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DESCONGELAMENTO SOB ÁGUA CORRENTE: RISCOS À SEGURANÇA DO ALIMENTO

Suellen Secchi Martinelli1, Pedro Paulo Pires2; Rossana Pacheco da Costa Proença1; Suzi Barletto Cavalli1

Programa de Pós-Graduação em Nutrição da Universidade Federal de Santa Catarina. Endereço: Campus Universitário Trindade, Centro de Ciências da Saúde. CEP: 88040-

900 - Florianópolis –SC. Telefone: (48) 3721-5138. Email: suellen.smartinelli@gmail.com

1Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. Departamento de Nutrição. Núcleo de Pesquisa de Nutrição em Produção de Refeições/UFSC. Florianópolis, SC. 2Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa Gado de Corte. Campo

Grande, MS. Resumo

No intuito de preservar a qualidade da carne, o processo de descongelamento deve ser conduzido de forma a evitar que as áreas superficiais se mantenham em condições favoráveis à multiplicação microbiana. Para um descongelamento seguro, recomenda-se que seja efetuado sob refrigeração à temperatura inferior a 5ºC. No entanto, quando se faz necessário rapidez no processo, utiliza-se a imersão do alimento congelado em água corrente, não devendo exceder o período de quatro horas. O objetivo do estudo foi verificar o tempo e temperatura da carne quando submetida ao descongelamento sob água corrente. Foi realizado um estudo de caso em um restaurante da cidade de Florianópolis - SC. A avaliação da temperatura da carne foi realizada no início e no final do processo de descongelamento como o auxílio de termômetros digitais. A temperatura da carne e o tempo utilizado no descongelamento apresentaram-se acima das recomendações na maioria das vezes. Ao final do processo, a carne atingiu temperatura média de 11,4ºC, ultrapassando a recomendação de 5ºC todos os dias. O tempo médio de descongelamento foi de 323,4 minutos, sendo que em 4 dias ultrapassou a recomendação de 4 horas. Ressalta-se a importância do monitoramento da temperatura da carne e/ou controle de tempo máximo recomendado para o procedimento. As informações deste estudo podem representar referência para restaurantes, no sentido de garantir a segurança do alimento e a sustentabilidade na produção de refeições.

Palavras chave: descongelamento; carne; temperatura; alimento seguro. Introdução

O manual “Cinco chaves para uma alimentação mais segura”, da Organização Mundial da Saúde, propõe que o descongelamento de alimentos seja realizado somente no refrigerador ou em local fresco1. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) determina os padrões sanitários relativos aos serviços de alimentação no Brasil. Estabelece que o descongelamento de alimentos seja efetuado em condições de refrigeração à temperatura inferior a 5ºC ou em forno de micro-ondas, quando o alimento for submetido imediatamente à cocção2.

No entanto, quando se faz necessário rapidez no processo, utiliza-se alternativamente a imersão do alimento congelado em água corrente3,4,5. O descongelamento sob água corrente é uma técnica recomendada pelo Codex alimentarius e seguida por diversos órgãos regulamentares, sendo muito utilizado em

restaurantes, já que reduz o tempo necessário para o descongelamento6,7,8,9. Contudo, se inadequadamente realizado, pode representar grande impacto ambiental3, além de comprometer aspectos nutricionais, sensoriais10 e higiênico- sanitários dos alimentos11.

Algumas recomendações são realizadas na tentativa de preservar a qualidade do alimento durante o descongelamento sob água corrente. A temperatura da água não deve exceder 21ºC e limita-se um tempo máximo de quatro horas6,7,8,9.

Entre os alimentos frequentemente descongelados em água corrente estão as carnes3. Dessa forma, a recomendação e utilização usual dessa prática tornam-se preocupantes ao considerar a importância das carnes, altamente suscetíveis a contaminação microbiana12. Isso se dá principalmente devido suas características intrínsecas, tais como: elevado valor nutricional; alta atividade de água (70 a 75%) e faixa de pH 5,0 a 6,8, próximo a neutralidade13.

Sendo assim, o objetivo do estudo foi verificar o tempo e a temperatura da carne quando submetida ao descongelamento sob água corrente.

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa descritiva, com abordagem teórica de natureza qualitativa e quantitativa, delineada como estudo de caso.

O estudo foi realizado durante 25 dias dos meses de maio e junho de 2010. Neste período, foram selecionados 5 dias em que houve a possibilidade do acompanhamento desde a retirada da carne da câmara fria de congelamento até o momento do preparo, englobando todos os cortes bovinos nos quais o procedimento foi realizado.

A avaliação da temperatura da carne foi realizada no início e no final do processo de descongelamento. Considerou-se a média das temperaturas quando cortes de carne variados eram descongelados na mesma cuba. A aferição da temperatura da água foi realizada no início do processo. A obtenção da temperatura da câmara de congelamento e de resfriamento realizou-se por meio de termômetros dotados de sensores internos e visores externos.

Dois termômetros auxiliaram na aferição das temperaturas. Um digital sem contato, infravermelho (modelo MT-350, da marca Minipa®), com capacidade para avaliar de -50°C até +450°C, para avaliação de temperatura externa, sem contato direto, de carnes congeladas e embaladas a vácuo. Outro termômetro digital calibrado com haste de inserção inoxidável, que avalia temperaturas entre -50°C e +150°C (modelo DT-625, da marca Dellt®), empregado na água e no centro geométrico de carnes descongeladas.

Resultados e Discussão

Apesar de a câmara fria de congelamento ter sido regulada para manutenção dos alimentos a -18ºC, as médias de temperaturas encontradas foram de -13,3ºC (±8,4) pela manhã e -7,1ºC (±3,1) no final da tarde, o que pode ser decorrente de aberturas frequentes de sua porta ao longo do dia. Observou-se a temperatura média da carne logo após sua retirada da câmara fria em -7,8ºC, chegando a -5,4ºC, valores acima do recomendado para manter a qualidade do alimento em condições satisfatórias.

As temperaturas da carne no início e no final do descongelamento, bem como a temperatura da água, podem ser observadas na Tabela 1.

A temperatura da água apresentou média de 20,6ºC (±0,6) e foi superior a recomendação de 21ºC em dois momentos. Já a temperatura da carne no final do descongelamento, mostrou-se acima das recomendações, que preconizam o valor máximo de 4ºC6,8.

A temperatura da carne e o tempo utilizado no descongelamento apresentaram- se acima das recomendações na maioria das vezes. Ao final do processo, a carne atingiu temperatura média de 11,4ºC. O tempo médio de descongelamento foi de 323,4 minutos, sendo que em 4 dias ultrapassou a recomendação de 4 horas. O tempo de contato com a água causou o aumento da temperatura da carne, já que o processo de transmissão de calor ocorre constantemente. No dia em que o tempo máximo foi observado, 394 minutos, a carne atingiu a maior temperatura do período observado, qual seja, 18,3ºC.

Conclusões

Apesar de recomendado no processo de descongelamento, não havia na unidade o monitoramento da temperatura da carne e/ou controle de tempo máximo recomendado. Ressalta-se que a melhor opção é a aquisição de carnes refrigeradas. Se esta opção não for possível, a carne congelada deve ser descongelada em refrigeradores. As informações deste estudo podem representar referência para restaurantes, no sentido de reduzir o consumo e o descarte de águas residuais, priorizando a sustentabilidade na produção de refeições e garantir a segurança do alimento.

Tabela 1 - Temperaturas iniciais e finais da carne e temperatura da água no início do descongelamento na unidade estudada.

Dia Temperatura inicial média da carne (ºC) Temperatura final média da carne (ºC) Temperatura da água (ºC)

1º -6,2 10,5 21,1

2º -5,4 18,3 21

3º -9,4 10,8 19,8

4º -6,8 10,2 21,2

5º -11,2 7,3 20,6

Gráfico 1: Tempo necessário para o descongelamento e temperatura da carne no final do procedimento na unidade estudada.

Referências

1 World Health Organization. WHO. Five Keys to Safer Food Manual. 2006. 29 p.

Disponível em: <http://www.who.int/foodsafety/publications/consumer/manual_keys.pdf>. 6 8 10 12 14 16 18 20 200 250 300 350 400 Tem pera tura C) Tempo (min) Dia 1 Dia 2 Dia 3 Dia 4 Dia 5

2 Ministério da Saúde (Brasil). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº. 216, de 15 de setembro de 2004. Dispõe sobre o Regulamento técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 16 de setembro de 2004.

3 Leung M, Ching WH, Leung DYC, Lam GCK. Fluid dynamics and heat transfer in cold water thawing. Journal of Food Engineering 2007; 78: 1221–27.

4 National Center For Home Food Preservation. General Freezing Information: Thawing and Preparing Foods for Serving. 2010. Disponível em: <http://www.uga.edu/nchfp/how/freeze/thawing.html>.

5 United States Department of Agriculture. USDA-FSIS. Food Safety and Inspection Service. Freezing and Food Safety. 2010. Disponível em: <http://www.fsis.usda.gov/factsheets/focus_on_freezing/index.asp>.

6 Food and Agriculture Organization. FAO. United Nations. Codex Alimentarius Commission. CAC/RCP 39, 1993: Code of Hygienic Practice for Precooked and

Cooked Foods in Mass Catering. Disponível em:

<http://www.codexalimentarius.net/web/standard>.

7 Food and Drug Administration. FDA. Food Code - model forms, guides and other aids. Maryland: Center for Food Safety and Applied Nutrition, 2009. Disponível em: <http://www.fda.gov/Food/FoodSafety/RetailFoodProtection/FoodCode/FoodCode2009 /default.htm.>.

8 Centro de Vigilância Sanitária de São Paulo. São Paulo (Estado). Portaria CVS 6 de 10 de março de 1999. Regulamento técnico sobre os parâmetros e critérios para o controle higiênico-sanitário em estabelecimento de alimentos. Diário Oficial do Estado, 13 mar. 1999.

9 Associação Brasileira das Empresas de Refeições Coletivas. Manual ABERC de práticas de elaboração e serviço de refeições para coletividades. 8 ed. São Paulo: ABERC, 2009.

10 Hering B; Proença RPC, Sousa AA, Veiros MB. Evaluation of nutritional and sensorial quality in meal production – NSQE SYSTEM. Journal of Foodservice 2006; 17:173-81.

11 Bolton DJ, Maunsell B. Guidelines for Food Safety Control in European Restaurants. Dublin: Teagasc The National Food Centre, 2004.

12 Pardi MC, Santos IF, Souza ER, Pardi HS. Ciência, higiene e tecnologia da carne. UFG, 2001.

13 Germano PML, Germano MIS. Higiene e vigilância sanitária de alimentos. São Paulo: Varella, 2001.

Avaliação do controle de qualidade dos estabelecimentos alimentícios de

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