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Questionamentos sobre a constitucionalidade da execução extrajudicial

A doutrina pátria tem divergido sobre a constitucionalidade da execução

extrajudicial563.

Autorizadas vozes bradaram a inconstitucionalidade deste instrumento. Tendo em vista principalmente o regime do Decreto-Lei 70/66, A.P.GRINOVER564, J. I. BOTELHO DE

MESQUITA565, C. A. OLIVEIRA566, L.G. MARINONI567, F. B. FRANCO568 e A. RIZZARDO569

entenderam que a execução extrajudicial hipotecária violaria garantias asseguradas pelo texto constitucional.

E. F. SANTOS570 e A. F. FABRÍCIO571 sustentaram que mesmo a execução extrajudicial disciplinada na Lei 9.154/97 padeceria de inconstitucionalidade, do que também pareceu suspeitar o magistrado paulista M. J. BEZERRA FILHO572.

563 Alude-se, aqui, à inconstitucionalidade em sentido lato, sem distinguir a suposta não-recepção do regime

do Decreto-lei 70/66 pela Constituição Federal de 1988 da possível inconstitucionalidade da figura da Lei 9.154/97.

564

Novas tendências do direito processual, 1990, pp.199/201.

565 O princípio da liberdade na prestação jurisdicional in Teses, estudos e pareceres de processo civil, v. 2,

2005, pp. 41-42.

566 Procedimento e Ideologia no Direito brasileiro atual, in Ajuris, nº 33, 1985, pp 82-83. 567

A tutela cautelar do direito ao devido processo legal (O caso da execução privada do Dec-lei 70/66), in Jurisprudência Brasileira Cível e Comércio, nº. 173, 1994, p.63.

568 A fórmula do devido processo legal, in RePro, nº. 94, 1999, p. 105. 569 Contratos de crédito bancário, 2011, p. 209-210.

570

Alienação Fiduciária de coisa imóvel, in Revista Jurídica, nº. 261, 1999, p. 22.

571 A alienação fiduciária de imóveis segundo a lei n. 9.514/97, in F. DIDIER JUNIOR, e C. C. FARIAS

(coords.), Procedimentos Especiais cíveis: legislação extravagante, 2003, pp. 1444-1447.

572 A execução extrajudicial de contrato de alienação fiduciária de bem imóvel – exame crítico da Lei 9.514,

de 20.11.1997, in Revista dos Tribunais, nº. 819, 2004, p. 75. Vale observar que, alguns anos mais tarde, quando de sua tese de doutoramento, o referido autor parece ter criticado com menos veemência tal espécie de execução extrajudicial, lamentando que a lei não tenha aproveitado melhor a oportunidade para adotar disciplina que desestimulasse o devedor a buscar socorro junto ao Poder Judiciário (Da fidúcia à securitização: as garantias dos negócios empresariais e o afastamento da jurisdição, 2006, pp. 162-169), disciplina que poderia ser alcançada, em seu entender, com ligeiros ajustes nos artigos 27 e 30 da Lei 9.514/97, cujo texto foi sugerido no ensaio antes referido (ob. cit., pp.75-76).

Mais recentemente, em obra monográfica sobre o tema, também E.H.YOSHIKAWA

partilhou do entendimento no sentido da inconstitucionalidade573.

De outro lado, destacados juristas, como J.C.MOREIRA ALVES574, O.GOMES575, C. M. PEREIRA576 e J. M. ARRUDA ALVIM577, defenderam a plena constitucionalidade da execução extrajudicial.

Foram seguidos por M. N. CHALHUB578,M. TERRA579, U. CUSTÓDIO FILHO580, S.

GARSON581 e pelo desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo M. Q.

PEREIRA CALÇAS582.

E em também recente obra monográfica sobre o tema, S. J.MARTINS583 procurou

demonstrar a constitucionalidade da execução extrajudicial.

Merece destaque o entendimento de C. R. DINAMARCO, que, de início, repudiou a

execução extrajudicial, em especial aquela disciplinada pelo Decreto-Lei 70/66: embora reconhecesse, desde o princípio, que “essas medidas poderão contar com legítimo

respaldo nessa ordem equilibrada que se alvitra, na medida em que tendentes a propiciar a efetividade dos direitos”, apontava que “o mal está no risco de arbitrariedades inerentes a uma possível justiça de mão própria”, que poderia afastar a execução de sua linha de humanização584.

Anos mais tarde, o referido professor, motivado pela entrada em vigor da Lei 9.514/97, voltou a debruçar-se sobre o tema – que, então, já contava com numerosos

573 Execução extrajudicial e devido processo legal, 2010, esp. pp. 112-136. 574

Da alienação fiduciária em garantia, 1979, p. 207 (tendo em vista a alienação fiduciária de bem móvel).

575 Direitos Reais, 2009, p. 429

576 Condomínios e Incorporações, 2002, pp. 323-328 (tendo em o leilão extrajudicial do art. 63 da Lei

4.591/64).

577

Contestação – Ação civil pública – pretensão a obtenção de declaração de inconstitucionalidade em tese – inadmissibilidade, in RePro, nº. 82, 1996, pp. 272-274.

578 O leilão extrajudicial face ao princípio do devido processo legal, in RePro, nº. 96, 1999, pp. 76-82 e 90. 579 Alienação fiduciária de imóvel em garantia (Lei 9.514/97, primeiras linhas), 1998, pp. 53-54 580

A execução extrajudicial do decreto-lei 70/66 em face do princípio do devido processo legal, in Revista de Direito Constitucional e Internacional, nº. 37, 2001, pp.168-173.

581 A viabilidade da desjudicialização do processo de execução, in M.P.CARVALHO (coord), Direito Processual Civil, 2007, pp. 523-545.

582

Aspectos gerais e questões polêmicas da alienação fiduciária de imóveis, pp. 07-10.

583 Execuções extrajudiciais de créditos imobiliários, 2007, esp. pp. 81-108. 584 Execução civil, 1994, pp. 308-310.

julgados a respeito da aplicação, em concreto, da execução extrajudicial hipotecária e da

alienação fiduciária em garantia de bens móveis –, para concluir pela constitucionalidade

do instituto585.

Em obra mais recente, C. R. DINAMARCO permanece adepto da tese da

constitucionalidade da execução extrajudicial, sobretudo em razão da largueza com que os atos nela praticados podem ser controlados pelo Poder Judiciário586. Esta parece ser mesmo a chave para a solução do problema, como se verá adiante.

A jurisprudência, depois de algumas vacilações iniciais587, firmou-se, sobretudo no SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, pela constitucionalidade das execuções extrajudiciais588. O

585

Alienação fiduciária de bens imóveis. Fundamentos do processo civil moderno, t. II, 2002, esp. pp. 1272-1281. Trata-se de parecer, originalmente publicado na Revista de Direito Imobiliário nº 51, julho-dezembro de 2001, pp 235-252.

586 Instituições de direito processual civil, v. IV, 2009, pp 64-65. 587

Com destaque para a Súmula 39 do Extinto PRIMEIRO TRIBUNAL ALÇADA CIVIL DO ESTADO DE SÃO PAULO, que considerava inconstitucionais os artigos 30, parte final, e 31 a 38, do Decreto-lei 70/ 66. Tal entendimento foi reiterado há não muito tempo pela 22ª Câmara de Direito Privado do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, sob os seguintes fundamentos: “(...) De fato, a possibilidade de o credor promover a execução extrajudicial de seu crédito, com a alienação do bem hipotecado, afronta os princípios constitucionais da inafastabilidade do controle jurisdicional, do contraditório, da ampla defesa, do juiz natural e do devido processo legal (CF, art. 5º, XXXV, LIV e LV). Ninguém pode ter sua esfera jurídica invadida por ato privado do credor, que deve valer-se do mecanismo estatal de solução de controvérsias, com todas as garantias a ele inerentes. A Constituição Federal estabeleceu o modelo processual constitucional, colocando-o à disposição de todos que necessitem da tutela jurisdicional. Impossível privar a pessoa de seus bens por outra via, sem assegurar-lhe as garantias do devido processo constitucional. Ademais, o benefício legal concedido aos agentes fiduciários fere ainda o princípio da isonomia, pois os coloca em situação de indiscutível vantagem em relação aos demais credores, que estão obrigados a suportar todos os ônus do processo judicial (...)” (TJ/SP, Embargos Infringentes 920.905-4/01, 22ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Roberto Bedaque, j. 07.11.2006). Mais recentemente, e versando sobre a execução extrajudicial da alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, a 14ª Câmara de Direito Privado do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO decidiu que “(...) a exemplo do que ocorre com o leilão extrajudicial preconizado no Dec.-Lei 70/66, o leilão extrajudicial da lei 9.514/97 é ilegal”, sob o entendimento de que “(...) a alienação extrajudicial não obedece aos princípios do contraditório e da ampla defesa, além de afastar a atividade jurisdicional, que compete ao Poder Judiciário, e somente a ele” (TJ/SP, Ap. 0002245-88.2011, Rel. Des. Melo Colombi, j. 29.02.2012); constando do v. acórdão ser “(...) certo que o Superior Tribunal de Justiça já assentou entendimento no sentido da legalidade desse tipo de alienação. Porém, em razão da afronta desse instituto aos princípios basilares de nosso Direito (contraditório, ampla defesa), este Relator mantém sua convicção, certo de que o resultado da demanda não pode fazê-lo curvar-se a uma interpretação política, preconizada pelo órgão superior”.

588 “Execução Extrajudicial. Decreto-lei nº 70/66. Constitucionalidade. Compatibilidade do aludido diploma legal com a Carta da República, posto que, além de prever uma fase de controle judicial, conquanto a posteriori, da venda do imóvel objeto da garantia pelo agente fiduciário, não impede que eventual ilegalidade perpetrada no curso do procedimento seja reprimida, de logo, pelos meios processuais adequados” (STF, 1ª Turma, RE 223.075, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 23.06.1998). Tal entendimento foi referendado, dentre outros, pelos seguintes julgados: STF, 1ª Turma, RE 287.453, Rel. Min. Moreira Alves, j. 18.09.2001; STF, 2ª Turma, RE 269.419 AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 20.11.2001; STF, 2ª Turma, RE 250.545, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. 20.08.2002; STF, 1ª Turma, RE 408.224 AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 08.03.2007; STF, 2ª Turma, RE 513.546 AgR, Rel. Min. Eros Grau, j. 24.06.2008; STF, 1ª Turma, RE 523.966 ED, Rel. Min. Carmen Lúcia, j. 15.12.2009 e STF, 2ª Turma, AI 678.256 AgR, Rel. Min.

assunto, no entanto, recentemente voltou à baila. Foi reconhecida a repercussão geral da

questão da constitucionalidade da execução extrajudicial do Decreto-Lei 70/66589 e, atualmente, aguarda-se a conclusão do julgamento dos Recursos Extraordinários submetidos ao Pleno590, intensificando as expectativas a respeito do enfrentamento do mérito por aquela Corte.

Examinamos, doravante – desde já com a ressalva de que os argumentos se interpenetram e não comportam classificação unívoca e estanque – os principais questionamentos a respeito da constitucionalidade das execuções extrajudiciais e as respostas que lhes podem ser dadas.

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