• Nenhum resultado encontrado

Para compreender melhor a importância dos queijos DOP transmontanos em termos de Centro- Norte de Portugal foi nosso objetivo a sua comparação com o queijo Serra da Estrela DOP, alvo de alguns estudos detalhados e muito conhecido do público nacional (Rebelo, 1994; Dinis, 1995; Pellin et al. 2016; Modesto e Barbosa, 2007).

Segundo o que pudemos perceber há fatores culturais diferenciadores entre estas duas realidades.

O queijo Serra da Estrela DOP, gerido pela Cooperativa ESTRELACOOP (Fig. 53), cuja região demarcada abrange 18 municípios (Guarda, Fornos de Algodres, Celorico da Beira, Gouveia, Manteigas, Seia, Trancoso, Oliveira do Hospital, Nelas, Penalva do Castelo, Mangualde e Covilhã), é um queijo produzido com leite de ovelha das raças Serra da Estrela e/ou Churra Mondegueira116 (Fig. 50 (a) e (b)).

Fig. 50 – (a) e (b) Ovelhas da raça Churra Mondegueira

Fonte: https://autoctones.ruralbit.com/index.php?rac=57&esp=2&pais=pt

116 - Segundo a ANILACT – Indústria Nacional dos Industriais de Lacticínios (consultado em https://www.anilact.pt/info/actual/sector/item/1162- reducao-de-50-na-producao-de-queijo-serra-da-estrela-devido-a-seca, em 2019).

128

Fig. 51 – Promoção do queijo da Serra da Estrela DOP na página oficial do Ministério da Agricultura Fonte: http://ptqc.drapc.gov.pt/documentos/queijo_serra_estrela.pdf, (extraído a 23 de janeiro de 2019)

129

Trata-se de um dos queijos cultural e historicamente mais conhecido de Portugal. Este é um dos queijos mencionados repetidamente quando se abordam “queijos portugueses”, como referência gastronómica e turística. A obra de Modesto e Barbosa (2007) cita os queijos de ovelha como uma referência nacional e sobretudo entre os DOP. O Serra da Estrela (DOP) é mencionado como um queijo que se perde nos tempos longínquos da ocupação romana (p. 46 adaptado), e é uma grande referência aos queijos nacionais. (p. 50):

Existe no imaginário de todos nós. Aquele queijo de forma redonda, casca muito fina, amarelada, com a pasta fina, macia, amanteigada, cor de marfim, que se dissolve lentamente na boca libertando sensações aromáticas e gustativas indescritíveis, transporta-nos à ideia de festa, de bem-estar, de uma mesa bonita e convidativa, de uma lareira aconchegante e de convívio entre família e amigos.

Trata-se, pois de um queijo de grande valor cultural e comercial, com eventos ligados à sua promoção, como A Feira do Queijo Serra da Estrela117 e a Festa do Queijo Serra da Estrela118 (Fig.

60), numa região frequentada pelo turismo desde cedo e com índices de crescimento acentuados do mercado português e espanhol (Costa, 2015)

Tais circunstâncias proporcionaram o aparecimento de 31 produtores do Queijo Serra da Estrela DOP, entre particulares e cooperativas, em 2016119.

Fig. 52 – Imagem do sítio promocional da Feira do Queijo Serra da Estrela (2018) Fonte: http://feiradoqueijo.cm-celoricodabeira.pt/

O mercado do queijo Serra da Estrela DOP tem vindo a crescer. Os dados apontados pela InovCluster – Associação do Cluster Agroindustrial do Centro, aponta o salto do volume de produção de 102 toneladas em 2012 para 197 toneladas em 2017120.

117 Evento anual realizado em Celorico da Beira, geralmente no mês de fevereiro. Disponível em: https://www.cm-celoricodabeira.pt/evento/feira- do-queijo-serra-da-estrela-22-a-24-de-fevereiro-de-2019/. Consulta em 20/02/2019.

O evento de mesmo nome ocorre também em Fornos de Algodres, anualmente, geralmente em março. Disponível em https://beira.pt/portal/noticias/feira-do-queijo-serra-da-estrela-em-fornos-de-algodres-3/. Acesso em 20/02/2019

118 Sediado em Oliveira do Hospital, o evento, anual, acontece durante o mês de março. Disponível em: https://www.cm- oliveiradohospital.pt/index.php/municipio/item/1736-festa-do-queijo-serra-da-estrela-de-oliveira-do-hospital-realiza-se-nos-dias-16-e-17-de-marco. Acesso em 20/02/2019

119 Extraído do “Inquérito aos Agrupamentos de produtores com produtos com DOP/IGP/ETG 2016. Disponível em: http://www.dgadr.gov.pt/images/docs/val/Relatorio_2016__DOP_IGP_ETG.pdf acesso a 18/11/2017.

130

Os interesses também estão na exportação. No mesmo ano (2017), as autoridades portuguesas do Parque Natural “Serra da Estrela” pretenderam desenvolver um plano de internacionalização do queijo, que ainda se limita a países como França e Estados Unidos. A proposta visa alcançar a América, China, Japão e toda a União Europeia121.

Tais características motivaram e dignificaram a criação animal nesse território onde as ovelhas têm como principal função produzir leite para o fabrico do queijo.

No entanto também existem alguns constrangimentos em relação à produção deste produto DOP. Sobre o assunto diz Pellin et al. (2016, p. 280):

Em relação ao processo produtivo identificaram-se três dificuldades: a) limitação da produção em razão de as únicas raças de ovelhas possíveis de serem utilizadas serem pouco produtivas; b) idade avançada dos produtores e o fato de não existirem garantias dos filhos continuarem a produção dos pais; e c) grande resistência de alguns produtores em submeterem a sua produção a reconhecimento como DOP, principalmente em razão dos custos de reconhecimento e da pequena agregação de valor ao produto observada, sobretudo, quando a comercialização é efetuada na região.

Recentemente, Dinis (2018)122, como representante da Associação de Criadores de Ovinos Serra

da Estrela (ANCOSE), voltou a referir os desafios citado em Pellin et al. (2016), a par de novas problemáticas, como o caso de produtores não certificados da Serra da Estrela que alteram o modo de produção tradicional, comprando leite de ovelha de origem espanhola, por ser mais barato, ou utilizando leite de vaca fresco ou em pó, para conseguirem aumentar o volume de produção, sendo, posteriormente vendidos mais baratos do que os certificados. Tal situação prejudica a fama e o sucesso do queijo certificado, cujo trabalho de autenticidade se busca alcançar desde 1996, e pode desestimular a produção local DOP.

Foi ainda referido o êxodo rural associado ao estilo de vida rural pouco atraente para os jovens, e os grandes investimentos e adaptações necessárias para a produção de um produto certificado, nem sempre suficientemente valorizados a nível local e nacional.

Apesar deste panorama, a situação do Queijo Serra da Estrela DOP está mais estabilizada no mercado e a sua situação é mais favorável ao seu crescimento ou manutenção, do que os queijos Transmontanos certificados, que lutam com dificuldades maiores a saber, segundo o estudo levado a cabo:

120 Disponível em: https://www.lusa.pt/article/25584341/produ%C3%A7%C3%A3o-do-queijo-da-serra-da-estrela-dop-atingiu-as-195-toneladas-em- 2017. Reportagem de 09/02/2019. Acesso em 26/02/2019.

121 Disponível em: https://www.efe.com/efe/portugal/portugal/portugal-quer-exportar-os-seus-queijos-cremosos-para-a-america-asia-e- europa/50000441-3185717. Reportagem de 21/02/2017. Acesso em 26/02/2019.

122 Comunicação apresentada por Rui Dinis, intitulada “Queijo Serra da Estrela”, na I Jornada de Produção de Laticínios, LACTIS’18, organização da Associação Portuguesa de Engenharia Zootécnica. Realizado em 23 de novembro de 2018.

131

- Atividade pastoril desvinculada da atividade das queijarias;

- A idade avançada dos criadores de caprinos e de ovinos e a incerteza da continuidade da atividade;

- Queijo menos conhecido e difundido a nível regional, nacional e internacional123, de que resulta

a falta de identificação das populações locais com este produto e seu consequente reconhecimento como valor de importância cultural e estratégica para a região;

- As cabras (raça Serrana – ecótipo Transmontano); e as ovelhas (raça Churra da Terra Quente) fornecedoras de leite para o fabrico de queijo são usadas, também, para outras funções, como o fornecimento de carne DOP. Tal implica riscos maiores em termos da manutenção das espécies e do fornecimento regular do leite.

- O impacto económico desta atividade é, ainda pequeno, em termos locais, pois há apenas três produtores que empregam funcionários para a produção dos queijos DOP124.

Claro que se contabilizarmos os criadores de gado e outros stakeholders envolvidos indiretamente, o impacto económico é maior (fornecimento de alimentos durante os invernos, serviços veterinários, pesquisa científica no melhoramento genético da raça, como por exemplo, além de outros).

Quanto a nós, trata-se, ainda, de um produto emergente, mas já com grandes potencialidades de sustentabilidade cultural e ambiental, ao contribuir para a manutenção da atividade tradicionais, da pecuária extensiva em Portugal e da preservação de espécies de ovinos e caprinos tradicionais.

14. A produção de queijos Terrincho DOP e Cabra Transmontano DOP e a sua relação com o