avaliação do bem no seio da execução, seja no CPC, seja na Lei 5.741, ou mesmo no DL 70/66 para que, quando da venda judicial ou extrajudicial, possa ele ser ofertado com base em seu valor real e, assim, por terceiro arrematado ou pelo credor adjudicado

Pensamos que a justa preocupação com o equilíbrio da execução extrajudicial não deve passar pela impossível exigência de avaliação não prevista em lei e incompatível com o procedimento; mas, isto sim, pela possibilidade de o executado que foi injustamente desfalcado em seu patrimônio como decorrência de expriopriação por preço vil tê-lo recomposto por meio de demanda indenizatória, como adiante examinado390.

Em segundo lugar, há quem também invoque o regime da execução judicial de hipoteca vinculada ao Sistema Financeiro da Habitação391, para apontar que, embora também lá não se exija que o imóvel seja expropriado por seu justo valor de mercado - o critério de valor mínimo, mais uma vez, é dado pelo saldo devedor392-, ao menos se estabelece, como compensação, que, não havendo licitante na praça pública, o Juiz

adjudicará, dentro de quarenta e oito horas, ao exeqüente o imóvel hipotecado, ficando

388 STJ, 4ª Turma, REsp 1.147.173/PB, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j 23.11.2010. Registrou-se ainda no

v. acórdão que “a pretensão de inserir, no rito da execução extrajudicial, a disciplina própria das execuções procedidas em juízo (aplicação de regras do CPC), sem a possibilidade de imprimir-lhe a eficácia prática de, ao final, chegar ao desapossamento do bem com sua entrega ao adquirente, conseqüência esta inerente apenas à execução judicial, além de todos os expedientes de controle concomitantes e posteriores, por meio do uso das vias processuais cabíveis, acabaria por retirar qualquer utilidade e sentido do rito do Decreto-lei 70/66, procedimento instituído com a finalidade de favorecer o fluxo de retorno dos recursos emprestados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação”

389 STJ, 3ª Turma, REsp 1.119.859-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j 28.08.2012. 390

V. item 9.2.2 abaixo.

391 V. item 6.6 abaixo. 392 Art. 6º da Lei 5.741/71.

exonerado o executado da obrigação de pagar o restante da dívida393, vedando-se, assim, o “deficiency judgment”.

Como se vê, no rito especial da execução judicial hipotecária, embora o lanço mínimo do leilão não guarde relação com o valor de mercado do imóvel, garante-se que, ao final do procedimento, o devedor necessariamente reste liberado de sua obrigação, seja porque o bem foi arrematado no mínimo pelo valor do saldo devedor, seja porque, frustrado o leilão, o bem restou adjudicado ao exeqüente com efeito de extinguir in totum o crédito.

Por tal razão, sustenta-se que a exoneração do devedor ao final do procedimento, expressamente prevista na execução judicial hipotecária, também deveria ocorrer na execução extrajudicial, impossibilitando ao exeqüente prosseguir na busca da satisfação de seu crédito, que então restaria extinto. Do contrário – lembrando sempre que a escolha por um ou outro dos ritos é faculdade do credor – o desequilíbrio seria evidente e a opção pelo rito extrajudicial, mais gravosa ao executado394, sobretudo nas situações - relativamente comuns no SFH – em que o saldo devedor, corrigido por índice distinto do reajuste das parcelas, acaba por alcançar valor bastante expressivo e bastante superior ao do próprio imóvel.

De nossa parte, parece-nos que deva ser mesmo vedado o “deficiency judgment” na execução extrajudicial, sendo esta uma das compensações à ausência de avaliação do bem expropriado, muito embora tal questão ainda esteja em aberto e deva ser enfrentada pela Corte Especial do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em razão de recurso especial repetitivo395.

393 Art. 7º da Lei 5.741/71.

394 Nesse sentido, V. L. DENARDI, Execuções judicial e extrajudicial no sistema financeiro da habitação: Lei 5.741/1971 e Dec.-lei 70/1966, 2010, pp. 90-93. Conclui o autor que “a Lei 5.741/1971, posterior ao Dec.-lei 70/1966, criou um microssistema de cobrança de créditos inadimplidos vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação”, que não deve admitir resultados diversos, seja judicial ou extrajudicial a cobrança, “ficando o devedor exonerado, em qualquer hipótese, do pagamento de valor residual acaso remanescente, inclusive despesas” (ob. cit, pp. 92-93). Com esse entendimento, STJ, 1ª Turma, REsp 605.357-MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 12.04.2005 e STJ, 1ª Turma, REsp 734.080-PB, Rel. Min. José Delgado, j. 02.06.2005. Em sentido contrário, entendendo pela possibilidade de o credor cobrar o saldo remanescente após execução extrajudicial: STJ, 4ª Turma, AgRg no REsp 1.118.161-PR, Rel Min. João Otávio de Noronha, j. 16.11.2010.

Ainda que se admita ao exequente cobrar evential saldo remanescente de seu crédito após o leilão, é assente no SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA a posição de que, na execução extrajudicial hipotecária, por não haver avaliação prévia, se o devedor não

concordar antecipadamente com o valor da arrematação, inexistirá liquidez do saldo remanescente, que, por isso, não pode ser cobrado do devedor pela via executiva396.

Adiante, já em vista do modelo de execução extrajudicial, as questões do valor

mínimo para a alienação e do “deficiency judgment” tornarão a ser enfrentadas397.

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