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Procedimento de execução extrajudicial na alienação fiduciária em garantia

O procedimento de execução extrajudicial em exame não se deflagra automática e imediatamente após o inadimplemento. Exige-se do credor que, por primeiro, aguarde o

prazo de carência estabelecido em contrato455.

Vencido tal prazo e persistindo o inadimplemento, o credor deverá dirigir ao Oficial de Registro de Imóveis da circunscrição do bem ofertado em garantia um “requerimento

escrito, instruído com demonstrativo analítico da dívida”456

, no qual postulará seja o devedor intimado a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se

vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação457. A purga da mora, como se vê, dá-se pelo pagamento do montante até então devido, acrescido dos respectivos consectários, mas sem previsão legal de vencimento antecipado do saldo458, caracterizando-se como mecanismo de “cure redemption”.

453 Arts. 37 e 38 da Lei 8.935/94

454 Arts 22 a 24 e 31 e ss. da Lei 8.935/94. 455

Art. 26, § 2º, Lei 9.514/97. Trata-se de um “prazo de tolerância, durante o qual, apesar de correrem

juros e demais cominações legais e contratuais, o credor fica impedido de agir” (M. P. MEZZARI, Alienação

fiduciária da Lei 9514, de 21-11-1997, 1998, p.61). Entende M. N. CHALHUB ser exigência legal o estabelecimento, em contrato, do prazo de carência (Negócio fiduciário, 2009, p. 251). Recomenda S. J. MARTINS que “o credor aguarde o inadimplemento de três prestações para iniciar a Execução Extrajudicial” (Execuções extrajudiciais de créditos imobiliários, 2007, p. 160), para guardar simetria com a exigência trazida para a execução extrajudicial hipotecária (v. art. 21 da Lei 8.004/90 e item 6.5.2 acima); muito embora, para a modalidade em questão, inexista norma em tal sentido.

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M. TERRA, Alienação fiduciária de imóvel em garantia (Lei 9.514/97, primeiras linhas), 1998, p. 43. V. ainda notas 366 acima e 534 abaixo, bem como item 9.1.1 abaixo.

457 Art. 26, § 1º, Lei 9.514/97

458 Na explicação de P. S. RESTIFFE - P. RESTIFFE NETO, “como só são cogitáveis as prestações vencidas até a data do pagamento (§1º do art. 26) para efeito de purgação da mora, não há falar em inocorrente antecipado vencimento de toda a dívida remanescente nas prestações futuras, que seguem o curso normal do contrato convalescido” (Propriedade fiduciária imóvel, 2009, p.144). Sobre o ponto, v. item 9.1.2 abaixo.

O ato de comunicação pessoal do devedor para que purgue a mora – tratado na Lei como intimação – cabe ao Oficial do Registro de Imóveis, que poderá designar preposto seu para cumpri-lo, ou delegá-lo ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou ainda realizá-lo por intermédio dos Correios, por carta com aviso de recebimento459.

Acaso não localizado o devedor, deverá ser o fato certificado pelo Oficial do Registro de Imóveis e, na seqüência, a requerimento do credor, deverá ser promovida pelo Oficial a intimação por edital, publicado por três dias, pelo menos, em um dos jornais de

maior circulação local ou noutro de comarca de fácil acesso, se no local não houver imprensa diária460.

Tendo em vista que a persistência do inadimplemento implica a consolidação da propriedade em nome do credor461, a purga da mora, ao menos administrativamente, é admitida antes de tal evento e faz convalescer o contrato462. O valor respectivo é recebido pelo Registro de Imóveis, que é obrigado a, no prazo de três dias seguintes à purgação da

mora, entregá-lo ao credor, ficando autorizado a deduzir as despesas de cobrança e de

intimação463.

Não purgada a mora, e em razão das já aludidas características da alienação

fiduciária em garantia de bem imóvel, no plano do direito material, deverá o Oficial do

459

Art. 26, § 3º, Lei 9.514/97. Com autoridade de registrador imobiliário, pontifica N. BALBINO FILHO: “optamos pelas diligências pessoais. O documento remetido via postal com aviso de recebimento não preenche os requisitos necessários à notificação, porque: 1º, pode ser recebido por outra pessoa que não o notificando; 2º, embora firmado pelo notificando, o comprovante do ‘AR’ faz prova de que o destinatário recebeu algo, mas não confirma o teor da correspondência, o seu conteúdo. Por isso, reputamos insegura a notificação via postal com ‘AR’” (Registro de imóveis, 2009, p. 141). Com efeito, a intimação pessoal é de fundamental importância para a validade do procedimento – v. item 9.1.1abaixo-. Daí observar A. L. CLÁPIS que “o registrador deve agir com muita cautela e garantir que a intimação seja feita de forma a garantir (i) o efetivo conhecimento do devedor da situação de mora em que se encontra e (ii) uma segura execução da garantia ao credor, caso o fiduciante não purgue a mora” (A propriedade fiduciária imobiliária – aspectos gerais e registrários, Dissertação (Mestrado), 2010, p. 159).

460 Art. 26, § 4º, Lei 9.514/97. Sustenta A. L. CLÁPIS que “o edital é ato privativo do oficial do Registro de Imóveis. É ele quem redige e promove a publicação. O teor do edital deverá conter todos os requisitos e as informações da intimação” (A propriedade fiduciária imobiliária – aspectos gerais e registrários, Dissertação (Mestrado), 2010, p. 160). Sobre o entendimento dos Tribunais a respeito da comunicação por meio de edital em procedimentos extrajudiciais, v. nota 365 acima.

461

Art. 26, § 7º, Lei 9.514/97. Sobre as limitações da consolidação havida neste momento, v. nota 449 acima.

462 Art. 26, §5º, Lei 9.514/97. 463 Art. 26, §6º, Lei 9.514/97.

Registro de Imóveis certificar o fato e promover a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade em nome do credor464, desde que este último, em contrapartida, apresente a prova do pagamento dos tributos incidentes465.

Dado que a transmissão do bem ao credor se deu com finalidade de garantia, não se admite que este remanesça com o imóvel em seu patrimônio; ao menos, não sem antes tentar aliená-lo466. Assim, dentro em trinta dias contados do registro do ato de consolidação da propriedade em seu nome, deverá o credor promover público leilão extrajudicial para a alienação do imóvel467, precedido, no mínimo, de editais que dêem publicidade ao ato468, a ser desempenhado por leiloeiro público469.

No primeiro leilão, persegue-se lanço que seja pelo menos equivalente ao valor do

imóvel, previamente fixado em contrato e revisado conforme critérios lá estabelecidos

pelas partes470.

464 Como bem observa G. G. FELICIANO, “nesse diapasão, o que na alienação fiduciária de móveis se dá pela busca e apreensão judicial (vez que a propriedade mobiliária somente se transfere pela tradição), na alienação fiduciária de imóveis ocorre por mero ato notarial, registrando-se a consolidação do domínio em favor do credor fiduciário” (Tratado de alienação fiduciária em garantia: das bases romanas à lei n. 9.514/97, 1999, p. 463). Com efeito, em se tratando de bem imóvel, o ato de consolidação da propriedade independe da posse direta e prescinde do emprego da força, daí poder ser realizado de maneira extrajudicial. A posse direta da coisa dada em garantia fiduciária, por seu turno, seja ela móvel (postulada por meio da ação de busca e apreensão prevista no art. 3º do Decreto-lei 911/69), seja ela imóvel (pretendida por meio da ação de reintegração de posse contemplada pelo art. 30 da Lei 9.514/97), por exigirem atos de força, deve ser perseguida no âmbito da jurisdição estatal (v. item 9.2.4 abaixo).

465

Art. 26, §7º, Lei 9.514/97, redação dada pela Lei 10.931/2004.

466 Também receberá o credor em definitivo a propriedade do imóvel ofertado em garantia, ficando

dispensado de realizar os leilões, se o devedor, com a anuência do credor, der o imóvel em pagamento da dívida, conforme previsão do art. 26, §8º, Lei 9.514/97, redação dada pela Lei 10.931/2004.

467 Art. 27, caput, Lei 9.514/97. Como bem explica M. N. CHALHUB, “nesta espécie de negócio, a função da propriedade fiduciária é apenas assegurar, ao credor, direito ao conteúdo econômico do bem, e é por isso mesmo que ele é obrigado a vender o bem em público leilão, para convertê-lo em dinheiro, quando poderá se apropriar do produto da venda, até o limite do seu crédito, e deverá entregar a quantia excedente ao devedor” (Alienação fiduciária de bens imóveis. Aspectos da formação, execução e extinção do contrato, in Revista de Direito Imobiliário, nº. 63, 2007, p. 94).

468 Neste sentido, M. TERRA, Alienação fiduciária de imóvel em garantia (Lei 9.514/97, primeiras linhas),

1998, p. 45. Sobre a publicidade das hastas públicas, v. item 9.1.3 abaixo.

469

Nos termos do Decreto 21.981/32, aplicado de maneira supletiva naquilo que a Lei 9.514/97 não dispuser de maneira diferente.

470 Art. 27, §1º e 24, VI, Lei 9.514/97. Como corretamente pondera S. J. MARTINS, “revisão não se confunde com atualização monetária; a revisão ocorre em função de fatores de mercado que podem alterar sensivelmente o valor inicialmente estabelecido” (Execuções extrajudiciais de créditos imobiliários, 2007, p.167). Observa M. N. CHALHUB que, na prática, é comum que as partes estabeleçam, quando a alienação fiduciária é contratada para garantia de financiamento de unidade autônoma decorrente de incorporação imobiliária, que o preço revisado será o preço pactuado originalmente corrigido pelos mesmos critérios do financiamento; de outro lado, sendo a alienação fiduciária garantia de aquisição de lote de terreno, o preço revisado considerará ainda o valor das acessões erguidas pelo fiduciante, que pode ser apurado, v.g., pela multiplicação da área construída por valor de referência extraído de revista especializada apontada pelas

Se no primeiro leilão o lanço não alcançar o valor revisado do imóvel, realiza-se, nos quinze dias seguintes, o segundo leilão, para o qual se aceita o maior lance oferecido,

desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais471.

Exitoso o leilão – vale dizer, o valor do lanço superou, pelo menos, o montante correspondente à dívida acrescida das despesas e encargos aos quais aludem os parágrafos segundo e terceiro do artigo 27 da Lei 9.514/97 -, o credor deve primeiramente pagar as despesas e encargos; na seqüencia, deve pagar-se e, após, havendo montante remanescente,

entregará ao devedor a importância que sobejar472, considerando-se nela compreendido o valor da indenização de benfeitorias, tendo-se as partes por mutuamente satisfeitas,

implicando o ato recíproca quitação, descabendo na hipótese que o ocupante sustente pretensão de retenção do imóvel por benfeitorias473.

A despeito da ausência de previsão legal, mas considerando-se as peculiaridades da

alienação fiduciária em garantia de bem imóvel no plano do direito material no que

concerne à propriedade, consolidada com o credor desde o inadimplemento, entende-se que o título translativo da propriedade, que permitirá o registro do imóvel em nome do arrematante, consiste de escritura pública ou documento particular ao qual a lei reconheça tal eficácia474, lavrada a partir do auto de arrematação expedido pelo leiloeiro.

partes, aplicando-se ainda eventual fator de depreciação em razão da passagem do tempo (Negócio fiduciário, 2009, pp. 262-263).

471

Art. 27, §§ 1 e 2º, da Lei 9.514/97. Observa-se que a própria lei cuida de especificar o que deve ser compreendido por dívida (“o saldo devedor da operação de alienação fiduciária, na data do leilão, nele incluídos os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais” - art. 27, §3º, I, Lei 9.514/97-) e por despesas (“a soma das importâncias correspondentes aos encargos e custas de intimação e as necessárias à realização do público leilão, nestas compreendidas as relativas aos anúncios e à comissão do leiloeiro” - art. 27, §3º, II, Lei 9.514/97-).

472“Embora a Lei seja omissa quanto à rigorosa ordem de pagamento, o mais coerente é que primeiro seja pago o leiloeiro, depois sejam compensadas as despesas cartorárias adiantadas pelo credor, seguindo-se a satisfação das Fazendas Públicas (observada a ordem de preferência estabelecida entre elas) e, por fim, a satisfação do credor fiduciário. Se houver saldo, deverá ser entregue ao devedor” (S. J. MARTINS, Execuções extrajudiciais de créditos imobiliários, 2007, p.170). Diferentemente do que se passa na alienação havida em juízo, eventuais débitos que gravam o imóvel não ficam sub-rogados no valor do lanço.

473

Art. 27, § 4º, da Lei 9.514/97. Tal dispositivo prevê, ainda, não se aplicar “o disposto na parte final do art. 516 do Código Civil”. A alusão é ao direito de retenção por benfeitorias e a menção é ao dispositivo do Código Civil de 1916.

474 Com esse entendimento, dentre tantos, M. TERRA, Alienação fiduciária de imóvel em garantia (Lei 9.514/97, primeiras linhas), 1998, p. 49 e M. N. CHALHUB, Negócio fiduciário, 2009, p. 264; valendo observar que o art. 38 da Lei 9.514/97, na redação que lhe deu a Lei 11.076/2004, admite tal eficácia aos instrumentos particulares atinentes à primeira Lei, aí incluídos aqueles que visem à constituição,

Importante notar que, no regime da alienação fiduciária, se o valor do lanço não for suficiente para cobrir a totalidade da dívida acrescida de despesas e encargos, ou mesmo se não houver licitantes, a solução imposta pelo legislador é a de que o credor receba definitivamente o bem em seu patrimônio475, sem restituição de valores ao devedor476 e, de outro lado, que a dívida resulte extinta, obrigando-se o credor a dar quitação ao devedor,

em termo próprio e no prazo de cinco dias contados da data do segundo leilão477. Também transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis. Em sentido contrário, invocando o quanto previsto no art. 37, caput, do Decreto-lei 70/66, sustenta A. L. CLÁPIS que o título a ser apresentado ao Cartório de Registro de Imóveis é a carta de arrematação assinada pelo leiloeiro, pelo credor, pelo devedor (cuja eventuais ausência ou recusa em assinar a carta devem ser certificadas pelo leiloeiro), pelo arrematante e por cinco testemunhas (A propriedade fiduciária imobiliária – aspectos gerais e registrários, Dissertação (Mestrado), 2010, p. 178).

475 “Diante do silêncio da lei, o que há de se subentender na prática após duas tentativas frustradas de leilão é a solução legal para o impasse, pela cessação natural da proibição circunstancial de poder o ex-credor ficar em definitivo com o imóvel fiduciado, restando liberado para negociá-lo supervenientemente, sob sua inteira disponibilidade de resultado, hipótese em que não cabe qualquer outra prestação de contas ao ex-

devedor após a ulterior venda privada” (P. S. RESTIFFE - P. RESTIFFE NETO, Propriedade fiduciária imóvel,

2009, p.175).

476 Em sentido contrário e aparentemente conflitante com o disposto no art. 27 § 5º da Lei 9.514/97,

sustentam P. S. RESTIFFE - P. RESTIFFE NETO remanescer, mesmo após frustrado o segundo leilão, a necessidade de se proceder a ajuste de posições, a ser feito considerando que o imóvel teria se incorporado ao patrimônio do credor pelo valor que lhe atribuíram as partes (art. 24, VI, Lei 9.514/97), aproveitando-se tal valor em favor do devedor, assim como as parcelas que já pagou da dívida, e apurando-se, a partir de então, a existência ou não de saldo a lhe ser restituído (Propriedade fiduciária imóvel, 2009, p. 170). De jure condendo, também com o objetivo de apurar eventual saldo em favor do devedor na hipótese de, frustrados os leilões, operar-se a adjudicação do imóvel pelo credor, propõe M. J. BEZERRA FILHO alteração nos §§2º e 5º do art. 27 da Lei 9514/97, para estabelecer que, no segundo leilão, o valor mínimo para expropriação seja igual ou superior a 75% do valor do imóvel mais as despesas e encargos, prêmios de seguros, encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais e que, se tal patamar não for alcançado, quando da adjudicação pelo credor, este deveria pagar ao devedor a diferença que existiria se o bem tivesse sido arrematado pelo valor mínimo que propôs (A execução extrajudicial de contrato de alienação fiduciária de bem imóvel – exame crítico da Lei 9.514, de 20.11.1997, in. Revista dos Tribunais, nº. 819, 2004, pp. 75-76).

477 art. 27, §§ 5º e 6º, da Lei 9.514/97. Na opinião de P. S. RESTIFFE - P. RESTIFFE NETO, o instituto, de inspiração canônica, “trata-se do ponto mais virtuoso do novo sistema legal, que funciona como atrativo tranquilizador ao financiado e aos coobrigados, pela segurança de que ao menos não serão estrangulados pelo ‘fantasma’ do saldo devedor, exonerados que estão ex lege desse temível resíduo exacerbado, que passa a integrar o risco da atividade do credor fiduciário, o que, noutros sistemas, completava a infelicidade dos

inadimplentes e seus garantes (Propriedade fiduciária imóvel, 2009, p.169). Aponta M. N. CHALHUB que a

obrigatoriedade de quitação, que “libera o devedor da responsabilidade pelo pagamento do eventual saldo da dívida, afastando a possibilidade de constrição de outros bens do seu patrimônio caso não se alcance, no leilão, valor suficiente para cobrir o crédito do fiduciário”, mitiga os eventuais impactos negativos do regime da alienação fiduciária e compensa a “maior eficácia da excussão da garantia”, que se opera em procedimento célere (Alienação fiduciária de bens imóveis. Aspectos da formação, execução e extinção do contrato, in Revista de Direito Imobiliário, nº. 63, 2007, p. 95). Obtempera, porém, que “esse perdão da dívida deveria ser limitado a financiamentos de natureza habitacional, dele excluindo-se as operações de financiamento não-habitacional, em geral, e as de autofinanciamento do tipo consórcio”; pois somente se justificaria se presente a finalidade assistencial do financiamento: “ora, o perdão da dívida em relação ao saldo residual é mecanismo compensatório que só se justifica nas operações de finalidade assistencial, e é por essa razão que é empregado nos processos de execução judicial no âmbito do SFH, nos termos da Lei 5.741/1971, pela qual o devedor fica exonerado de pagar o saldo residual, da mesma forma que prevê o art. 27, § 5.º, da Lei 9.514/1997”. Para os demais casos, propugna que a cobrança do saldo seja autorizada (ob. cit., p. 105 e Negócio fiduciário, pp. 264-266). Com o objetivo de alterar a regra em questão, para excluir do

neste caso, a despeito do silêncio da lei, entende a doutrina que deverá ser lavrado e averbado na matrícula do imóvel o correspondente auto de leilões negativos478.

Também levando em conta as peculiaridades da alienação fiduciária em garantia

de bem imóvel, sob o aspecto da posse, certo que o credor conserva consigo, desde a

constituição da garantia, a posse indireta do bem, e que a posse direta do devedor só é justa enquanto estiver adimplente479, assegura-se ao credor – a este, até mesmo antes do leilão, desde que já consolidada em seu nome a propriedade do imóvel480 - ou ao seu cessionário ou sucessor, ou ainda ao adquirente do imóvel em leilão – a estes em conseqüente transmissão ficta da posse, por força de constituto possessório-, resistindo o ocupante em desalojar-se do imóvel, a obtenção da posse por meio de ação de reintegração na posse, na qual deverá o magistrado conceder liminar para desocupação em sessenta dias481.

benefício do perdão da dívida as operações de financiamento não-habitacional e as de autofinanciamento do tipo consórcio, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 1.070/2007. De nossa parte, reputamos o benefício – típica vedação do “deficiency judgment” - como necessário ao equilíbrio da execução extrajudicial (v. item 9.1.4 abaixo): ao credor que antever como insuficiente o resultado de remanescer com o imóvel em troca da quitação da dívida, restará perseguir a satisfação de seus interesses em via judicial.

478

M. N. CHALHUB, Negócio fiduciário, 2009, p. 264 e A. L. CLÁPIS, A propriedade fiduciária imobiliária – aspectos gerais e registrários, Dissertação (Mestrado), 2010, p. 152.

479 “O fato que enseja a reintegração é a perda de legitimidade da posse do fiduciante, que decorre da inexecução do contrato de alienação fiduciária, tendo em vista que a lei só reconhece legitimidade na sua

posse enquanto adimplente” (M. N. CHALHUB, Alienação fiduciária de bens imóveis. Aspectos da formação,

execução e extinção do contrato, in Revista de Direito Imobiliário, nº. 63, 2007, p. 106).

480 “SFI - Sistema Financeiro Imobiliário. Lei 9.514/97. Alienação fiduciária de bem imóvel. Inadimplemento do fiduciante. Consolidação do imóvel na propriedade do fiduciário (...). Pretensão, do credor, a obter a reintegração da posse do imóvel anteriormente ao leilão disciplinado pelo art. 27 da Lei 9.514/97. Possibilidade. Interpretação sistemática da lei. 1. Os dispositivos da Lei 9.514/97, notadamente seus arts. 26, 27, 30 e 37-A, comportam dupla interpretação: é possível dizer, por um lado, que o direito do credor fiduciário à reintegração da posse do imóvel alienado decorre automaticamente da consolidação de sua propriedade sobre o bem nas hipóteses de inadimplemento; ou é possível afirmar que referido direito possessório somente nasce a partir da realização dos leilões a que se refere o art. 27 da Lei 9.514/97. 2. A interpretação sistemática de uma Lei exige que se busque, não apenas em sua arquitetura interna, mas no sentido jurídico dos institutos que regula, o modelo adequado para sua aplicação. Se a posse do imóvel, pelo devedor fiduciário, é derivada de um contrato firmado com o credor fiduciante, a resolução do contrato no qual ela encontra fundamento torna-a ilegítima, sendo possível qualificar como esbulho sua permanência no imóvel. 3. A consolidação da propriedade do bem no nome do credor fiduciante confere-lhe o direito à posse do imóvel. Negá-lo implicaria autorizar que o devedor fiduciário permaneça em bem que não lhe pertence, sem pagamento de contraprestação, na medida em que a Lei 9.514/97 estabelece, em seu art. 37-A, o pagamento de taxa de ocupação apenas depois da realização dos leilões extrajudiciais. Se os leilões são

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