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Os Axiomas Jurídicos e os Princípios Jurídicos

3.1 SISTEMA JURÍDICO E AUTONOMIA JURÍDICA OS ASPECTOS PONTUAIS DA

3.1.1 A Unidade no Sistema Jurídico: Racionalidade e Direito A Inteligência Jurídica e o

3.1.1.2 Os Axiomas Jurídicos e os Princípios Jurídicos

Entre os entes básicos de asseguramento do Sistema Jurídico queremos nos referir ao primeiro deles que são os axiomas, e porque fazem parte deste sistema devemos reconhecê- los como axiomas jurídicos. Como noção ou ideia anteposta, um axioma (do grego: axioma;

axio = valor, axios= estar em equilíbrio, válido, apropriado) pela sua significação e importância se apresenta como uma máxima, um adágio, ou mesmo um brocardo admitido como universalmente verdadeiro, sem uma necessidade de demonstração ou mesmo de comprovação. Em certas áreas do conhecimento como na Matemática ele existe como uma verdade que não exige demonstração, como uma verdade evidente por ela própria. Pela sua dimensão, uma vez que conceito e definição não se confundem do ponto de vista da Lógica Formal, se por um lado devemos dizê-lo deficiente na sua definição, por outro lado devemos dizê-lo suficiente enquanto conceito.

Os axiomas são aceitos intuitivamente e constituem fundamentos para uma ciência lógica e dedutiva. Por isso eles comparecem como pontos iniciais, ou hipóteses iniciais, como uma luz que ilumina determinados rumos a serem seguidos nas várias dimensões da compreensão, entre as quais não se coloca como exceção também o Direito. O papel do axioma jurídico tem um grau de importância destacado porque surge como aquele que batiza o caráter etiológico do Sistema Jurídico, permitindo a elaboração dele enquanto um sistema formal. Ele se antepõe a todos os demais fatores, criando um nível não só de estruturação, mas de compreensão do Direito demarcando-lhe um caráter ontológico diante dos demais fenômenos. O axioma jurídico deve ser entendido como uma máxima inicial evidente que dispensa qualquer providência demonstrável, e por isso afirmando-se por si mesmo, sendo que a sua aceitação se impõe para a organização do sequenciamento lógico no sistema. A sua presença no sistema jurídico é percebida e sentida em pontos gerais de arranjo que irão informar aspectos como determinação, ordenação, e mesmo de contiguidade (aproximação) nas disposições normativas e nos modelos (institutos) jurídicos.

Sobre um axioma jurídico há um implícito estado de consciência para a sua aceitação e admissão automáticas. Talvez seja o recurso lógico que mais atingiu um nível elevado de abstração para gozar de um padrão de imposição na dimensão da consciência jurídica. É que pelo seu caráter de abstração ele vai apresentar certa independência em maior ou em menor

grau de um condicionante material85. Por esta extensão ao nível da consciência jurídica em geral, deve ele ser tido como evidente e ao mesmo tempo admitido como verdadeiro sem a necessidade de ser demonstrado. O axioma jurídico pode existir de forma posta no sistema, mas pode existir mesmo antes do sistema posto, para inspirar neste os seus mecanismos regulamentares. Se verificarmos, por exemplo, a máxima romana no sentido de que na elegante definição de Celsus o Direito é a arte do bom e do equitativo (ut eleganter Celsus

definit, ius est ars boni et aequi), e que a ideia de Direito vem de ius86, deparamos nestes casos com matrizes axiomáticas jurídicas. Aqui o axioma comparece já como algo anteposto ao próprio sistema.

Fazendo parte do sistema um axioma jurídico não comporta uma contraposição, em razão do status da sua convicção afirmada no sistema. Pode-se dizer que num caráter de generalidade ele vai constituir a premissa maior do sistema, e para a sua constatação prática em um sistema hipotético-dedutivo ele deixa um sintoma que podemos diagnosticar através de “toda proposição, evidente ou não, que não se deduz de outra, mas que é posta pelo espírito no início da dedução”87. Ademais, ao discutir a dimensão de um axioma como um produto do espírito, devemos enxergar nisto a resultante em três operações básicas que é a simples apreensão, o juízo e o raciocínio88. Aplicando isto ao Direito temos a apreensão jurídica, o juízo jurídico e o raciocínio jurídico. No primeiro caso podemos ter uma ideia ou conceito jurídico; no segundo caso podemos ter uma proposição jurídica; e no terceiro caso podemos ter uma argumentação jurídica. Com esses alcances, um axioma, então, será interpretado existindo tanto fora do sistema como no interior do sistema, mas em ambos os casos ele vai compor vigas de sustentação do sistema.

Devemos compreender e aceitar na composição sistêmica do Direito, ao lado dos axiomas, também o papel e a presença dos princípios reconhecidamente como princípios

jurídicos. Embora os princípios possam ter uma fonte de inspiração nos axiomas, ambos não se confundem quando se trata de identificar os primeiros, principalmente se a tratativa busca uma atenção no Direito Positivo. Os princípios, diferentemente dos axiomas, são facilmente identificáveis no ordenamento, comparecendo de forma dispositiva e expressa na condução do regramento geral. De um modo geral um princípio serve de regra fundamental para as

85 TELLES JÙNIOR, Goffredo. Tratado da Consequência. 5. ed. São Paulo: Bushatsky, 1980, p. 74.

86 JUSTINIANO. Digesto. 7. ed. Trad. de Hélcio Maciel França Madeira. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2013, p. 19.

87 LALANDE, André. Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia. op. cit, p. 120. 88 TELLES JÙNIOR, Goffredo. Tratado da Consequência. op. cit, p. 75.

explicações tanto de alcance filosófico como científico (neste último caso uma regra positiva), podendo se assumir como uma lei de caráter geral que regula um determinado fenômeno. Nisto ele é o mesmo que uma regra-mestra (ou regra matriz), podendo comparecer como regra de comportamento, preceito ou diretriz, materializando-se em lei ou em norma. E quando focalizamos o problema no âmbito do Direito Positivo isto deve ser uma recomendação tanto para os princípios gerais do Direito como também para qualquer modelo de princípio especial que comparece expressamente encartado no sistema. Ambos assumem um caráter normativo mesmo no caso dos princípios gerais de Direito, que segundo Norberto Bobbio eles constituem “normas fundamentais ou generalíssimas do sistema”, ou seja, “são normas como todas as outras”89.

No âmbito do Sistema Jurídico positivo os princípios se destacam de um axioma assumindo-se como um poder regulamentar de forma expressa, direta e imediata, apresentando-se como regras matrizes do sistema. Podemos dizer que os princípios comparecem como regras estruturantes no sistema, o que se percebe pelo alcance da sua eficácia programática. Eles existem como componentes fundamentais do Sistema Jurídico na medida em que este se constitui numa construção de princípios e normas, e cuja estrutura ordenada conserva seus princípios próprios, estes que vão constituir o fundamento da vida jurídica90. Daí a força da autonomia jurídica. O princípio no Sistema Jurídico positivo então é de alcance determinado como viga de sustentação e de asseguramento da própria positividade. Não há como se dissociar, no Direito, esta função elevada que é reservada aos princípios. Neste seu papel estruturante eles se projetam sobre o sistema normativo positivo propiciando- lhe o entendimento num padrão lógico e racional. Neste caso, como lembra oportunamente Celso Antônio Bandeira de Mello, a sua violação “é muito mais grave que transgredir uma norma”91.

Para se ter uma ideia do comprometimento que é reservado aos princípios, quando falamos na ideia de princípios gerais do Direito na índole positivista, eles haverão de corresponder aos princípios gerais de determinado Direito Positivo, os quais emanam necessariamente de um determinado texto legal e do sistema normativo referentes a um

89 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10. ed. Trad. de Maria Celeste Cordeiro Leite dos

Santos. Brasília: Editora Universidade de Brasília, p. 158.

90 PALASI, José Luis Villar. La Interpretacion y los Apotegmas Juridicos-Logicos. 1. ed. Madrid: Editorial

Tecnos S.A., 1975, p. 47 - 48.

91 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. 1. ed. São Paulo: Editora RT,

Estado específico92. Por isso os princípios jurídicos positivos não devem ser confundidos com outras naturezas de princípios, quando se coloca em pauta a compreensão do fenômeno jurídico. Neste contexto devemos nos advertir que na sua função técnica da dimensão sistêmica os princípios são, na essência, normas que não assumem distinção quanto a isto quando comparadas com as demais categorias normativas, diferenciando-se apenas quanto ao grau de generalidade ou quanto ao aspecto programático93que nutrem no sistema e para o sistema.