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Marca de sabão em pó.

No documento Jornalismo e Estudos Mediáticos (páginas 190-192)

Felipe Harmata Marinho

1 Marca de sabão em pó.

são muito parecidas com o meu jeito. Falam palavrão e não estão nem aí. Ou são mulheres que falam sobre assuntos que as meninas não gostam de falar. É questão de se identificar”. Isso também aparece com relação a desafios pessoais. “Se eu vejo que a pessoa é gorda, aí ela começou a fazer um negócio e ficou magra. Eu também estou pensando em ficar magro. Vou acompanhar para saber o que ela fez”. Esse tipo de discussão mostra que o conteúdo da vida pessoal do influenciador digital no YouTube pode ser tão importante quanto o conteúdo do canal a que ele se propõe falar. Como mostrado na fundamentação teórica, se o gatekeeper tradicional era conhecido por ser o especialista em algum con- teúdo, agora outros elementos se misturam a isso. No geral, percebe-se na pesquisa que os entrevistados gostam de saber da vida pessoal e do cotidiano dos influenciadores. Mas não há um consenso sobre até que ponto isso pode atrapalhar. “Fico pensando: ela é muito linda, carismática, muito legal. Quero saber do namorado dela, vou acompanhar a história da família. Vou fazendo um stalker até que você percebe que ama a família dessa pessoa”.

Mesmo com todo esse espaço para a exposição do lado pessoal, o grupo focal encara que é preciso ter também um bom assunto a ser abordado. “Quero conversar com uma pessoa que vai agregar meu conhecimento sobre aquilo. Tanto a identificação quanto o conteúdo são fundamentais”. Mas esse mistura não é consenso entre os entrevistados. Um deles não gosta quando o conteúdo cai em questões pessoais. “Não assisto por me identificar, pelo contrário, acho que quando começa a falar muito da vida da pessoa eu corto. Não é isso que eu quero ver”. Outro integrante do grupo focal diz: “vou perder 30 minutos olhando a vida de uma pessoa quando eu podia estar vivendo a minha. Pra que mascarar tua vida ou se tornar muito dependente da vida de outra pessoa?”.

Mesmo com essa divergência, o grupo focal percebe que, e muitos momentos, a vida de alguns influen- ciadores é o próprio tema. Nesse caso, falar da vida deles faz sentido. “Sou muito atraída pelo carisma das pessoas. Se é alguém que eu acho carismática, quero saber tudo sobre ela. Depende muito da pessoa”. Uma das entrevistadas chega a dizer que acompanha a vida de uma youtuber do mesmo jeito que assiste a uma série. “É a minha série. Todo dia ela libera vídeo. Se cada vídeo tem uns 25 minutos e eu estou atrasada, não assito tudo. Mas tem um dia que eu vejo todos, fico umas três horas vendo”. O que se percebe analisando as respostas do grupo focal é que há uma relação diferente entre acom- panhar a vida pessoal dos outros e de mostrar a própria vida pessoal. A maioria deles é reticente a dar muitos detalhes da própria vida na internet. “Sempre quis ter um canal no YouTube. Mas acabo usando stories para isso. Tenho muito medo de abrir um canal. Me sinto super confortável para falar sobre várias coisas. Mas, ao mesmo tempo, sei que não tem relevância nenhuma o que eu estou falando”. Esse tipo de receio aparece em outras respostas. “Tem que ter muita coragem”. Outro entrevistado comple- menta. “Não tenho essa autoconfiança de colocar a cara a tapa no YouTube”. Uma das entrevistadas cita algo que aconteceu com ela. “Comecei a trabalhar em um lugar mais sério, parei de fazer alguns vídeos porque dá medo disso te prejudicar. Nunca falaria quem é meu namorado, nunca mostraria meu namorado na internet. É colocar tua cara para todo mundo te xingar”. Mas também não há um consenso com relação a isso. Uma das integrantes do grupo focal, a que possui canal no Youtube, pensa diferente. Conta que conseguiu espaço em uma empresa justamente por ter um canal. “Pode ajudar. O meu estágio eu consegui por causa do meu canal. Tem muitas coisas benéficas”.

Baseado nesse tipo de exposição, a pesquisa buscou saber se o grupo focal considera o influenciador digital no YouTube como um tipo de celebridade. Os entrevistados consideram que, por estarem rela- cionados a determinados nichos, a relação do influenciador digital com o público é outra. “Não parece

que tem mais um monte de gente que assiste. É diferente de você encontrar um influenciador na rua e encontrar um Tony Ramos. Por causa do público”. Por serem ligados a nichos eles não são conhecidos pelo grande público. “Não alcança tanta gente igual na televisão. Se eu mostrar para a minha avó, ela não sabe quem é. Celebridade é uma coisa maior”. Uma das integrantes do grupo focal conta como foi o dia em que encontrou com alguns youtubers em um show. “Tinha fila para tirar foto com eles, inclusive eu estava nessa fila. Falei para o meu pai: vou tirar uma foto. Aí ele: mas quem é esse? Ele: nossa, o youtuber, aquele que você assiste?”.

3.3. A autoridade do Influenciador x Especialidade

O grupo focal não considera que os youtubers são especialistas nos temas que abordam, pelo menos não no sentido de quem estudou formalmente determinado assunto. Eles consideram que a abordagem dos temas é muito próxima a de uma conversa com um amigo. “É como se fosse um amigo falando um conselho, dizendo para você não pensar de tal forma que é errada. Você vai levar isso em conta”. Nessa linha outro entrevistado complementa: “você escolhe os seus amigos porque você gosta da forma como eles conversam contigo, gosta do assunto que eles estão falando, você acha uma pessoa inteligente, que vai te agregar. Então você foca nele como uma pessoa que você pode confiar”.

Mesmo sem ter estudado academicamente um assunto os entrevistados consideram que o influen- ciador do YouTube tem sim autoridade para falar sobre um tema. Gostar de determinado conteúdo e estudar por conta própria o assunto são os motivos que aparecem relacionados a isso. “O youtuber é um especialista não porque ele é formado, mas porque ele fala de algo que ama muito. Tem o canal Pipocando2 que eu amo demais e nem sei se eles são formados em alguma coisa relacionada a cinema”. Mas isso não quer dizer que eles não estudem sobre o assunto. “São pessoas que conseguem buscar informação sobre aquilo». Mais do que uma autoridade formal, o grupo focal entende que o que os in- fluenciadores fazem é emitir opiniões. “Eles estão dando a opinião deles sobre aquilo. Se você concorda ou não concorda, o julgamento é seu”.

Quando perguntados porque eles preferem alguém que não é especialista, os entrevistados respondem que a linguagem aparece como fator determinante. “Especialista não sabe falar com você de uma forma que é fácil de cativar”. Outra entrevistada complementa: “um especialista fala com aquela autoridade, ele se impõe sobre o assunto e talvez distancia você. Outra entrevistada entende que com o influencia- dor é diferente. “Ele é gente como a gente, sabe?”.

Um exemplo aparece na fala dos entrevistados e ajuda a entender essa questão. Eles citam a busca de alguém no YouTube para aprender a fazer algo diferente no cabelo. Falam de um vídeo de alguém que não entende tecnicamente como aquela química funciona. Quando questionados sobre possíveis problemas que o uso pode causar no cabelo a resposta deles é relacionada ao juízo de valor do próprio usuário. “O problema é meu, sabe? Corto o meu cabelo sozinha desde os meus 15 anos. Foi uma opção minha e eu tenho consciência. Se acontecer [algum problema] fui eu quem errei, que não devia ter cortado tanto”. Outra entrevistada complementa: “não consigo ver o youtuber como um especialista.

No documento Jornalismo e Estudos Mediáticos (páginas 190-192)

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