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O HOMEM E A ALMA: A IMORTALIDADE E O DESTINO ÚLTIMO

I II DEUS E O MUNDO (TEOLOGIA E COSMOLOGIA)

IV. O HOMEM E A ALMA: A IMORTALIDADE E O DESTINO ÚLTIMO

1. O homem e a alma.

Então, que é o homem? — Não sei o que dizer. — Mas, sabes dizer que êle é aquêle que usa do corpo, sabes dizer isso? — Sim. — E talvez seja algum outro quem usa do corpo, e não da alma? — Não, a a lm a .. . — E talvez a alma

governe o corpo juntam ente com o corpo? Êsses dois são o homem? — Pode ser. — De modo algum: pois se o um isto é, o corpo, não governa, não há maneira de que possam go­ vernar os dois. — Exatamente. — E como o homem não é só o corpo, nern o corpo e a alma juntos, conclui-se então que o homem não é nada, ou, se é algum a cousa, não pode ser outra cousa senão a alma (Âlcib. 'primeiro, XXV, 130).

2. As faculdades e as partes da alma: racional, passional apetitiva.

Há êste problema: se com uma mesma faculdade faze­ mos cada uma destas cousas, ou tendo três, com cada uma delas, um a cousa diferente: aprender com uma, inflamar-se corn^ a outra, com uma terceira apetecer os prazeres da nu­ trição e da geração, e todos os fins que existem . . . (Rev

IV, 12, 436). v p ’’

Não nos persuadirá em absoluto (a afirmação) de que algo que permaneça o mesmo possa, ao mesmo tempo sofrer ou fazer os contrários, com respeito e em relação à mesma coisa. — Em verdade, n ã o . . . — Ora bem (digo eu), o dizer sim e o dizer não, o aspirar a ter um a cousa e recusá-la, o atraí-la a si e o repeli-la, tôdas estas e outras ações seme­ lhantes ou paixões colocarias entre os contrários ou não?

(437).

Pois a alma que tem sêde, enquanto tem sêde, não quer senao beber, a isso aspira e isso deseja. — Evidentemente.

Então, se, enquanto tem sêde, algo a detém, não haverá nela alguma cousa de diferente do que tem sêde e a arrasta como animal, ao beber? — Pois, dissemos, não poderia alguém mesmo, com o mesmo de si e a respeito do mesmo objeto fazer a um tempo cousas contrárias? — Certamente que n ã o .. . Que diremos então dêstes? Talvez em seu ânimo haja um a fôrça que incita e outra que impede de beber, diversa e mais forte do que a outra estimulante? — Bem me parece, digo. — E a fôrça que impede, não entra talvez (quando entra), por meio do raciocínio, enquanto a que em­ purra e arrasta entra pela via dos afetos e das turbações? — Parece. Não sem razão agora (disse eu) estimaremos que ha duas faculdades, e distintas entre si, chamando de fa­

culdade racional àquela pela qual a alma raciocina, e aque­ la pela qual ama e sofre fome e sêde e se inflama de outros desejos, irracional e a p e titiv a ... Eis aqui, portanto, deter­ minadas estas duas faculdades inerentes à nossa alma; é talvez, uma terceira aquela pela qual nos enfurecemos, a da ira? Ou com qual das duas teria natureza comum? — Talvez, (disse) com a segunda, a apetitiva. — Mas, disse e u . . . (439), não sentimos muitas vêzes, quando os desejos violentam alguém contra a razão, que êsse alguém se inju­ ria a si mesmo e se enfurece com o desejo que o violenta interiormente, e, como entre duas partes em luta, a facul­ dade passional se alia à razão?. . . E então? Quando al­ guém tem a convicção de sofrer uma injustiça, não se aca­ lora e se consome e toma o partido do que lhe parece justo, mesmo sofrendo fome e frio etc., e persistindo vence, e não abandona a obra generosa antes de havê-la realizado ou de sucumbir, ou de ser, chamado a si pela razão como o cão do pastor, quietado por êste? — Justamente. — Mas observa tam bém . . . que nos parece o contrário da faculdade passio­ nal de antes. Então, nós a acreditávamos, efetivamente, semelhante à apetitiva; agora, ao contrário, dizemos acon­ tecer de modo muito diverso, ou melhor, que a alma, em tumulto, associa mais suas armas com o racional. ( 4 4 0 ) ... a menos que esta se ache viciada pela m á educação. — É necessário que seja uma terceira faculdade (disse). — Cer­ tamente, disse eu, se se torna distinta da racional, como se tornou diferente da apetitiva. — Mas não é difícil que se torne; disse. Pois se pode observar também nos meninos, que, apenas nascidos, estão cheios de furor, enquanto pa­ rece que alguns nunca alcançam a razão, e a maioria já muito tarde. — Sim, por Júpiter (disse eu), tens razão. E também nos irracionais se pode ver que é assim {M d., 441).

O mito do auriga (faculdade racional) e o dos dois cavalos (passional e apetitivo). Semelha-se (a alma) ao poder combinado de um carro alado e de um a a u rig a ... A parte que governa dentro de nós guia o carro; e . . . um dos cavalos é bom e belo, êle e seus pais; e o outro, como seus pais, mau e feio: por isso é-nos m uito difícil e penosa a direção do c a r ro ... Tôda al­ m a ... enquanto perfeita e alada, voa para o alto e govema o mundo; mas, se perder as suas penas, é arrastad a daqui para ali enquanto não se fixar em alguma cousa sólida e, transform ando-a em sua casa, não tom e corpo te rre n o ... Mas o que é divino é beleza, é ciência, bondade e perfeições

semelhantes, e destas nutrem -se e florescem as asas da alma, e entriste­ cem-se, e perdem as penas nos casos contrários (Fedro, XXV-XXVI, 246).

O m elhor dos dois cavalos tem o corpo direito e flexível, cabeça alta, nariz curvo, pêlo branco, olhos negros; am a a honra, o pudor, a tem pe­ rança e a opinião verdadeira, e não é preciso açoitá-lo, pois é dócil às ordens da razão. O outro é curto e roliço, tem a cabeça dura, o pescoço curto, nariz chato, pêlo negro e azulado, olhos sangüíneos, orelhas hirsu­ tas; é petulante, lascivo e surdo e cede com dificuldade às chicotadas e à espora (Fedro, 253).

A criação e a colocação das partes da alma (na cabeça, no peito, no ventre). Deus confiou a geração dos m ortais aos seus filhos. Êstes rece­ beram dÊle um princípio im ortal de alma, imitando-o, e form aram em seu redor um corpo m ortal a êle se entregando à m aneira de carro. E acres­ centaram no interior do corpo outra espécie de alma, que é m ortal e que acolhe em si fatais paixões violentas. .. Temendo que se contaminasse o prin­ cípio d iv in o ..., albergam o princípio m ortal em outra região do corpo, fa­ bricando um a conjunção e térm ino no meio, entre a cabeça e o peito, isto é, o pescoço... Por conseguinte no p e ito ... instalaram a alm a m ortal. E, como um a parte dela tem m elhor natureza e a outra pior, dividiram em duas a cavidade do p eito . .. estendendo o diafragm a à semelhança de um tabique. Por isso, aquela p arte que é forte e cheia de ir a . .. colocaram mais perto d.a ca b eç a... A parte desejosa de alimento e de bebidas e do que tem necessidade a própria natureza do corpo, colocaram-na no meio entre o diafragm a e o u m b ig o ..., o m ais longe possível da alm a racional, a fim de que, saciando-se e fartando-se todo o dia com os prazeres da mesa, perturbasse e molestasse o menos possível (Timeu, XXXI-II, 69-70).

3. As provas da imortalidade da alma.

a) A geração recíproca infinita dos contrários. Se os

contrários, gerando-se, não acompanhassem um ao outro, por sua vez, de modo que voltassem quase em círculo, mas corressem diretamente, de modo que um passasse, sim, ao outro, porém êste não voltasse àquele, desviando-se a gera­ ção e dando voltas, sabes que no final tôdas as cousas ten­ deriam à mesma forma e acabariam finalm ente por mu­ d a r ... Se morresse tudo o que é vivo, assim permanecen­ do e não revivendo mais, não seria necessário que finalmen­ te tudo estivesse morto e nada vivo?. . . Sim, é verdade que se ressuscita, e que os vivos nascem dos mortos, e que as almas dos mortos existem {Féd., XVII, 72).

[A concepção do nascim ento dos vivos dos m ortos pertencia não sò- mente à teoria órfico-pitagórica da transm igração m as tam bém à mais am­ pla esfera dos cultos agrários, ligados ao alternar-se do m orrer e renascer das plantas, de onde a idéia se estende à vida animal e humana. Cfr. És-

quilo, Coeforas, 128 e ss., onde se diz a propósito do m orto n a tum ba: “a T erra que, só, gera todos os sêres, os nutre e recebe de nôvo o germe fecundo”; Aristófanes, Tagen., 1, 13, onde se pede aos m ortos “para fa­ zerem germinar aqui em cima as cousas boas”, e Hipócrates, Somn., VI, 658: “dos m ortos vêm os alimentos, o crescim ento e os germ es”].

b) A reminiscência e a vida anterior. Também de

acôrdo com essa razão de que o nosso aprender não é senão recordar, é preciso ter aprendido antes o que se recorda no presente. E isto não poderia ser, se a nossa alma não tivesse vivido em outro lugar, antes de haver entrado nesta forma de homem; pelo que, ainda por esta razão, se torna eviden­ te que a alma é algo imortal (Féd., XVIII, 72-3).

O defeito destas duas provas: demonstram somente a -preexistência e não a supervivencia ao corpo. E stá claro que se dem onstrou somente a m etade do que se devia dem onstrar, isto é, que a nossa alm a existia antes de nascermos; m as tam bém é preciso dem onstrar que, m orrendo, não dei­ xará de existir, do mesmo modo que existia antes de nascer, se a demons­ traç ão quiser ser com pleta (Féd., X X III, 77).

Valor resolutivo da segunda prova: exclusão do conceito pitagórico da alma harmonia ( que morre com o corpo). Nem tu mesmo te aprovarias se dissesses que a harm onia, que é composta, existe antes das cousas que a com põem ... E não vês que dizes isto, ao dizeres que a alm a existia antes de en trar em um a form a corpórea de hom em ?. .. A harm onia nasce por últim o e m orre em prim eiro lu g a r... Ora, entre os dois conceitos do ra­ ciocínio, qual escolhes: que o aprender é recordar ou que a alm a é harm o­ nia? (Féd., XL, 92).

c) Identidade de natureza entre a alma e as idéias:

simplicidade, invisibilidade, im utabilidade eterna. Vejamos,

não é certo que o que é por natureza composto não convém que se decomponha da m esma maneira como se compôs?. . . E não é verossímil que as cousas que se mantêm sempre em um a mesma condição são sim p les? ... O r a ..., a essência m esm a. . . conserva-se em uma única condição e não muda de modo algum para nenhum outro estado? — É necessário que se conserve de uma mesma maneira. — E o que dizes das cousas multiformes, como homens, cavalos, vestimen­ tas?. . . — É verdade; não se conservam jamais em um mes­ mo estado. — Portanto, se podes ver, tocar, sen tir. . . estas cousas mutáveis; por que meio podes aprender as imutáveis, senão por meio do curso do pensam ento?. . . E por isso que­ res que estabeleçamos duas espécies de sêres, uma visível e

outra invisível?. . . Com qual das duas espécies diremos que o corpo está mais relacionado?.. . — Com a espécie visível: é a todos evidente. E a alm a?. . . É invisível. . . Ora b em . . . quando a alma considera alguma cousa por meio do seu corpo. . . , anda errando e bamboleando-se como ébria. . . Mas quando pode recolher-se a si m esm a. . . eleva-se ao que é puro, eterno, imortal e imutável, e, tendo semelhança com êle, permanece em sua com panhia. . . E a que se asse­ melha a alma? — É claro, Sócrates, que se assemelha ao que é divino; e o corpo, ao que é m o r ta l... — E se assim é, não convém ao corpo, talvez, dissolver-se logo, e à alma que seja em tudo ou indissolúvel ou algo semelhante? {Féd., XXV-IX, 78-80).

d) Participação da alma na idéia de viâa e incom pati­

bilidade com o seu contrário. Parece-me que se há alguma

cousa bela além da mesma beleza,. . . nenhum a outra razão a faz ser bela, salvo a própria beleza, exceto a presença e a comunhão com aquela beleza,. . . e igualmente para as gran­ dezas, as cousas grandes são grandes etc. . . . M as. . . todos êsses entes, os q u a is. . . encerram em si os contrários, não mostram de modo algum querer receber a idéia contrária à que êles en cerram .. . — Muito bem, respondeu. — Vamos, responde-me: que se deve gerar em um corpo para que vi­ va? E aquêle: a a lm a .. . E onde entra, a alma produz sem ­ pre vida? — Sim. — Ora, bem, há alguma cousa contrária à vida, ou não? — Sim, há, disse êle. — Que é? ■— A morte. --- Então, a alma jamais receberá o contrário do que ela produz. . . E o que não recebe morte, como o chamaremos? — Imortal, respondeu. . . — Portanto, ela é imortal (Féd., XLIV-LXV, 100-105).

e) A alma princípio de m ovim ento que se move a si

mesmo. Tôda alma é imortal, porque é imortal o que se

move sempre. Mas se uma cousa move a outra, e é movida por outra, naquela há cessação de movimento e também cessação de vida. Então, unicamente o que se move por si enquanto não se abandona a si mesmo, não deixa de mo­ ver-se, mas é fonte e princípio de movimento de tôdas as cousas que se movam. E o princípio não é gerado. . . e, des­ de que não é gerado, é necessàriamente incorruptível tam ­

b ém . . . E desta maneira é princípio de movimento o que se move de per s i . . . E esta mesma é a essência e a razão da alma: mover-se de per s i . . . E se na verdade assim é, que o que se move de per si não é outra cousa senão a alma, esta seria, necessàriamente, sem nascimento e imortal (Fe­

dro, XXIV, 245-6).

f) Nenhum mal, nem próprio nem de outro ser, pode

destruí-la. Não sabes que a nossa alma é imortal e jamais

perece?. . . ·— Podes demonstrá-lo? — Nomeias o bem e o mal? — S im . . . — E tudo o que destrói e arruina é mal, e o que conserva e beneficia é b em . . . Ora, o mal e o vício congênito a cada ser destroem cada um, e, se não destroem êste, nenhum outro pode destruí-lo. . . — E então? Não há para a alma alguma cousa que a torne má? — Como não! — ...in ju stiç a , intemperança, vileza e ignorân­ cia. — V am os!. . . talvez a injustiça e outro mal inerente a ela, por ser inerente e residir dentro dela, destroem-na e viciam-na, até que, levando-a à morte, a separam do corpo? — N u n c a ... — Mas seria muito absurdo que o mal alheio pudesse destruir e o próprio n ã o .. . Nunca diremos, pois, que pela febre nem por outra enfermidade, nem por assas­ sínio, nem mesmo se alguém cortasse em pedacinhos o cor­ po, nem ainda por tudo isto a alma pudesse morrer. . . por conseguinte, uma vez que a alma não pode ser destruída por nenhum mal, é evidente que deva existir sempre; e, se exis­ tir sempre, é imortal (Rep., X, 9-10, 608-11).

Por isso, as almas são sempre as mesmas. Se assim é, observa que (as alm as) são sem pre as mesmas. Porque não podem dim inuir, não se des­ truindo alguma, nem aum entando o seu número. Pois se algo im ortal au­ m entasse em núm ero, deves saber que o aum ento deveria provir do mortal; e então, finalmente, tudo seria im ortal (Rep., X, 11, 611). Cfr. Leis, X, 12, 904: Alma e corpo. .. são indestrutíveis, pois se uma ou outro perecem, não haveria mais geração de sêres animados.

4 . O destino último das almas (escatologia òrfica):

a) A ju sta retribuição infalível. Mudam, pois, (no ato

da morte) todos os que são dotados de alma, possuindo em si mesmos a causa da mutação, e transformando-se voltam segundo a ordem e a lei do destino. Mudando menos os

costumes, passam (no ato da morte) a um lugar menos di­ ferente da superfície terrestre; mudando em mais e caindo em maiores injustiças, passam ao abismo e aos lugares cha­ mados subterrâneos, que, sob o nome de Hades e outros se­ melhantes, tanto os atem orizam . . . E quanto mais a alma participa da maldade ou da virtude por sua vontade ou pela fôrça do hábito, ela, no caso em que, alcançando a divina virtude se torne de tal modo singular, passa também a um lugar singular totalmente santo, transferida para outra mo­ rada melhor; em caso contrário passa para lugares opostos onde vai viver. . . isto é, a padecer e a fazer, em vida e em tôdas as mortes, o que convém que façam os semelhantes aos seus semelhantes. Nem tu nem nenhum outro infeliz podereis gabar-vos de haverdes fugido a esta justiça dos D e u s e s ... Nem jamais, por pequeno que sejas, penetrarás na profundidade da terra, nem, por maior que te faças, po­ derás voltar ao Céu, mas expiarás a pena correspondente por êles estabelecida (Leis, X, 12, 904-5).

[Cfr. em Górgias, LXXIX-LXXXII, 523-6, o m ito do juízo das almas desnudas diante de Minos, Eaco e Radam ante, e em Repúbl., X, no final, o mito de E r, o arm ênio].

b) A eterna vida bem-aventurada das almas puras e a

transmigração das. impuras·, a Filosofia como caminho de purificação e salvação. Entre tôdas (as almas) tem melhor

sorte a que levou corretamente a sua vida; a que não a tem pior. Pois, por espaço de dez mil anos, nenhum a alma vol­ tará para o lugar de onde veio (a morada d iv in a ). . . ex­ ceto a alma daquele que filosofou sem falácia (Fedro, XXVIII-IX, 248).

Uma alma que se ache em tais condições, então, irá pa­ ra o que se lhe assemelha, para o que é invisível, para o que é eterno, divino, intelectual e imortal, aonde, chegando, será bem-aventurada, livre dos erros, da insensatez, dos temores dos selvagens amores e das outras desgraças humanas, pas­ sando todo o seu tempo com os Deuses (Fédon, XXIX, 81). Mas as outras, imediatamente depois do término da sua primeira vida, sofrerão o juízo (Fedro, XXIX, 249). E par­ tindo do corpo manchadas e im undas,. . . preocupadas com os desejos corporais,... tais a lm a s ... dos m a lv a d o s... es­ tão condenadas a errar em tôm o dêstes lugares, expiando

a pena da sua má vida passada, e vagam até que, arrastan­ do-as o desejo corporal que possuem, se unem novamente a um corpo. E, como é natural, tomarão as formas e costumes a que se afeiçoaram em vida (Féãon, XXX-I, 81).

Os que se entregaram à glutonaria, à luxúria e à embriaguez devem tom ar a form a de asnos e de outros animais sem elhantes... Os que tive­ ram como ponto de honra tiranizar e com eter injustiças e rapinas tom arão form as de lôbos, corvos e m ilh afre s... Os que cultivaram a virtude civ il... devem adquirir as form as de animais políticos e mansos, abelhas, vespas e formigas, ou convertem-se novamente em homens (Féãon, XXXI, 81-2).

[Esta oposição de almas puras e im puras, necessária para relacionar o suprem o destino das almas com a personalidade e a conduta do indivíduo, estabelece — contra a passagem citada de Timeu, 69-70 e outros, que fazem im ortal sòmente a alm a intelectiva — o problem a sôbre se a sobrevivência não pertence tam bém à alm a passional e apetitiva, que, em sua relação com a prim eira, dão a característica pessoal à conduta do homem. Com­ preende-se que, para Platão, a purificação, necessária à salvação e bem- -aventurança eterna da alma, não é de característica ritual e religiosa, como era para os órficos, porém para todo o espírito, e de características morais. Por isso, o problem a do destino da alm a relaciona-se com o proble­ m a do bem e da virtude].