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Os discentes, em sua maioria, mostraram-se receptivos às atividades propostas e as desenvolveram dentro de suas possibilidades. E alguns momentos os prazos não foram respeitados, todavia, a partir do diálogo e da compreensão, por parte do regente, acerca da atividade, pois muitas etapas eram estruturadas fora da instituição escolar.

Figura 3: Print de um dos documentários produzidos sobre um projeto social daquela região.

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Percebe-se que os alunos ficaram entusiasmados quando expuseram seus vídeos: tantos as prévias, quanto a produção final. Percebeu-se certo encantamento com a descoberta de espaços adjacentes desconhecidos por eles enquanto moradores ou andantes desses bairros.

Notou-se que as atividades de escrita e reescrita da sinopse não foram tão interessantes à turma, quanto à produção e edição de vídeos, por isso foi pertinente mover uma sensibilização acerca da importância desse gênero discursivo em produções audiovisuais – ainda mais esse produto deles que colocavam em evidência aquele contexto, tantas vezes ignorado pelas políticas públicas, sociedade e até residentes dali.

O comportamento dos alunos nem sempre foi favorável, devido a maior parte das oficinas acontecerem em sala de aula, por questões de logística espaços externos em alguns momentos já agendados por outros professores, aparelho de projeção nem sempre disponível, a falta de organização dos estudante à entrega das demandas atrasava a fluidez das oficinas. Todavia, quando presentaram o seu material, observou-se uma postura positiva no comportamento da classe – tanto dos que apresentavam, quanto daqueles que assistiam – e todos estavam muito empenhados com a produção final, inclusive os que não conseguiram concluir o “projeto piloto” do documentário em tempo. Devido à quantidade de atividades e orientações as dez, doze aulas previstas foram diluídas em dezesseis.

No final da tarefa, do total de estudantes, apenas um não desenvolveu e não interagiu com o grupo. Ressalta-se que esse aluno em específico não estava assistido às aulas, pouco se envolvia com os demais e solicitou transferência quase ao fim daquele ano letivo. Outra aluna participante também pediu transferência da escola, durante a semana em que se computava a nona aula das oficinas aqui mencionadas.

Percebeu-se na prática docente, a partir da categorização bakhtiniana, esses documentários curtos são enunciados concretos em movimento – carregados da história desses alunos, das ideologias dessa comunidade. Também podemos relacionar esse gênero com o princípio do dialogismo bakhtiniano, ressaltado por Brait (2009), pois um documentário transcende seus limites e pode mudar o seu sentido global e ainda consegue refletir outras vozes que vão além dos seus produtores, porque quem assiste se sente tocado e tem sua memória discursiva resgatada. Isso acontece, porque aquilo que está concretizado no vídeo potencializa atravessamentos às experiências do outro, manifestando-se como uma reação ao dizer do outro.

A partir desse relato de experiência, entende-se que atualmente as aulas de português podem apontar também para as convenções que emergem nas vivências dos estudantes: eles deram ‘um show’ ao expor qual aplicativo Android era mais pertinente para a execução dessa produção, por exemplo.

Sobre a produção de sentido a partir do texto em movimento, o documentário, podemos vê-la no trabalho numa perspectiva dialógica, em que o aluno interage com o próprio evento discursivo. O documentário, enquanto enunciado, é concreto, pois traz marcas de subjetividade, intersubjetividade e da alteridade que caracterizam a linguagem em uso (BRAIT, 2005). A compreensão se constrói não apenas a partir do gênero e dos

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enunciados que o compõe, mas dos discursos que envolvem o sujeito diante daquilo que foi lido, visto, ouvido – a semiose, a multimodalidade presentes em vídeo.

Dessa forma, é impossível pensar em linguagem fora de uma conjuntura efetiva, nesse exemplo de atividade, concebe-se esse gênero discursivo emprenhado de outros enunciados – subsidiados a partir de circunstâncias temporais, ideológicas e sociais que transcendem sua materialidade; e por essa orientação, a interpretação do leitor/ interlocutor/ espectador considera todas essas condições.

Para tanto, a execução das atividades foi extremamente importante, mesmo com as fragilidades na proposta do Programa da OLP, pois possibilitou trabalhar a língua para além do texto escrito, em funcionamento digital e valorizou as experiências dos estudantes e sua comunidade, visto que na contemporaneidade os letramentos também requerem mudanças, (ROJO, 2012).

Considerações finais

A prática de ensino de língua a partir da produção de documentários em sala de aula a partir das orientações do Caderno 06 da Olímpiada de Língua Portuguesa nem sempre será exequível – ao pensarmos na gama de realidades que as escolas públicas estão inseridas. Foi preciso adaptá-la ao contexto que os estudantes supracitados estavam inseridos para que se pudesse trabalhar em uma perspectiva dialógica, onde se pudesse gerar reflexões acerca do meio o qual eles estavam inseridos.

Os recortes das atividades aqui apresentadas estão consoantes ao pensamento teórico de Bakhtin (2000), Marcuschi (2008), Maingueneau (2015) e Rojo (2012). Produzir documentários com essa 2ª série de Ensino Médio Integrado foi disponibilizar à turma estratégias multimodais que foram além do texto escrito em um diálogo de diferentes linguagens, entendendo a produção final enquanto um enunciado situado historicamente. E a prática veio mostrar que os estudantes lidam com a multimodalidade em seu dia a dia.

Através do contato com o documentário, percebeu-se que os discentes já produzem vídeos que são compartilhados em seu dia a dia, sendo apesentados a estes a internet como uma arena pública e política, capaz de instigar a reflexão sobre diferentes realidades.

Tratando-se da produção de documentários na escola, se faz necessário pensar que o professor não vem com uma bagagem acerca da produção audiovisual, umas das fragilidades do caderno de número 06 da OLP que trazia termos técnicos e excessos de conteúdo – pouco considerando o real trabalho realizado pelos professores de português da Educação Básica.

Um documentário é uma produção situada no tempo, capaz de representar a história de uma comunidade, sua cultura e formas de expressão. Essa atividade de produzi-lo na escola instiga a reflexão analítica sobre as representações do dia a dia materializadas em vídeo. Todavia, a perspectiva de um concurso de produção textual traz para a escola básica particularidades neoliberais, dividindo os estudantes em vencedores e vencidos, inclusive, umas das fragilidades do concurso.

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Foi um trabalho válido, visto que se percebeu muito mais receptividade dos alunos ao trazerem sua realidade para a aula, torná-la pauta de discussão crítica e ‘reeditá-la’ no celular na aula de português foi extremamente inovador – um trabalho da língua em dialogia, sem a análise de um gênero discursivo sem atividades “mecânicas” ou de caráter metalinguístico. As oficinas puderam instigar o caráter atuante desses jovens, sendo importante para professor a reflexão sobre a importância de trazer o cotidiano dos estudantes para o contexto escolar em diálogo com os conteúdos a serem ministrados.

Afirma-se que essa prática viés veio contribuir para a construção da proficiência leitora dos sujeitos participantes dela e propiciaram a reflexão por meio da semiótica, uma outra forma de fomentar a compreensão de textos que pode contribuir positivamente para o entendimento de textos escritos seja em sala de aula ou em plataformas digitais, onde várias linguagens se fundem.

É fundamental que sequências didáticas, práticas ou oficinas sejam adequadas ao contexto dos estudantes, para que eles se sintam valorizados diante do processo de ensino- aprendizagem, por isso, termina-se este artigo de relato de experiência mostrando às professoras e professores de língua materna o quão importante é essa correlação entre multimodalidade e meio em que os estudantes estão inseridos e, que este seja entendido como uma provocação – para que analise criticamente os materiais e formações continuadas consoante à prática pedagógica, pois desta forma a sala de aula poderá ser concebida como um verdadeiro campo de construção de dados.

Referências

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Capítulo

12

O ensino em língua inglesa no ensino médio

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