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Questionamentos acerca do monopólio judicial da execução e da variabilidade

dos instrumentos em função das particularidades do direito material

A crise de falta de efetividade retro apontada justifica múltiplas reflexões acerca da execução e do modelo executivo brasileiro, que extrapolam, em muito, os limites do presente trabalho.

78 Daí ter C. R. DINAMARCO ponderado que “a triste realidade da execução burocrática e condescendente, que ao longo dos tempos se apresenta como um verdadeiro paraíso dos maus pagadores, impõe que o disposto no art. 620 do CPC seja interpretado à luz da garantia do acesso à justiça, sob pena de fadar o sistema à ineficiência e pôr em risco a efetividade dessa solene promessa constitucional” (Instituições de direito processual civil, v. IV, 2009, pp. 63-64), e proposto a seguinte leitura da aludida regra: “quando não houver meios mais amenos para o executado, capazes de conduzir à satisfação do credor, que se apliquem os mais severos” (ob. cit., p. 63).

79 M. BONÍCIO, com total acerto, disse que “o princípio da proporcionalidade exerce papel importantíssimo nessa situação, impondo uma interpretação mais ampla da regra do artigo 620 mencionado, na exata medida em que deva existir proteção contra excessos tanto para o devedor quanto para o credor (...). No contexto da execução civil, o princípio da proporcionalidade precisa assumir uma dimensão ampla o suficiente para, em conjunto com a garantia do devido processo legal, estabelecer parâmetros de efetividade condizentes com as necessidades que a sociedade moderna apresenta, tanto do ângulo da celeridade quanto do da segurança, sem incorrer no grave equívoco de proteger exacerbadamente o patrimônio do devedor” (Proporcionalidade e processo: a garantia constitucional da proporcionalidade, a legitimação do processo civil e o controle das decisões judiciais, 2006, p. 127).

Ao que aqui interessa, dois elementos devem ser destacados para análise mais aprofundada: (i) o monopólio judicial da execução e (ii) a variabilidade dos instrumentos

em função das particularidades do direito material.

O monopólio judicial da execução, uma das características marcantes do modelo executivo brasileiro extraído do Código de Processo Civil, tem sido questionado – e, sobretudo, criticado – mundo afora.

Pela importância para o tema central da tese, dedicaremos os capítulos subseqüentes ao exame da relação entre Estado, jurisdição e execução; à análise da

inserção do agente de execução na estrutura de poderes do Estado e sua relação com o juiz - procurando demonstrar que o exame de modelos executivos estrangeiros, a partir da

figura do sujeito incumbido de conduzir a execução, revela verdadeira miríade de alternativas à técnica de concentrar nas mãos do juiz a condução da execução – e às considerações sobre o fenômeno de minimização da participação do juiz no desempenho

dos atos de execução, reservando-a para atividades em que sua intervenção se faça

necessária, tais como julgar litígios que possam surgir no curso da execução ou autorizar o uso da força.

Tal fenômeno, examinado em capítulo próprio, pode se desdobrar em técnicas de

desjudicialização da execução – caminho recentemente trilhado, v.g., por Portugal, com o

declarado propósito de proporcionar efetividade à execução - e de execução extrajudicial; ambas com potencial de contribuir para combater a crise de que padece a execução80.

A variabilidade dos instrumentos em função das particularidades do direito

material, por seu turno, é elemento visto com simpatia quando se cogita, de maneira mais

ampla, da diversidade de técnicas de tutela em função das particularidades das situações da

80

Não se acredita – ressalve-se desde logo - que, simplesmente, afastar o juiz tanto quanto possível da direção e prática dos atos de execução, atribuindo-os a outros agentes, proporcionaria ao credor receber rapidamente a quantia pecuniária que lhe é devida; e nem se quer apanagiar tais técnicas. Como bem ponderou R. WALTR, sistemas públicos e privados de execução representam apenas diversidade de soluções, cada qual com vantagens e desvantagens e que não conseguem superar um problema de fundo comum a ambos: a localização de bens do devedor (Les agents d’exécution, in L’ exécution des décisions de justice en matière civile, 1998, p. 120).

vida e da disciplina do direito material81, e deve ser igualmente explorado quando se cogita, especificamente, da tutela executiva.

Pondo em destaque a necessidade de adequação da tutela executiva às diversas situações substanciais a fim de alcançar a efetividade da tutela jurisdicional de direitos, observa M. TARUFFO que cada direito deve atuar através de um trâmite executivo mais

idôneo e eficaz em função das específicas necessidades do caso concreto 82.

Voltando os olhos à execução por quantia, que nos interessa mais de perto, parece razoável afirmar, então, que, dentro do amplo gênero das obrigações de pagamento de

quantia, devam existir, para além do procedimento da execução por quantia certa contra devedor solvente disciplinado nos artigos 646 e seguintes do Código de Processo Civil,

aplicável à generalidade das situações, outros instrumentos voltados à satisfação coercitiva de prestações pecuniárias que sejam adequados às particularidades de certas espécies de relações jurídicas de direito material83- destacam-se, para o presente estudo, as obrigações pecuniárias garantidas por hipoteca e por alienação fiduciária de bem imóvel-, o que também deve contribuir para a almejada efetividade da execução.

81 Aponta C. R. DINAMARCO que, em função da variedade de situações da vida lamentadas pelo exeqüente e das respectivas soluções prometidas pelo direito substancial, “é rigorosamente inerente ao sistema da tutela jurisdicional a variação das tutelas segundo as situações desfavoráveis a debelar e os resultados a obter, com a legítima recepção de elementos jurídico-materiais para a composição das técnicas ou mesmo de certos conceitos processuais” (Instituições de direito processual civil, v. IV, 2009, p. 466).

82 A atuação executiva dos direitos: perfis comparatísticos, in RePro, nº. 59, 1990, p. 78. No mesmo sentido,

ressalta L. P. COMOGLIO a importância de se buscar relação constante de efetividade entre as diferentes formas e as correspondentes técnicas de atuação de tutela dos direitos substanciais, de modo que se possa alcançar alto grau de adequação qualitativa dos resultados práticos proporcionados pela execução (Principi costituzionali e processo di esecuzione, in Rivista di diritto processuale, 1994, p.457).

83 O próprio Código de Processo Civil pátrio, como já se examinou, ao disciplinar a execução por quantia,

concebeu mecanismos diferenciados em função de aspectos subjetivos (v. g., a presença da Fazenda Pública como devedora – arts. 730 e 731 do CPC-) ou objetivos (v.g., a natureza de prestação alimentícia do crédito – arts. 732 e ss. do CPC). Na legislação extravagante, diversos outros exemplos podem ser colhidos, dentre as quais a já mencionada execução fiscal (Lei 6.830/80), a execução judicial hipotecária de crédito vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação (Lei 5.741/71) e, segundo nos parece, também a execução extrajudicial hipotecária (arts. 29 e ss. do Decreto-lei 70/66) e a execução extrajudicial do imóvel objeto de alienação fiduciária em garantia (arts. 26 e ss. da Lei 9.514/97).

2.6 A hipótese da execução extrajudicial para satisfação de crédito pecuniário com

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