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Estética da recepção: metodologia proposta para as aulas de literatura

A Estética da Recepção surgiu por meio das teorias propostas por Hans Robert Jauss, em uma Conferência proferida na Universidade de Constança, na Alemanha, em 1967, na qual, Jauss faz uma crítica em relação ao modo como a teoria literária vinha sendo abordada com foco na história da literatura. Jauss, ao considerar os métodos de ensino da época, propõe reflexões importantes acerca deles. Para Jauss (1994), a história da literatura, quando segue um cânone ou descreve a vida e as obras de alguns autores na sequência cronológica, organizadas em períodos literários, deixa de observar a historicidade das obras, desconsiderando o lado estético da criação literária. Ainda o autor, em sua palestra, apresenta sua teoria sobre a recepção a partir de sete teses.

A primeira tese diz respeito à historicidade da literatura, ou seja, ao diálogo estabelecido entre a obra e o leitor. A segunda tese está relacionada aos conhecimentos prévios do público, ou seja, o texto apresentado dialoga com as experiências que o leitor possui, ela desperta no leitor e o conduz uma determinada postura e compreensão. Já na terceira tese, o texto pode satisfazer o horizonte de expectativas do leitor ou provocar o estranhamento e o rompimento desse horizonte, levando o leitor a uma nova percepção da realidade. Na quarta tese, Jauss sugere contextualizar o texto com a época de sua publicação, relacionando qual era o horizonte de expectativas do leitor. Assim, por meio da releitura, é recuperada a historicidade do texto literário. Jauss (1994) apresenta, nas três últimas teses, uma metodologia, na qual está o estudo da obra literária, nos aspectos diacrônico e sincrônico, relacionados com a literatura e a vida. De acordo com Jauss, o aspecto diacrônico está relacionado à recepção da obra literária ao longo do tempo, na qual devemos analisar o momento da leitura, juntamente com leituras de obras anteriores. Já no aspecto sincrônico, temos uma articulação entre obras produzidas na mesma época e que provocaram rupturas e novos rumos na literatura. Assim, se torna importante para a compreensão, pois ao relacionar uma obra literária com outra do mesmo período, percebe-se a evolução da literatura.

A relação entre literatura e vida prática, para Jauss, implica uma função social, pois o leitor é capaz, por meio da literatura, de relacionar a sua prática cotidiana; assim,

64 Luci Collin nasceu em Curitiba em 1964, é graduada em Piano, Letras e Percussão. Doutora em Letras

pela USP. Recebeu premiações em concursos de literatura no Brasil e nos EUA. Atualmente reside em Curitiba e leciona Literaturas de Língua Inglesa, na UFPR. Tem publicações de livros de poesia, tais como:

Estarrecer (1984), Espelhar (1991), Esvazio (1991), Ondas e Azuis (1992), Poesia Reunida (1996) e Todo Implícito (1998); de contos: Lição Invisível (1997) e Precioso Impreciso (2001), Inescritos (2004), Vozes num divertimento (2008); e o romance Com que se pode jogar (2011).

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“a função social somente se manifesta na plenitude de suas possibilidades quando a experiência literária do leitor adentra o horizonte de expectativas de sua vida prática”. (JAUSS, 1994, p. 50).

Ademais, a Estética da Recepção “é a história literária definida como um processo que envolve três actantes: o autor, a obra e o público” (NITRINI, 2010, p. 170). O método não foca só no texto, nem na leitura, mas entre os dois, uma vez que há necessidade do ponto de convergência entre o texto e o leitor. O leitor é o responsável ao atribuir sentidos no momento de leitura. Assim, os textos são lidos sempre de acordo com uma dada experiência de vida, pois o leitor é constituído ideologicamente, apresenta outros tipos de leitura. Ele se torna para esse estudo uma instância fundamental na construção do processo de significação desencadeado pela leitura de textos.

Assim, baseando se na teoria da Estética da Recepção de Jauss, as professoras Maria da Glória Bordini e Vera Teixeira de Aguiar (1993), discutiram o ensino de Literatura e elaboraram o Método Recepcional, no qual propõem uma metodologia alternativa para o Ensino de Literatura. Para as educadoras, esse método tem como objetivo principal atuar em textos literários de acordo com o entendimento do leitor, como um elemento atuante no processo. O método resulta principalmente na atitude participativa do aluno/leitor em contato com diferentes textos.

O processo de recepção se inicia antes do contato do leitor com o texto. O leitor possui um horizonte que o limita, mas que pode transformar-se continuamente, abrindo- se. Esse horizonte é o do mundo de sua vida, com tudo que o povoa: vivências pessoais, sócio-históricas e normas filosóficas, religiosas, estéticas, jurídicas, ideológicas, que orientam ou explicam tais vivências. Munidos dessas referências, o sujeito busca inserir o texto que se lhe apresenta no esquadro de seu horizonte de valores. Por sua vez, o texto pode confirmar ou perturbar esse horizonte, em termos das expectativas do leitor, que o recebe e julga por tudo o que já conhece e aceita. O texto, quanto mais se distancia do que o leitor espera por hábito, mais altera os limites desse horizonte de expectativas, ampliando-os. (BORDINI; AGUIAR, 1993, p. 87).

Portanto, constatamos que o método recepcional proporciona inovações para um ensino de literatura, uma vez que, por meio dele, o professor pode verificar, nitidamente, questões sociais, políticas, ideológicas e outras, que são discutidas por meio de textos na sala de aula. Isso se dá, exatamente, pela preocupação direta com o leitor, seus conhecimentos prévios e a constatação de seus horizontes de expectativas.

As autoras, na elaboração do método, trabalham com cinco etapas, sendo elas: (a) Determinação do Horizonte de Expectativas; (b) Atendimento do Horizonte de Expectativas; (c) Ruptura do Horizonte de Expectativas; (d) Questionamento do horizonte de expectativas; (e) Ampliação do horizonte de expectativas. De acordo com essas cinco etapas, há uma forma de como o professor deverá agir em cada uma das etapas conforme os encaminhamentos propostos pelas autoras. Na primeira etapa do Método Recepcional, o trabalho do professor deverá ser pautado nas expectativas de seus alunos/leitores para que possa, posteriormente, elaborar estratégias de ruptura e transformação desses horizontes. Entretanto, o professor deve trabalhar com os alunos a temática que será abordada nas aulas. Na segunda etapa, o docente deve oferecer aos alunos textos, vídeos, filmes, charges, entre outros, que correspondam ao esperado por eles, a fim de

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desenvolver estratégias para acrescentar elementos ao conhecimento dos alunos. Atendido o horizonte de expectativas dos alunos, o docente inicia a terceira etapa do método, na qual devem introduzir textos e atividades que promovam rupturas em relação às certezas e aos costumes dos alunos. Nessa etapa, o aluno deve perceber aos poucos que há algo de novo. Portanto, a ruptura deve-se acontecer de forma cautelosa para que os alunos não rejeitem a nova experiência. Aqui, o professor trabalha com a temática e a estratégia de trabalho com o gênero. Na quarta etapa do método, a classe analisa os textos e vídeos estudados. Eles devem estar preparados para refletirem sobre o trabalho desenvolvido, havendo uma comparação com as etapas anteriores com intuito de julgar qual trabalho exigiu um nível maior de reflexão.

Portanto, na etapa final da atividade, o aprimoramento da leitura faz com que o aluno torne-se um agente de aprendizagem; assim, o método recepcional propicia um trabalho dinâmico, pois acontece passo a passo e facilita o trabalho do professor bem como a compreensão e a participação dos alunos. De acordo com Ivana Martins,

A literatura não pode ser compreendida como objeto isolado, sem as interferências do leitor, sem o conhecimento das condições de produção/recepção e que o texto foi produzido, sem as contribuições das diversas disciplinas que perpassam o ato da leitura literária, inter/multi/transdisciplinar pela própria natureza plural do texto literário. (MARTINS, 2006, p. 86)

Entretanto, entende-se que o leitor é um elemento deveras importante para a compreensão do texto literário, pois ele é ambíguo, apresenta várias leituras, uma vez que diferentes leitores podem realizar leituras diferentes de um mesmo texto. Portanto, na escola, as outras disciplinas como Geografia, História, Sociologia, Filosofia, Artes, etc., podem contribuir com o entendimento do texto literário, devido ao fato de os textos conterem vários temas, conteúdos que podem ser relacionados, propiciando, assim, um trabalho interdisciplinar e intertextual.

Com efeito, entende-se que o aluno deve olhar a literatura como “fenômeno cultural, histórico e social, instrumento político capaz de revelar as contradições e conflitos da realidade” (MARTINS, 2006, p.90), ou seja, o professor, ao trabalhar com textos literários, deve questionar a função ideológica do textos, contribuir para que os alunos compreendam a si próprios, pois os textos apresentam questões de uma determinada época social. Quando a literatura é apresentada de uma forma adequada e prazerosa no contexto escolar, de modo que ela seja compreendida como produção artística, inserida em uma cultura, favorecemos com que os alunos desenvolvam uma compreensão mais crítica, pois o mesmo perceberá que a obra integra um contexto maior, com valores ideológicos, costumes e questões culturais.

Da teoria à prática: o conto feminino e suas possibilidades intertextuais

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