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O Brasil no início do século

No documento Jornalismo e Estudos Mediáticos (páginas 103-106)

Christiane Monteiro Machado

1. O Brasil no início do século

Foi nas últimas décadas do século XX que a pirâmide etária brasileira começou a deixar de ter a forma de uma pirâmide. A combinação entre a queda nos índices de natalidade e o aumento de expectativa de vida vem fazendo com que o país acompanhe uma mudança muito rápida em sua estrutura etária. As projeções feitas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que esse fenômeno terá sua consolidação nas próximas décadas.

Em 2015, o Brasil tinha cerca de 24 milhões de pessoas acima dos 60 anos – cerca de 12% da popu- lação –, e as projeções consideram um aumento para 66,5 milhões em 2050, o que corresponderá a mais de 29% da população. Simões (2016, p. 102) afirma que “o Brasil já começa a enfrentar algumas das questões que atualmente afetam os países da Europa”. O gráfico a seguir mostra a evolução da população nos censos a partir de 1940 e as projeções para as próximas décadas. Pode-se perceber que a curva que segue um padrão distinto das demais é a da projeção da distribuição da população em 2050, quando crianças e jovens serão os menores grupos e haverá um contingente aumentado a partir dos 50 anos. As projeções indicam que o Brasil então terá consolidado a transição etária sua população.

Gráfico 1. Distribuição da população brasileira década a década desde o Censo de 1940, e projeções da distribuição em 2020 e 2050, por grupos etários e por sexo.

Fonte: Simões (2016, p. 94), a partir de dados do IBGE.

Segundo estudos da Organização Mundial de Saúde (OMS), até 2025, o Brasil será o sexto país do mundo em população de idosos. Essa mudança vem acontecendo de forma mais acelerada do que em países europeus, de economia mais desenvolvida, que passaram pela inversão de suas pirâmides etárias durante períodos mais longos. Simões (2016, p. 21), explica que “o Brasil vem realizando uma das transições demográficas mais rápidas do mundo, enquanto em países como a França essa transição teria levado quase dois séculos”.

Percebe-se, sob o ponto de vista estritamente demográfico, que os idosos são uma categoria social cuja importância irá crescer nos próximos anos. Mas o aumento de sua proporção na população brasileira total pede uma compreensão mais ampla, em relação aos desafios que traz: já está em discussão, há alguns anos, o tema de uma possível reforma da Previdência; será necessária uma ampla revisão de políticas públicas, de programas sociais e de estímulo a iniciativas privadas que contemplem as neces- sidades de uma população mais envelhecida. Para o Banco Mundial (2011), “o Brasil passa por uma

estrutura etária muito favorável”, com uma parcela ainda crescente da força de trabalho madura, que “representa uma atividade econômica maior e gera a maior parte da riqueza do país”, e queda na força de trabalho jovem. “No médio prazo, porém, as mudanças esperadas na composição da força de traba- lho devidas ao envelhecimento populacional irão impor desafios ao crescimento econômico” (Banco Mundial, 2011, p. 49).

Até mesmo a classificação de quem são os idosos está relacionada com as características dos diferentes países. Economias mais estáveis classificam as pessoas a partir dos 65 anos como idosas, enquanto que em economias em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, é idoso o indivíduo com mais de 60 anos, como aponta Simões (2016, p. 22 e p. 95), citando a Política Nacional do Idoso (Lei n. 8.842, de 04.01.1994) e a classificação adotada pela OMS.

Observando os idosos como público consumidor, diversos autores percebem o distanciamento entre a realidade – um público exigente, com renda disponível para os mais diversos tipos de gastos e inves- timentos – e a forma como são tratados por muitas marcas. Um estudo feito no Brasil em 2016 pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas aponta que “67% dos idosos são os únicos decisores so- bre as compras que fazem, mas três em cada dez (34%) afirmam sentir falta de produtos para a terceira idade” (Julio, 2016). Esse segmento da população, segundo a pesquisa, sente falta de produtos nos mais diversos setores: “Quando se trata de atendimento e pontos de venda, 70% dos idosos acreditam que é preciso haver melhorias. Três a cada dez idosos acreditam ainda que os rótulos devem ser mais fáceis de serem lidos”.

Essa aparente dificuldade que as marcas, seus produtos e sua comunicação têm em atender as neces- sidades dos idosos está relacionada com um fenômeno que se manifesta em todo o mundo, e que é especialmente forte no Brasil: a valorização da juventude. Oliveira e Oliveira (2007, p. 115) pontuam que “a tendência no Brasil é valorizar o que é novo e desprezar o que é velho”, ideia compartilhada por Debert (2003, p. 152), para quem, no Brasil, “o culto à beleza, à juventude e à sensualidade tem sido uma das marcas mais destacadas de sua cultura”. Ver a juventude como superior à velhice é algo que vem de longa data. O fenômeno já era estudado por Simone de Beauvoir em seu clássico A Velhice: “Ao invés de oferecer ao velho um recurso qualquer contra seu destino biológico, garantindo-lhe um porvir póstumo, a sociedade de hoje o rejeita, ainda vivo, para um passado já superado” (Beauvoir, 1970, p. 119).

Esse ambiente de desvalorização acaba por reforçar preconceitos relação à idade. Nem todos os estudio- sos da gerontologia concordam, mas para vários deles esses preconceitos têm origem com industrializa- ção. Butler (2009) explica: “Societies shifted from agrarian economies, where older men had traditionally

owned the land, to industrialized economies, where work was no longer centered in the home and older persons lost their authority”. Com essa perda de autoridade dos idosos, fica reduzida a valorização do

papel social que eles exercem. Os preconceitos que surgem como consequência desse fenômeno foram chamados por Butler (2009) de idadismo (em inglês, ageism). Marques (2016, p. 11) explica que o ter- mo se refere “às atitudes e práticas negativas generalizadas em relação aos indivíduos baseadas somente numa característica – a sua idade”.

As discussões mais recentes da Gerontologia, que leva em consideração um conjunto de teorias sobre o envelhecimento que tem por base a Psicologia e a Sociologia, indicam esforços para reduzir os efei- tos negativos dos preconceitos em relação à idade. Com o envelhecimento das populações dos países europeus, o tema esteve presente em discussões da OMS desde o fim do século passado. Em 2002, a

instituição criou a expressão envelhecimento ativo, que descreve “o processo de otimização das oportuni- dades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas”. Com isso, a intenção da OMS é influenciar na formulação de políticas de forma multidimensional, por integrar ideias de saúde e atividade social que têm como consequência a busca da redução da dependência que o idoso tem da família e do estado: “Policy is to be shaped in

a way that combines the promotion of individual well-being with the achievement of benefits to the wider society” (Zaidi e Howse, 2017, p. 3). As alterações nas políticas públicas refletem uma mudança, ainda

em andamento, no entendimento da sociedade a respeito do envelhecimento. Este estudo passa agora a verificar como a Publicidade participa das construções dessas representações sociais.

No documento Jornalismo e Estudos Mediáticos (páginas 103-106)

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