da experiência do mal e da reflexão Quem não desejou nem jamais experimentou a vergonha e o mal não é (ainda) um
AS ESCOLAS SOCRÁTICAS MENORES
I. A ESCOLA CIRENAICA
[Fundador: Aristipo de Cirene (que viveu talvez por volta de 360 a.C.), o refinado (como o chama Platão). Depois de sua filha Areta e de seu sobrinho Aristipo, o Jovem, a escola dividiu-se em três ram os com Teo doro, o Ateu, Hegesias, o conselheiro da morte, e Anlceris (floresceu cêrca de 300-280)].
1. O interêsse cognoscitivo, reconhecido só em relação com a prática da vida.
Parece, segundo alguns, que também os cirenaicos abra çaram somente a parte moral, e repeliram a Física e Lógica, porque não cooperam com a vida feliz. Mas, segundo alguns, voltam novamente a elas enquanto dividem a Ética em (cin co p a rtes): 1) dos objetos a desejar e a fugir; 2) das sen
sações; 3) das ações; 4) das causas, e finalmente; 5) das demonstrações. Pois, destas (subdivisões) a consideração das causas faz parte, dizem, da Física, e a das demonstra ções faz parte da Lógica (Sexto Empírico, Adv. m ath. VII, 11).
(Cfr. Sêneca, Ep., 89, 12) [que, quase com as m esmas palavras, explica que: “tam bém êles, por outra via, tornam a introduzir o que queriam afa star”].
Ünico interesse cognoseitivo: a avaliação. Nas M atem áticas não se dão dem onstrações do porquê do m elhor e do pior; antes, ninguém recorda nenhum a destas cousas. Pelo que alguns sofistas, como Aristipo, as des prezavam; pois nas outras artes, ainda nas m anuais (como nas dos edi fícios ou nas dos calçados) de tudo se diz p o r que seja m elhor ou pior; m as nas Matemáticas não se fala um a palavra de bem ou de m al (Aristó teles, Metaf., III, 2, 996).
2. Teoria do conhecimento: sensitivismo e fenomenismo.
Dizem, pois, os cirenaicos que o único critério de ver dade são as sensações, e que só estas se entendem e são ve razes; não é possível entender nenhum dos objetos que pro duzam as sensações nem se acham nunca isentos de engano. Que na verdade, vemos o branco ou sentimos o doce (dizem) pode-se afirmar sem mentira e irrefutàvelmente; mas que o objeto que produz a sensação seja branco ou doce não é possível mostrar. Visto que é verossímil também que se tenha a sensação de branco do não-branco e de doce do não-doce. Assim, de fato, quem tem a vista ofuscada ou sofre de icterícia, vê tudo de côr amarela, e quem tem os olhos inflamados vê tudo vermelho e quem comprime os olhos enxerga duplamente os objetos e o louco vê duas Te bas 1 e im agina dois sóis e em todos êsses casos é verdade que todos êles vejam as referidas cousas como amarelas, vermelhas ou duplas, mas, em compensação, parece falso afirmar que o objeto que produz essas sensações seja ama relo, vermelho ou duplo; da mesma maneira é muito veros símil que não possamos apreender senão nossas próprias sensações. . . Ora, se por fenômenos (o que aparece) enten demos nossas impressões, todos os fenômenos devem consi
1. Cfr. Eurípedes, Bacantes, 918.
derar-se verdadeiros e percebidos: mas, se chamamos fenô menos às causas produtoras das impressões, todos os fenô menos são enganosos e impossíveis de entendimento. De fato, a impressão que se produz em nós não nos revela nada mais do que ela mesma. Pelo que, em verdade, somente nos aparece a sensação, e o que se acha fora e produz a sen sação existe talvez, mas não nos aparece. E por isso, n in guém se engana sôbre as sensações próprias; sôbre o que jaz por baixo e se encontra fora todos nós nos enganamos: e aquelas se apreendem e êste é inalcançável, permanecendo a alma totalm ente impotente para conhecê-lo, pelos lugares, as distâncias, os movimentos, as mutações e muitas outras causas (Sexto Empírico, Adv. m ath., VII, 191-195).
a) Tudo é movimento, relatividade e fenômeno: os objetos reduzidos a grupos de sensações. H á alguns m ais refinados, cujos m istérios te reve larei. O p rin cíp io ... é o seguinte: que tudo é movimento e nada fora dêle; e h á duas espécies de movimento, infinita cada um a em m ultidão, tendo um a a capacidade de agir, a outra, de sofrer. Do seu recíproco acom panham ento e fricção geram-se filhos infinitos em núm ero, porém gêmeos: o sensível e a sensação, sem pre coincidente e gerada com o sensível. As sensações, então, têm para nós os seguintes nom es: visões, audições, odo res, im pressão de frio e de calor, prazeres e dores, desejos e tem ores, e outras, infinitas, as que não têm nome. O gênero sensível, por seu lado, nasce juntam ente com cada um a destas: com as visões de cada espécie, as côres de cada espécie, e igualmente com as audições, os sons da mesma espécie, e assim, com as outras sensações, os outros sensíveis que se geram como congêneres. .. E, do mesmo modo, deve-se supor que cada um , por si mesmo, nada s e ja ... m as que todos sejam gerados no recíproco acom panham ento e em tôdas as m aneiras, por efeito do movimento; pois não se pode pensar, em absoluto, que o agente e o paciente, cada um da própria m aneira, seja algo (separadam ente). Uma vez que o agente não é nada antes de encontrar-se com o paciente, nem o paciente antes de en trar em contacto com o agente, e o que é agente encontrando-se com um, é agente, entrando em contacto com outro, surge como paciente. Ve modo que, por tudo is s o ... nada é por si mesmo um a cousa, m as sem pre é gerado por alguma cousa, e o ser deve-se elim inar de tôdas as p a rte s. . . E assim deve dizer-se de cada cousa em particular e de m uitas reunidas em conjunto: e a um a coleção dada dão o nome de homem, a outra, de pedra ou de algum animal ou de qualquer espécie de sêres (Platão, Teetetos, X II, 156-7).
b ) Nominalismo. Por isso dizem que não se dá critério de conheci mento aos homens, m as sòmente nomes comuns aos juízos. Porque todos em comum chamam branco ou doce qualquer cousa, m as não têm em co mum algo de branco ou de doce, pois cada um apresenta sòmente a sua própria sensação (Sexto Emp., Adv. math., VII, 195-6).
3. Conseqüência: a sensação, além de critério de verdade, é também critério da prática.
Semelhantemente às cousas expressas a respeito dos critérios (de verdade), aparecem também as mesm as em re lação aos fins (do agir), pois as sensações se estendem tam bém aos fin s . . . As sensações são, portanto, critérios e fins de tôdas as cousas: vivemos seguindo-as, procurando a evi dência e a satisfação; a evidência, nas outras sensações; a satisfação, no prazer (Sexto Empírico, A d v . m a t h . , VII, 199).
4. Prazer, dor, indiferença: ou seja bem, mal, neutralidade. Três, dizia (Aristipo), são os estados relativos ao nosso temperamento: um, pelo qual sentimos dor, sem elhante à tempestade no mar; outro pelo qual sentimos prazer, pare cido com a leve onda, porque o prazer é um leve movimento, comparável a uma brisa favorável; o terceiro é o estado in termediário pelo qual não sentimos dor nem prazer, aná logo à calma do mar (Arístocles, em Eusébio, P r a e p . e v .,
XIV, 18, 32). A ausência da dor não lhes parece prazer, como (depois) foi dito por Epicuro, nem a falta de prazer dor. Porque ambos estão em movimento, e a ausência da dor ou do prazer não é movimento, mas algo semelhante ao es tado do adormecido (Diógenes Laércio, II, 89).
Crítica ãe Platão', não movimento leve ou rude, mas conforme ou con trário à natureza. Digo, pois, que, quando nos viventes, a harm onia se desfc.z, se produz conjuntam ente naquele mom ento a dissolução da sua natureza e a geração da d o r ... Quando, ao contrário, a harm onia volta a im perar e retorna à própria natureza, deve-se dizer que se gera o prazer (Filebo, X VII, 31, 32).
Dizem que as cousas dolorosas, cujo fim é a dor, são males, as prazenteiras, bens, cujo fim é o rião enganoso prazer; as intermédias, nem bens nem males, cujo fim não é nem bom nem mau, isto é, um a sensação intermédia entre o prazer e a dor (Sexto Emp., Adv. m ath., VII, 199).
5. O prazer atual é bem e fim.
Aristipo, aceitando a sensação prazenteira, dizia que es ta é o fim e que nela consiste a felicidade, e que somente
ela é atual (A th en ., XII, 544). O fato de procurarmos desde meninos, instintivamente, o prazer, e conseguindo-o não pro curamos nada mais, e de nada fugirmos tanto quanto da dor, contrária àquele, confirma que o prazer é fim (Dióge- nes’ Laércio, II, 88). E é atrativo para todos os animais; a dor, ao contrário, é repulsiva (id. 87).
Cír. a crítica de P latão: O prim eiro (lugar ao prazer) não : nem mes mo se todos os cavalos e bois e tôdas as dem ais bêstas o afirm assem indo ao encalço do gozar (Filebo, X LII, 67).
6. Diferença entre prazer e felicidade.
Parece-lhes que o prazer difere da felicidade. Porque o fim é o prazer particular, a felicidade é o sistem a dos pra- zeres particulares, aos quais se somam também os passados e os futuros. E o prazer particular é por si mesmo desejá vel; mas a felicidade não o é por si mesma serião pelos pra- zeres particulares (Diógenes Laércio, II, 87-88).
7. O prazer efetivo está no movimento em ação e não em sua imagem mental.
Mas afirmam que o prazer não se produz nem na recor dação nem na espera dos b en s. . . porque o movimento da alma se dissolve no tempo (Diógenes Laércio, II, 89). Não dava valor nem à recordação dos gozos experimentados em si mesmo no passado, nem na esperança dos futuros, mas julgava que o bem se acha somente no presente, e não es timava nada, em absoluto, o haver gozado ou estar por go zar, um porque já não existe mais, o outro porque não existe ainda e não aparece (Athen., XII, 544).
Conseqüência·, não se atormentar com o lamento ãa recordação (passa da) nem com o desejo (futuro)', carpe diem. De fato, gozava (Aristipo) o prazer das cousas presentes, m as não se cansava na caça do gôzo das au sentes (Diógenes Laércio, II, 6 6). O sábio não se atorm enta pela inveja, nem pelo desejo nem pela sup erstição : cousas que provêm tôdas de vã opinião. B asta que cada um seja prazenteiram ente afetado pelos prazeres que lhe ocorrem sucessivamente (id., 91). _
Aristipo parecia falar com grande vigor, recomendando que não se ator m entasse nem depois, com as cousas passadas, nem antecipadamente, com
as futuras, pois tal atitude é prova de serenidade e m anifestação de inteli gência favorável, e prescreva que tivesse a inteligência no hoje, ou melhor, no mom ento de hoje em que cada um age e pensa alguma cousa, porque, dizia, “só o presente é nosso e não o mom ento anterior nem o esperado, pois um já está destruído e o outro não sei se existirá algum dia” (Eliano, Var. hist., XIV, 6).
8. Do hedonismo ao utilitarismo: reconhecimento da pre vidência calculadora e do valor dos meios:
a) A prudência. Dizem que a prudência é um bem
desejável não por si mesmo, mas pelos efeitos que dela de rivam (Diógenes Laércio, II, 91).
b) Causas desagradáveis de efeitos prazenteiros: êrro
de se lhes opor. Quanto mais duro o sofrer mais grato o
g o z a r .. . Por isso acontece que, por mais que o prazer seja desejável em si mesmo, amiúde, todavia, as suas causas produtoras, sendo molestas, são combatidas; pelo que apa rece muito difícil a colheita dos prazeres que formam a fe licidade (id ., 90).
c) A utilidade dos meios para o fim e necessidade do
seu uso inteligente. Também as riquezas, embora não dese
jáveis em si mesmas, são produtoras de prazer (id., 92). Mas os homens deixam como herança aos filhos as ri quezas, porém não lhes deixam ao mesmo tempo a sua in teligência para dela se servirem (Demétrio, De eloc., 296).
d) A educação dos jovens com vistas ao futuro. Aris-
tipo, interrogado sôbre as cousas que os jovens devem apren der de bom, respondeu: as de que deverão valer-se quando se transformarem em homens (Diógenes Laércio, II, 80).
O exercício do corpo favorece a conquista da virtude
(id., 91).
Questões conexas com a passagem do hedonismo ao utilitarismo·. 1) Distinções qw litativas e quantitativas entre os prazeres. Os praze res corpóreos são m uito superiores aos espirituais, e piores os males cor póreos; por isso, punem-se com êsses tam bém os culpados [Diógenes Laér cio, II, 90 — que desm ente o outro aforism o: “Não difere o prazer do pra zer, nem se dá um prazer m aior do que outro”, ibid., 87].
2) Reconhecimento dos prazeres espirituais e do seu valor. Dizem que os prazeres não provêm da pura sensação visual ou auditiva. De fato,
ouvimos com prazer os lam entos dos atores, m as os verdadeiros, não (Dió genes Laércio, II, 90). E sta é um a prova de grande im portância p ara os cirenaicos que não está na vista ou no ouvido, m as em nossa mente, onde experimentamos o gôzo das audições ou visões (Plutarco, Quaest. conv., V, 1, 2, 7). Nem todos os prazeres e dores espirituais se derivam de prazeres e dores corporais. De fato, pela prosperidade da p átria sente-se também um a alegria igual à proporcionada pela própria prosperidade (Dió genes Laércio, II, 89).
3) A avaliação dos atos diferenciada do reconhecimento d o 'p ra zer em si, mas considerada de maior pêso para o sábio. O prazer é (em si mesmo) um bem em bora provenha das cousas m ais to rp e s. . . pois, conquanto uma ação seja inconveniente, o prazer, tom ado em si mesmo, é um bem, e de sejável (Diógenes Laércio, 8 8).
Nada é justo por natureza, nem honesto ou torpe, m as por convenção e por costume. O homem sábio não fará, por isso, nada contrário às leis penais e às opiniões estabelecidas, pois dem onstrará sabedoria (id., 93).
9. Regra da vida: dominar ativamente e não ser dominado pelos impulsos.
Possuo mas não sou possuído; pois dominar os prazeres e não se deixar dominar por êles é ótima cousa; e não abs ter-se dêles (Diógenes Laércio, II, 75). Domina o prazer rião quem se abstém, mas quem, sem deixar-se arrastar por êle, sabe usar do mesmo (Stobeo, Flor., 17-18).
I. Condições: a) domínio das circunstâncias exteriores. Volto agora aos princípios de Aristipo, e esforço-me p o r subm eter as cousas a m im e não submeter-me às cousas (Horácio, Ep., I, 1, 18);
b) independência pessoal. Creio que há um caminho interm ediário pelo qual procuro cam inhar, isto é, não pela via do m ando nem pela da servidão, mas pela da liberdade que, m ais do que nenhum a outra, conduz à felici dade (Xenofonte, Memor., II, 1);
c) a fôrça do caráter. Aristipo, interrogado sôbre qual era a cousa mais adm irável na vida, respondeu: um homem justo e comedido, que, encontrando-se no meio de m uitos malvados, não se deixa desviar por êles (Stobeo, Flor., 37, 25).
II. críticas de Platão: a) um a crítica injusta. Como não seria absurdo (adm itir) que não existe nenhum b e m ... senão na alma, e nesta só o prazer; e em compensação, fortaleza, tem perança, inteligência ou al gum outro dos bens que concernem à alma, não são tais verdadeiram ente? E mais ainda, que a quem não goza m as sinta pena, deve chamar-se mal vado enquanto sofre, em bora fôsse o melhor hom em do mundo, e a quem goza, em troca, quanto m ais goza, chamar-se destacado em virtude, no momento em que goza? (Filebo, X X X III, 55);
b) uma crítica fundada. Êstes (pretensos) tem perantes não se encon tram talvez nestas condições: são tem perantes p o r intem perança?... Visto que por mêdo de privar-se de outros prazeres e por desejo de possuí-los se
abstenham de alguns, dominados como estão pelos outros. E, enquanto cha m am intem perança o deixar-se dom inar pelos prazeres, acontece que dominam alguns prazeres, porque se acham dominados por outros prazeres. Eis por que há pouco se dizia que são, de certa m aneira, tem perantes p o r intem perança (Féãon, X II, 68-69).
10. As três ramificações posteriores do cirenaísmo:
a) Teodoro, o A te u : a felicidade como fim , em lugar
do prazer. Considerou êle a felicidade e a infelicidade como
fim (sumo bem e sumo m a l) : um a colocada na prudência; a outra, na insensatez; bens, a prudência e a justiça; males, os hábitos contrários; prazer e dor não são nem um nem outro. — A independência (autarquia) do sábio e a amizade. Repudiava a amizade como insubsistente, tanto para os in sensatos como para os sábios: pois, para aquêles, a amizade se desvanece por incapacidade para empregá-la; os sábios, por sua vez, bastam-se a si mesmos e não têm necessidade de amigos. — Individualismo e cosmopolitismo do sábio. Di zia também que a razão quer que o sábio não se sacrifique pela pátria; que não se deve esbanjar a sabedoria em pro veito dos insensatos. E pátria é o mundo (Diógenes Laércio, 11, 98, 99).
Aceitação do extremismo cínico? Na ocasião, o sábio com eterá furtos, adultérios e sacrilégios, pois nada disto é torpe por natureza, quando se rejeita a opinião que sôbre estas cousas se form ou por vínculo dos tolos (Diógenes Laércio, II, 99).
b) Hegesias, o persuasor da marte: a felicidade é ina
tingível. É absolutamente impossível a felicidade, porque o
corpo é afligido por uma multidão de males, e a alma sofre e se agita juntamente com o corpo, e a fortuna impede quase sempre que se alimentem as nossas esperanças: assim, por tudo isso, a felicidade não pode existir. — Indiferença por tô-
das as cousas em si mesmas: avaliação som ente segundo à disposição subjetiva. Vida e morte podem ser desejadas (igual
m ente). Nada acreditavam doce e amargo por sua natureza; mas pela raridade ou novidade ou saciedade, uns gozam e ou tros sentem-se oprimidos. Pobreza e riqueza não têm absolu tam ente nenhum valor a respeito do prazer, pois não gozam
de maneiras diversas ricos e pobres. Também é igualmente indiferente, a respeito da medida do prazer, a escravidão ou a liberdade, e a nobreza ou o nascimento obscuro, e a glória como a in fâ m ia .. . E, por maiores que pareçam os bens con quistados por alguém, não valem a fadiga que custam. —
Conclusão: não procurar os bens, m as unicam ente evitar os males: meio, a indiferença. — Por isso, o sábio não se
entregará tanto à tarefa de procurar bens, como a de afas tar males, considerando como fim o viver isento de dores e de aflições, o que se pode conseguir por quem permaneça indiferente às causas do prazer. — Indiferença à vida. ~ A vida é um bem aos olhos do insensato; para o homem sá bio é indiferente. — Egocentrismo: porém indulgência e be
nevolência para com os outros. O sábio nada realiza a não
ser para si mesmo, pois não julga ninguém digno, assim como a si p róp rio.. . Mas diziam que os pecados merecem perdão, pois ninguém peca voluntàriamente, mas constran gido por alguma paixão. E por isso não deve ser odiado, mas educado (Diógenes Laércio, II, 91-95).
c) Aníceris: concepção do fim: a to m ista} positiva, es
piritual. Os assim chamados anicerianos da escola cirenaica
afirmavam que não há um fim determinado para tôda a vida, mas um próprio para cada ação, pois o prazer nasce da ação. Êstes cirenaicos repudiam a definição epicurista do prazer, que seja remoção da dor, e chamam-no estado de morte, mas (dizem que) gozamos não sòmente do prazer dos sentidos, mas também da companhia dos homens e da sua estima (Ciem., Strom., II, 130, 7). — Revalidação conse
quente do altruísm o e do sacrifício. Admitiam também a
amizade, a graça e a reverência para com os pais e o servir à pátria. Pois, se também o sábio tiver que sofrer alguma moléstia, não será por isso menos feliz, embora lhe restem poucos prazeres. . . E o amigo não se deve aceitar sòmente por utilidade, nem, por faltar esta, voltar-lhe as costas; mas por natural benevolência, pela qual se devem sofrer dores também. E quem também considere o prazer como fim e sofra ao ser privado dêle, não obstante o suporte com cora gem pelo amigo (Diógenes Laércio, II, 91). — Importância
basta a razão por si mesma para dar confiança a alguém e torná-lo superior às opiniões vulgares: mas é necessário que se constitua o hábito, a causa da má disposição acrescentada em nós no longo transcorrer do tempo (ibid.).