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OBJETIVO E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA A educação ambiental crítica ergue a bandeira das profundas transformações sociais;

No documento Volume 2 (páginas 61-66)

nesse sentido, a educação é entendida como instrumento de luta. “a EA crítica volta-se para uma práxis de transformação da sociedade em busca de uma sustentabilidade calcada em novos paradigmas, condições materiais, posturas ético-políticas, entre outros.” (GUIMARÃES, 2004, p. 48, grifo nosso). Logo, é uma educação política e promovedora de seu próprio fundamento, a cidadania.

Pelicioni e Phillipi Júnior (2005, p.3, grifo nosso) estabelecem a posição assumida pela EA crítica:

Ela se coloca numa posição contrária ao modelo de desenvolvimento econô- mico vigente no sistema capitalista selvagem, em que os valores éticos, de justiça social e solidariedade não são considerados nem a cooperação é esti- mulada, mas prevalecem o lucro a qualquer preço, a competição, o egoísmo e os privilégios de poucos em detrimento da maioria da população.

Sobre a cidadania promovida e que, ao mesmo tempo, promove a educação ambiental crítica, Guimarães (2004, p.75, grifo nosso) discorre que:

essa educação ambiental crítica viabiliza-se como instrumento de gestão, na medida em que se volta para a construção de uma cidadania ativa, diferente da ideia hegemônica de uma cidadania passiva, submissa aos deveres e pouco reivindicativa na conquista dos direitos já contemplados e de novos direitos, e/ou individualista, centrada no exercício individual do cidadão. O exercí- cio dessa cidadania ativa, promovida por uma educação ambiental crítica, dá aos educandos e educadores, como importantes atores do processo de gestão, instrumentos (compreensão-ação sobre realidades complexas mediadas por relações desiguais de poder) para sua efetiva participação como atores sociais num movimento coletivo de transformações socioambientais.

Reafirmando o caráter cidadão da educação, Luzzi (2005, p.383) diz que:

É uma educação para o exercício da cidadania, que se propõe a formar pessoas que assumam seus direitos e responsabilidades sociais, a formar cidadãos que adotem uma atitude participativa e crítica nas decisões que afetam sua vida cotidiana.

A cidadania promovida e que promove a educação ambiental crítica, como já havíamos dito, é uma cidadania planetária, isto é, agir localmente e pensar globalmente. Esse senso de pertencimento e (re)ligação ao todo é um dos princípios trabalhados pela educação ambiental crítica em oposição à separação homem e natureza estimulada pelo pensamento cartesiano da educação conservadora.

Sobre esse senso de pertencimento ou de (re)ligação ao todo, Guimarães (1995, p.15) nos fala que:

a EA tem o importante papel de fomentar a percepção da necessária integração do ser humano com o meio ambiente. Uma relação harmoniosa, consciente do equilíbrio dinâmico na natureza, possibilitando, por meio de novos co- nhecimentos, valores e atitudes, a inserção do educando e do educador como cidadãos no processo de transformação do atual quadro ambiental do nosso planeta.

No que concerne ao exercício da cidadania ativa, Freire (1997, p.36) nos diz que os seres humanos reúnem, dentro de si, condições para efetivá-lo, uma vez que são seres éticos: “mulheres e homens, seres histórico-sociais, nos tornamos capazes de comparar, de valorar, de intervir, de escolher, de decidir, de romper, por tudo isso, nos fizemos seres éticos”.

Tendo já apresentado o objetivo cidadão que fundamenta a educação ambiental crítica, deteremo-nos, agora, a discutir a natureza de algumas das suas práticas pedagógicas, as quais são determinantes para o sucesso ou insucesso da educação ambiental como instrumento de mudanças.

Primeiramente, devemos ter em mente a diversidade de propostas concebidas como iniciativas de educação ambiental. Nesse artigo, discutiremos apenas as que mais despontam nas atividades de EA.

A primeira proposta a ser aqui discutida é a mudança de comportamentos individuais. Embora seja importante, a atividade da EA não pode se restringir a essa proposta, uma vez que se tem percebido que a mudança individual, por si só, não tem sido suficiente para engendrar uma transformação mais complexa. Sobre essa estratégia, nos fala Pelicioni (2005, p.175, grifo nosso) que:

A ênfase na mudança de comportamento individual ofusca a dimensão política das questões socioambientais e, como ressalta a vertente am- bientalista ecossocialista, contribui para o prolongamento do status quo e para o atraso nas transformações estruturais necessárias. Portanto, é preciso que se realizem, concomitantemente, mudanças individuais e estruturais.

Guimarães (2004, p.132-133), ao nos falar sobre a importância da sinergia, articula-se ao pensamento de Pelicioni:

Para que essa postura represente de fato uma ruptura, com transformações sig- nificativas em uma intervenção processual, é necessária a sinergia de um mo- vimento conjunto. Não a soma de mudanças de comportamentos individuali- zados que gerem intervenções pontuais [...]. [...]. Sinergia é a força resultante de um movimento conjunto que se produz por uma intenção e ação coletiva, concentrada em objetivos comuns e no ritmo do que se tivesse produzido por uma soma de esforços individualizados (1 + 1 = 2; 1 com 1 > 2).

Dialogando com esses dois autores acima, citamos o que nos diz Pelicioni e Philippi Júnior (2005, p.4, grifo nosso), com destaque para o papel de transformação social também atribuído à educação:

Aos poucos foi ficando claro que a ecologia por si só não dá conta de reverter, de impedir ou de minimizar os agravos ambientais, os quais dependem de formação ou mudanças de valores individuais e sociais que devem expressar- -se em ações que levem à transformação da sociedade por meio da educação da população.

Em relação à estratégia de divulgação de informações, embora seja importante no pro- cesso de participação democrática, segundo Pelicioni (2005), ela é frágil se tomada como cami- nho único, uma vez que apenas o acesso à informação não conduz à resolução dos problemas socioambientais. Sobre isso, também nos fala Guimarães (2004, p.137-138, grifo nosso) que:

Educação ambiental não é apenas comunicação ambiental. Estabelecer uma equivalência entre educação e comunicação é acreditar que apenas a transmis- são da informação ambiental seja suficiente para proporcionar a transforma- ção individual e coletiva da sociedade, e que a transmissão da informação am- biental correta terá como reflexo uma mudança de comportamento individual e consequentemente social diante da natureza. Essa é uma visão reduzida da educação e que se amolda àquela visão mais conservadora que, ao não promo- ver as transformações, ajusta-se à reprodução do status quo. A informação é para ser trabalhada e não apenas transmitida.

Ao trabalhar essas informações, é importante haver problematização e criticidadee com- bate à superficialidade do tratamento dos problemas. Pelicioni (2005, p.178) exemplifica a am- pliação da abordagem do tema gerador lixo, evidenciando suas múltiplas inter-relações:

O problema do lixo, por exemplo, deve ser abordado e enfrentado conside- rando-se toda a sua complexidade, desde o trinômio produção-distribuição- -consumo de produtos e infra-estrutura e serviços existentes para o destino final daquilo que se tornou lixo, até os valores subjetivos que permeiam o imaginário dos membros da sociedade de consumo, o papel da mídia, entre outros fatores que sustentam o sistema capitalista.

Quanto à estratégia de sensibilização, Pelicioni e Philippi Júnior (2005, p.4) afirmam que “Consciência ecológica sem ação transformadora ajuda a manter a sociedade tal qual ela se encontra.”, logo, faz-se necessário “o exercício pleno de nossa cidadania em um processo de conscientização (consciência + ação), quando exteriorizamos, em nossas ações, aquilo que interiorizamos (razão e emoção) por uma reflexão crítica.” (GUIMARÃES, 2004, p.86).

Em relação aos agentes sociais envolvidos, é bastante comum atribuir à educação a res- ponsabilidade única de transformação social. Todavia, muitos outros sujeitos estão envolvidos, tendo em vista que a práxis é uma ação coletiva, de caráter popular. Como vimos, a EA estimula a cidadania para que os inúmeros sujeitos sociais possam atuar na construção de uma sociedade mais justa e ambientalmente sadia. Dentre esses agentes, Pelicioni (2005, p.177-178) destaca a responsabilidade do poder público, ou seja, a presença e atuação do Estado: “a comunidade não deve atuar em substituição às responsabilidades públicas, pois essas significam a evolução da própria sociedade, mas deve procurar a realização de ações em parceria [...]”.

Nesse ponto, é importante ressaltar a necessidade que essa educação ambiental crítica tem de dialogar e se articular à sabedoria popular e de se constituir, portanto, em uma educação multilateral, conforme afirma Gaudiano (1999) apud Guimarães (2004, p.34, grifo nosso):

Recuperam o saber tradicional e popular como ponto de partida na formulação de suas propostas pedagógicas (palavras geradoras, etnoconhecimentos etc.), para projetar desde aí a construção de outros conhecimentos que os dotem de melhores instrumentos intelectuais para mover-se no mundo e consideram que as condições de possibilidade de uma verdadeira educação ambiental residem na construção de propostas abertas, fraturadas, que não pretendem constituir- -se em universais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das discussões que foram estabelecidas neste artigo, inferimos as seguintes con- siderações.

Primeiramente, é indiscutível a necessidade de se (re)acender a chama crítica da educa- ção, de tal modo que ela ofusque o brilho da chama conservadora, pois, como vimos, a detur- pação da educação pelo sistema capitalista é inegável, tendo em vista a dialogicidade estabe- lecida entre si. Por mais que seja essa uma característica inerente da própria educação, deve-se buscar um movimento que vá de encontro à correnteza do rio (movimento único), provocando, assim, a mudança de seu curso, conforme reflete Guimarães (2004). Quem reunirá forças para

deflagrar esse movimento, essa mudança, será a educação crítica que conduz à práxis, na qual se insere a educação ambiental. Portanto, a influência da ordem capitalista sobre a educação é intrínseca à sua própria natureza, assim como o enfrentamento dessa condição, uma vez que a educação influencia a sociedade e é por ela influenciada.

O embate dialógico, de que havíamos falado, é constante, fazendo-se necessário, segun- do Freire (1996), comprometimento, coragem, alegria, humildade, criatividade, perseverança... de seguir nessa luta em busca de um presente (e futuro) mais humano.

Embora a educação crítica possa ser vista como “porta-voz” das mudanças necessárias, deve-se ter em mente que se trata de um processo que necessita da participação de vários agen- tes sociais, dentro os quais, a própria educação, o Estado, a participação cidadã da comunidade, etc.

Outra consideração a se fazer é que, apesar de ter sido um passo importante na relação meio ambiente e sociedade, a institucionalização e disseminação da EA, por si só, não são sufi- cientes para reverter o quadro de crise ambiental. É preciso, contudo, estar de olho na natureza de suas práticas, procurando refletir se elas possuem condições ou estão dispostas verdadeira- mente a contribuir para mudança do cenário atual.

Por último, é importante não perder a fé no ser humano, na sua capacidade de mudança e regeneração... enfim, na energia que traz consigo que o possibilita ser cada vez mais humano. REFERÊNCIAS

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 17. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GUIMARÃES, Mauro. A dimensão ambiental na educação. 8. ed.Campinas: Papirus, 1995. Disponível em: <http://books.google.com.br/books/about/Dimens%C3%A3o_Ambiental_ Na_Educa%C3%A7%C3%A3o_a.html?hl=pt-BR&id=huMtr2kOGoUC>. Acesso em: 28 set. 2014.

______. A formação de educadores ambientais. 8. ed.Campinas: Papirus, 2004.

LUZZI, Daniel. Educação ambiental: pedagogia, política e sociedade. In: PELICIONI, Maria Cecília Focesi; PHILIPPI JUNIOR, Arlindo. Educação ambiental e sustentabilidade. Ba- rueri: Manole, 2005.

PELICIONI, Andréa Focesi. Desvelando representações e práticas em educação ambiental. In: RIBEIRO, Helena (Org.). Olhares geográficos: meio ambiente e saúde. São Paulo: Senac São Paulo, 2005.

PELICIONI, Maria Cecília Focesi; PHILIPPI JUNIOR, Arlindo. Bases políticas, conceituais, filosóficas e ideológicas da educação ambiental. In: PELICIONI, Maria Cecília Focesi; PHI- LIPPI JUNIOR, Arlindo. Educação ambiental e sustentabilidade. Barueri: Manole, 2005. SEVERINO, Antônio Joaquim. Filosofia da educação: construindo a cidadania. São Paulo: FTD, 1994.

MATA ATLÂNTICA NOS LIVROS DIDÁTICOS: CONTEÚDOS E ATIVIDADES

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