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O PONTO DE VISTA FREUDIANO

ROBERT insiste na maneira pela qual um conjunto concreto é visto em sua organização" e LAROUSSE, partindo da

B) O PONTO DE VISTA FREUDIANO

D. ANZIEU (1967) constata que depois de FREUD não mais se pode com- por uma obra de arte como antes dele; do mesmo modo, não mais se pode con- ceber uma nosologia após FREUD como antes dele.

Em suas Novas Conferéncias de 1932, S. Freud nos lembra que, se deixar - mos cair no chão um bloco mineral cuja forma

ê

cristalizada, ele se quebra, mas não de um modo qualqu er.

Em todo corpo cristalizado ex iste, no estado de equilíbrio normal, micro- cristalizações invisíveis, reunidas entre si para formar o corpo total segundo li- nhas de clivagem cuj os 1 limites, direções e angulações acham-se pré-estabe! ecidas de forma precisa, fixa e constante para cada corpo em particular; existe, para ca- da corpo, apenas um modo de cristalizar-se, e cada modo de c rista liz ação é pró- prio de um corpo químico unicamente. Ademais, estas linhas de clivagem per- manecem invisíveis enquanto o corpo não for quebrado ou então colocado sob

111110 aparelho óptico especial; no máximo, em estado de equilíbrio, a forma geral da amostra examinada mostr ará ao observador

algumas figuras geométricas específicas de seu contorno,sua periferia, seus limit es exteriores.

Se deixarmos cair ao chão nossa amostra mineral cristalizada, ela poderá quebrar-se, conforme explica Freud, apenas segundo as linhas de clivagem pré- estabelecidas no estado de equil!brio, segundo seus limites, suas direções e an- guláções até então invisíveis. Tais linhas de clivagem originais e imutáveis defi- nem a estrutura interna do mineral.

FREUD pensa que o mesmo aconteceria com a estrutura mental, que em

situação normal a organização de um indivíduo se acharia constituída de forma durável, específ ica e invisível. Bastaria um acidente ou um exame minucioso para que se encontrassem as linhas de clivagem (e tamMm de sutura) funda- mentais entre os elementos primários .

Seja ao nível da doença ou ao nível prévio da simples estrutura não das-

compensada, não se pode passar do modo de estruturação psicótica, ou inver- samente, uma vez que um ego espedfico

é

organizado em um sentido ou em outro. A mais "neurótica" das psicoses e a mais "psicótica" das neuroses jamais chegarão a encontrar-se em uma linhagem comum de organização do ego. Na primeir a hipótese, já existe uma nítida negação da realidade constrangedora, a libido narcisista em primeiro plano, o processo primário que a domina, desin- vestimento do obj eto, proj eção e identificação projetiva como defesas banais; na segunda hipótese, ao contrário, existe um conflito entre o ego e as pulsões e um recalcamento destas, adesão ao principio de realidade, uma atividade, ao menos relativa, da libido obj etai e um importante j ogo dos processos secundários.

Segundo P. JANET (1929), o termo "neurose" foi introduzido em 1777 por W illiam CULLEN, e "psicose", em 1845, por FEUCHTERSLEBEN. Estas duas noções não correspondiam ao seu conteúdo atual quando for am utilizadas pela primeira vez. Reportando-nos à liter atu ra psiquiátrica alemã do final do século XIX, constatamos que FRE UD havia tido conhecimento dos escritos de autores dos anos de 1895-1900 e da distinção nitidamente estabelecida entre neuroses e psicoses.

A preocupação de FRE UD permanece, contudo, mais centrada na desco-

berta dos mecanismos psíquicos em questão nos doentes, vistos in vivo em seu dinamismo e evolução relaciona!, do que nas distinções categor iais entre o gr u- po dos neuróticos (do qual pensa ocupar-se mais comumente) e o grupo dos psicóticos, sobre o qual, talvez muito apressadamente, adquiriu-se o hábito de dizer que a este se dedicou bem menos.

Sem novamente estendermo -nos aqui sobre as posições freudianas con-

cernentes às neuroses, o essencial pode resumir -se à expressão simbólica dos sintomas, bem como à realização de um compromisso entre pulsões e defesas, ao estatuto intrapsíquico do conflito entre

o

ego e o id, ao aspecto parcial das regressões e fixações, ao caráter obj etai da libido, que nunca

é

muito desinvesti- do, às funções do fantasma que deforma a realidade sem jamais negá- la .

No que diz respeito às psicoses, ao contrár io, muitas vezes contentamo- nos em pensar que Freud aceitava mal o contato com os psicóticos e o face a fa-

c:e

donde, justamente, sentia-se objetalmente excluído, e limitamos seu ponto de -vista à exclusão da transf erência na relação de objeto psicótica. Em geral preten- de-se não conhecer mais do que a oposição entre "neuroses de transferência" e

...neuroses narcisistas". Ora, a posição freudiana, ou antes as sucessivas posições freudianas em relação ao assunto psicose, mostram-se muito mais ricas e nuan- çadas:

a) Primeira posição freudiana

A primeira posição freudiana corresponde às cartas a FLIESS, principal- mente aos Manuscritos D, G, H e K, (1887-1902). aos

Estudos sobre a Histe- ria (1895 d}, aos artigos sobre as psiconeuroses de defesa (1894), à neurose de angústia (189 5 b), à resposta a

LOW ENFELD a respeito do mesmo artigo (1895 f) e, finalmente, às Novas observações sobre as psiconeuroses de defesa (1896).

Durante todo este período, FRE UD opõe as "psiconeuroses" ao grupo das "neuroses atuais", no qual dispõe, pelo menos de momento, essencialmente a neurose de angústia à neurastenia.

FREUD ainda não havia feito uma nítida escolha dos mecanismos que iria descrever. Apreendendo, então, superficialmente o conjunto do campo psiquiá- trico havia, desde este momento, pressentido formas etiológicas difíceis de dis- por em categorias psicóticas ou neuróticas da época, quaisquer que tossem as suas denominações.

b) Segunda posição de Freud

A segunda posição freudiana corresponde ao período da primeira teoria do aparelho psíquico.

É

na análise do caso SCHREBER (1911 c), na Introdução ao Narcisismo (1914 c), na Metapsicologia (1915 a), na Introdução Psicanáli- se (1916-1917) e, finalmente, em O Homem dos Lobos (1918), que vemos Freud dispor, de um lado, ainda inalteradas, as "neuroses atuais" (Neurastenia e neu- rose de angústia) e, de outro, as "psiconeuroses", divididas em duas partes:

"psiconeuroses de transferência" (histeria, neurose obsessiva

e

fobia s) e "psico-

neuroses narcisistas", correspondentes às psicoses clássicas. A propósito desta última categoria, FREUD mostra-nos como, nas psicoses, a libido permanece fi- xada em um estágio auto-erótico, perde sua mobilidade e não encontra mais o caminho para os objetos. Ao contrário, nas neuroses, enfatiza-se a r€1ação entre investimentos libidinais e investimentos das pulsões do ego, entre libido objetai e libido narcisista, tmto mais que, no a rtigo sobre o narcicismo, FREUD de certa forma estabelece uma ponte a este nível (pelo intermediário da hipocondria, da qual se diz "tentado a considerá-la uma terceira neurose atual") e mostra como a li- bido narcisista está ligada justamente a estas "neuroses atuais", da mesma for- ma que a libido obj etai às neuroses histéricas e obsessivas.

c) Terceira posiç o freudiana

A terceira posição freudiana inscreve-se na elaboração da segunda tópica. São artigos sobre O Ego e o ld (1923 b), Neuroses

e

Psicoses (1924 b), Perda da Realidade nas Neuroses e nas Psicoses (1924

e),

A Economia do Masoquismo (1924

c) e A Denegaç3o (1925 h).

A oposição sempre se estabelece entre "neuroses atuais" de um lado e, de outro, agora três categorias: as antigas "psiconeuroses de transferência", agora chamadas simplesmente de "neuroses", e duas outras categorias: as "psico- neuroses narcisistas" (que então compreendem apenas a depressão e a melan- colia) e as "psicoses" (onde são colocadas a paranóia e a esquizofrenia).

O ego ocupa uma posição intermediária entre o id e a realidade. Nas neu- roses, o ego obedece às exigências da realidade e do superego, ele recalca as pulsões; nas psicoses, há uma ruptura entre o ego e a realidade. O ego cai sob o domínio do id e reconstrói para si uma nova realidade (delírio) conforme os de- sejos do id.

Nas neuroses de transferéncia existe um conflito entre o ego e o id;nas psi-

coses, o conflito situa-se entre o ego e o mundo exterior.

A noção de "neuroses narcisistas", na última concepção de Freud, deve ser comparada à fixidez da opinião de FREUD acerca das "neuroses atuais". O pri- meiro grupo compreende a depressão e o segundo, a neurose de angústia, duas entidades que não deixam de ter estreita relaç ão entre si.

É

neste período que FREUD, depois de pesquisar, em seus dois estudos, o

que opunha neuroses e psicoses, termina seu primeiro artigo descrevendo uma terceira possibilidade do ego: "deformar-se", para não ter de romper-se. Esta hi- pótese

é

de 1924 e parece muito importante,embora não tenha sido posterior- mente desenvolvida na obra de FREUD. Parece haver sido eclipsada, demasiado cedo e rapidamente, pelo conceito único de clivagem que, em meu entender, nada mais

é

do que uma conseqüência, quando se fala da clivagem do objeto.

d)Quartaposição freudiana

A quarta posição freudiana,por fim, inicia com o importante trabalhoSo- bre algumas conseqüéncias psfquicas da

diferença anat6mica entre os sexos (1925 j) e prossegue com os artigos sobre O Fetichismo (1927 e), Os tipos libidinais (1931 a), A

clivagem do ego no processo defensivo (1938 a) e o Esboço da Psican li- se (1940 a).

A partir deste momento, a questão para FREUD não

é

mais opor entidades

nosológicas umas às outras,mas antes esquadrinhar certos mecanismos, princi- palmente da vertente psicótica e, em particular, as noções de "Spaltung" (cliva- gem) e "Verleugnung" {negação de um fato que se impõe no mundo exterior).

Os psicanalistas parecem interessar-se pouco pelo artigo Os tipos libidinais (1931 a). Contudo,

é

neste trabalho que FREUD nos mostra como pressente que será para nós, mais tarde, uma estrutura neurótica, como uma estrutura histérica

ou obs essiva ainda não doente poderá fat.er eclodir, em caso de acidente patoló- gico, quer uma neurose histérica,quer uma neurose obsessiva . Pa r ece que nun- ca se observa com suficient e atenção o quanto FREUD colocou aqui, em uma posição

à

parte, aquilo que chama de tipo "narcisista", o quanto definiu a into- lerância deste tipo às frustrações exteriores e sua particular predisposiç ão

à

"psi- cose" (sic), bem como para distúrbios que poderíamos atualmente c!lamar de "caracteriais" ou "perversos".