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QUINTA VIVÊNCIA AS CRIAÇÕES SIMBÓLICAS DE SI, DO OUTRO E DO UNIVERSO VIVENCIAL.

A BELEZA DO JOGO DOS GRÃOS E SEU DESENHO NO MUNDO

4.5 QUINTA VIVÊNCIA AS CRIAÇÕES SIMBÓLICAS DE SI, DO OUTRO E DO UNIVERSO VIVENCIAL.

Os espaços diferenciados para a montagem dos cenários já foi discutido por alguns autores que tratam o Jogo de Areia na abordagem terapêutica, neste sentido nos diz Ammann (2004, p. 45) “alguns terapeutas criticam a forma retangular da caixa. Eles acham que deveriam ser quadrada ou redonda, pois estas formas estimulariam a concentração”. Alguns pesquisadores como Bazhuni e Sant‟Anna (2006) utilizam caixas portáteis para serem utilizadas em leitos hospitalares. Estudos realizados por Sant‟Anna (2001) e Sant‟Anna e Chagas (2003) verificaram que a caixa portátil atende às necessidades de atendimentos em leitos hospitalares. Silva et. al. (2004), também utilizaram uma caixa móvel e portátil, adaptada a partir de uma cesta de palha com tampa e com medidas reduzidas (20 x 30 cm, aproximadamente).

Na abordagem pedagógica vivencial do Jogo de Areia que estamos pesquisando, a forma e o tamanho da caixa são variáveis. Em alguns laboratórios de pesquisadores da BACOR são utilizadas caixas de sapato, bandejas redondas de alumínio e outros recipientes como base para a criação dos cenários. São espaços relativamente grandes em relação às miniaturas, possibilitando liberdade na criação e disposição das mesmas.

Espaços maiores e abertos como a praia, onde cada um escolhe seu território, já foi usada para a criação de cenários. Portanto, o formato e o tamanho da “caixa” não são impeditivos para a realização do jogo na areia e a construção dos cenários, como esclarece o poeta Manoel de Barros (2010, p. 67) “a gente descobre que o tamanho das

coisas há de ser medido pela intimidade que temos com as coisas”. Logo, a intimidade com a caixa de areia é que vai determinar o tamanho do mundo que será representado ali e, se o universo cabe em uma casca de noz (HAWKING, 2002), então em qualquer tamanho de caixa caberá o mundo contido na imaginação de cada um.

As miniaturas de Hélio Leite18 evidenciam como o pequeno pode se tornar gigantesco no mundo da imaginação. A partir de objetos como botões e palitos de fósforo, ele transforma o mundo, não só com as miniaturas de mundo que constrói, mas principalmente pelas histórias que as acompanha, como afirma Pires (2008, p. 12), ele “eleva o pequeno à potência necessária para alterar sua grandeza”. E neste jogo do pequeno se tornando grande, experimentamos o espaço reduzido para a montagem dos cenários, fazendo com que as miniaturas se tornassem gigantescas e, neste brincar e devanear, percebemos como a criatividade e a sensibilidade fluem no jogo da ludicidade.

Além de investigar as criações simbólicas de cada participante em um espaço diferenciado na montagem dos cenários, investigamos também as representações simbólicas de cada um. Em um dos encontros, antes deles conhecerem o espaço disponibilizado para a criação do cenário, foi solicitado que cada participante escolhesse um número limitado de miniaturas dentre uma grande variedade fornecida. Desde objetos usuais do dia–a-dia e do contexto regional no qual estão inseridos, como também aqueles simbólicos como anjos, bruxas e animais mitológicos. Como afirma Ammann (2004, p. 44): “o importante não é tanto o número de figuras disponíveis, mas o seu conteúdo simbólico”.

Tendo isso com premissa, cada participante deveria escolher uma miniatura que os impulsionasse a refletir sobre: a) sua representação pessoal, b) uma representação de si mesmo na educação; c) uma representação de seu colega que estava sentado a sua direita, d) um meio de locomoção; e) um animal de estimação. Assim, eles teriam a representação de si, do outro e de seu mundo vivencial.

As miniaturas foram espalhadas no centro do círculo e todos foram convidados a escolherem suas representações. Esses momentos de escolha das miniaturas é sempre motivo de alegria entre os participantes. E mais uma vez o burburinho se instala na sala

18 José Hélio Silveira Leites – 1951, Lapa, PR – Pintor, escultor, artista performático, poeta e,

segundo a historiadora e crítica de arte Adalice Araújo, o anarquiteto do sonho. Hélio Leites é um artista curitibano de múltiplas linguagens que inventa formas e performances com caixas de fósforos, retrós de linha, pequenos objetos inválidos que contam as histórias do mundo.

e não há como não sermos remetidos, mais uma vez, ao encontro de nossas memórias lúdicas relacionadas às nossas brincadeiras de criança e, assim, livres para manifestarem sua ludicidade (Figura 11).

Figura 11 – Momento de escolha das miniaturas da representação de si, do outro e do universo vivencial. O processo de escolha das miniaturas ocorreu em clima de alegria e ludicidade, com entrega e afetividade.

Fonte: Musse (2009).

Optamos por deixar as miniaturas espalhadas pela mesa, para dar a sensação de brincadeira de crianças, uma vez que, geralmente, nas brincadeiras, os brinquedos ficam espalhados pelo ambiente. A liberdade para a escolha das miniaturas e a forma aleatória de distribuição das miniaturas no ambiente da pesquisa reforça o caráter lúdico do Jogo de Areia na abordagem pedagógica.

Muito mais que brincar, a miniatura possibilita o devanear como afirma Bachelard (2008b, p. 168) “a miniatura é repousante, sem jamais fazer adormecer. A imaginação permanece vigilante e feliz”.

Nas representações de si, a figura mais escolhida foi a representação humana. Como há muitos tipos de figuras humanas, as variações ficam nas roupas e na cor da pele, com poucas associações a características da personalidade. Outro destaque é que os bonecos não demonstram a idade, ou seja, tanto eles podem representar crianças

quanto adultos, mesmo tendo a opção de miniaturas representando adultos e crianças em várias fases de idade.

As participantes Lepidolita e Turmalina escolheram o barco para representá- las. Para elas o barco significa a transitoriedade, ou seja, elas não estão paradas, mas em constate movimento, como afirma Turmalina (2009) “ser um barco é estar em movimento, não estar parada no mundo, assim sou eu, mudando sempre: cabelo, roupas, conhecimento, enfim, tudo”. Para Chevalier e Gheerbrant (2007), a barca é o símbolo da viagem, de uma travessia.

As representações de si na educação apresentam muitas variações, desde as representações usuais de um ser humano até figuras de animais irracionais, flores e árvores. Vale destacar a presença da árvore e das flores associadas com o florescer e o frutificar, como se observa no depoimento que se segue:

Escolhi a árvore para me representar na educação porque acho que minha formação para ser um professor de Geografia vai me possibilitar frutificar meus conhecimentos, passando o que eu sei, mas também aprendendo (ORTOCLÁSIO, 2009).

De posse das miniaturas, foi disponibilizado a eles uma pequena caixa com areia, de formato ovalado e com dimensões de 15 cm de comprimento, 5 cm de largura e altura de 3 cm além da areia (figura 12). Era um espaço diferenciado para a montagem do cenário, com espaço reduzido, assim como as miniaturas Foi solicitado que eles montassem um cenário com as miniaturas selecionadas, contextualizando-as em seu mundo vivencial. Como seria criar e dar vazão à criatividade e imaginação em um espaço tão pequeno?

Nesta pesquisa adotamos a metodologia que está sendo investigada pelo grupo da BACOR, onde o processo inicia-se com uma questão problematizadora, passando pela criação do cenário, reflexão, socialização, reflexão e desmonte do cenário. Assim, nesse encontro, a questão problematizadora foi: como montar um cenário com cinco

miniaturas que possa representar vocês em seu mundo vivencial?

Todos os participantes se mostraram à vontade para fazerem suas construções. Os cenários foram surgindo nos espaços reduzidos, carregados de beleza e significação (figura 12). Nessa figura, à direita, observa-se a miniatura de uma pessoa mirando-se no espelho, secundada pela miniatura de um homem, e de uma bolsa. Isso mostra que as

miniaturas foram colocadas no cenário obedecendo a uma cena pré-concebida e não simplesmente colocadas no espaço.

Figura 12 - Cenário com as representações de si, do outro e do espaço vivencial montado na caixa em miniatura. O espaço físico da caixa é ultrapassado com tranquilidade e evidencia que a imaginação não se detém ao espaço definido pela caixa.

Fonte: Musse (2009).

Após a montagem dos cenários, foi solicitado que cada um dos participantes expressasse em uma palavra o sentimento de estar vivenciando o Jogo de Areia, e outra palavra com o sentimento de trabalhar em um espaço pequeno.

Esta vivência no Jogo de areia foi avaliada positivamente por todos os participantes e, ao analisar as palavras associadas a ele, pudemos perceber a criatividade, a sensibilidade, a ludicidade, e também a reflexividade autobiográfica e a reflexividade vivencial, que representam os fios da teia da corporeidade:

[...] tive bastante facilidade nessa organização, visto que de um modo geral os espaços menores e com menos objetos me dão uma sensação maior de organização e conforto. Tive a mesma sensação com a “caixinha” que, comparada a outra - bem maior – me deixou, apesar da limitação espacial, mais ágil e decidida no momento da elaboração. Foi bastante interessante a sensação de conforto com tantas limitações naquele momento. (AMETISTA, 2009).

O uso de um espaço pequeno e limitado para a elaboração dos cenários não foi problema para a maioria dos participantes. Os cenários foram construídos sem grandes dificuldades, mostrando que a imaginação e a criatividade são de grande importância nos momentos em que aparecem as demandas para se vivenciar o novo nas caixas em miniatura. Sobre isto Bachelard (2008b, p. 159) revela que “não basta uma dialética platônica do grande e do pequeno para conhecer as virtudes dinâmicas da miniatura. É preciso ultrapassar a lógica para viver o que há de grande no pequeno”.

A flexibilidade para se adequar e não ficar imobilizado diante do novo é uma característica muito importante que devemos ter para que a autoformação humanescente possa fluir.

4.6 SEXTA VIVÊNCIA – SIMBOLISMO NO JOGO DE AREIA: O VER, O FAZER

E O SENTIR.

Uma das características do Jogo de Areia é a liberdade de criação, usando as miniaturas livremente e criando os cenários que emergem do interior imagético de cada um. Para Ammann (2004, p. 47) “não só as crianças, mas também os adultos precisam de espaços vazios de toda espécie para poder deixar fluir sua fantasia e criar suas imagens”. Assim, estar diante da caixa de areia é abrir as portas da imaginação e deixar fluir a sensibilidade e a criatividade em um ambiente de ludicidade e reflexividade. Porém, o número de miniaturas é limitado e como afirma Weinrib (1993, p. 37) sobre a questão do número finito de miniaturas “a fantasia do paciente é mantida em limites seguros”. Mas, ainda assim, é dada ao participante plena liberdade para construir a cena que desejar o que possibilita dar forma às suas fantasias e a expressar aspectos de sua subjetividade (KALFF, 2003).

Não se observa na literatura sobre o Jogo de areia, referências sobre a limitação de miniaturas para a criação de cenários. Mesmo nos trabalhos realizados em hospitais, com as caixas portáteis (SANT‟ANNA; CHAGAS, 2003; SILVA et. al., 2004; BAZHUNI; SANT‟ANNA, 2006) o número de miniaturas, apesar de ser limitado, soam representativos do espaço vivencial e imaginário do paciente.

Nos laboratórios vivenciais dos pesquisadores da BACOR, onde se investigam a abordagem pedagógica do Jogo de Areia, as miniaturas são disponibilizadas em

grande quantidade de forma a possibilitar que todos possam deixar fluir suas criações imagéticas e que possam materializá-las nas caixas de areia (MUSSE, 2007a; MAIA, 2008; MUSSE, 2008b; SAMPAIO, 2009).

Nesse encontro, nossa proposta foi investigar como seriam as criações com um número limitado de miniaturas. As miniaturas escolhidas por cada um no encontro anterior, da caixa reduzida, ficaram reservadas e deveriam ser usadas novamente neste. A questão problematizadora para a construção dos cenários foi escolhida naquele momento, a partir de uma revista semanal de notícias. A revista foi aberta aleatoriamente em uma matéria sobre uma briga judicial entre um pai biológico estadunidense e o padrasto brasileiro que lutam na justiça pela guarda de uma criança19. Queríamos compreender como a criatividade e a imaginação se articulam com a ludicidade e a reflexividade no Jogo de Areia, em situações onde se limita a quantidade de miniaturas a serem usadas. A temática a ser problematizada na caixa de areia não parece ter relação com o mundo vivencial dos sujeitos e, aliada a essas limitações, o tato foi intermediado pelo uso de luvas de látex, sendo que o tempo para construir o cenário foi estipulado em quinze minutos.

Nesta vivência as caixas de areia eram maiores, com mais espaço para a construção do cenário e o substrato era de areia seca, com várias granulometrias, podendo usar apenas a três miniaturas do encontro anterior.

Freedle (2006), ao explorar o processo de individuação em pessoas com lesões cerebrais graves, observou a importância da experimentação dos aspectos multissensoriais do Jogo de Areia. De acordo com a autora, ao interagir com a areia em um nível sensorial e fazer uma cena, na caixa de areia, os participantes ficavam conectados diretamente a seus corpos, sentimentos e energias criativas. Essas conexões, por sua vez, levam a auto-descobertas e novas possibilidades. A este processo a autora denominou retroalimentação sensorial do sandplay, cujo esquema pode ser observado na figura 13.

19Mãe brasileira foge para o Rio com o filho que teve com um americano, casa-se de novo, morre – e o

garoto? Volta para o pai nos EUA? Fica com o padrasto no Brasil? O caso está virando um enrosco diplomático entre os países. Fonte: http://veja.abril. com.br/040309 /p_060.shtml

Figura 13. Desenho esquemático da retroalimentação sensorial do Jogo de Areia no processo de individuação proposto por Freedle (2006).

Fonte: Freedle (2006). Livre tradução da autora.

A experiência multisensorial do fazer e do ver na experiência vivencial ludopoiética no Jogo de Areia cria importantes conexões para o corpo e para os sentimentos, e a profusão da energia criativa propicia a autoformação humanescente. Tendo isso como guia, foi solicitado que cada participante registrasse, por escrito, suas impressões sobre: o que viram, o que fizeram e o que sentiram nesta experiência. (Anexo H). Foi o momento de avaliar suas experiências e compreender que a criação na ludicidade encontra mais facilidade para fluir. Eles se entregaram com alegria e prazer à construção dos cenários, que expressaram suas criatividades e reflexividades. Para Moraes (2003, p. 121, grifos da autora) “é a partir da convivência que as dimensões do

ser e do fazer vão modulando-se mutuamente, junto com o emocionar e, a cada

momento, influenciam as ações, os comportamentos e as condutas dos seres aprendentes”. A análise do fazer, do ver e do sentir possibilitou aos participantes se conectarem com seu corpo e sua corporeidade por meio de seus sentimentos, fazendo emergir sua energia criativa.

O ver é muito relativo, uma vez que o contexto e a bagagem vivencial possibilitam diferentes olhares para o mundo e para as pessoas, como afirma Chauí

(2006b, p. 33) “olhar é, ao mesmo tempo, sair de si e trazer o mundo para dentro de si”. Ou seja, a abertura para o olhar deve estar presente, deve-se ter a intenção de ver para que o olhar aconteça. Neste sentido Bosi (2006, p. 65, grifos do autor) argumenta “o ato de olhar significa um dirigir a mente para um “ato de intencionalidade”, um ato de significação que, para Husserl, define a essência dos atos humanos”. No entendimento de alguns dos participantes, o que eles viram foi a manifestação da criatividade e da imaginação na perspectiva de uma autonomia na tomada de decisões, e na vivencialidade do ser, do fazer e do conhecer:

Vi uma situação na qual a criatividade e a imaginação tinham que trabalhar de forma rápida, em virtude do tempo e da quantidade de miniaturas (BERILO, 2009).

Vi muita criatividade por parte dos colegas de projeto que representaram bem a problemática mesmo com os recursos limitados das miniaturas. (PLAGIOCLÁSIO, 2009).

Sabe-se que a criatividade é inerente aos seres humanos, e o contexto vivencial é o responsável pelo seu bloqueio (BOHM; PEAT, 1989; CSIKSZENTMIHALYI, 1996; MASLOW, s.d). Muitas vezes é o desafio e a postura diante da vida que faz florescer a criatividade, como afirma Maslow (s.d, p. 171) “a criatividade é construtiva, sintetizadora, unificadora e integradora”, e o desafio de criar tendo o limite como desafio e não como punição é que faz desabrochar nos sujeitos a criatividade, como revela Zircão (2009): “a princípio eu via apenas mais uma caixa de areia. Entretanto quando peguei o tema e os brinquedos selecionados da última atividade vi um cenário pronto para ser trabalhado”.

E neste sentimento de desafio aparece o aprender a fazer. Como representar um cenário que retrate uma situação que não pertence ao cotidiano daquele que constrói? E neste momento, o fazer necessita avançar para se tornar muito mais que a elaboração de uma tarefa, como alerta Delors (1999). O aprender a fazer necessita estar em sintonia com o aprender a ser e o aprender a conhecer na convivência com o outro. E o pilar aprender a fazer se mostra no Jogo de Areia, com a criação de cenários que mostram a temática proposta, com a marca do sujeito que constrói a história do outro, mas permeado pela sua própria história de vida e seus conhecimentos, como expressa Caolinita,( 2009) na figura 14 e no depoimento que se segue:

No meu cenário foram representados dois territórios, o brasileiro e os Estados Unidos da América, com uma linha dividindo os dois e a criança no meio. Essa linha representa a divisão e a dúvida que a criança está em escolher em ficar com a família com a qual foi criada ou com o pai biológico. O carrinho também representa a indecisão de qual caminho tomar

Figura 14 - Cenário construído na caixa de areia. Cenário com duas miniaturas: uma criança e um carrinho. Uma linha traçada na areia divide o cenário em dois territórios: o território dos EUA, à esquerda e o território brasileiro à direita.

Fonte:Musse (2009)..

As conexões entre o ver e o fazer no Jogo de Areia provocam o desabrochar dos sentimentos que nascem do sentir. Sentir de todas as formas possíveis: no conviver, no ser, no fazer e no compreender. Damásio (2004, p. 35) reforça que “as emoções e as reações a ela relacionadas parecem preceder os sentimentos na história da vida e constituir o alicerce dos sentimentos”. A vivência na areia, a interação com as miniaturas, o criar dos cenários despertam nossas emoções e o corpo responde a este emocionar pelo sentir. Sentir a areia nas mãos desperta alegrias e emoções profundas, alicerçadas em nossas memórias. Porém, quando as mãos estão cobertas por uma luva, geralmente despertam sentimentos de desconforto como revela o Plagioclásio (2009): “Senti um pouco de desconforto ao utilizar as luvas para fazer o cenário”, e também agonia para o Quartzo (2009, grifo do autor que é cego): “Primeiramente senti uma agonia em colocar a luva e tocar os objetos e a areia e também tive vontade de tirá-la, me sinto “cego” com elas”. Ou ainda sentem limitação do tato como observa o

Diopsídio (2009): “Quanto às sensibilidades me senti um pouco limitado devido ter que trabalhar com luvas, o que me deixa sem definição tátil”.

Poucas pessoas se sentem à vontade em interagir com a areia com as mãos encobertas pela luva, pois o tato possibilita as conexões com todos os sentidos e é também o sentido de domesticação do mundo. Para Austry (2008, p. 118), o tato, ao nos dar a sensação de realidade, “permite-nos descobrir sua infinita variedade, graças às suas possibilidades múltiplas: sinto a dureza, a flexibilidade daquilo que toco, mas também sinto o frio, o calor, a suavidade, a textura daquilo que me toca.”. Nossos sentidos são desenvolvidos a partir de estimulação e da entrega ao sentir, eles não atuam separadamente, mas muitas vezes ignoramos alguns de nossos sentidos e nos apegamos mais a visão ou a audição. Corroborando com este pensamento Moraes (2008, p. 166) entende que os seres humanos são “multidimensionais, multissensoriais, e não somente pentassensorais, pois percebemos a realidade a partir da colaboração dos outros sentidos”.

Para alguns participantes, a experiência foi motivadora e instigadora de novas possibilidades e posturas diante do desafio, como afirma Água-marinha (2009) “como futura profissional da educação, abstraí dessa atividade todas as possibilidades que um professor precisa buscar para criar seus próprios cenários e fazer de sua aula momentos lúdicos, sem ter que seguir à risca tudo o que já está pré-estabelecido”. Essa é uma postura muito importante para um futuro educador. Essa abertura para o novo, para o diferente, sem receio de enfrentar o inusitado são as características diante do novo paradigma educacional, necessárias para o aprimoramento da autoformação humanescente. Essa postura pode ser observada nos seguintes depoimentos: “achei que meus brinquedos se encaixaram perfeitamente com o que foi pedido (ZIRCÃO, 2009) e “achei interessante a limitação que foi proposta: o tema surpresa, os elementos representativos reduzidos” (TOPÁZIO, 2009).

Muitas vezes as pessoas vivem na defensiva, sempre achando que as coisas não vão fluir, não vão acontecer e, se acontecerem, pode ser de forma errada. Essa postura nós encontramos no ambiente educacional e, muitas vezes, é um entrave no aprimoramento pessoal, impedindo o ambiente vibracional adequado necessário para o reencantamento da educação e da vida.

4.7SÉTIMO ENCONTRO - A LIBERDADE NO JOGO DE AREIA: O FLUIR DA