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I. Das Declarações para memória Futura

8. Hiperligações e referências bibliográficas 1 Hiperligações

2.5. As declarações para memória futura e o processo tutelar educativo

No que concerne ao processo tutelar educativo, o problema das declarações para memória futura tem assumido contornos bem diferentes: pode discutir-se, por um lado, a (des)necessidade da realização de tal diligência no âmbito daquele processo. Por outro, a questão da utilização e aproveitamento das declarações da vítima obtidas em processo penal no âmbito do processo tutelar educativo pode apenas conceber-se quando haja lugar, em casos de co-autoria, à separação dos processos em virtude das diferentes idades dos co-

56 CARMO, Rui do, “As crianças como testemunhas – aplicar e clarificar a lei [as declarações únicas da criança; o

estatuto da vítima; recusa a depor]", in Revista do CEJ, Lisboa, N.º 2, ano 2016, p. 101.

57 Com relevo, também, a propósito das declarações para memória futura, o Encontro da Rede de Magistrados do

MP (do Distrito Judicial de Lisboa) dos Tribunais de Família e Menores, de 27-11-2008, no âmbito do qual se concluiu que “deverá ser estabelecida articulação entre o magistrado do Ministério Público da área de Família e

Menores e da área Criminal, assim devendo ser compatibilizados os tempos de realização daquela diligência com outras cuja realização se imponha.” – Cfr. nota ao artigo 271.º do Código de Processo Penal, em

www.pdlisboa.pt/legislação.

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autores da prática do ilícito (maiores ou menores de 16 anos de idade e, portanto, imputáveis ou inimputáveis do ponto de vista criminal). Vejamos.

Atendendo à questão suscitada em primeiro lugar, adiantando desde já a nossa posição, cremos que o artigo 271.º do Código de Processo Penal não tem aplicação subsidiária no domínio do processo tutelar educativo, em face do regime consagrado e particularidades da Lei Tutelar Educativa.58

Se olharmos à solução legal ínsita nos artigos 66.º, n.ºs 3 e 4, e 106.º, ambos do diploma legal sob apreciação, conclui-se que os objectivos de evitar a repetição da inquirição da vítima e as necessidades de acautelar a prova inerentes às declarações para memória futura não colhem nesta sede.

O artigo 106.º, de forma bem diferente do regime processual penal, ao permitir a leitura em audiência de autos de qualquer das fases do processo tutelar que não contenham declarações do menor, seus pais, representante legal ou quem tenha a sua guarda de facto, possibilita que as declarações prestadas por qualquer testemunha em sentido amplo, mesmo perante órgão de polícia criminal, possam ser sempre lidas e tidas em conta na formação da convicção do Juiz.

Por outro lado, o entendimento de que o artigo 128.º da Lei Tutelar Educativa poderia reclamar a aplicação subsidiária do artigo 271.º do Código de Processo Penal também não é argumento válido, porquanto, em boa verdade, aquela Lei estabelece um regime particular de tomada de declarações à vítima, mormente da que tenha idade inferior a 16 anos, cujo objectivo incide, por si só, na protecção dos seus interesses, designadamente o de evitar a sua futura reinquirição, pelo que não há necessidade de recorrer à lei de aplicação subsidiária. Assim sendo, à partida, cremos não ser premente o recurso às declarações para memória futura no âmbito do processo tutelar educativo, com normas muito próprias no que à produção de prova testemunhal em audiência diz respeito.59

A segunda questão que nos propusemos abordar prende-se com a susceptibilidade de aproveitamento das declarações para memória futura da vítima recolhidas no processo-crime quando houve lugar à separação de processos no caso de co-autores, uns com idade inferior a 16 anos e outros já imputáveis em razão da idade.

Acompanhando aqui de perto a posição sustentada no aresto da Relação de Lisboa, de 7-02- 2012, proferido no processo n.º 3610/10.4TAALM.L1-5, desde logo, a inquirição da vítima em

58 Neste sentido também SILVA, Júlio Barbosa e, “«Por quem os Sinos Dobram» As Declarações para Memória

Futura, a sua (Des)necessidade no âmbito da Lei Tutelar Educativa e o Contraditório no âmbito da Jurisprudência Nacional e do TEDH”, Revista Julgar, n.º 19, Coimbra Editora, ano 2013, pp. 171 e seguintes.

59 Diferente foi o entendimento da Relação de Lisboa no aresto de 30-06-2011, no processo n.º 4752/10.1T3AMD-

A.L1-9 que considerou que o artigo 271.º do Código de Processo Penal, por força do artigo 128.º, n.º 1, da Lei Tutelar Educativa, é subsidiariamente aplicável ao inquérito tutelar educativo, devendo a vítima menor ser ouvida pelo juiz nesta fase processual. Todavia, na sua fundamentação parece esquecer, por completo, o regime especial do artigo 106.º daquele diploma legal.

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declarações para memória futura implica uma solenidade maior do que a exigida no âmbito da Lei Tutelar Educativa, ao abrigo do artigo 66.º, sendo certo que, em face do desenho do artigo 106.º, n.º 1, já aludido nada obsta, a não ser o contraditório, à leitura e valoração daquelas declarações prestadas no processo penal.

Todavia, em consonância com o citado acórdão, cremos que não está precludido o exercício do contraditório, que não se confunde com o denominado cross-examination, já que “Não estando a defesa do menor/arguido, impedida de indicar outra prova que contradite aquelas declarações, de confrontar o menor com as mesmas, ou de as discutir em contra- argumentação, com a sua produção em audiência não são afectadas as exigências de contraditório e de possibilidade de defesa”.

Posto isto, cremos, pois, que nada obsta ao aproveitamento das declarações da vítima, prestadas no processo penal, pelo processo tutelar educativo, prova que pode ser produzida, discutida e valorada nesta sede, sendo assim possível atingir as finalidades de protecção da vítima e, de outra parte, permitir que sejam prosseguidos os objectivos primordiais do processo tutelar educativo que atendem à necessidade de educação do jovem para o direito. IV. Hiperligações e referências bibliográficas

Hiperligações www.dgsi.pt

www.pdgdlisboa.pt/legislação Referências bibliográficas

ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, “Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, 4.ª edição actualizada, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2011;

BUCHO, Cruz, “Declarações para memória futura (elementos de estudo)”, 2012, disponível em:

https://www.trg.pt/ficheiros/estudos/declaracoes_para_memoria_futura.pdf;

CARMO, Rui do, “As crianças como testemunhas – aplicar e clarificar a lei [as declarações únicas da criança; o estatuto da vítima; recusa a depor]", in Revista do CEJ, Lisboa, N.º 2, ano 2016, pp. 97-107;

CARMO, Rui do, “Declarações para memória futura: Crianças vítimas de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual”, Revista do Ministério Público, n.º 134, Abril-Junho, 2013, pp. 117-147;

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CORREIA, João Conde, “O papel do Ministério Público no Crime de Abuso Sexual de Crianças”, Revista Julgar, n.º 12 (especial), 2010, pp. 163 a 182;

COSTA, Maia, “Código de Processo Penal Comentado” – anotação ao artigo 271.º, 2.ª edição revista, Almedina, 2016, pp. 916 a 921;

CUNHA, José Damião da, “O Regime Processual de Leitura de Declarações na Audiência de Julgamento (arts. 356.º e 357.º do CPP) (Algumas reflexões à luz de uma recente evolução jurisprudencial)”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 7, Julho-Setembro 1997, pp. 403 a 443;

GAMA, António “Reforma do CPP: prova testemunhal, declarações para memória futura e reconhecimento”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 19, n.º 3, Julho-Setembro, 2009; GIAV, “Declarações para Memória Futura e o Papel do Psicólogo Forense”, 2 de Maio de 2014, Edição 1, Volume 1;

NEVES, Andreia, FERNANDES, Bárbara R. O. e ALMEIDA, Íris, “Workshop: Boas práticas nas Declarações para Memória Futura”, disponível em:

https://apav.pt/25/images/PDF/Workshop_Boa_Praticas_nas_Declara%C3%A7oes_para- Memoria_Futura.pdf;

RIBEIRO, Catarina, “A Criança na Justiça – Trajectórias e Significados do Processo Judicial de Crianças Vítimas de Abuso Sexual Intrafamiliar”, Coimbra, Almedina, 2009;

SILVA, Júlio Barbosa e, “«Por quem os Sinos Dobram» As Declarações para Memória Futura, a sua (Des)necessidade no âmbito da Lei Tutelar Educativa e o Contraditório no âmbito da Jurisprudência Nacional e do TEDH”, Revista Julgar, n.º 19, Coimbra Editora, ano 2013, pp. 149- 178;

SILVA, Sandra Oliveira e, “A Protecção de Testemunhas no Processo Penal”, Coimbra Editora, 2007;

VEIGA, António Miguel, “Notas Sobre o Âmbito e a Natureza dos Depoimentos (ou Declarações) para Memória Futura de Menores Vítimas de Crimes Sexuais (ou da Razão de Ser de uma Aparente “Insensibilidade Judicial” em Sede de Audiência de Julgamento)”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 19.º, n.º 1, Janeiro-Março 2009, Coimbra Editora, pp. 101- 134.

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5. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

5. DECLARAÇÕES PARA MEMÓRIA FUTURA. ENQUADRAMENTO JURÍDICO, PRÁTICA E GESTÃO PROCESSUAL

Susana Cristina Silva Jóia I. Introdução

II. Objectivos III. Resumo

1. Declarações para memória futura

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