• Nenhum resultado encontrado

A Grande Depressão e o pensamento keynesiano

uma política de restrição de crédito do governo alemão, a recuperação do marco foi desacelerando o processo inflacionário e, em 1931, os pagamentos foram suspensos.

Mesmo com a relativa melhora, no final da década de 1920, o baixo crescimento, os elevados índices de desemprego, a inflação e a dívida da guerra possibilitaram o fortalecimento de partidos políticos de extrema direita e extrema esquerda, ou seja, o Partido Nacional Socialista e o Partido Comunista, respectivamente.

Grande Depressão da década de 1930

Decorrente da prosperidade econômica norte-americana, na década de 1920, a Bolsa de Valores de Nova York, no início de setembro de 1929, registra um valor recorde de 200,9 pontos. Considerando o período de 1920 a 1929, as principais ações tiveram uma valorização média de 196%, como destacado pelo gráfico 1. O mercado acionário vivia momentos de grande otimismo e muitos investidores criavam verdadeira fortunas na compra e venda dos papéis das principais empresas norte-americanas.

Contudo, em 24 de outubro deste ano, o pregão da Bolsa de Nova York foi marcado por um pes-simismo generalizado, alastrando para uma situação de pânico e venda expressiva dos papéis. A “Quinta-Feira Negra”, como ficou conhecida, jogou para baixo os preços das ações, com medo de uma recessão generalizada na economia. O gráfico 1 destaca que de 1929 a 1930 a bolsa caiu em média 21,3% e em quatro anos (1929-1933) reduziu em mais de 66%. Destaca-se que, durante toda a década de 1930, os preços das ações permaneceram inferiores ao valor de 1929 e só retornam aos seus valores pré-crise no final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

O volume negociado na Bolsa de Nova York foi reduzido drasticamente. Os empréstimos aos cor-retores atingiram seu topo em setembro de 1929, com um valor mensal de US$8,5 bilhões. Em dezembro deste mesmo ano, o volume negociado era de aproximadamente US$3,9 bilhões e, com a falta de con-fiança no mercado acionário, em dezembro de 1930, o volume negociado pelos corretores foi de aproxi-madamente US$1,8 bilhão. Em dezembro de 1932, o volume despencou para US$347 milhões.

O sistema financeiro e as corretoras de valores foram as atividades que inicialmente mais sofreram

com a queda da bolsa. De acordo com o Federal Reserve Bank (FED)1, em dezembro de 1929 havia 24 026

bancos comerciais2 operando no país; no mesmo mês de 1930 o número já era de 22 172, caindo para 19

375, no ano seguinte e para 15 519 em 1933, o pior ano da Grande Depressão. Isso significa dizer que em quatro anos consecutivos, 6 653 bancos comerciais, principais instituições do sistema financeiro, pediram falência. Uma queda de 30% no número de instituições bancárias.

Como consequência, a concessão de empréstimos foi drasticamente reduzida. Em 1929, os bancos comerciais emprestaram cerca de US$49,4 bilhões para o consumo e o investimento das empresas; em 1933, este valor foi reduzido para US$30,4 bilhões, uma queda de 38,5%.

62 | A Grande Depressão e o pensamento keynesiano

Gráfico 1 – Preço médio anual das ações nos EUA de 1920 a 1941:: Índice geral das ações comuns, 1935-1939 = 100 Índic e das aç ões Ano 220 200 180 160 140 120 100 80 60 40 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1929 1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1941 St an da rd a nd P oo r’s C or po ra tio n.

No momento em que a crise do sistema financeiro, gerada pela queda repentina das ações, atinge as decisões de investimento e consumo dos agentes econômicos, a recessão econômica começa a ser observada com mais vigor. O desempenho do aparelho produtivo pode ser mensurado pelos compo-nentes da demanda agregada que, por sua vez, determinam o Produto Interno Bruto (PIB) da economia. Nesse sentido, podemos argumentar que o PIB é composto por cinco variáveis expressas pela identida-de a seguir:

PIB = C + I + G + X – M (1) Uma breve explicação dessas variáveis torna-se necessário.

Consumo das famílias (C)

:::: : corresponde à demanda realizada pelos agentes familiares dos

bens finais produzidos no período de mensuração do produto. Isso inclui escola, carro do ano, comida, geladeira nova, médico, transporte, gasolina, entre outros.

Investimento das empresas (I)

:::: : em Economia, investimento significa ampliação, por parte

da empresa privada, do estoque de capital físico, ligado à produção. De fato, o investimento consiste na construção civil (novas casas), máquinas e equipamentos, construção e ampliação de fábricas e adições ao estoque de bens finais das empresas. Se uma empresa compra um carro novo então é investimento, mas se uma pessoa física o compra, então é consumo das famílias.

Gasto do governo (G)

:::: : representam as compras efetuadas de bens e serviços pelo setor público,

tanto na esfera municipal, estadual e federal. Incluem gastos com a administração pública, salários, defesa e segurança nacional, rodovias, ferrovias, saneamento básico, aeroportos, entre outros. Não estão incluídos, neste item, gastos com aposentadorias e programas sociais. Exportações de bens e serviços não fatores (X)

:::: : representam os produtos finais vendidos

para o exterior. No caso de um bem físico, isto é, uma mercadoria, ela é contabilizada na balança comercial, e no caso de um serviço não fatores, por exemplo, uma viagem internacional ou um

63 | A Grande Depressão e o pensamento keynesiano

Importações de bens e serviços não fatores (M)

:::: : representam os produtos finais comprados

do exterior. O fato desses produtos não representarem a atividade produtiva do país devem ser excluídos do cálculo da produção.

É fácil observar que se, por exemplo, o consumo das famílias e o investimento das empresas se

elevam em um determinado período3, então a economia cresce. Contudo, não foi isso que ocorreu após

a crise financeira de 1929.

Gráfico 2 – Desempenho anual do PIB (em %) dos EUA durante a Grande Depressão

–3,4% 8,1% 5,1% 13,0% 8,9% 10,8% –8,6% –6,4% –13,0% –1,3% –15,0% –10,0% –5,0% 0,0% 5,0% 10,0% 15,0%

Taxa de crescimento do PIB (%)

A no 1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938 1939 Bu re au o f E co no m ic A na ly si s ( BE A ).

O gráfico 2 destaca que, em 1930, o PIB4 da economia norte-americana sofreu uma retração de

8,6%, sendo que o consumo das famílias caiu 3,99%5 e o investimento privado nacional retraiu 5,23%.

Em 1932, o PIB cai em 13,0% e mais uma vez observou-se um forte retração do consumo (–7,0%) e dos investimentos (–5,3%). No ano seguinte, a economia retraiu novamente em 1,3%. O valor em si parece pouco, comparado aos anos anteriores, mas devemos destacar que uma queda de 1,3% em 1933 em relação a 1932, que é uma base estatística muito fraca, é um valor expressivo. Em 1933, a economia norte-americana encontra-se no pior momento da Grande Depressão.

Entre os anos 1929 e 1932, os gastos do governo ficaram praticamente estagnados em torno

de US$6,5 bilhões, representando cerca de 6% do PIB6. Com a queda da renda, devido à recessão, a

arrecadação total do governo declinou de US$9,9 bilhões em 1929 para US$7,7 bilhões o menor valor em 1932. Nesse mesmo período, o governo registrou um superávit comercial na ordem de US$2,6 bilhões em 1929 e um ligeiro déficit público de, aproximadamente, US$700 milhões. Essa inversão do orçamento governamental foi mais pela queda da arrecadação do que pelo aumento nos gastos públicos. Pelo contrário, no início da recessão econômica, o investimento governamental anual caiu de US$ 2,8 bilhões, em 1929, para US$2,1 bilhões, em 1932, e US$1,9 bilhão no ano seguinte.

3 Um crescimento não inflacionário.

64 | A Grande Depressão e o pensamento keynesiano

Devido à crise mundial, as exportações também sofreram forte arrefecimento. De acordo com os dados do comércio dos EUA, o volume médio mensal das exportações caiu mais de 60% entre os anos de 1929 a 1933. A produção industrial geral e de bens de consumo duráveis caiu, entre 1929 a 1932, 47,3% e 68,9%, respectivamente.

Considerando uma retração de todas as variáveis da demanda agregada, descritas no gráfico 1, pode-se argumentar que a crise atingiu proporções enormes. A pobreza no mundo e nos EUA aumentou drasticamente, assim como a perda no poder aquisitivo. A figura ao lado reflete o grande problema social vivido durante a Grande Depressão: miséria e desemprego (falta de renda).

Os salários reais já vinham sofrendo reduções durante a década de 1920 devido ao crescimento de-sigual nos Estados Unidos. De 1920 a 1929, os salários

reais7 caíram mais de 2,8%, sendo que deste período

ao ano de 1931 diminuíram em mais de 20,8% e, com-parando com 1933, mais de 50%. Devido a essa queda nos salários e no produto, a economia norte--ameri-cana registrou uma deflação muito elevada no nível

geral de preços. O Índice de Preços ao Consumidor (IPC), de acordo com o gráfico 3, caiu 6,4% em 1930; 9,32% em 1931; e 10,27% em 1932. Essas sucessivas quedas nos preços não foram suficientes para

esti-mular o consumo dos agentes econômicos como pensavam os economistas liberais8 para restabelecer

os níveis de consumo. Com isso, a economia ficou operando com crescimento econômico negativo e deflação no IPC.

Gráfico 3 – Variação percentual do Índice de Preços ao Consumidor (IPC), nos EUA:: 1929-1938

–12,0 –10,0 –8,0 –6,0 –4,0 –2,0 0,0 2,0 4,0 0,58 –6,40 –9,32 –10,27 0,76 1,52 2,99 1,45 2,86 –2,78 1931 1929 1930 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938 Ano IPC (%) U .S . D ep ar tm en t o f L ab or : B ur ea u o f L ab or S ta tis tic s

Nota: IPC para todos os itens de consumo urbano.

7 Salários reais dos homens, incluindo os trabalhadores qualificados e não qualificados (Department of Labor).

8 O governo republicano de Herbert Hoover esperava que o mercado iria se autorregular através da queda dos preços. Com isso, não interferiu

Família desempregada, vivendo em condições miserá-veis, em Elm Grove, Califórnia, Estados Unidos.

65 | A Grande Depressão e o pensamento keynesiano

A elevada taxa de desemprego foi a “pedra no sapato” das economias capitalistas durante a Grande Depressão. Ao analisar essa variável, devemos deixar bem claro como ela é obtida. A seguir é expresso um cálculo simples de como se obtém a taxa de desemprego.

Quadro 2

d = Número de pessoas desempregadas

População economicamente ativa x 100

Sendo:

d = taxa de desemprego em porcentagem obtida da População Economicamente Ativa (PEA). Nesse sentido, a taxa de desemprego é obtida pela razão entre o número de pessoas desempre-gadas e a população economicamente ativa, isto é, a oferta de trabalhadores. E, assim, classificamos

a taxa de desemprego como uma variável socioeconômica. Um elevado valor9 desta representa um

desperdício de mão de obra que necessita de emprego, mas não encontra.

Com a queda substancial do PIB, no início da Depressão, o desemprego explodiu. Em 1929, nos

EUA, havia 1,5 milhões de desempregados e a taxa de desemprego era de 3,2% da força de trabalho10. Em

um ano o número de pessoas sem emprego aumentou para 4,3 milhões de pessoas ou 8,7% da PEA. Em 1932, em uma situação caótica da economia mundial, a taxa de desemprego norte-americana foi de 23,6% da PEA, representando cerca de 12 milhões de pessoas desesperadas por um trabalho. No ano seguinte, a taxa de desemprego aumentou para 24,9% da força de trabalho, isto é, mais de 12,8 milhões de pessoas esperando por um emprego.

Desesperado, o governo norte-americano lança um amplo programa de combate à depressão. O

New Deal, como ficou conhecido, foi implementado entre 1933 e 1937, pelo presidente Franklin Delano

Roosevelt. As principais medidas foram: expandir o crédito para a agricultura.

::::

reforma nas leis bancárias.

::::

amplos programas de geração de emprego e renda.

::::

criação de programas socias, tais como a redução da jornada de trabalho, salário mínimo e o

::::

seguro-desemprego.

O investimento público em rodovias, ferrovias, energia, por exemplo, aumentou de US$1,9 bilhão em 1933 para US$4,1 bilhões em 1936. Os benefícios sociais do governo, nesse período, saltaram de US$1,3 bilhão para US$2,7 bilhões. O gasto do governo com bens e serviços chegou a US$9,0 bilhões em 1936, representando 10,7% do PIB norte-americano.

Em 1934, o PIB cresceu 10,8%, puxado pela expansão no consumo das famílias de 5,71% e pelo investimento das empresas de 2,78%. Em 1936, mais uma vez a economia cresceu 13,0%, liderado pelo consumo (7,74%) e pelo investimento (2,53%). Como consequência positiva, a taxa de desem-prego caiu para 21,7% da PEA, em 1934, representando 11,3 milhões de pessoas sem emdesem-prego e, em

66 | A Grande Depressão e o pensamento keynesiano

1937, último ano do New Deal, o desemprego caiu para 14,3% da força de trabalho, com 7,7 milhões de pessoas. Entre o período de 1933 a 1937, a produção industrial total e de bens duráveis cresceram 63% e 126%, respectivamente.

Apesar do bom desempenho inicial do New Deal, esse programa não foi suficiente para recuperar a economia americana da Grande Depressão. A restabilização total da economia só ocorreu no final da Segunda Guerra Mundial. Em 1939, a taxa de desemprego era elevada: 17,2% da PEA (9,4 milhões de pessoas).

Em 1944, essa taxa cai para 1,2% da força de trabalho, representando um desemprego de apenas 670 mil trabalhadores. Nesse mesmo período, a produção industrial total aumentou em 116% e a de bens duráveis 224%. O PIB registrou uma excelente recuperação entre 1941 e 1943, com taxas de cres-cimento de 17,1%; 18,5%; 16,4%, respectivamente.