• Nenhum resultado encontrado

Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência

1. DIREITOS HUMANOS: BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA

2.3 Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência

Em 09 de dezembro de 1975 houve a aprovação da Resolução nº 2.542, quando se afirmou historicamente a promessa realizada pelos Estados- membros na Carta das Nações Unidas, de cooperação entre os povos e as nações, sobre a

promoção de padrões mais altos de vida, bem como do pleno emprego e de condições de desenvolvimento e progresso econômico e social aos deficientes.

A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência constitui-se como o mais abrangente e relevante documento internacional dedicado à pessoa com deficiência e que foi adotado pela Assembleia Geral da ONU em 06 de dezembro de 2006 (Resolução nº 61/06), passando a vigorar em maio de 2008.

No Congresso Nacional, a Convenção foi aprovada em 09 de julho de 2008, junto ao Decreto Legislativo nº 186, que foi promulgada em 25 de agosto de 2009, havendo uma mudança de paradigma no que concerne ao universo que cerca as pessoas com deficiência, sendo incorporada junto ao Direito brasileiro com o status equivalente à de Emenda Constitucional, conforme preceitos do art. 5º, § 3º da Constituição Federal de 1988.

A referida Convenção é a primeira de Organismo Internacional do século XXI, no âmbito de um contexto global de proteção aos direitos humanos e que possui por intenção preservar a dignidade da pessoa humana e da paz mundial.

O preâmbulo da Convenção menciona que seu objetivo é o de proteger e promover os direitos e a dignidade das pessoas com deficiência, ao mesmo tempo em que presta significativa contribuição a fim de se corrigir as profundas desvantagens sociais das pessoas com deficiência, promovendo a sua participação na vida econômica, social e cultural, em igualdade de oportunidades, tanto nos países em desenvolvimento como nos desenvolvidos.

A Convenção intenta mudar um paradigma da visão de deficiência no mundo, passando-se do modelo médico e assistencialista – quando a deficiência é tratada como um problema de saúde – para um modelo social de direitos humanos, em que a deficiência é resultante da interação de limitação funcional com o meio.

O art. 1º da Convenção discorre sobre a intenção de se promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo dos direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência, promovendo-se o respeito por sua dignidade.

Nesse sentido, o Brasil deve adotar medidas legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, que sejam necessárias para a realização dos reconhecidos direitos, esforçando-se por eliminar as práticas que venham, por ventura, discriminar as pessoas com deficiência.

Em síntese, deve o Estado abster-se de participar de qualquer ato ou prática incompatível com a Convenção e assegurar que as autoridades públicas e instituições atuem em conformidade com seu texto, além de tomar todas as medidas apropriadas para eliminar a discriminação baseada em deficiência, por parte de qualquer pessoa, organização ou empresa privada.44

Sob tal conceituação, a deficiência não seria entendida como algo inerente à pessoa, mas como resultado da interação desta com o meio, sendo que a Convenção seria inspirada no paradigma contemporâneo da inclusão, quando há um marco normativo para a promoção da igualdade substantiva, tal como mencionado no art. 3º, a, da Convenção, que estabelece: “O respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a liberdade de fazer as próprias escolhas, e a independência das pessoas”.

São princípios basilares da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: a dignidade inerente à pessoa humana; autonomia individual; não discriminação; participação plena e efetiva na sociedade; respeito pela diferença e aceitação da deficiência como parte da diversidade e condição humana; igualdade de oportunidades; acessibilidade e igualdade entre homens e mulheres, bem como o respeito pelas capacidades em desenvolvimento de crianças com deficiência.

No preâmbulo da referida Convenção, observa-se que esta inspirou o desenvolvimento de um direito internacional dos direitos humanos, e, para tanto, de um sistema especial de proteção desses direitos, com a reafirmação dos direitos humanos das minorias. Há ainda, o reconhecimento da necessidade de se particularizar medidas de proteção das pessoas com deficiência, uma vez que essas pessoas continuariam a enfrentar barreiras contra sua participação junto aos outros membros da sociedade.

Logo, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência seria um instrumento normativo que, de forma geral e integral, promoveria e protegeria os direitos e a dignidade das pessoas com deficiência.

Ao se conceituar a deficiência, art. 1º, segundo a Convenção, menciona-se que:

44 SILVIO, Solange Almeida Holanda. Os Direitos das Pessoas com Deficiência. A Convenção da

ONU e os Vetores da Educação para Interpretação da Constituição da República Federativa do Brasil. In: COSTA-CORRÊA, André L. et al. (Orgs.). Direitos e garantias fundamentais: novas perspectivas. Birigui-SP: Editora Boreal, 2016, p. 239.

Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Nesse sentido, enquadrar-se-á como pessoa com deficiência aquela incapaz de assegurar a si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual e social, quando da acepção de uma deficiência, que seja congênita ou não, de acordo com suas capacidades físicas ou mentais.

Ademais, salienta-se que o referido conceito implica em tratar a sociedade como mantenedora da deficiência do indivíduo, quando observa-se a falta de acolhimento e integração do “diferente” na comunidade, vez que os impedimentos não são somente do ponto de vista clínico, mas também os das barreiras sociais existentes.

Ainda sobre o Brasil no processo de construção da Convenção, teve este sua participação quando convocou os especialistas da antiga Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Conde) – entendida atualmente como Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNPD), vinculada à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) e o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conabe).

Logo após a edição do Decreto Legislativo que deu status constitucional ao texto da Convenção, o movimento das pessoas com deficiência começou a se mobilizar para regulamentar esta nova situação jurídica. Passados quase três anos, questões simples, como forma de chamar a pessoa com deficiência, ainda são desconhecidas para muita gente. O próprio Congresso Nacional transcorre nesse tema. Em 2010, a Câmara dos Deputados publicou a 6ª edição do livro Legislação Brasileira Sobre Pessoas Portadoras de

Deficiência para “Pessoas com Deficiência”.45

Nesse sentido, vê-se a necessidade de que a legislação anterior à promulgação da Convenção seja revista para se adequar ao novo conceito, bem como incorporar os avanços que foram conquistados com a inclusão da Convenção à Constituição.

Sobre os benefícios com a promulgação da Convenção, Solange Almeida Holanda Silvio esclarece:

45 SILVIO, Solange Almeida Holanda. Os Direitos das Pessoas com Deficiência. A Convenção da

ONU e os Vetores da Educação para Interpretação da Constituição da República Federativa do Brasil. In: COSTA-CORRÊA, André L. et al. (Orgs.). Direitos e garantias fundamentais: novas perspectivas. Birigui-SP: Editora Boreal, 2016, p. 240.

A melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência está diretamente relacionada à ampliação da sua participação na sociedade. Com a ratificação da Convenção deu-se início a um processo de sensibilização da comunidade em relação aos direitos das pessoas com deficiência. Ação voltada à conscientização e à disseminação de conhecimento acerca do conteúdo desse novo tratado de direitos humanos vem sendo realizada por organizações não governamentais atuantes na defesa dos direitos das pessoas com deficiência e dos direitos humanos no país.46

Para a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a incapacidade ou deficiência:

É um conceito em evolução e que resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao meio ambiente, que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. (Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da ONU, ratificado pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo n. 186, de 9.7.2008 e promulgado pelo Decreto n. 6.9 49, e 25.8.2009).

Algumas das preocupações e observações que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência apresenta é o fato de que os países- membros, com as barreiras existentes na sociedade, obstaculizam o acesso de pessoas com deficiência a terem uma posição em igualdade com os demais cidadãos, havendo violação de seus direitos. Consta ainda a situação de que a maioria das pessoas com deficiência vive em condições de pobreza, restando resignada à necessidade de lidar com o impacto negativo da pobreza em relação às pessoas com deficiência.

Ademais, as barreiras externas agravam, ou ainda, impedem que os deficientes tenham uma participação ativa na sociedade em igualdade com os demais cidadãos, havendo uma grande relação entre pobreza e deficiência, pois, no caso dos deficientes pobres, as barreiras internas – tais como falta de acesso, de participação nas políticas públicas, no meio ambiente e em relação a condições pessoais e econômicas – corrobora para que exclusão seja muito maior.

Nesse sentido, por conta da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, nova redação foi dada ao art. 20 da Lei nº 8.742/9347,

46 SILVIO, Solange Almeida Holanda. Os Direitos das Pessoas com Deficiência. A Convenção da

ONU e os Vetores da Educação para Interpretação da Constituição da República Federativa do Brasil. In: COSTA-CORRÊA, André L. et al. (Orgs.). Direitos e garantias fundamentais: novas perspectivas. Birigui-SP: Editora Boreal, 2016, p. 247.

conforme a Lei nº 12.435/11, que alterou a concepção de deficiência, conforme § 2º e 10 da referida Lei.

§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

§10º Considera-se impedimento de longo prazo, para fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.

A Assembleia Geral da ONU declarou ser o ano de 1981 o ano internacional das pessoas com deficiência. Por isso, em 1982, foi aprovado o Programa de Ação Mundial para as pessoas com Deficiência, sendo que o período de 1983 a 1992 foi considerado a década das pessoas com deficiência.

Por meio de tal Programa, de Resolução 48/96, propôs-se a implantação de Regras Gerais sobre a Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiências. Intenta-se, assim, por meio da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promover a humanidade junto ao processo de integração e inclusão de todos.

A proteção efetiva do valor humanidade afirmada na Declaração dos Direitos dos Deficientes é fundamental para o desenvolvimento e progresso social das nações do mundo e das sociedades modernas. Do contrário, o ser humano está fadado a conviver com o egoísmo e a vaidade, o que conduzirá ao desrespeito aos semelhantes, com a consequente violação da dignidade dos homens em sua convivência social. A proteção dos direitos humanos dos deficientes, que implica respeito à invariante axiológica dignidade humana, permitirá maior grau de desenvolvimento social de determinada sociedade.48

Sob tal perspectiva, e como orientação da Declaração dos Direitos das Pessoas com Deficiência, busca-se um desenvolvimento integral do homem para que haja o desenvolvimento da própria condição humana, a fim de que a nação internacional alcance tal feito na medida em que protege os direitos de pessoas com deficiência e assegura-lhes o bem-estar e a reabilitação, seja física, sensorial ou mentalmente, uma vez que estas encontram-se em prejuízo em comparação com as demais pessoas da sociedade.

48 HORVATH JÚNIOR, Miguel; SILVA, Roberta Soares da. Direitos Humanos e Pessoa com

Deficiência: uma Visão Integrativa. In: COSTA-CORRÊA, André L. et al. (Orgs.). Direitos e

O desenvolvimento integral do homem coexiste à medida que este encontra sua essência e dignidade, bem como os povos e sociedade civil encontram-se na caridade e solidariedade.

Para isso, deve haver cooperação, amizade mútua, tendo como fim o bem comum, o futuro da humanidade. Deve haver fraternidade entre os povos, o respeito às diferenças, às crenças, aos valores. As nações devem solidarizar- se com os menos favorecidos, seja econômico, político ou social. Ou seja, deve haver uma fraternidade universal, a promoção do bem de todos os povos.49

Amparada na proposta de fraternidade e caridade, Santo Agostinho cita o seguinte: “nas coisas essenciais, a unidade; nas coisas não essenciais, a liberdade; em todas as coisas, a caridade”.

Em relação ao protocolo facultativo à Convenção, os grupos e indivíduos comprometidos devem apresentar petições legais ao Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência em caso de processo em seus respectivos países que venham a esgotar as vias legais de defesa de seus interesses.

Por isso, em relação aos países que adotarem a Convenção, ficarão estes obrigados a eliminar leis, costumes e práticas que representem a discriminação contra as pessoas com deficiência.

Uma vez satisfeitos os requisitos de admissibilidade e recebida a petição pelo Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, o Estado-parte deverá submeter ao Comitê explicações ou declarações por escrito, fundamentando a matéria e eventual solução a ser adotada, conforme art. 3 do Protocolo. Ademais, o Comitê pode transmitir ao Estado-parte um pedido para que este tome as medidas provisórias necessárias a fim de se evitar danos irreparáveis às vítimas, segundo art. 4, I, do Protocolo.

Além disso, segundo propõe o art. 6º, o Comitê poderá adotar medidas para monitorar e fiscalizar o Estado-parte, designando um ou mais membros para investigação e análise de relatório.

Com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, objetiva-se promover a dignidade, bem como proteger e assegurar o gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais para todas as pessoas com

49 HORVATH JÚNIOR, Miguel; SILVA, Roberta Soares da. Direitos Humanos e Pessoa com

Deficiência: uma Visão Integrativa. In: COSTA-CORRÊA, André L. et al. (Orgs.). Direitos e

deficiência, propiciando-se, junto à garantia de respeito da dignidade da pessoa humana, o Estado Democrático de Direito, haja vista que para que a democracia seja resplandecida, é importante que haja a inclusão de todos, inclusão esta que pode ser observada quando da destinação da aposentadoria da pessoa com deficiência.